quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

IMPLANTAÇÃO DE CASSINOS SOFRE PRESSÃO DE GRUPOS CONTRÁRIOS

 

Jogos de azar

Por
Jônatas Dias Lima – Gazeta do Povo

A volta dos cassinos ao Brasil deve ser votada no início do ano.| Foto: Pixabay

Uma peculiar convergência de fatores tem levado analistas políticos a apostarem – com temor ou com torcida – que 2022 será o ano do retorno dos cassinos ao Brasil. Se a previsão se confirmar, o fato disso ocorrer durante a gestão de um governo de direita será emblemático e expõe o quanto o tema divide esse espectro político. No centro do debate moral que envolve o assunto está um dilema entre a liberdade do indivíduo de fazer as próprias escolhas, sem tutela do Estado, e as consequências concretas dessas escolhas à sociedade e à família.

No Congresso 
A evidência mais recente da força que o tema está ganhando foi a votação da urgência do Projeto de Lei 442/91, que legaliza e regulamenta os jogos de azar no Brasil. Ocorrida na última semana de sessões na Câmara dos Deputados em 2021, a articulação liderada pelo próprio presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), foi bem-sucedida e obteve 293 votos favoráveis contra 138 contrários, garantindo que o projeto seja votado diretamente no plenário, sem necessidade de passar por comissões. Essa vitória, contudo, está longe de ser o único movimento relevante para favorecer a jogatina.

No Senado, pelo menos quatro propostas que tratam do mesmo assunto – embora se diferenciem nas modalidades e locais onde a prática seria permitida – tiveram avanços na tramitação e ganharam destaque midiático nos últimos anos, em parte, graças à atuação do senador Ciro Nogueira (PP-PI), hoje, ministro-chefe da Casa Civil no governo Bolsonaro, e autor do mais abrangente deles, PLS 186/2014, que libera a exploração de jogos de azar em todo o território nacional.

As posições estratégicas ocupadas hoje tanto por Lira quanto por Nogueira – defensores históricos dos jogos de azar – na sustentação política do governo e no controle da agenda legislativa do Congresso tem relação direta com o otimismo indisfarçável dos grupos que defendem a volta dos cassinos ao Brasil.

No STF 
Paralelamente às movimentações dos parlamentares, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode acabar impulsionando a regulamentação, dependendo do que decidir no julgamento previsto para 7 de abril, quando discutirá se os jogos de azar podem ou não ser considerados como contravenção penal à luz da Constituição de 1988, já que tal tipificação é anterior à Carta Magna, constando no Decreto-lei 3.688 de 1941, a Lei das Contravenções Penais.

O caso concreto em discussão parte do Recurso Extraordinário 966177, no qual o Ministério Público do Rio Grande do Sul questiona a decisão do Tribunal de Justiça do estado que desconsiderou a exploração de jogos de azar como contravenção penal, sob o argumento de que os fundamentos que embasaram a proibição não se adequam aos princípios constitucionais vigentes. Se os ministros do Supremo concordarem com o entendimento do TJ-RS, a decisão descriminalizará a prática em todo o país, pois em 2016 a Corte já havia reconhecido a repercussão geral do tema.

No governo 
Peça essencial nesse tabuleiro, o posicionamento do governo Bolsonaro sobre o assunto é ambíguo, o que acaba por refletir a divisão inconciliável de sua base de apoio quanto aos jogos de azar, a começar pela própria equipe ministerial. Ao lado de Ciro Nogueira está o ministro do Turismo, Gilson Machado, que no início de 2020 foi à Las Vegas acompanhado do filho do presidente, o senador Flavio Bolsonaro, para reuniões com empresários do ramo de cassinos. Em 2019, quando era presidente da Embratur, Machado declarou em entrevista à Folha de S. Paulo que com os cassinos, “o Brasil atrairá o turista que gasta”.

A resistência contra o lobby da jogatina dentro do governo é liderada pela ministra Damares Alves que já afirmou publicamente, em diversas ocasiões, que sua pasta se opõe à liberação, como ocorreu em setembro de 2021, durante entrevista à CNN: “Se o Ministério dos Direitos Humanos for provocado para emitir parecer, com certeza nos manifestaremos contrários à aprovação da matéria”.

Antes de ser ministra, Damares foi uma das fundadoras do Movimento Brasil Sem Azar, grupo que há anos atua para impedir avanços da jogatina no Congresso Nacional. Ela também é próxima da bancada evangélica na Câmara e vem justamente daí o maior obstáculo para os entusiastas do jogo. Com 196 signatários e considerável influência junto a simpatizantes, quando vota unida a Frente Parlamentar Evangélica constitui uma força poderosa para barrar projetos em plenário ou mesmo impedir que entrem em pauta. Foi o que aconteceu em 2016, durante o governo Dilma, quando uma articulação semelhante em favor do jogo foi colocada em curso, mas graças à inflexível oposição combinada dos parlamentares evangélicos, teve que ser abandonada, voltando à gaveta por mais alguns anos.

O presidente 
Pressionado por apoiadores a se posicionar de forma mais clara sobre o assunto, após a votação da urgência, Bolsonaro disse num almoço com jornalistas que é contra a liberação dos jogos de azar e prometeu vetar a proposta, caso o Congresso a aprove. Na mesma ocasião, contudo, fez questão de incluir um adendo que muitos tem interpretado como um sinal de que o governo pouco fará para impedir a aprovação: “Se eu vetar e o parlamento derrubar o veto, vamos cumprir a lei”.

