História de ADRIANA FERNANDES, IDIANA TOMAZELLI E VICTORIA AZEVEDO – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Fernando Haddad (Fazenda)
entregou ao Congresso Nacional nesta quarta-feira (24) a primeira
proposta de regulamentação da reforma tributária.
O projeto de lei complementar trata das regras gerais de operação dos
novos tributos, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) federal, o
IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) de estados e municípios e o IS
(Imposto Seletivo).
Em entrevista coletiva após o ato, o secretário extraordinário da
Reforma Tributária, Bernard Appy, disse que, com o desenho do projeto de
lei, a alíquota do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado) ficaria
entre 25,7% e 27,3%, com uma média de 26,5%. “Eu diria que a referência é
a média”, afirmou.
Se confirmado esse patamar, a alíquota brasileira ficará entre as
maiores do mundo para um IVA. Hoje, a maior do gênero é a da Hungria, de
27%.
Não estava nos planos do Ministério da Fazenda divulgar agora os
valores das alíquotas, mas a equipe econômica foi alertada de que essa
seria uma das primeiras cobranças dos deputados no início da tramitação
do projeto.
Quando a reforma foi promulgada, no final do ano passado, o governo
preferiu não revelar os novos cálculos, apesar da insistência de vários
setores empresariais.
No ano passado, o governo chegou a estimar uma alíquota de até 27,5%,
mas o valor médio atualizado ficou um pouco mais baixo do que o
previsto anteriormente porque alguns itens do projeto de regulamentação
ficaram mais duros.
Na prática, isso significa regras mais apertadas para os regimes
diferenciados ou com alíquota reduzida. É a primeira vez que o governo
divulga a média da banda de variação da alíquota, que é o ponto
considerado mais factível.
Segundo Appy, o resultado final vai depender das mudanças promovidas
pelos parlamentares durante a tramitação. Quanto mais exceções, maior a
carga sobre os demais contribuintes.
Por outro lado, a Fazenda tem a expectativa de que a digitalização da
cobrança exerça um papel importante para reduzir a sonegação, o que
contribuiria na direção de reduzir a alíquota.
Haddad entregou o projeto ao presidente da Câmara dos Deputados,
Arthur Lira (PP-AL), na presença de líderes da Casa. Segundo ele, o
texto tem cerca de 300 páginas e 500 artigos.
“As pessoas podem se assustar um pouco, são 300 páginas e 500
artigos, mas isso substitui uma infinidade de leis que estão sendo
revogadas e substituídas por um sistema tributário que será um dos mais
modernos do mundo”, afirmou o ministro.
Após dias de ruídos em torno da articulação política do governo com o
Congresso, o ministro da Fazenda aproveitou o ato para elogiar as
tratativas com Câmara e Senado para o envio da proposta.
“Nós estamos muito confiantes no processo. Eu fiz mais uma vez
questão de elogiar as tratativas que vêm ocorrendo na Câmara e no Senado
em torno dos projetos, sobretudo da agenda econômica, têm recebido
atenção das Casas. Nós nem sempre saímos daqui eufóricos com o resultado
das negociações, mas em todos os casos houve avanço. Em todos os casos
nós demos um passo na direção correta”, disse Haddad.
“Todos os projetos encaminhados ao Congresso receberam atenção, e o
presidente Lira me afiançou que o calendário que ele pretende fixar para
a deliberação nesta Casa vai até o recesso do meio do ano”, afirmou o
ministro.
Após o ato na Câmara, Haddad foi à residência oficial do Senado fazer
a entrega simbólica do projeto ao presidente da Casa, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG). Os senadores analisarão a proposta só depois da votação na
Câmara.
A ideia inicial do ministro era enviar dois projetos. O segundo
agruparia a regulamentação do Comitê Gestor do IBS e as novas regras
sobre como lidar com disputas administrativas e judiciais dos novos
tributos, o que, na prática, definirá como funcionará o contencioso.
Na noite de segunda-feira (22), Haddad afirmou que o envio dos textos
seria dividido. Como mostrou a Folha de S.Paulo, um impasse envolvendo o
Comitê Gestor do IBS travou a conclusão do segundo projeto.
O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da PEC (proposta de
emenda à Constituição) da reforma no ano passado, também estava presente
e ficou próximo a Haddad durante a entrevista coletiva, embora sua
indicação como relator do projeto esteja incerta.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, em meio a disputas antecipadas pela
sucessão na Mesa Diretora da Câmara, circula nos bastidores a
possibilidade de Ribeiro não ser designado para o posto.
Lira sinalizou a aliados que estuda a possibilidade de fatiar os
textos que serão enviados pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
para prestigiar diferentes grupos políticos ou partidos com as
relatorias.
Ribeiro tem o apoio da Fazenda e de Lula, que defendeu sua indicação
nesta terça-feira (23) em conversa com jornalistas no Palácio do
Planalto.
O petista ressaltou que a indicação do relator é prerrogativa de
Lira, mas afirmou que o deputado está familiarizado com o tema e as
negociações, o que pode facilitar na tramitação do texto.
“Quem indica é o presidente da Câmara, longe de mim indicar, só
gostaria que levassem em conta isso”, afirmou Lula, sem citar
nominalmente Ribeiro.
O presidente da Câmara disse nesta quarta que vai conversar com
líderes dos partidos para definir relatorias e calendário de tramitação.
“Não tive reunião com parlamentares e líderes para discutir, mas
nossa ideia é trabalhar para que em 60, 70 dias isso possa estar no
plenário da Câmara, ou seja, antes do final do recesso do primeiro
semestre. Se não houver condições políticas, a gente vai vendo com o
tempo”, afirmou Lira.
Ele disse que Ribeiro terá “eterna gratidão” pelo papel que
desempenhou na relatoria da PEC da reforma no ano passado, mas não deu
certeza de sua indicação para cuidar dos projetos de regulamentação.
“A opinião do presidente é importante, a gente respeita, mas nós
temos uma quantidade absurda de deputados competentes que também desejam
relatar essas matérias. O deputado Aguinaldo Ribeiro tem sempre e terá a
nossa eterna gratidão, é companheiro de partido, muito conceituado e
competente, mas ele já relatou a PEC da tributária, essas
regulamentações necessariamente não precisam ter o mesmo relator”,
disse.
Segundo ele, há a possibilidade de se formar dois grupos de trabalho para cuidar das discussões.
Pacheco, por sua vez, afirmou que também pretende dar celeridade à análise do texto.
“Mesmo sendo ano eleitoral, nós teremos todo o compromisso para,
ainda este ano, assim como fizemos com a emenda constitucional no ano
passado, entregarmos para a sociedade brasileira essa lei aprovada para
termos, enfim, uma reforma tributária no nosso país”, disse após receber
o texto.
A regulamentação da reforma tributária vai detalhar diversos pontos
da reforma tributária, como quais produtos farão parte da chamada Cesta
Básica Nacional, que terá alíquota zero, e quais terão o benefício da
alíquota reduzida (equivalente a 40% da cobrança de referência).
“Vários alimentos foram incluídos na cesta básica de tributação zero.
Aí tem uma segunda alíquota que não é zero, que é a alíquota reduzida. E
uns poucos produtos de consumo de luxo que ficaram na alíquota cheia,
na chamada alíquota padrão ou alíquota de referência. Isso tudo está nas
tabelas, isso tudo vai ser de conhecimento público”, disse Haddad.
O Ministério da Fazenda vai conceder uma entrevista coletiva nesta quinta-feira (25) para detalhar pontos técnicos da proposta.