segunda-feira, 15 de agosto de 2022

AS EMPRESAS TÊM A FINALIDADE TORNAR O MUNDO UM LUGAR MELHOR?

 

Free Enterprise Project

Por
Bruna Komarchesqui – Gazeta do Povo


No ano passado, um membro do Free Enterprise Project esteve em uma reunião de acionistas da Coca-Cola, para questionar suas políticas identitárias, como um treinamento de diversidade que sugeria a funcionários “tentar ser menos brancos”; a foto é da planta de Málaga, em 2020| Foto: EFE/Jorge Zapata

Balizador da economia mundial por quase cinco décadas, o princípio do capitalismo acionário (aquele em que o propósito de uma corporação é gerar lucro para seus donos) vem sendo ameaçado por uma onda militante, cuja crença é a de que as empresas têm o dever moral de tornar o mundo um lugar melhor. Se, como dizem os progressistas, o capitalismo “acordou”, a verdade é que despertou consigo a reação de acionistas conservadores, que têm se organizado em iniciativas como o Free Enterprise Project (FEP, ou Projeto de Livre Empresa, em tradução livre). Fundado em 2007, pelo Centro Nacional de Pesquisa de Políticas Públicas dos Estados Unidos, o programa compra ações de empresas de capital aberto, para fazer perguntas difíceis nas reuniões de acionistas. O objetivo é combater as políticas “woke”, para tirar as corporações americanas da política.

No ano passado, os alvos do FEP incluíam Warner Bros. Discovery, Comcast, Twitter e Coca-Cola. Entre as críticas à produtora do refrigerante mundialmente famoso estava uma lição do LinkedIn Learning (posteriormente removida), instruindo funcionários a “tentar ser menos brancos”, como parte de um treinamento de diversidade, além da oposição a um projeto de lei tido como discriminatório por exigir documento de identificação para eleitores na Geórgia. “Nós nos opomos a medidas que possam procurar diminuir ou restringir o acesso a voto. Defendemos o amplo acesso, a conveniência do eleitor, a integridade da eleição e a neutralidade política. Qualquer coisa que possa inibir estes princípios pode levar à supressão do voto”, disse na ocasião o CEO da Coca-Cola para a América do Norte, Alfredo Rivera.

Em uma reunião de acionistas do Bank of America, o diretor do Free Enterprise Project, Scott Shepard, pediu ao CEO Brian Moynihan que “explicasse especificamente como exigir que os eleitores mostrem identidade para evitar fraudes é racista”. A resposta, considerada por Shepard uma pequena vitória, foi que talvez o banco devesse ter uma comissão bipartite para decidir quando entrar em questões políticas.

“Todo o ativismo dos acionistas nos últimos 20 anos foi da esquerda e, cada vez mais, da extrema esquerda. Nosso objetivo não é que as empresas adotem posições políticas conservadoras de repente, mas que voltem ao negócio de vender refrigerantes”, argumenta Shepard.

Em uma reunião de acionistas da Progressive, terceira maior seguradora dos Estados Unidos, Ethan Peck, do FEP, questionou “a valorização das características superficiais em detrimento do mérito” e por que a companhia prioriza “cor da pele e órgãos reprodutivos” ao contratar funcionários. A CEO Tricia Griffith exaltou a Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I), dizendo que a empresa deseja que sua força de trabalho “reflita os clientes que atendemos e que nossos líderes reflitam as pessoas que lideram”.

Questionada por Peck se isso supunha que “as pessoas com uma certa cor de pele pensam de uma certa maneira”, ela encerrou a conversa: “Você não pode se colocar no lugar de outra pessoa se não tiver uma organização representativa que represente o país como um todo. Você nunca poderia saber como é ser uma mulher, eu nunca poderia sentir como é ser um homem, então precisamos representar todos”.

Dificuldades 
A experiência de intervir em reuniões de acionistas tem encontrado uma resistência “criminosa” por parte dos executivos, segundo relata Ethan Peck. “As elites corporativas tomam todas as medidas possíveis para excluir e silenciar os acionistas que pagam seus salários multimilionários”, conta. As dificuldades encontradas por eles nas reuniões vão desde a permissão para entrar nas assembleias (mesmo sendo proprietários), até ter suas perguntas reformuladas ou ignoradas e suas propostas de acionistas omitidas. “Embora os acionistas de centro-direita sejam os mais discriminados, os executivos ainda os desprezam mais por serem acionistas do que por serem conservadores”, garante.

A hipótese levantada por Peck é que, longe de serem militantes progressistas ou sinalizadores de virtudes, os executivos estejam usando o “capitalismo de stakeholders” (em tradução livre, capitalismo das partes, ou seja, funcionários, clientes, fornecedores, comunidades locais e a sociedade em geral), como eufemismo para um “golpe da cúpula contra os verdadeiros donos das empresas, os acionistas”. “Os executivos postulam que as corporações são responsáveis ​​não por seus acionistas, mas sim por ‘todas as partes’. Isso permite que a liderança corporativa confisque o poder dos acionistas sob o pretexto de ajudar os outros. Não é diferente do comunismo, na verdade: ‘Dê-me sua propriedade; É para um bem maior!’”, denuncia Peck.

Segundo ele, algumas corporações utilizaram os protocolos de combate à Covid-19 para fazer reuniões virtuais (que permitiram pré-selecionar, modificar ou omitir comentários e perguntas de acionistas) ou para exigir a vacinação (o que excluiu muitos acionistas). “Nossas perguntas foram totalmente ignoradas nas reuniões da Alphabet, Amazon, Meta, Twitter, BlackRock, JPMorgan, Visa, Starbucks, Coca-Cola, Pepsi, Exxon, Chevron e outros. Na Apple, Raytheon, Boeing, US Bancorp, Marriott, Nordstrom e outros, nossas perguntas foram estrategicamente reformuladas para perguntas fáceis por um moderador. A Pfizer e a Netflix não se deram ao trabalho de responder a nenhuma pergunta. American Express, Abbott Laboratories e AES nos negaram a entrada por completo”, enumera.

Na reunião da Lincoln Financial, Ethan Peck era o único acionista presente. Ao questionar o então presidente Bill Cunningham acerca do apoio de Lincoln à Human Rights Campaign (que participou do lobby contra a lei proibindo o ensino sobre identidade de gênero para alunos do jardim de infância até a terceira série na Flórida) ele teve sua pergunta blindada por um assessor e acabou sem resposta.

O Free Enterprise Project também denuncia que as eleições de diretores corporativos não são confiáveis. Das 57 reuniões em que seus membros estiveram presentes em 2022, nenhum candidato deixou de ser eleito, de acordo com Peck. “Na verdade, nunca vi um membro do conselho receber menos de 90% dos votos. Há uma explicação simples para isso: BlackRock, Vanguard, State Street e outros gigantes da gestão passiva votam em nome de seus clientes – que são os verdadeiros acionistas – para colocar no poder esses membros do conselho que desprezam os acionistas”, lamenta.

Acionistas engajados 
Investidores interessados em combater o capitalismo woke, podem se tornar acionistas engajados, juntando-se ao Free Enterprise Project. No site do programa, há uma série de orientações práticas, explicando como participar de uma assembleia de acionistas, fazer perguntas em uma assembleia virtual ou presencial, elaborar uma boa pergunta, votar e apresentar propostas em reuniões.

Contrário aos boicotes, que “são ineficazes e, francamente, um desperdício de tempo e energia”, o projeto acredita que o combate ao progressismo ocorrerá por meio do engajamento de acionistas ativistas conservadores. “Incentivamos fortemente os acionistas a se envolverem ativamente como proprietários da empresa. A melhor maneira de responsabilizar essas corporações é participar de assembleias anuais de acionistas, votar em seus procuradores, questionar executivos de negócios durante sessões de perguntas e respostas e votar em membros do conselho que abandonaram seus deveres fiduciários”, defende o FEP, em uma das “perguntas frequentes” do site.

Fórum de Davos 

O conceito “capitalismo de stakeholders” tem mais de cinco décadas, mas ganhou forças nos últimos anos, com a publicação do Manifesto de Davos 2020, assinado pelo fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab (que cunhou o termo ainda nos anos 1970).

“O propósito de uma empresa é engajar todos os seus stakeholders na criação de valor compartilhado e sustentado. Ao criar esse valor, uma empresa atende não apenas a seus acionistas, mas a todos os seus stakeholders – funcionários, clientes, fornecedores, comunidades locais e a sociedade em geral. A melhor maneira de entender e harmonizar os interesses divergentes de todas as partes interessadas é por meio de um compromisso compartilhado com políticas e decisões que fortalecem a prosperidade de longo prazo de uma empresa”, afirma o Manifesto.