Em 2018, quando ainda era deputado e pré-candidato à presidência da república, Bolsonaro já havia optado por manifestações que acenassem tanto aos que se opõem, quanto aos que defendem a volta dos cassinos. “Em princípio sou contra, mas vamos ver qual a melhor saída”, afirmou em maio daquele ano, durante palestra dada na Associação Comercial do Rio de Janeiro.

A divisão de posições sobre o tema parece ocorrer até entre os filhos do presidente. Enquanto Flavio é um defensor explícito da instalação de cassinos no Brasil, o deputado federal Eduardo Bolsonaro foi um dos 138 que votou contra a urgência do tema na Câmara, apesar de sua conhecida admiração por um grande empresário do ramo de cassinos: Donald Trump.

Fachada do Trump Taj Mahal, um dos cassinos mais badalados do ex-presidente americano. Encerrou suas atividades em 2016.| Wikimedia Commons


Trump 
O ex-presidente dos Estados Unidos, aliás, pode ser um dos fatores que vem fazendo parte da direita brasileira repensar sua histórica oposição à jogatina, afinal, Trump inovou ao se tornar ídolo de conservadores em todo o mundo, mesmo sendo um milionário proprietário de cassinos que fez fortuna com seus empreendimentos de luxo. Não há registro de outro líder político que tenha esse perfil e, ao mesmo tempo, tenha tomado decisões e dado declarações que favorecessem tanto as demandas da direita cristã norte-americana.

Coincidentemente ou não, o parceiro de negócios e maior doador da vitoriosa campanha de Trump em 2016, o milionário dono de cassinos Sheldon Adelson, foi também o responsável pela pública tomada de posição a favor dos jogos de azar do ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, que em 2018 admitiu em entrevista ao jornal Valor Econômico que estava conversando com Adelson para construir na capital carioca um estabelecimento nos moldes daqueles que o magnata possuía em Las Vegas e Cingapura, e que articulava junto aos parlamentares de seu estado para que a legislação brasileira sobre o tema fosse alterada. “As pessoas sabem que se não tivermos emprego, vamos para o caos social. E joga quem quiser”, afirmou Crivella, que é pastor licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus e sobrinho de Edir Macedo, o fundador da instituição.

O que conservadores veem de mal nos jogos de azar? 
Apesar dessa relativização por parte de relevantes expoentes da direita política, a posição majoritária dos cristãos e dos conservadores em geral a respeito da legalização dos jogos de azar permanece sendo de oposição, principalmente por causa das consequências inegáveis às comunidades e famílias das regiões onde cassinos, bingos, caça-níqueis e similares são instalados. O aumento no número de viciados, o endividamento e a desestruturação familiar constituem uma característica constante, comprovada por numerosos estudos em todo o mundo.

O problema do vício é tão grave e afeta tantas pessoas que em 2017 a Organização Mundial da Saúde decidiu incluir o transtorno de jogo oficialmente no Código Internacional de Doenças (CID).  Cinco anos antes, a Universidade de São Paulo (USP), por meio de seu Programa Ambulatorial do Jogo Patológico, já havia mostrado que 73% dos viciados em jogos na capital paulista eram também dependentes de álcool, 60%, de nicotina e quase 40% tinham algum transtorno relacionado às drogas.

Em 2004, o trabalho do professor e pesquisador do jogo Earl Grinols, PHD em Economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), provocou grande repercussão entre gestores públicos ao apontar que a cada dólar arrecadado pelos Estados Unidos com o pagamento de impostos pela indústria do jogo, outros três dólares eram gastos para remediar os impactos sociais provocados pela jogatina, especialmente no que diz respeito a crimes e contravenções cometidos por dependentes do jogo. Sua pesquisa ganhou reconhecimento internacional e foi posteriormente publicada em forma de livro pela editora da Universidade Cambridge, no Reino Unido, sob o título Gambling in America – Costs and Benefits.

O impacto na vida dos familiares de um viciado em jogos de azar também já foi objeto de pesquisa por numerosos estudos acadêmicos. Um deles, intitulado Gambling behaviour in Great Britain, foi desenvolvido pela agência nacional de saúde do Reino Unido, com dados de 2015. Um dos resultados aos quais o estudo chegou foi o de que um apostador afeta negativamente a vida de, pelo menos, dez pessoas em seu entorno, deteriorando relações afetivas e profissionais, além de comprometer as finanças domésticas.

Crimes 
Além dos fatores que envolvem diretamente os viciados e seus familiares, não se pode ignorar os alertas feitos pelas instituições relacionadas ao combate à corrupção no Brasil, que constantemente tem se manifestado de forma contrária à liberação desse tipo de atividade devido à grande dificuldade de evitar crimes como a lavagem de dinheiro, a evasão de receitas e a sonegação fiscal. Foi nesse sentido que já se pronunciaram no passado, por meio de notas técnicas ou participação em audiências públicas, entidades como o Ministério Público Federal (MPF), o Conselho de Controle de Atividade Financeira (Coaf) e a Receita Federal.

Na nota de 2016, por exemplo, ao analisar a proposta do senador Ciro Nogueira, o MPF chegou a afirmar que “a enorme quantidade de bingos e cassinos cuja abertura é estimulada pelo PLS 184/2014 está em evidente descompasso com a realidade dos órgãos nacionais de controle, ainda que estes fossem dotados de estrutura de fiscalização de primeiro mundo”.

Entidades religiosas 
No que diz respeito aos religiosos, não apenas políticos pertencentes a denominações cristãs têm atuado para impedir a aprovação dos jogos, mas também instituições tem tomado parte no debate. No dia 16 de dezembro, data da votação da urgência do PL 442/91 na Câmara, a Associação Nacional dos Juristas Evangélicos (ANAJURE) manifestou seu repúdio, afirmando que a jogatina “facilita atos de corrupção, sobrecarrega os órgãos fiscalizadores e colabora com a decadência social que destrói inúmeras famílias no contexto do vício”, acrescentando que “essa não seria uma pauta urgente para ter atenção do Congresso Nacional neste momento”.

Em 2016, quando os defensores da liberação dos jogos de azar estiveram próximos de alcançar seu objetivo, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) emitiu nota para expor sua apreensão com os mesmos projetos de lei que hoje voltam aos holofotes.

Num texto iniciado pelo versículo bíblico “uma árvore má não pode dar frutos bons (Mt 7,18)”, os bispos reafirmaram sua posição, dizendo que “o jogo de azar traz consigo irreparáveis prejuízos morais, sociais e, particularmente, familiares” e é concluído com um claro recado aos parlamentares: “tenham certeza de que o voto favorável será, na prática, um voto de desprezo por nossas famílias e seus valores fundamentais”.

No caso dos católicos, a oposição à exploração comercial dos jogos de azar não é apenas uma definição de autoridades regionais, mas faz parte de sua doutrina social, constando inclusive no Catecismo da Igreja Católica. O texto eclesiástico, contudo, aponta nuances, destacando-se que não se trata de um mal em si. Conforme o documento publicado durante o pontificado de João Paulo II, “os jogos de azar ou apostas em si não são contrários à justiça. Tornam-se moralmente inaceitáveis quando privam a pessoa daquilo que lhe é necessário para suprir suas necessidades e as dos outros”. O Catecismo diz ainda que “apostar injustamente ou trapacear nos jogos constitui matéria grave, a menos que o dano infligido seja tão pequeno, que aquele que o sofre não possa razoavelmente considerá-lo significativo”.

O passado dos cassinos no Brasil 
O Brasil já teve cassinos funcionando a todo vapor em território nacional, mas foi por um período curto: de 1920 a 1946. Historiadores falam que o país chegou a ter entre 50 e 70 casas de jogos, com destaque para aquelas instaladas na cidade do Rio de Janeiro.

Pôster do antigo Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, anunciando show de Carmen Miranda. | EBC

A decisão de acabar com a proibição herdada desde o Brasil Império partiu do presidente Epitácio Pessoa que, pressionado por empresários do ramo, permitiu a abertura de cassinos restritos a determinadas regiões com potencial turístico, o que na época significava, em geral, estâncias balneárias ou climáticas, como a cidades de Campos do Jordão e Petrópolis. Os impostos arrecadados seriam usados para custear o saneamento básico no interior do país.

Entusiastas da jogatina costumam se referir aos anos 30 como a era de ouro dos cassinos no Brasil, pois foi com a ascensão de Getúlio Vargas que esse tipo de empreendimento passou a ser não apenas tolerado pelo poder público, mas incentivado e usado para fazer propaganda nacional no exterior. Não por acaso, é no final da década de 30 que surge o fenômeno Carmen Miranda, a artista mais disputada pelos cassinos nacionais e, posteriormente, internacionais.

Com o fim do Estado Novo imposto por Vargas e a eleição do general Eurico Gaspar Dutra, surgiram acusações de que os cassinos pagavam propina a Vargas para serem favorecidos pelo governo. O jornal Diário Carioca, por exemplo, publicou no dia seguinte ao decreto-lei que “o jogo, como toda a escala dos negócios aventurosos, que permitem lucros fáceis e rápidos, é uma planta de estufa dos regimes de ditadura”, acrescentando ainda que “seja qual for o cinismo dos comparsas do getulismo, não poderão disfarçar a condenação moral que receberam do primeiro magistrado da república, fechando-lhes as baiucas e as tavolagens, as quais chegaram a ser um patrimônio e uma política de toda a família Vargas”. A nova gestão também tinha interesse em se desvincular da ditadura recém-encerrada e como Vargas fez questão de vincular sua imagem aos cassinos, uma ruptura com esse setor era até previsível.

Em 30 de abril de 1946, três meses depois de assumir a presidência e ainda dotado dos poderes garantidos pelo Estado Novo – portanto sem a necessidade de aval do Congresso – Dutra emitiu um decreto-lei, proibindo a prática ou exploração de jogos de azar em todo o território nacional. Em sua justificativa, o presidente mencionou “a tradição moral jurídica e religiosa do povo brasileiro” e afirmou que “das exceções abertas à lei geral, decorreram abusos nocivos à moral e aos bons costumes”.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/ideias/do-apoio-de-trump-ao-repudio-evangelico-os-cassinos-dividem-a-direita/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

BALANÇA COMERCIAL FOI POSITIVA

Editorial
Por
Gazeta do Povo

Movimento no porto de Santos: superávit da balança comercial foi recorde em 2021, bem como a corrente de comércio.| Foto: Ricardo Botelho/Ministério da Infraestrutura.

As próximas semanas trarão uma série de dados consolidados sobre o desempenho da economia brasileira em 2021; se já é dado como certo que haverá indicadores ruins, como o da inflação, ao menos um número bastante positivo já está confirmado: o desempenho recorde da balança comercial brasileira no ano passado. O superávit de US$ 61 bilhões ficou 21,1% acima do saldo de 2020 e bateu também o recorde anterior, registrado em 2017, quando as exportações superaram as importações em US$ 56 bilhões. A corrente de comércio total – quase US$ 500 bilhões, resultado da soma de US$ 280,4 bilhões em exportações e US$ 219,4 bilhões em importações – também foi recorde; até então, o maior valor era de US$ 481,6 bilhões, em 2011.