O texto ainda defende que “uma empresa é mais do que uma unidade econômica geradora de riqueza. Ela cumpre as aspirações humanas e sociais como parte de um sistema social mais amplo. O desempenho deve ser medido não apenas pelo retorno aos acionistas, mas também pela forma como atinge seus objetivos ambientais, sociais e de boa governança”.

Iniciativa da Sala de Reuniões 

Em abril, o Free Enterprise Project e o 2ndVote (outra organização contra o ativismo corporativo), juntamente com o fundador do grupo conservador Job Creators Network, Bernie Marcus, firmaram uma parceria com o ex-CEO do McDonald’s Ed Rensi e o ex-CEO da Best Buy Brad Anderson para criar o The Boardroom Initiative (A Iniciativa da Sala de Reuniões, em tradução livre), uma ação em defesa da capitalismo.

“Servir a uma minoria vocal por ignorância é absolutamente inaceitável. Quando as empresas públicas tomam partido em debates políticos, é em detrimento dos acionistas da empresa. O capitalismo de livre mercado – um sistema responsável por tirar bilhões da pobreza e melhorar o padrão de vida mundial – está sob ataque e, em muitos casos, as corporações estão participando avidamente desses ataques por um senso de virtude equivocado”, defende Rensi, presidente executivo da Iniciativa.

O trabalho da coalizão pretende realinhar as corporações com seus principais objetivos, por meio de propostas de acionistas, da promoção da diversidade de pontos de vista nos conselhos das empresas e pela utilização de canais digitais para divulgar as ações. A ideia é dar aos acionistas as ferramentas necessárias para “vencer a luta”. O primeiro esforço da Boardroom Initiative foi uma proposta de acionistas na reunião anual do Bank of America, pedindo auditoria nas políticas de diversidade da empresa, de modo a garantir que nenhum grupo de raça ou gênero seja excluído em nome de equidade ou anti-racismo.


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VARÍOLA DOS MACACOS E ARTIMANHAS POLÍTICAS NO JUDICIÁRIO

 

Ação no STF

Por
Alexandre Garcia


Ação de deputado do PSB no STF quer tornar obrigatória a vacina contra varíola dos macacos| Foto: Nelson Jr./STF

Os pequenos partidos, que não têm votos suficientes no plenário do Congresso para fazer valer suas vontades, continuam usando o Supremo Tribunal Federal como ferramenta política. O próprio presidente do STF, Luiz Fux, já fez um apelo sobre isso aos colegas da Corte: partido político tem que decidir essas questões no plenário político e não nos tribunais. Mas não adiantou nada.

Agora, um deputado do PSB do Distrito Federal entrou no STF contra o presidente Jair Bolsonaro por causa da varíola dos macacos. O ministro Alexandre de Moraes foi sorteado relator. E o que quer o deputado? Quer que a vacina contra a varíola dos macacos seja obrigatória.

Em primeiro lugar, quem já tomou vacina contra varíola está vacinado, segundo ouvi de especialistas em imunologia. Em segundo lugar, estão matando macacos, por envenenamento, imaginando que a doença vem deles, mas não vem. Basta que a gente se informe: essa varíola passa de homem para homem – não é de homem para mulher – em 98% dos casos.

Então deixem os macacos e quem não é grupo de risco e já tomou vacina contra varíola em paz. Essa história de vacina obrigatória virou mania.

Morte de delator
Paulo Roberto Costa, o primeiro a fazer um acordo de delação premiada com a Justiça na Lava Jato, morreu no sábado (13), de câncer, aos 68 anos. Ele foi diretor da Petrobras entre 2004 e 2012, indicado pelo líder do PP na Câmara, o deputado paranaense já falecido José Janene.

Naquele tempo, era isso que acontecia. Os líderes dos partidos decidiam sobre os rumos da Petrobras, o que ela podia comprar ou não. Eram os intermediários das negociatas, que resultava em dinheiro para partidos, empreiteiras, políticos.

Costa estava condenado a 70 anos de prisão, mas passou os últimos de vida em casa, beneficiado pelo acordo de colaboração premiada. Entrou para a história como o primeiro delator a dizer como funcionava o esquema do petrolão.

Processo arquivado
O juiz da 10ª Vara Federal de Brasília, Ricardo Leite mandou arquivar, por sugestão do Ministério Público, o processo contra os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, e o ex-ministro Aloizio Mercadante por suposta obstrução da Justiça. E por que foi para o arquivo? Porque Lula e Dima tem mais de 70 anos e o prazo de prescrição se reduz pela metade. O caso Lula na Lava Jato lá de Curitiba foi uma questão de CEP, agora foi uma questão de calendário.

São as artimanhas que os políticos põem na lei que fazem para se livrar quando chegar neles. A lei penal brasileira, com essas prescrições, audiências de custódia e etc, é feita para derrubar tudo aquilo que você, pai, mãe, mestre, pastor, padre…, diz quando ensina as crianças que o crime não compensa. A lei brasileira derruba isso, mostra que aqui no Brasil o crime compensa. Muito triste isso!


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CHINA TEM PROBLEMAS COM ALUNOS COM DIFICULDADES DE APRENDER

 

Ásia

Por
Fábio Galão – Gazeta do Povo


| Foto: Pixabay

Numa entrevista em 2017 à prestigiada revista científica Science, o professor Scott Rozelle, do Instituto Freeman Spogli de Estudos Internacionais da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, fez um alerta: quase um terço da população da segunda maior economia do mundo está ficando para trás na formação escolar.

Naquela época, pesquisas realizadas pela equipe de Rozelle, coordenador do Programa de Ação de Educação Rural (Reap, na sigla em inglês), apontaram que mais da metade dos alunos da oitava série em áreas rurais pobres na China tinham QI abaixo de 90 e um terço ou mais das crianças nessas regiões não completava o ensino fundamental.

Acrescentando a essa conta os 15% ou mais de crianças moradoras de áreas urbanas chinesas que também apresentavam resultados ruins em avaliações de habilidades e aprendizado, Rozelle estimou à Science que cerca de 400 milhões de chineses corriam “o risco de se tornarem deficientes cognitivos”.

Uma proporção tão grande da população sem conseguir a formação escolar adequada seria um indicador ruim em qualquer país, mas é especialmente dramática para a China, que aposta na capacitação do seu povo para seguir crescendo a níveis superiores ao do resto do mundo e para aumentar sua classe média, com foco no crescimento da renda pessoal e do consumo.

“Este é o maior problema que a China está enfrentando e que ninguém nunca ouviu falar”, destacou Rozelle há cinco anos.

Tentando verificar se havia estratégias que poderiam reverter esse cenário preocupante, a equipe do pesquisador de Stanford monitorou nos últimos anos nove programas, abrangendo 11 intervenções, que contemplaram 47.480 alunos do ensino secundário (etapa que antecede o ensino médio no currículo escolar chinês) rural em 713 escolas chinesas.

Em maio, um relatório apontou o resultado dessas estratégias e ele foi desanimador: elas foram incapazes de gerar melhorias significativas de aprendizado na população estudantil atendida.

Esses programas e intervenções foram baseados em quatro eixos principais. O primeiro foi ajuda financeira, já que nas regiões rurais da China muitas famílias não conseguem pagar as mensalidades da educação básica, “que estão entre as mais altas do mundo em desenvolvimento”.

O segundo eixo foi incentivar a continuidade dos estudos por meio de aulas-extras em que os professores abordaram com os estudantes possibilidades de carreira, níveis salariais almejados e habilidades e formação necessárias para atingir esses objetivos, além de controle emocional e maneiras de lidar com a ansiedade – que é alta entre estudantes das áreas rurais da China.

Outro eixo foram treinamentos online suplementares e acompanhamento contínuo dos professores que atuam nessas regiões, além da introdução de um sistema de pagamentos em que os docentes receberam bônus salariais com base não no nível médio de desempenho de seus alunos, mas sim nos ganhos de desempenho de cada estudante em comparação com alunos em outras escolas que apresentavam nível semelhante quando o programa começou.

Por fim, o quarto eixo consistiu na entrega de óculos grátis para estudantes com problemas de visão.

Entretanto, quase cinco anos depois da entrevista de 2017, a equipe de Rozelle concluiu que nenhuma das 11 intervenções aplicadas foi capaz de melhorar o desempenho dos alunos monitorados no estudo.

“Uma interpretação disso é que o desempenho dos alunos no ensino secundário rural chinês não é suscetível a simples mudanças nas políticas”, apontou o relatório. “Depois de explorar algumas hipóteses, encontramos evidências sugestivas de que a natureza da política chinesa de matrícula no ensino médio e o currículo do ensino secundário são as melhores possibilidades para explicar a falta de ganhos de desempenho.”

O estudo de Stanford apontou que o sistema de educação imposto pela ditadura comunista, altamente centralizado, impede que estudantes com mais dificuldades ou aprendizado mais lento sejam atendidos satisfatoriamente – e acabam sendo deixados para trás.