Embora seja preciso destacar a vitalidade do agronegócio, que elevou exportações em 22% apesar das quebras de safra, e aumentos expressivos nas vendas de itens como minério de ferro, o grande personagem da balança comercial de 2021 não foi tanto um produto específico, mas o dólar. O real desvalorizado foi um estímulo às exportações, que na comparação com 2020 aumentaram 28,3% em preços, mas apenas 3,5% em quantidade, segundo o Ministério da Economia. Ou seja, em 2021 o Brasil basicamente exportou apenas um pouco mais que no ano anterior, mas a um valor muito maior graças ao dólar em alta. Com as importações ocorreu o contrário: também de acordo com os dados do governo, elas aumentaram 21,8% em quantidade e 14,2% em preços. E, se por um lado o dólar alto ajudou o exportador, por outro ele acabou encarecendo as importações de combustíveis e energia elétrica, deixando o número final da balança comercial abaixo das projeções do governo, que no início de dezembro esperava fechar 2021 com um superávit de US$ 70,9 bilhões.

A corrente de comércio brasileira ainda é baixa, tanto como porcentagem do PIB nacional quanto como participação no comércio global. O grande desafio brasileiro é ampliar sua inserção internacional

Os números, em seu conjunto, mostram como a economia mundial está se recuperando do enorme estrago causado pela pandemia de coronavírus, que freou negócios globalmente e causou interrupções em importantes cadeias de produção – um cenário que ainda persiste em alguns casos específicos, como o dos chips semicondutores, com reflexo em vários setores relevantes como a indústria automotiva e a de eletroeletrônicos. Quando a pandemia for finalmente derrotada e houver a normalização completa das atividades econômicas, o comércio internacional deve recuperar sua vitalidade – e o Brasil tem de estar pronto para aproveitar este momento.

A corrente de comércio brasileira ainda é baixa, tanto como porcentagem do PIB nacional (na casa dos 30%) quanto como participação no comércio global (com apenas 1% do total mundial de exportações e importações). O Brasil já chegou a ser apontado em 2015 como o país mais fechado do G20 e ocupa posições medíocres, incompatíveis com o tamanho da economia brasileira, nos rankings de maiores importadores (29.º lugar em 2020, segundo a OMC) e exportadores (26.º lugar) do mundo. O grande desafio brasileiro é ampliar sua inserção internacional, tornando-se um grande player do comércio exterior, aumentando a competitividade do produto nacional e reduzindo o protecionismo. Em março de 2018, relatório do Banco Mundial mostrou que uma verdadeira abertura comercial poderia tirar milhões de brasileiros da pobreza e fazer o PIB crescer quase um ponto porcentual a mais por ano.


A maior inserção brasileira no comércio global tem estado no radar da equipe econômica, mas ela esbarra em alguns obstáculos, especialmente quando os parceiros do Mercosul se agarram ao protecionismo, dificultando reduções nas tarifas. A grande conquista da atual gestão neste campo, a assinatura do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia – concluindo negociações iniciadas em governos anteriores –, está travada pela ausência de ratificação dos países envolvidos; nações europeias fazem críticas à política ambiental brasileira, mas é fato que governos como o francês também se aproveitam da alegada preocupação com a Amazônia para não irritar seu próprio setor agropecuário, pesadamente subsidiado e que sairia perdendo com o acordo. Fazer do Brasil um país mais aberto ao comércio internacional não é tarefa simples; ela esbarra em fortes interesses locais e estrangeiros, mas que precisam ser enfrentados com coragem e estratégia.
Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/editoriais/recorde-na-balanca-comercial/


Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

 

PARLAMENTO BRASILEIRO PRECISA DE MUDANÇAS COM IDEIAS NOVAS

Congresso Nacional

Por
Thaméa Danelon – Gazeta do Povo

Ações recentes do Poder Legislativo ajudaram a enfraquecer leis e mecanismos de combate à corrupção| Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Um novo ano se inicia e, de forma previsível, os brasileiros renovam suas esperanças nas possibilidades de mudanças para o nosso país. No final do ano ocorrerão eleições para a Presidência da República e muitos indivíduos apostam todas as suas fichas em algum candidato que terá a função de “salvar o país”.

Evidentemente que o futuro presidente poderá implementar mudanças significativas em nosso país, mas, para além do cargo do chefe do poder Executivo, a escolha adequada de novos parlamentares – no caso deste ano de senadores – se faz ainda mais importante. Muitos se preocupam apenas com quem ocupará a cadeira de presidente, contudo, não se dão conta da extrema necessidade de um poder Legislativo forte, independente e, principalmente, honesto.

No ano que passou ocorreram muitos retrocessos no combate à corrupção: do final da operação Lava Jato à aprovação de leis que dificultaram esse combate. Não foi aprovada nenhuma lei que endurecesse a punição de práticas corruptas e de má gestão; por outro lado, foram aprovadas legislações que aumentaram gastos públicos desnecessários, como o bilionário fundo eleitoral, que generosamente teve seus valores duplicados.

A CPI da Covid, realizada pelo Senado Federal, é outro exemplo de gasto público desnecessário, diante da paralisação por diversos meses dos trabalhos do Senado e das ínfimas conclusões concretas obtidas. Assim, é primordial que o cidadão brasileiro dedique certo tempo na escolha adequada de seus candidatos ao Parlamento, pois inúmeros projetos de lei essenciais estão paralisados no Congresso Nacional.