“Devido à importância do exame de admissão ao ensino médio, o currículo no ensino secundário é altamente estruturado, difícil e acelerado. Também é regulamentado em um nível superior de administração (por exemplo, o condado, a prefeitura ou a província), de modo a ser justo para todos os alunos da jurisdição”, destacou o relatório da equipe de Rozelle.

“Como todos na jurisdição fazem o mesmo exame, todos precisam cobrir o mesmo material para o exame no mesmo período e com a mesma profundidade. Como resultado, o ritmo da aula muitas vezes escapa ao controle de professores e diretores – e não considera as diferenças de habilidade entre os alunos”, descreveram os pesquisadores americanos.

Nos últimos anos, o ditador Xi Jinping colocou a educação como um dos pilares para a transformação da China em uma “nação socialista moderna” até 2035 e em uma grande potência “próspera” e “forte” até 2049, ano do centenário da vitória comunista na Guerra Civil chinesa.

Entretanto, assim como o Partido Comunista defendeu no ano passado que a China é uma “democracia que funciona”, a diferença entre discurso e prática segue o padrão local de gigantismo e o alerta de que 400 milhões de chineses podem ser atropelados pela história segue válido.


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FUNKEIROS FAZEM MÚSICAS COM APOLOGIA AO CRIME

 

Sem medo da polícia
Por
Gabriel de Arruda, especial para a Gazeta do Povo


Clipe da música “Carro Forte”.| Foto: Reprodução/Youtubr

As letras de duplo sentido são coisa do passado no mundo do funk. Com cada vez mais frequência, crime, drogas e sexo têm sido tratados de forma crua para uma audiência de milhões de pessoas e com a simpatia do chamado mainstream cultural. Além dos perigos da influência nociva sobre os mais jovens, o fenômeno traz à tona a relação entre facções criminosas e artistas do mundo do rap — ou dos seus subprodutos funk e trap.

A existência dos chamados funk “proibidões”, que exaltam o crime, não é nova. A novidade é que a apologia à atividade criminosa deixou de ser algo amador, quase secreto, para atingir um público gigantesco e ganhar a legitimação de parte do establishment cultural — sem serem incomodados pelo Judiciário e das plataformas como o YouTube, que costumam ser mais ágeis ao sancionar quem questiona a eficácia das vacinas ou a confiabilidade da urna eletrônica.

Os exemplos se multiplicam
O carioca Marlon Brendon Coelho Couto da Silva, conhecido como MC Poze do Rodo, é um dos principais nomes do rap nacional. Poze é amigo do jogador Gabigol, tem 7,6 milhões de seguidores no Instagram e, em 2021, participou até mesmo do jogo das estrelas de fim de ano, organizado pelo ex-jogador Zico e transmitido pelo canal Sportv. Acontece que, para a polícia do Rio, Poze do Rodo é mais do que isto: ele é um porta-voz do Comando Vermelho.

E não é difícil dar credibilidade a esta tese. Não só porque ele já apareceu, de fuzil em punho, ao lado de criminosos da facção, ou porque ele faça apresentações em áreas onde o tráfico de drogas detém o monopólio dos bailes funk, mas porque o próprio Poze do Rodo faz questão de proclamar sua ligação com o crime.

E uma de suas músicas mais populares, “Cara do Crime”, os versos iniciais são estes:

“Ela fala que quer crime e eu sou criminoso. Ela é da Zona Sul e eu sou cria do Rodo”

Na letra, assim como faz em boa parte de suas músicas, Poze do Rodo também pede “liberdade aos amigos”, em referência aos aliados que estão na prisão.

O videoclipe da música tem 258 milhões de visualizações no YouTube. O sucesso levou Poze do Rodo a lançar duas partes para a música, em parceria com outros rappers. Na parte 3 (que teve 36 milhões de visualizações até agora), as referências ao crime organizado são ainda mais diretas.

No videoclipe, o rapper Bielzin aparece no alto do morro, em uma laje, com um radiocomunicador nas mãos e uma mochila nas costas. É o estereótipo do soldado do tráfico. Ele canta:

“É a melhor gestão
Complexo dominando o alto igual falcão
Fazendo a ronda com os crias”

“Gestão” é como os defensores das facções criminosas se referem ao grupo de traficantes que controlam uma área específica. Nesse caso, o Complexo do Alemão, cuja “gestão” é do Comando Vermelho.

A poesia segue:

“Fazendo a ronda com os cria
Na atividade dobrada
Mil e duzentas no porte do homem
Se tentar contra nós, tu se f.”

A canção também tem a participação de Filipe Ret, que acabou de lançar uma música com a cantora Anitta. Ele aparece entoando os seguintes versos:

“Queimando um no meio-fio
Desse perfume eu vendo quilo”

Os versos se referem ao uso e tráfico de maconha. Para quem tem alguma, Filipe Ret faz questão de deixar claro:

“A cara do chefe do crime perfeito
Fala o que quiser, nós é exemplo mermo”

O que talvez seja ainda mais chocante é que o vídeo tem o patrocínio da Blaze, um site de apostas que, além de youtubers, é o principal patrocinador da equipe do Botafogo. No videoclipe, entre ameaças aos inimigos e versos de exaltação própria, os artistas aparecem utilizando o aplicativo da Blaze.

“A Cara do Crime” foi produzido pela Mainstreet, uma gravadora que tem perfil verificado no YouTube. A empresa foi criada pelo rapper Orochi e apresenta um longo catálogo de músicas com apologia ao crime — todas elas com grande audiência no YouTube.

Em uma canção batizada de “Quebra Osso”, por exemplo, é possível encontrar ameaças aos “pilas” — aparentemente, uma referência à polícia.

“Eu tô de glockada, com a mochila cheia de pente
Dois ar e os cobertura na cautela, nós foi pela linha amarela
Da janela eu vi os pila, mas o carro não é blindado
Se eles vim tentar dar bote é duas pra baixo, eu largo o aço”

Outra produção da gravadora, “Carro Forte”, descreve um assalto a um carro forte de forma detalhada.

“É só pitbull de raça
Se reagir nós te passa” (mata).

O vídeo tem mais de 45 milhões de visualizações. O clipe exibe exatamente o que a letra descreve: armas e mais armas, seguranças sendo feito reféns e os criminosos celebrando o assalto. Assim como quase todas as músicas que exaltam a atividade criminosa, a letra de “Carro Forte” inclui menções pouco lisonjeiras às mulheres, que são apresentadas como interesseiras e descritas em termos vulgares.

A Mainstree não é uma gravadora marginal. O canal do grupo no YouTube tem 2,2 milhões de inscritos e o selo de verificação da plataforma. Em março deste ano, o jornal O Globo fez uma reportagem elogiosa à Mainstreet com o título de “Gravadora carioca faz sucesso unindo trap dos EUA com o funk da favela”.

A tolerância com a apologia ao crime parece estar se tornando cada vez maior. Em 2019, a cantora Ludmilla fez uma música exaltando maconha – não só o uso, mas o comércio da droga – e isso não tirou dela o espaço como atração na TV Globo. A letra de “Verdinha”, que não exige maiores explicações:

“Eu fiz um pé lá no meu quintal
Tô vendendo a grama da verdinha a um real
(…)
Fiquei loucona, chapadona
Só com a marola da ‘juana”

Ludmilla teve a oportunidade de entoar estes versos em rede nacional, no programa Encontro com Fátima Bernardes. Talvez o interesse comercial explique as vistas cegas à apologia ao crime. Segundo o Spotify, o funk foi o segundo estilo mais ouvido entre os brasileiros em 2021, atrás apenas do sertanejo.

Relações criminosas
Para João Henrique Martins, cientista político especializado em economia ilícita e controle do crime, o rap brasileiro está profundamente ligado à urbanização acelerada e desordenada na segunda metade do século 20. Ele diz que, em sua forma original, o estilo falava sobre o crime, que era parte da realidade das periferias, mas não exaltava o crime. Isso mudou a partir dos anos 1990, por dois motivos. Em primeiro lugar, a expansão do poderio econômico das facções criminosas, que passaram a financiar diretamente a indústria do rap e do funk. Em segundo lugar, o avanço do relativismo cultural, promovido de diversas formas, mas sempre retirando a responsabilidade moral dos indivíduos.

Na opinião de Lucas Azambuja, doutor em sociologia e professor do Ibmec, o que se vê no rap brasileiro e no funk, que tem uma gênese parecida, também precisa ser visto como um eco das suas versões originais, vindas da cultura de periferia americana —- onde referências ao crime são comuns.  “São estilos nascidos nos Estados Unidos e lá também cantores desses estilos abordaram esses temas de modo semelhante ao que vemos no Brasil. Então, há uma influência da absorção do próprio estilo e ao mesmo tempo a sua adaptação à realidade social brasileira”, diz ele.

Azambuja afirma não haver elementos suficientes para se falar em uma “cultura pró-crime” impulsionada pelo rap e o funk. “A música tem sido uma forma de expressão que muitas vezes visa chocar e causar algum tipo de impacto. E de fato, a questão da criminalidade perpassa toda a sociedade, seria estranho que nenhum estilo musical expressasse essa questão”, diz ele.

Mas Martins, que também é oficial da reserva da Polícia Militar de São Paulo e foi pesquisador do Núcleo de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), afirma que de fato existe um discurso que justifica a atuação dos criminosos e a promoção de uma cultura à margem da lei. Ele explica que a corrente teórica chamada de Criminologia Crítica, popular nas faculdades de sociologia, sustenta um discurso que legitima a atuação dos criminosos. “Os adeptos das teorias críticas não têm nenhum compromisso com a realidade ou com valores sociais, como a defesa da vida e a proteção das vítimas. Desta forma, crimes como racismo e homofobia devem ser punidos com prisão, pois as vítimas coletivas (negros e homossexuais) são politicamente importantes. Já os autores de crimes como tráfico de drogas ou roubo, não devem ser punidos porque foram primeiro vítimas da sociedade”, ele explica.

Para Luiz Fernando Ramos Aguiar, especialista em segurança pública e Major na Polícia Militar do Distrito Federal, o interesse das facções criminosas ao promover os bailes funk e financiar os artistas do gênero vai além do aspecto financeiro. “O financiamento de artistas e de eventos é fundamental para o fortalecimento da imagem dos traficantes como defensores de suas comunidades. Na ausência de opções de lazer e de eventos culturais, sejam financiados pela iniciativa privada ou promovidos pelos governos locais, os marginais firmam sua posição como benfeitores”, diz ele. “Dessa forma, eles criam um ambiente cultural que acaba fazendo com que muitos moradores acabem se tornando defensores das quadrilhas”, complementa. Além disso, esses eventos acabam servindo para recrutar jovens para as fileiras do tráfico.

Martins concorda: “Criminosos que exercem controle territorial, especialmente traficantes de drogas, têm custos econômicos e sociais para manter um território sob controle, pois o caos pode ser útil para tomar um território, mas não para mantê-lo. Para isso eles precisam “imitar o papel do Estado, como garantidor do contrato social’ em alguma medida”, ele afirma, antes de prosseguir: “Isso significa que não basta controlar formalmente, no caso deles pelo crime e o terror, é preciso estabelecer algum nível de soft power, ou controle informal, aquele exercido pelo compartilhamento de valores e regras sociais”. A diferença é que, com a internet, a exaltação do tráfico foi além das áreas comandadas pelo crime.

Na opinião de Aguiar, a solução para o problema não depende apenas da ação policial, mas também de uma mudança cultural e educacional — o que não é simples. Ainda assim, diz ele, uma legislação mais rigorosa alteraria o cálculo de custo-benefício feito por quem cogita ingressar nas fileiras do crime organizado. “Mudanças legislativas que levem a punições mais severas aos criminosos são imprescindíveis para que os jovens que estão tentados a aderir às quadrilhas entendam que as consequências desse estilo de vida não compensarão as vantagens”, diz ele. Martins tem a mesma opinião: “Cometer crimes, ainda que seja limitado a apologia, não pode valer a pena”, ele defende.


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ANITTA UMA EMPREENDEDORA DE SUCESSO

Por Fabio Milnitzky – CEO da Consultoria Estratégica IN

De cantora a empresária, artista é um case de sucesso para o Marketing

Definir Anitta tem sido quase que um desafio. A carioca de apenas 28 anos surgiu como funkeira em meados de 2013. Nove anos depois, contrariando as apostas de muitas pessoas, que a julgaram como mais uma artista de carreira meteórica, além de ser a primeira cantora brasileira a conquistar o topo da parada global do Spotfy com o hit Envolver, Larissa de Macedo Machado faz parte do conselho administrativo do Nubank, é chefe de criatividade da Beats, marca da Ambev, lançou recentemente um curso de empreendedorismo em parceria com a Estácio e anunciou no fim de maio ter se tornado sócia investidora da Fazenda do Futuro, startup que fabrica proteínas a base de vegetais (plant based).

Se no passado Larissa enfrentou alguma dificuldade por falta de dinheiro, Anitta passou por cima disso com maestria. Ela aparece na lista da revista Forbes entre os cantores mais ricos do mundo, com uma quantia estimada em R$ 550 milhões. “É muito claro como o marketing pessoal pode elevar um artista ao patamar de marca cultuada (cult brand).

Anitta é militante de muitas causas e se expõe em negócios dos quais se identifica com o propósito e valores. Ela estudou marketing e usa isso muito bem a seu favor. Consistência, autenticidade e relevância”, explica Fábio Milnitzky, CEO e fundador da iN, empresa de gestão de marcas. 

Para Fábio, o fato de Anitta criar estratégias que expandem sua exposição, evidencia o fato de grandes empresas buscarem incluir a artista em seus negócios. “Anitta passou a ser conhecida no mundo inteiro através de músicas gravadas com artistas populares de outros países. Ela chamou isso de ‘co-branding’ e essa fórmula foi bastante assertiva. Sua formação em administração aliada a uma carreira em ascensão mostra o quanto ela é competente no que faz e que sabe traçar planos para alcançar seus objetivos. Quem não quer uma colaboradora de sucesso?”, pontua.

Nomear artistas para cargos estratégicos tem sido mais recorrente, o que mostra uma ruptura da visão de que apenas executivos ocupem tais cadeiras. “As organizações precisam acompanhar o mercado, inovar, trazer mentes brilhantes para formarem seus times. Se determinado artista possui conhecimento profundo de um setor, entende o que os consumidores querem e conhece o mercado, por que não? Além de serem ótimos influencers, pois conversam com o público”, diz Milnitzky.

Para chancelar o poder da marca Anitta, ela recentemente foi homenageada com uma estátua no museu de cera de Nova York, sendo a primeira cantora brasileira a ser eternizada pelo Madame Tussauds.

A Startup Valeon reinventa o seu negócio

Enquanto a luta por preservar vidas continua à toda, empreendedores e gestores de diferentes áreas buscam formas de reinventar seus negócios para mitigar o impacto econômico da pandemia.

São momentos como este, que nos forçam a parar e repensar os negócios, são oportunidades para revermos o foco das nossas atividades.

Os negócios certamente devem estar atentos ao comportamento das pessoas. São esses comportamentos que ditam novas tendências de consumo e, por consequência, apontam caminhos para que as empresas possam se adaptar. Algumas tendências que já vinham impactando os negócios foram aceleradas, como a presença da tecnologia como forma de vender e se relacionar com clientes, a busca do cliente por comodidade, personalização e canais diferenciados para acessar os produtos e serviços.

Com a queda na movimentação de consumidores e a ascensão do comércio pela internet, a solução para retomar as vendas nos comércios passa pelo digital.

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domingo, 14 de agosto de 2022

A RÚSSIA ESTÁ MAIS CAUTELOSA NA GUERRA DA UCRÂNIA

 

Conflito na Ucrânia

Por
Luis Kawaguti


O presidente russo, Vladimir Putin, tem optado pela estratégia de conquistar território pouco a pouco, porém, de forma sistemática| Foto: EFE/EPA/MIKHAIL KLIMENTYEV/KREMLIN

Longe de ser um lunático prestes a usar o maior arsenal nuclear do mundo, o presidente russo Vladimir Putin parece estar sendo “cauteloso” em suas ações recentes na guerra da Ucrânia. Não por ética ou benevolência, mas sim porque Putin aparenta ter medo da capacidade militar da OTAN (aliança militar ocidental), de uma eventual reviravolta na opinião pública na Rússia e de que o país seja “engolido” pela economia chinesa.

O indício mais recente dessa cautela foi a resposta da Rússia às explosões na base aérea russa em Saky, na Crimeia. A instalação militar russa foi devastada por 12 detonações na terça-feira (9). Elas acabaram com armazéns de munições e combustíveis, teriam deixado ao menos 60 mortos e destruído oito aviões de combate – o maior número de caças russos liquidados de uma só vez desde o início da guerra.

A Ucrânia negou responsabilidade publicamente. Mas jornais americanos, entre eles o New York Times, publicaram entrevistas de oficiais ucranianos afirmando que as explosões teriam sido fruto de um ataque ucraniano.

Essa possibilidade foi reforçada por analistas ocidentais que avaliaram imagens de satélite da base, fornecidas pela empresa norte-americana Planet Labs. O think tank Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS) disse à rede britânica BBC que dois edifícios usados para estocar munições podem ter sido atacados com o objetivo de causar o máximo de danos possível a aviões de caça guardados fora de hangares.

Após os vazamentos de informações ao New York Times, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky repreendeu seus oficiais e os aconselhou a não dar informações à imprensa sobre táticas de guerra.