Como exemplo, podemos mencionar quatro propostas de emenda à Constituição (PEC) que sem dúvida merecem uma atenção especial de nosso parlamento. A primeira é a PEC 199/19, que trata da prisão após condenação em 2ª instância judicial, e autoriza a execução da pena após a decisão de um órgão colegiado. A referida PEC está sem tramitação na Câmara dos Deputados desde 08/08/20, e aguarda ser pautada para votação pela comissão especial.

Outra proposta que também trata da prisão após segunda condenação e caminha no Senado é a PEC 166/2018 e, de acordo com seu texto, seria claramente inserida na Constituição a prisão após condenação em 2ª instância. A terceira PEC é a 333/2017, que versa sobre a diminuição do foro privilegiado, que hoje é um grande fator de impunidade, uma vez que mais de 55 mil pessoas possuem esse benefício.

Por fim, há a PEC 35/2015, que altera a forma de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), implementando um mandato de 10 anos a eles.

Além dos parlamentares elaborarem e aprovarem novas legislações, os membros do poder Legislativo também apresentam outras funções extremamente importantes, como a realização de processos de impeachment contra ministros do STF e o presidente da República; e também a realização de Comissões Parlamentares de Inquéritos, pois, caso sejam instauradas e conduzidas de forma séria, profissional e com reais métodos investigativos, seus resultados podem ser satisfatórios.

Assim, nesse novo ano é fundamental que o brasileiro entenda a importância de termos um poder Legislativo federal limpo, honesto, sem que seus membros estejam envolvidos em escândalos de corrupção e que apresentem um devido comprometimento com a sociedade brasileira, com a ordem e com o progresso do nosso Brasil.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/thamea-danelon/o-ano-novo-e-a-necessidade-de-mudancas-no-parlamento/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

 

DECRETO ARGENTINO PROÍBE A EXPORTAÇÃO DE CARNE BOVINA

 

Mais mercado

Por
Alexandre Garcia – Gazeta do Povo

EXPEDIÇÃO SAFRA 2018/2019 -Paulo Roberto Nascimento, produtor rural e pecuarista de Capinópolis MG – FOTO: MICHEL WILLIAN/GAZETA DO POVO – 09.02.2019 (PECUÁRIA – BOI – GADO DE CORTE – GADO CONFINADO)

Decreto que praticamente proíbe exportação de carne de gado da Argentina deve abrir mais mercado para o boi brasileiro.| Foto: Michel Willian/Arquivo/Gazeta do Povo
Ouça este conteúdo

Os pecuaristas brasileiros, que na segunda-feira (3) fizeram a manifestação “Segunda com carne”, satirizando uma campanha mundial, oferecendo churrasco em frente a agências do Bradesco, foram premiados com um decreto do presidente Alberto Fernández, da Argentina, que praticamente está proibindo a exportação de carne. Talvez os pecuaristas argentinos não tenham a mesma militância que a nossa.

É proibido exportar o boi inteiro, ou pela metade, o quarto dianteiro, o quarto traseiro com osso, a costela com ou sem osso, a fraldinha, o matambre, uma outra parte da costela, coxa, paleta… eu acho que só estão permitindo exportar o filé.

Com isso sai ganhando a pecuária brasileira, que preserva o meio ambiente. Só a área de preservação do agronegócio, por conta própria, é maior que vários países europeus juntos. E tem mais, só para lembrar, carne vermelha, que fazem campanha contra, contém zinco, e em épocas de Covid, é muito importante, porque protege a célula contra a entrada de vírus.

Bolsonaro melhora aos poucos
O presidente Jair Bolsonaro está se recuperando após a internação no hospital a que foi submetido. A sonda nasogástrica foi retirada, mas ele ainda terá que seguir uma dieta que não provoque fermentação e gases no intestino, porque depois da facada, o intestino dele está sujeito a aderências que interrompem a passagem. Ele vai ter que se comportar mais com a boca daqui por diante.

Nesta terça-feira (4), Bolsonaro trabalhou do hospital e sancionou uma lei, que teve origem no Congresso, que obriga escolas, hospitais, repartições públicas, o Judiciário e os locais de trabalho a manter o sigilo sobre pessoas que têm tuberculose, hepatite, HIV e hanseníase. Eu acho muito justo. Agora não há esse respeito com os não-vacinados.

Cerca de 570 mil funcionários públicos estaduais de São Paulo não vão poder entrar em seu trabalho. Agora mesmo, o presidente do Superior Tribunal de Justiça não concedeu uma liminar num habeas corpus pedido por um funcionário que quer trabalhar. O servidor alegou o direito constitucional de livre locomoção e de acesso ao trabalho. E, no entanto, o ministro do STJ disse não.

Qual é a culpa dos cruzeiros
Tem outra injustiça aí. O Procon disse que as empresas de cruzeiro, desses três navios que tiveram surtos de Covid-19, é que têm que arcar com os direitos do consumidor pelo ônus pelo qual passaram os passageiros. Interessante isso, porque eu acho que as empresas de cruzeiro e os passageiros cumpriram todos os requisitos estabelecidos pela Anvisa. De passaporte, de teste, cumpriram tudo, então a culpa não é deles. A responsabilidade não é nem dos cruzeiros nem dos passageiros, temos que procurar quem deveria pagar.

Audiência pública
Aliás, a propósito, nesta terça houve uma audiência pública sobre a vacinação em crianças. É uma questão muito séria que os pais precisam pensar, porque a Anvisa autoriza a vacina, mas não se responsabiliza. O Ministério da Saúde coloca a vacina à disposição, vai pôr agora, a partir do dia 10 ou 15.