Assim, não se sabe que tipo de armamentos poderiam ter sido usados no suposto ataque. A posição militar da Ucrânia mais próxima de Saky fica a 160 quilômetros de distância – e os mísseis e foguetes mais potentes que os ucranianos possuem, projetados para ataques contra alvos terrestres, têm alcance máximo de 80 quilômetros.

Um eventual bombardeio também poderia ter sido realizado por aviões de caça ou helicópteros ucranianos. Mas esse cenário é pouco provável, porque a base tinha fortes defesas antiaéreas.

Uma das hipóteses que vem ganhando força é a de que os ucranianos tenham adaptado mísseis nacionais antinavio Neptune para atacar alvos terrestres. Eles têm alcance de 280 quilômetros.

A segunda possibilidade é que equipes de comandos (forças de infantaria leve altamente treinadas) tenham invadido a base com ajuda de partisans (guerrilheiros da resistência ucraniana) e dinamitado os depósitos de munições.

Apesar dessas especulações, a reação da Rússia foi afirmar que as explosões não foram causadas por um ataque ucraniano, mas sim por um acidente. O ministro da defesa da Ucrânia, Oleksiy Reznikov, afirmou: “Eu acho que os soldados russos dessa base desrespeitaram a regra mais básica: não fumar em locais perigosos”.

Em outras palavras, Moscou minimizou o evento e também eventuais baixas – dizendo inicialmente que apenas uma pessoa morreu. A conduta foi a mesma adotada em abril, quando a Ucrânia atacou e afundou o navio capitânia da armada russa no Mar Negro, o cruzador Moscou.

A embarcação foi localizada por meio de informações de inteligência fornecidas pelas potências do Ocidente e destruída por uma provável combinação de ataques de drones e mísseis Neptune.

Mas o Kremlin atribuiu a perda do navio a um incêndio acidental em um depósito de munições. A resposta russa foi dada por meio de uma série de ataques de precisão a instalações militares ucranianas em Kyiv, como depósitos de combustíveis e munições e fábricas de blindados e mísseis.

Mas por que Moscou não responde à altura suas perdas militares?

Em linhas gerais, a doutrina militar russa autoriza a retaliação com o uso de armas nucleares em caso de ataque contra território nacional, segundo o think tank americano ISW (sigla em inglês do Instituto para o Estudo da Guerra). A Crimeia foi anexada à Rússia em 2014 em um referendo que não foi reconhecido pela comunidade internacional.

Mas uma retaliação russa de grandes proporções às explosões na base de Saky poderia provocar também uma reação de grande intensidade da OTAN. Ela poderia acontecer por meio do aumento da ajuda militar à Ucrânia, fornecimento de equipamentos de ataque mais potentes – como aviões de caça, por exemplo – ou mesmo poderia significar a entrada da OTAN no confronto por meio da implantação de uma zona de exclusão aérea.

Putin parece estar tentando evitar quaisquer desses cenários. Isso porque a escala atual da guerra tem permitido à Rússia conquistar território pouco a pouco, porém, de forma sistemática. Ou seja, Moscou trava uma guerra de atrito, na qual a superioridade de sua artilharia vem conquistando cidade após cidade no leste da Ucrânia.

Mas o Kremlin pode usar armas nucleares, certo?

Em tese, sim. Mas isso poderia provocar uma resposta nuclear da OTAN e uma consequente escalada sem limites do conflito.

Ou ainda: se Moscou detonasse uma bomba nuclear tática de pequenas proporções (com um décimo da potência da bomba de Hiroshima, por exemplo), o cenário mais provável seria uma retaliação não nuclear de grandes proporções por parte da OTAN. Segundo analistas ocidentais, a Rússia não tem condições de vencer a aliança ocidental em uma guerra convencional.

Além disso, uma escalada na intensidade da guerra da Ucrânia exigiria que o Kremlin mobilizasse mais tropas e equipamentos. Por enquanto, a necessidade de tropas adicionais, decorrente das baixas no campo de batalha, vem sendo suprida em grande parte pela empresa militar privada Wagner Group.

Mas se a Rússia precisasse aumentar significativamente seu poder ofensivo, necessitaria para isso declarar mobilização nacional. Mesmo com todo o aparato de repressão e controle das mídias, o recrutamento massivo de soldados russos poderia abalar os altos índices de popularidade de Putin.

Em outras palavras, a Ucrânia luta uma guerra absoluta de sobrevivência da nação. Ou seja, uma guerra na qual todos os esforços do Estado e do povo estão voltados para o conflito. Uma guerra sem limites.

Já a Rússia encara a ação na Ucrânia como um conflito que tem grande importância estratégica, mas que por ora não tem potencial para determinar o destino da Rússia. Entre outros motivos, é por isso que Putin chama a guerra de “operação militar especial”.

Os Estados Unidos e seus aliados europeus tampouco estão interessados em entrar em uma guerra absoluta e, assim como Putin, temem uma escalada do conflito. Talvez por isso, com medo de perder apoio, o governo de Zelensky não cantou vitória abertamente sobre o suposto ataque a Saky.

A China é a salvação ou uma ameaça à Rússia?
Outro temor que influi no raciocínio russo em relação à guerra na Ucrânia é o papel da China na esfera econômica do conflito.

Putin e o ditador chinês Xi Jinping firmaram em 4 de fevereiro, antes da guerra, uma “parceria sem limites” – que foi interpretada por analistas ocidentais como um pacto de momento contra a hostilidade dos Estados Unidos e seus aliados.

A curto prazo, Pequim se tornou um grande fornecedor de produtos e comprador de energia de Moscou – substituindo parceiros comerciais europeus que aderiram às sanções internacionais capitaneadas pelos Estados Unidos e destinadas a isolar a economia russa.

Para se ter ideia, as vendas de petróleo e gás natural da Rússia para a China chegaram a 8,4 milhões de toneladas em maio – 55% a mais do que no mesmo período do ano anterior, segundo a Administração Geral de Alfândegas da China. Assim, a Rússia desbancou a Arábia Saudita (7,8 milhões de toneladas) como o maior fornecedor de hidrocarbonetos para a China.

Mas a salvação econômica tem um preço. Na medida em que o tempo passa e as sanções continuam, a Rússia terá que aceitar condições desfavoráveis em negociações comerciais com a China, segundo artigo do analista Alexander Gabuev, do think tank Carnegie Endowment for International Peace, publicado na revista Foreign Affairs.

De acordo com o pesquisador, no campo diplomático, a China pode obrigar Moscou a abrir mão de parcerias de defesa com a Índia e com o Vietnã, além de apoiar Pequim em suas demandas sobre Taiwan e a região marítima ao sul da China. O Kremlin também terá que fazer negociações e construir reservas financeiras baseadas na moeda chinesa.

No campo dos armamentos, a China poderá se beneficiar da compra de tecnologia russa. Na exportação de maquinário pesado, os chineses devem tentar substituir os alemães como grandes fornecedores para a Rússia.

Nesse processo, Xi Jinping terá que se preocupar em evitar as sanções americanas por conta da ajuda a Moscou. Mas não pode forçar seu novo parceiro a ponto de fragilizar demais o governo de Putin – pois a queda do russo e sua substituição por um líder menos hostil ao Ocidente podem prejudicar os interesses chineses.

Isto é, Moscou deve receber o apoio econômico que precisa para continuar lutando na Ucrânia. Mas, se não souber lidar com os chineses, a longo prazo a Rússia pode perder muito de sua autonomia estratégica – tornando-se uma espécie de “parceiro júnior” da China, cuja economia pode ultrapassar a americana por volta de 2030. Essa dependência é outro medo que tem estimulado o exercício da cautela por parte de Putin.

Ameaça de catástrofe nuclear

As Forças Armadas da Rússia têm capacidade para atingir, a distância, praticamente qualquer alvo na Ucrânia. Até agora, a despeito de toda a destruição causada, elas vêm poupando centros de grande concentração populacional, como a capital Kyiv.

Mas a atitude cautelosa na estratégia de guerra como um todo não está acontecendo em relação à usina nuclear de Enerhodar, em Zaporizhzia, no sul da Ucrânia.

A maior usina nuclear da Europa foi tomada pelos russos no dia 4 de março. Na ocasião, tropas russas bombardearam e provocaram um incêndio em uma parte da planta – que não resultou em vazamento de radiação. Na época, o Kremlin tentou culpar a Ucrânia pelo incêndio.

Nos últimos dias, a usina voltou a ser bombardeada, nos dias 6 e 11 de agosto. Segundo os ucranianos, a Rússia posicionou peças de artilharia entre os reatores nucleares. O objetivo é atirar contra posições ucranianas nas proximidades, sem correr o risco de receber fogo em retaliação.

Os ucranianos têm tentado então atingir os russos fora da usina, no momento em que soldados entram e saem do complexo em trocas de turnos.

Já a Rússia acusa tropas ucranianas de serem as responsáveis pelos ataques à usina. Kyiv, por sua vez, diz que jamais bombardearia as instalações nucleares, pois um vazamento de radiação colocaria em risco a sua população e contaminaria o território do país por décadas.

Não é possível verificar de forma independente quem foram os responsáveis pelos recentes bombardeios. Mas essa é a primeira vez que uma usina nuclear é palco de uma guerra de alta intensidade.

Um disparo de artilharia que atinja uma estrutura crítica da usina pode resultar em dois cenários. No mais grave, a destruição dos sistemas de resfriamento do núcleo de um reator nuclear poderia levar ao seu derretimento e explosão. Nesse caso, uma nuvem de radiação equiparável às dos desastres de Chernobyl, em 1986, ou Fukushima, em 2011, poderia atingir não só a Ucrânia, mas a Rússia ou países da Europa, dependendo das condições do vento.

O outro cenário possível seria um vazamento de radiação mais limitado, mas que também poderia afetar a Ucrânia e os países vizinhos. Em ambos os casos, o número de vítimas seria contado aos milhares, grandes áreas ficariam inabitáveis por décadas e o dano ambiental seria de magnitude catastrófica.

A ONU e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) vêm pedindo que os combates na região cessem imediatamente e que a Rússia permita o acesso de técnicos internacionais à planta e crie uma zona desmilitarizada ao seu redor. A Ucrânia tem apoiado os pedidos internacionais para que toda a área seja excluída da zona de conflito, mas todos esses apelos por ora não têm sido atendidos.

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/jogos-de-guerra/russia-mais-cautelosa-na-guerra-o-que-esta-provocando-medo-em-putin/
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LÍTIO É MUITO UTILIZADO NA FABRICAÇÃO DE BATERIAS PARA CARROS ELÉTRICOS

Lítio

Por
Cristina Seciuk


Após 25 anos de restrição, o lítio brasileiro tem caminho aberto para exportação e pode se beneficiar da crescente demanda pelos carros elétricos.| Foto: EFE/EPA/Rungroj Yongrit


O governo federal pretende posicionar o Brasil como produtor mundial de lítio ao retirar limitações impostas desde 1997 ao comércio exterior do minério. Em decreto assinado no mês passado, o presidente Jair Bolsonaro revogou medidas anteriores que por 25 anos mantiveram a obrigatoriedade de autorização prévia da Comissão Nacional de Energia Nuclear para a realização de exportações do material.

Então considerado “de interesse para a energia nuclear” (conforme texto do decreto dos anos 1990), o lítio ganhou novos usos com o passar das décadas e hoje é estratégico para a transição energética, com destaque para sua ampla utilização na fabricação de baterias para carros elétricos.

O desenvolvimento do segmento é acelerado e a perspectiva é de que a dinamização do mercado brasileiro de lítio melhore as condições de competitividade para garantir ao país boa fatia dessa cadeia.

Dados da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) apontam que 2021 foi de recorde nas vendas de carros elétricos, que chegaram a 6,6 milhões de unidades – o dobro do ano anterior. Além do paralelo já consolidado, as vendas globais continuam subindo fortemente em 2022, “com 2 milhões [de veículos elétricos] vendidos no primeiro trimestre, um aumento de 75% em relação ao mesmo período de 2021”, frisa a IEA.

O avanço dos elétricos se dá globalmente, ao sabor de incentivos a tecnologias limpas e restrições esperadas para os próximos anos, como o banimento da venda de novos carros a combustão na Europa a partir de 2035.

Ao ganhar mais espaço, a indústria automotiva dos eletrificados puxa também a busca pelos minérios utilizados na fabricação das baterias. Números da consultoria S&P Global indicam que a demanda pelo lítio deve atingir 2 milhões de toneladas até 2030; até 2040 a demanda deve crescer mais de 40 vezes, projeta a IEA, um prato cheio para os produtores.

Para o Ministério de Minas e Energia (MME), o decreto pode viabilizar mais de R$ 15 bilhões em investimentos até 2030, concentrados no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, uma das regiões mais pobres do país. É lá que fica a maior parte das reservas conhecidas no país.

É esperada ainda geração de sete mil empregos diretos apenas na mineração e mais de 84 mil postos de trabalho diretos e indiretos ao longo das cadeias produtivas do lítio. Pelos cálculos da pasta, os pagamentos de salários devem somar R$ 440 milhões por ano e a arrecadação anual de royalties deve passar de R$ 100 milhões, distribuídos, na maior parte, aos municípios produtores.

Para a pasta, o fim das restrições à exportação do lítio brasileiro promove abertura que pode “posicionar o Brasil de forma competitiva na cadeia global e atrair investimentos para pesquisa e produção mineral”, além de fazer avançar nossa capacidade produtiva em processamento e produção de componentes e baterias.

“A medida também representa um passo fundamental para ampliar o olhar da indústria automotiva e atrair investimentos para a produção de veículos elétricos no Brasil”, diz comunicado do MME.


Qual o tamanho das reservas e a produção de lítio no Brasil
Comparativamente aos “vizinhos” de América Latina, as reservas brasileiras conhecidas – de aproximadamente 500 mil toneladas – são enxutas. O continente concentra a maior parte das reservas mundiais do mineral, com destaque para Bolívia, Argentina e Chile (com 21 milhões, 19,3 milhões e 9,6 milhões de toneladas de lítio, respectivamente).

Devido à exploração contínua do minério, entretanto, os recursos identificados vem crescendo em todo o mundo, o que pode levar a novas descobertas. Em 2021, havia 86 milhões de tonelada de lítio conhecidas globalmente, conforme o Serviço Geológico dos Estados Unidos.

Ainda conforme dados do órgão norte-americano, a produção brasileira em 2019 foi de 2,4 mil toneladas. Em comparação, a Austrália, maior produtor, extraiu 45 mil toneladas no mesmo ano.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/economia/brasil-abre-mercado-e-espera-atrair-r-15-bilhoes-em-investimentos-em-mineral-estrategico/
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STF USA PRÁTICA MEDIEVAL CONTRA O BOLSONARO

 

Por
André Uliano – Gazeta do Povo


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No programa “Fora dos Autos” que foi ao ar no dia 4 de agosto, abordamos o risco de que esteja sendo praticada pescaria probatória contra o Presidente Jair Bolsonaro. A hipótese havia sido veiculada já em meados de 2020 pela própria Procuradoria-Geral da República, em relação aos apoiadores do Presidente vítimas de diligências infundadas determinadas no bojo do Inquérito do Fim do Mundo. Mais recentemente, diante das medidas inquisitoriais adotadas por Alexandre de Moraes, a Vice-PGR, Drª. Lindora Araújo, voltou a suscitar o tema, ao afirmar que a conduta do ministro era “passível de configurar a prática denominada de ‘fishing expedition’”.

Importante deixar claro que a questão aqui não é se você gosta, apoia ou pretende votar no atual presidente. O que está em jogo é se o Brasil é um país que adota as melhores práticas das democracias ou se, pelo contrário, torna-se cada vez mais parecido com seus vizinhos chavistas.

Mas, afinal, o que é pescaria probatória (fishing expedtition) e por que sua adoção seria preocupante para a democracia?

Para entender esse problema é necessário compreender que a prova é um dos “pulmões” de um processo judicial. De fato, o processo é uma relação dialética entre partes que disputam o convencimento do órgão julgador. A convicção jurídica do juiz tem dois elementos centrais: a interpretação das normas jurídicas aplicáveis e a reconstrução do fato histórico.

Ou seja: é crucial num processo saber o que aconteceu e como o direito regula eventos dessa espécie. Por exemplo, se alguém responde por homicídio, é necessário verificar se foi ele quem desferiu os golpes e se sua conduta se enquadra na norma penal que proíbe a conduta de matar alguém. A disputa, portanto, por produzir provas e tê-las examinada perante um juízo imparcial é ponto-chave para o deslinde do feito.

Ocorre que essa relação pode ser parecida com uma guerra ou uma luta de vale tudo. É o que ocorre em sociedade primitivas e em regimes autoritários, como nossos vizinhos chavistas. Nas democracias, por outro lado, a relação ocorre num modelo acusatório, em que o juiz é provocado pelas partes, sendo o procedimento mediado por regras prévias e aplicadas de modo isonômico.

No Brasil, que é uma democracia não consolidada, sempre houve problemas de abuso probatório. Contudo, o país vinha numa crescente de adoção de boas práticas desde o fim do regime militar. Esse movimento, no entanto, foi formalmente revertido após a instauração do inconstitucional Inquérito do Fim do Mundo. Desde então o direito processual e probatório do país passou a sofrer um retrocesso sem precedentes em períodos democráticos. Hoje podemos concluir que há um movimento reacionário promovendo um desmonte das garantias processuais.