Os laboratórios, produtores da vacina, têm contrato com o governo brasileiro em que não assumem a responsabilidade jurídica. Então a responsabilidade é puramente dos pais e é uma senhora responsabilidade.

Um problema que também atinge os Estados Unidos, que está tendo um surto de Covid como nunca. Muito maior agora, com o presidente Joe Biden, do que aconteceu com o presidente Trump, inclusive com consequências políticas. Essa é uma discussão que está lá também.

Aliás, um juiz proibiu a Marinha americana de punir quem não quisesse tomar a vacina. Se bem que na Marinha americana, segundo dados oficiais, mais de 98% já se vacinaram.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/alexandre-garcia/decreto-do-governo-argentino-ajuda-a-nossa-pecuaria/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

DESPESAS DE LULA NA SUA TURNÊ PELA EUROPA

 

Por
Lúcio Vaz – Gazeta do Povo

Lula é recebido com honrarias de chefe de Estado pelo presidente francês| Foto: Ricardo Stuckert

A prestação de contas da viagem do ex-presidente Lula da Silva pela Europa em novembro revela despesas de R$ 223 mil com diárias e passagens aéreas. Em pré-campanha presidencial, Lula esteve na Alemanha, Bélgica, Espanha e França, onde foi recebido com honras de chefe de Estado pelo presidente Emmanuel Macron. Após as visitas, Lula lidera o ranking de gastos dos ex-presidentes, com R$ 976 mil – num total de R$ 5,2 milhões. Paga pelo contribuinte, a gastança dos ex-presidentes já soma R$ 75 milhões.

Considerando as viagens de Lula pelo país e mundo afora, as despesas chegam a R$ 362 mil. A equipe de seguranças, motoristas e assessores que prestam serviços ao ex-presidente já receberam R$ 595 mil neste ano, sem contar o mês de dezembro. Lula ainda gastou R$ 14,5 mil com combustível e R$ 1,3 mil com a manutenção de veículos. Cada ex-presidente conta com dois carros oficiais, comprados em 2019 e pagos durante a pandemia da Covid-19, no valor total de R$ 1,3 milhão.

A ex-presidente Dilma Rousseff está em segundo lugar no ranking de gastos, com R$ 963 mil, sendo R$ 99 mil com diárias e passagens. As viagens para o exterior custaram R$ 60 mil. Seus servidores custaram R$ 828 mil. Mas ela já gastou bem mais. Em 2019, antes da pandemia, Dilma torrou R$ 544 mil em visitas a 13 países. Na viagem de férias de 42 dias a Nova York e Sevilha, só a despesa com 96 diárias para assessores chegou a R$ 136 mil.

Gastos em dose dupla
O terceiro do ranking é o atual senador Fernando Collor (PROS-AL), com R$ 962 mil. A sua equipe de apoio já custou R$ 706 mil neste ano. O curioso é que ele conta com mais 52 assessores do Senado Federal. No ano passado, esses servidores custaram mais R$ 6 milhões aos cofres públicos. Como ex-presidente, Collor viaja mais pelo país – foram gastos R$ 208 mil com passagens e diárias.

Michel Temer já gastou 835 mil neste ano, sendo 736 com servidores. As despesas com viagens somaram 73 mil, com R$ 57 mil em deslocamentos para o exterior. Como viaja muito de carro oficial pelo interior paulista, gastou R$ 24 mil com combustível.

Fernando Henrique Cardoso não viajou neste ano. Quase a totalidade das suas despesas como ex-presidente – R$ 707 mil – foram com a sua equipe de apoio, R$ 706 mil. José Sarney gastou um total de R$ 747 mil, sendo R$ 683 com servidores. Suas viagens custaram R$ 45 mil. Ele gastou mais R$ 15 mil com o SiafWeb, sistema que permite acompanhar os gastos do governo.

Críticas duras a Bolsonaro
A viagem de novembro à Europa ofereceu a Lula um palanque que ele não tem no Brasil. Falou da sua “absolvição”, fez críticas duras ao presidente Jair Bolsonaro e falou dos seus planos para um possível governo. Em discurso no Parlamento Europeu, afirmou: “Aonde quer que eu vá, faço questão de dizer: o Brasil tem jeito, porque ele é muito maior do que qualquer um que tente destruí-lo”.

Lula citou erros do governo na condução da pandemia, afirmando que Bolsonaro ironizou a gravidade da doença, zombou dos mortos, atrasou a compra das vacinas, fez propaganda enganosa, distribuiu medicamentos ineficazes contra o vírus, deixou faltar oxigênio em hospitais, incentivou aglomerações e ajudou a espalhar fake news contra as vacinas.

Na palestra que fez no Instituto de Estudos Políticos de Paris, Lula falou da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a sua condenação. “Foram cinco anos de luta pela verdade e pela justiça até que o Supremo viesse a estabelecer, afinal, a suspeição e a parcialidade do juiz que me condenou sem provas e sem causa”.


Honrarias na França

O grande momento da viagem aconteceu no dia 17 de novembro, quando foi recebido com honrarias de chefe de Estado. O encontro com o presidente da França, Emmanuel Macron, no Palácio do Eliseu, sede do governo francês, durou 1 hora e 15 minutos. Segundo relato da sua assessoria, Lula e Macron conversaram sobre as relações da França com o Brasil e a América Latina. Dialogaram sobre a crise mundial, os desafios da preservação ambiental, geração de empregos e redução das desigualdades.