Esse processo é ainda mais preocupante, porque ele incide de modo assimétrico a depender da posição política do investigado. Portanto, há indícios de que no Brasil estamos não apenas diante de um fenômeno de uma posição ideológica menos garantista, mas de tribunais politicamente sequestrados, o que é um elemento típico de democracias em processo de erosão. Situações análogas ocorreram na Venezuela e na Nicarágua, antes do colapso total de suas instituições.

Voltando ao tema do processo em si, nele a reconstrução do fato histórico dá-se, basicamente, por meio da produção probatória. Assim, o abuso nos meios de obtenção de provas, como a fishing expedition ou a atividade inquisitorial do juiz, além de violarem direitos fundamentais, desequilibram o processo e o seu resultado. Quando essas condutas são praticadas pelo próprio órgão julgador também há quebra da imparcialidade, descrita pela Suprema Corte Canadense como “um estado mental no qual o julgador está desinteressado do resultado e aberto à persuasão pela evidência e pelos depoimentos. Pelo contrário, viés denota um estado mental predisposto a um resultado particular” (R. v. S. (R.D), 1997, 3 SCR 484).

Frise-se que já há quase meio século, acertada lição da Corte Europeia de Direitos Humanos demonstrou que a imparcialidade não é apenas subjetiva, mas também objetiva. Aprofundaremos nisso em texto futuro. Mas é importante ressaltar que, conforme arrematou aquele tribunal nos casos Piersack v. Belgica e DeCubber v. Belgica – a imparcialidade tem uma liturgia própria, de modo que o comportamento do julgador, o modo como ele aparenta atuar – por exemplo, revelado na obsessão por levantar provas contra pessoa específica – é o suficiente para demonstrar sua parcialidade.

Aqui gostaríamos de nos concentrar, no entanto, na pescaria probatória, também denominada pelo título em inglês: fishing expedition.

A alcunha do fenômeno indica de modo bastante adequado sua ideia central. Assim como o pescador lança suas redes sem saber ao certo o que irá apanhar, o investigador de má-fé lança uma rede de medidas invasivas sobre o mar da vida privada de sua vítima (ou de pessoas a ela próximas) a fim de buscar qualquer elemento que possa macular sua imagem ou justificar a posteriori a investigação persecutória anteriormente aberta.

Em uma investigação normal e típica de países democráticos o investigador fixa seus olhos num fato específico e busca elementos probatórios a partir dos dados concretos que ele possui: se encontra um cadáver alvejado por disparos de arma de fogo, ele busca o revólver; se encontra o armamento, busca seu proprietário; se encontra o proprietário, busca verificar o que ele fez no dia e assim por diante.

Na pescaria probatória, o agente-inquisidor em geral mira uma pessoa. Então, passa a determinar provas as mais amplas possíveis, a fim de estabelecer uma devassa em sua vida. A finalidade é pescar algo de irregular que possa legitimar as diligências praticadas e novas medidas de perseguição. Não são os indícios já colhidos que justificam a prática probatória. É a prova colhida a posteriori que justifica a investigação.

Como explica Pedro Molina em trabalho sobre o tema, a prática da fishing expedition já incomodava os advogados nas antigas cortes britânicas. Naquele tempo costumava-se exigir dos investigados juramentos de responder qualquer pergunta, sem silenciar ou mentir. Eram os chamados juramentos ex officio ou juramentos de veritate dicenda. O detalhe é que o alvo da investigação não precisava saber qual fato estava sendo investigado e, assim, os questionamentos podiam abranger qualquer dado de sua vida. Alguns agentes abusavam então da situação e, no intuito de justificar a caçada a suas presas, passavam a fazer perguntas sem conexão direta com a causa, levando o investigado por vezes a incorrer em perjúrio ou produzir prova contra si mesmo.

Na common law, o privilégio contra a autoincriminação (privegie against self-incrimination) passou a funcionar como incipiente escudo contra tais práticas. A exigência de respostas sem conexão com fato específico por meio de juramento passou a ser paulatinamente restringida e hoje é vedada pelas garantias consagradas nas Constituições das democracias modernas. Veremos mais à frente que a jurisprudência já condenou medidas probatórias dessa espécie no Brasil.

No tocante à definição de fishing expedition, o dicionário Collins traz o seguinte conceito: “qualquer inquérito realizado sem qualquer plano ou propósito claramente definido na esperança de descobrir informações úteis”. A dicionário Merriam-Webster talvez seja ainda mais claro: “uma investigação que não se apega a um objetivo declarado, mas espera descobrir evidências incriminatórias ou dignas de notícia”

Na doutrina brasileira, Alexandre de Morais da Rosa, conceitua a pescaria probatória como a “procura especulativa, no ambiente físico ou digital, sem ‘causa provável’, alvo definido, finalidade tangível ou para além dos limites autorizados (desvio de finalidade), de elementos capazes de atribuir responsabilidade penal a alguém.” Explica ele: “Denomina-se pescaria (ou expedição) probatória a prática relativamente comum de se aproveitar dos espaços de exercício de poder para subverter a lógica das garantias constitucionais, vasculhando-se a intimidade, a vida privada, enfim, violando-se direitos fundamentais, para além dos limites legais.”

Na obra conjunta, “Fishing Expedition e Encontro Fortuito na Busca e na Apreensão”, os autores apresentam ainda a seguinte definição:

“É possível, portanto, definir a pescaria probatória (fishing expedition), como a apropriação de meios legais para, sem objetivo traçado, ‘pescar’ qualquer espécie de evidência, tendo ou não relação com o caso concreto. Trata-se de uma investigação especulativa e indiscriminada, sem objetivo certo ou declarado, que, de forma ampla e genérica, ‘lança’ suas redes com a esperança de ‘pescar’ qualquer prova, para subsidiar uma futura acusação ou para tentar justificar uma ação já iniciada.”

Nossos tribunais superiores já condenaram sua prática, pois conforme leciona precedente do STJ, “os indícios de autoria antecedem as medidas invasivas, não se admitindo em um Estado Democrático de Direito que primeiro sejam violadas as garantias constitucionais para só então, em um segundo momento, e eventualmente, se justificar a medida anterior, sob pena de se legitimar verdadeira fishing expedition, conhecida como pescaria probatória” (AgRg no RMS 62562).

Em Mandado de Segurança impetrado contra ato invasivo decretado pela CPI da COVID, um dos advogados de defesa – acertadamente – alegou: “A quebra irrestrita dos sigilos perseguidos pela CPI – Pandemia, sem fundamentação e individualização concreta equipara-se ao que a doutrina moderna e especializada nominou como ‘fishing expedition’ ou ‘pescaria probatória’, sendo em resumo, o meio de investigação especulativa indiscriminada, sem objetivo certo, determinado ou declarado, decretado de forma ampla e genérica, no afã (ou esperança) de ‘pescar’ qualquer prova para fortalecer um futuro processo.”

Nesse sentido, ademais, corretamente asseverou o ex-ministro Celso de Mello, no âmbito do Inq 4831:

“E o motivo de observar-se a existência de conexão com os eventos alegadamente delituosos sob investigação penal reside no fato de que o nosso sistema jurídico, além de amparar o princípio constitucional da intimidade pessoal, repele atividades probatórias que caracterizem verdadeiras e lesivas ‘fishing expeditions’, vale dizer, o ordenamento positivo brasileiro repudia medidas de obtenção de prova que se traduzam em ilícitas investigações meramente especulativas ou randômicas, de caráter exploratório, também conhecidas como diligências de prospecção, simplesmente vedadas pelo ordenamento jurídico brasileiro, como resulta não só da doutrina (…), mas, também, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”.

Segundo Alexandre de Morais da Rosa, no ambiente estadunidense, conforme precedente do caso Hickman v. Taylor (1947), “ao mesmo tempo em que as regras não podem ser restritivas (impedir a apuração de condutas criminosas), os limites legais devem ser respeitados, a saber, o ato não pode ser movido por má-fé ou com desvio de finalidade (vinculado à causa provável), de modo opressor e/ou vexatório, nem invadir o domínio de direitos reconhecidos. Trata-se de expediente (…) em que o órgão investigador pode se utilizar dos meios legais para, sem objetivo definido ou declarado, ‘pescar’ quaisquer evidências a respeito de crimes desconhecidos ou futuros. Configura verdadeira devassa ampla e irrestrita do passado, presente e futuro do alvo (pessoa ou conduta suspeita), desprovida de ‘causa provável’, isto é, fora do enquadramento normativo da investigação democrática.”

A produção probatória, portanto, sempre depende de fundada suspeita – baseada em elementos concretos – de que a pessoa praticou delito específico objeto do ato investigatório e demonstração de que a prova é necessária para as investigações daquele fato concreto alvo da apuração.