Em Madri, Lula voltou à questão da Covid-19. No seminário “Cooperação multilateral e recuperação regional pós-Covid-19”, afirmou: “Vivemos um verdadeiro ‘apartheid de vacinas’, como definiu o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom. Enquanto em países ricos há uma extrema direita e negacionistas que se recusam a tomar a vacina, os países mais pobres lutam para ter acesso a imunização. Na África não tem 10% de sua população vacinada”.

Afirmou ainda que, às vésperas da Cúpula Global da Saúde do G20, em maio deste ano, a Aliança Vacina para Todos revelou que a imunização contra a Covid-19 criou 9 novos bilionários. “São os executivos e grandes acionistas de laboratórios farmacêuticos, que enriqueceram graças aos excessivos lucros obtidos com o monopólio das vacinas. A riqueza combinada desses novos bilionários soma 19,3 bilhões de dólares, que poderiam ser investidos na imunização da população de países mais pobres”, disse Lula.

No dia 19, Lula foi recebido pelo presidente da Espanha, Pedro Sánchez. No encontro, eles falaram do papel que Espanha e Brasil podem ter para a consolidação do desenvolvimento na América Latina, com governos solidários e democráticos. O encontro aconteceu no Palácio de Moncloa, em Madri.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/lucio-vaz/as-despesas-de-lula-na-tourne-pela-europa-voce-pagou-a-conta/?ref=escolhas-do-editor
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

PROPÓSITOS DE VIDA EM 2022

 

Por
André Uliano – Gazeta do Povo

2022| Foto:

Esse artigo marca minha volta à Gazeta do Povo, após um ano em que fiquei afastado (com muitas saudades de contribuir para o debate no jornal) a fim de encerrar minhas pesquisas sobre ativismo judicial, montar meu curso sobre o tema e realizar uma visita de estudos à Universidade de Oxford, onde pude enriquecer minha análise sobre o assunto estudando e assistindo aulas com professores dos departamentos de Teoria Constitucional e Filosofia do Direito.

Foi sem dúvida alguma um período bastante frutuoso e enriquecedor e poderei compartilhar parte do que aprendi com vocês por meio dos artigos. Como o tema do ativismo judicial tem dominado meus estudos, dominará também meus artigos. Por isso, a presente coluna será, basicamente, voltada a expor textos críticos ao sistema de justiça, particularmente ao STF, órgão que julgo o mais disfuncional da República na atualidade. E fico longe de estar isolado nessa opinião. O tribunal hoje utiliza investigações que são rosários de ilegalidades, promove atos que redundam em inegável censura, direciona perseguições contra grupos políticos específicos e tem determinado prisões indubitavelmente arbitrárias.

Todavia, tendo em vista que este meu primeiro texto cai em data próxima ao início do ano de 2022 – e como não faltarão oportunidades para debater o ativismo judicial – dedicarei esse primeiro artigo a uma finalidade quiçá mais prosaica, porém não menos edificante: sugerir 5 metas para o ano novo.

Essas metas visam de modo muito especial um público específico: pessoas que se dedicam à vida de estudos, sejam por serem acadêmicos, intelectuais diletantes ou apenas pessoas que gostam de participar do debate público de forma mais qualificada do que a média ou têm o desejo de impactar positivamente o ambiente cultural brasileiro. Contudo, creio que as dicas aqui esboçadas podem se revelar valiosas (ou ao menos úteis) para qualquer pessoa em busca de preencher o seu ano com metas exigentes e capazes de dotar de sentido o ano corrente, vendo-o como uma etapa dentro de um plano de vida pessoal eticamente responsável e socialmente comprometido.

Antes de apontar as metas propriamente, irei rapidamente sugerir o modo de estabelecê-las:

1) Escreve-as: minha experiência pessoal me indica e estudos confirmam que pessoas que escrevem suas metas incrementam significativamente as chances de perseverar nelas e vê-las realizadas. Aliás, de preferência, mantenha-as visivelmente acessíveis ou cheque-as com frequência;

2) Estabeleça objetivos exigentes, porém factíveis e específicos para o presente ano: ainda que você tenha metas de mais longo prazo, veja o que elas exigem de concreto de você no presente ano;

3) Fixe propósitos passíveis de verificação quanto ao seu alcance (preferencialmente quantificáveis): não descreva coisas elusivas ou conceitos abstratos e vagos. Ainda que uma parte de seus sonhos e compromissos pessoais tenham essas características (p. ex.: ter uma família feliz), tente estabelecer metas concretas para o ano corrente: por exemplo, sair para jantar fora ao menos uma vez por mês com minha esposa e fazer um pequeno passeio toda semana; ler uma quantidade X de minutos todos os dias para os meus filhos etc.

4) Tenha metas compartilhadas com outra(s) pessoa(s): metas compartilhadas são mais difíceis de abandonar, pois há a sensação de “pressão” por parte da pessoa ou grupo com o qual você compartilhou a meta, além de que atividades conjuntas têm um valor particular em virtude da sociabilidade que envolvem e das amizades que possibilitam.

Dito isso, vamos às metas. Apenas dois últimos avisos: primeiro, minha formação pessoal inegavelmente marca os tipos de sugestões que apresento. Pessoalmente, sou alguém apaixonado por humanidades em geral (história, música, literatura etc) e com formação jurídica. Creio que boa parte dos meus interlocutores terão perfil semelhante. Se você estiver distante desse perfil, terá de fazer algumas adaptações. Mas repito: estou absolutamente convencido de que é perfeitamente possível adaptá-las com proveito para pessoas de qualquer perfil.