No programa Fora dos Autos mencionado acima, apontamos alguns indícios de que isso não vem sendo respeitado no Brasil. Tal fato configura patente risco de violação das garantias constitucionais, particularmente do devido processo legal, e de erosão da democracia e do Estado de Direito.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/andre-uliano/pescaria-probatoria-entenda-a-pratica-medieval-utilizada-contra-bolsonaro/
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FOME NO BRASIL O PROBLEMA É A FALTA DE DINHEIRO

 

Artigo
Por
Alexis Fonteyne


Imagem ilustrativa.| Foto: Unsplash

Dados revelados pelo 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19, divulgados no início de junho, mostram que 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer no país. São 14 milhões de brasileiros a mais em insegurança alimentar grave em 2022, na comparação com 2020.

De acordo com o estudo, promovido pela Rede Brasileira de Pesquisa e Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, seis em cada dez domicílios não conseguem manter acesso pleno à alimentação e, pior, mantêm algum nível de preocupação com a escassez de alimentos no futuro. As regiões Norte e Nordeste são as mais impactadas.

A fome em nosso país tem caráter diferente do flagelo vivido em outras nações do mundo, que padecem da escassez de alimento, seja pela baixa produção, seja por condições climáticas adversas ou por guerras que desmontam o equilíbrio das relações humanas.

O problema do Brasil é que os brasileiros perderam o poder de compra e a inflação corroeu os vencimentos.

O Brasil, ao contrário, é um dos maiores produtores agrícolas do mundo. Nossas safras batem sucessivos recordes, assegurando a balança comercial brasileira e mitigando os efeitos negativos no Produto Interno Bruto (PIB). O abastecimento interno é assegurado por uma legião de agricultores familiares, que correspondem a 77% dos estabelecimentos agrícolas, segundo o mais recente Censo Agropecuário, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 10 milhões de pessoas, o equivalente a 67% da força de trabalho ocupada em atividades agropecuárias.

O problema do Brasil é que os brasileiros perderam o poder de compra e a inflação corroeu os vencimentos. O desemprego tem dados sinais de recuo e neste trimestre deve ficar em 9,5%. Mas a prévia da inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA-15 divulgado em maio, acumulou alta de 11,73% em 12 meses.

O diagnóstico tem que ser bem-feito, correndo-se o risco de não resolver nunca a causa do problema da fome no Brasil. No curto prazo, a fome de hoje precisa de assistência governamental, mas, se não atacarmos a causa, ela funcionará como um eterno palanque eleitoral.

Seja no caso de um agricultor de escala industrial, ou de um agricultor familiar, a situação não foge muito do perfil: a safra terá que ser vendida para custear a semente, o adubo, os equipamentos e implementos, o óleo diesel. Portanto, voltamos ao ponto inicial: a fome não decorre da falta de alimentos disponíveis, mas, sim, da falta de renda para comprá-los. Precisamos descomplicar o Brasil, facilitar a vida de quem toma risco e empreende, eliminar os gargalos, acabar com o custo Brasil, atraindo investimento, gerando emprego e renda.

Temos, dentre tantos outros gargalos, problemas de educação – apenas 4% dos jovens de 15 a 24 anos estão matriculados em cursos técnicos ou profissionalizantes, o que poderia ser um caminho para aqueles que têm menos acesso a escolas de qualidade. Os alunos regulares têm desempenhos ruins nas avaliações PISA, que medem os conhecimentos de Matemática e Português. Já o mercado de trabalho é burocrático e pouco competitivo. As leis trabalhistas, ao invés de proteger de fato os trabalhadores, impedem a geração de novos postos de trabalho.

Não adianta ficarmos apenas lamentando as cenas de famílias inteiras passando dificuldades pela TV ou nosso dia a dia, nas ruas, se não formos capazes de atacar o cerne da questão: melhorar a capacitação de nossos estudantes e trabalhadores, para que eles tenham condições de atender as necessidades mais básicas, dentre elas o direito à alimentação. E a solução só virá o dia em que tirarmos as amarras que impedem o país de ser mais competitivo e inclusivo.

Alexis Fonteyne é deputado federal e presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo.

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/problema-fome-nao-e-falta-de-comida-mas-falta-de-renda/
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FILMES PRÓPRIOS PARA QUEM INVESTE NO MERCADO FINANCEIRO

 

COMPORTAMENTO

Confira nossa seleção de seis filmes disponíveis no streaming para você aprender mais sobre investimentos

RENATO VIEIRArenato.vieira@estadao.com – Jornal Estadão

Você investe no mercado financeiro? Então assista a esses filmes
Giovanni Ribisi e Vin Diesel em cena do filme O Primeiro Milhão (2000).
  • O cinema americano produziu filmes premiados sobre o mercado financeiro, boa parte deles baseado em histórias reais e eletrizantes
  • Confira alguns deles nesta seleção do E-Investidor

O cinema norte-americano produziu filmes premiados sobre o mercado financeiro, boa parte deles baseado em histórias reais e eletrizantes, de ganhos e perdas. Em alguns, você pode aprender o que fazer com seus investimentos. Mas a maioria dos longas-metragens mostra o que o investidor não deve fazer.

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Por isso, o E-Investidor fez uma seleção de seis filmes disponíveis nas plataformas de streaming para que você possa aprender como funciona o complexo, e ao mesmo tempo cinematográfico, mundo dos investimentos e das finanças.

A Grande Aposta (2015)

O filme de Adam McKay é baseado em livro de Michael Lewis. Michael Burry (Christian Bale) é um guru de Wall Street que, após perceber a iminente inadimplência do mercado imobiliário, decide investir contra ele. Jared Vennett (Ryan Gosling) também segue a percepção de Burry e tenta fazer dinheiro se antecipando à tragédia financeira.

O longa também mostra as personalidades de Mark Baum (Steve Carell), diretor da empresa FrontPoint, subsidiária do Morgan Stanley, e de Ben Rickert (Brad Pitt), um ex-banqueiro que volta ao jogo ao ser abordado por dois jovens. Margot Robbie e Selena Gomez participam do filme, que ganhou Oscar de Melhor Roteiro Adaptado.

O Lobo de Wall Street (2013)

Indicado a cinco Oscars, o filme de Martin Scorsese conta a história real do corretor de ações Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio). Depois de perder o emprego, ele passa a trabalhar em uma empresa que vende papéis modestos de fora da bolsa de valores. Ao lado de amigos como Donnie (Jonah Hill), ele cria a empresa Stratton Oakmont e utiliza esquemas ilegais para se dar bem, até que chama a atenção do FBI. Margot Robbie e Matthew McConaughey também atuam na produção.

Onde ver: HBO Max
Amazon Prime Vídeo, YouTube e Google Play Filmes: (aluguel de R$ 2,90)

Margin Call – O Dia Antes do Fim (2011)

O longa começa com um dia de demissão em massa em uma instituição financeira em Wall Street cujo nome não é revelado. Mas está claro para o espectador mais atento que o banco foi inspirado no Lehman Brothers, que quebrou com a explosão da bolha imobiliária.

O experiente analista de riscos Eric Dale (Stanley Tucci) é um dos dispensados, mas antes de sair do prédio deixa um pen drive com outro funcionário, o jovem Peter Sullivan (Zachary Quinto), pedindo “cuidado”. Após analisar os dados, Sullivan descobre que uma catástrofe econômica está por vir.

O Mago das Mentiras (2017)

Tendo Robert De Niro e Michelle Pfeiffer no elenco, o longa-metragem é baseado no livro da jornalista Diana B. Henriques. De Niro interpreta Bernie Madoff, uma lenda de Wall Street que tinha um poderoso fundo de investimentos, circulava entre os ricos e famosos de Nova York e armou um esquema de pirâmide financeira que prometia grandes retornos.

O Primeiro Milhão (2000)

Seth (Giovanni Ribisi) é um jovem que gerencia um cassino clandestino quando foi recrutado para trabalhar em uma corretora de ações com a promessa de ficar rico.

Mas a corretora funciona na base do “pump and dump”: seus próprios corretores criam demandas artificiais para os papéis, o que pode colocar tudo a perder. Vin Diesel e Ben Affleck também participam do longa-metragem dirigido por Ben Younger.

Wall Street – Poder e Cobiça (1987)

O filme de Oliver Stone, apesar de ficcional, foi considerado como um retrato fiel da crueza e ambição que cercavam Wall Street na metade dos anos 1980. O corretor de ações Bud Fox (Charlie Sheen) tenta de todas as formas se aproximar do poderoso investidor Gordon Gekko.

Após conseguir e se tornar aprendiz dele, Fox começa a ser guiado por Gekko, que pede para ele espionar o CEO de uma grande empresa. Por meio de informações privilegiadas, Fox e Gekko lucram e chamam a atenção do órgão equivalente nos Estados Unidos à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) brasileira. O longa ganhou uma continuação, Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme (2010).

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

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