Segundo e último ponto: quis nesse texto indicar pontos que reputo relevantes para a vida de estudos e que, correntemente, tendem a ser subestimados por intelectuais em geral. Por isso tentei fugir do que seria usual (dicas de livros, filmes e cursos) e apontar hábitos que poderiam parecer desligados da vida do espírito num primeiro momento; contudo, acredito que valem a pena serem integrados criativamente num projeto de vida desse estilo.

Sem mais delongas.

1) Pratique esportes regularmente: estudos demonstram já de modo bastante consolidado que a prática esportiva acarreta importantes benefícios psicológicos e físicos. O desporto é um modo bastante importante de descanso e é capaz de melhorar o sono, fatores relevantes para nos manter alertas, criativos e com boa memória. Friso que descanso de boa qualidade não é não fazer nada, mas desempenhar atividades que exijam um tipo de esforço diferente daquele que nos é corrente. Logo, para a vida de estudos, exercitar o corpo é um ótimo modo de repousar a mente.

O esporte ainda nos mantém em boa forma e combate o sobrepeso, o que incrementa nossa produtividade e capacidade laborativa. Não só: ele reduz o stress e a ansiedade, os quais são predadores da atenção, e ajudam na autoestima. Ressalto o desenvolvimento de uma reta autoestima é importante para a vida intelectual. Para uma visão bastante completa do tema, recomendo o livro “A Autoestima do Cristão”, publicado no Brasil pela Editora Quadrante. Especificamente no tocante à vida intelectual, pessoas com baixa autoestima podem ser tragadas para uma busca de pura autoafirmação ou aceitação pelos pares.

Especificamente no tocante a esportes coletivos, adiciono que eles envolvem qualidades de liderança e atuação em equipe, e a prática esportiva de longo prazo exercita a paciência, a disciplina e a perseverança.

Em suma, o esporte condensa vários elementos da vida boa. Talvez, por esse motivo as aristocracias sempre o tenham visto como dotado de um papel na composição de uma personalidade bem formada. De fato, segundo o intelectual austro-brasileiro Otto Maria Carpeaux, é um traço do estilo aristocrático equilibrar esporte e cultura, nobreza e religiosidade.

Também o Papa Bento XVI, em discurso proferido em 1 de agosto de 2009, a atletas presentes na cidade de Roma afirmou sobre a prática esportiva:

“Com as vossas competições ofereceis ao mundo um emocionante espetáculo de disciplina e de humanidade, de beleza artística e de vontade tenaz. Mostrai para que metas pode conduzir a vitalidade da juventude, quando não se rejeita o cansaço de treinamentos árduos e se aceita de bom grado não poucos sacrifícios e privações. Tudo isto constitui uma importante lição de vida (…).

Como há pouco foi recordado, o desporto praticado com paixão e atento sentido ético, especialmente para a juventude, torna-se ginásio de espírito de competição sadio e de aperfeiçoamento físico, escola de formação para os valores humanos e espirituais, meio privilegiado de crescimento pessoal e de contato com a sociedade. (…)

As disciplinas desportivas, cada uma com diversas modalidades, ajudam-nos a apreciar este dom que Deus nos concedeu. A Igreja acompanha e está atenta ao desporto, praticado não como um fim em si mesmo, mas como um meio, como instrumento precioso para a formação perfeita e equilibrada de toda a pessoa. Inclusive na Bíblia encontramos interessantes referências ao desporto como imagem da vida. Por exemplo, o Apóstolo Paulo considera-o um autêntico valor humano, utiliza-o não apenas como metáfora para explicar altos ideais éticos e ascéticos, mas também como meio para a formação do homem e como componente da sua cultura e civilização.”

2) Monte seu plano de vida

Qualquer plano inteligente de ação depende, primeiramente, de uma ideia suficientemente clara de qual o seu fim. Na obra clássica de Lewis Carroll, “Alice no país das Maravilhas”, o personagem o Gato de Cheshire imortalizou essa lição em sua fala: “Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve”.

Pois bem, um projeto de vida não é nada mais do que um planejamento inteligente para a existência como um todo. Por isso, ele também depende de uma visão razoavelmente delineada de qual o propósito de nossa vida como um todo. Em suma: qual a missão que escolhemos desempenhar na terra.

Nesse sentido, o jurista e filósofo John Finnis, professor emérito da Universidade de Oxford, em suas principais obras (“Natural Law & Natural Rights” e “Fundamentals of Ethics”) ao elencar os requisitos da ação inteligente (que ele chama de razoabilidade prática) coloca como primeiro deles o estabelecimento de um plano de vida coerente.

Vou dar um exemplo trivial para demonstrar como isso é imprescindível para tomada de decisões inteligentes diante de alternativas de ação. Se eu me perguntar: devo fazer um curso de engenharia ou medicina? Simplesmente inexiste resposta pronta para essa questão. Cada opção possui prós e contras. Nenhuma é simplesmente superior. Agora, se você sabe que você quer ser médico ou que você quer ser engenheiro, a decisão se tornou simples.

Na vida nos deparamos constantemente com perguntas desse tipo: devo assumir um novo emprego que implica em sacrifícios para minha família? Devo dedicar mais tempo ao trabalho? Qual o critério para escolher sobre a educação dos meus filhos? Saber a pessoa que queremos ser e com qual missão de vida nós estamos comprometidos lança luzes sobre esse tipo de dilema.

Agora, fica a dúvida: como esboçar um plano de vida? Já vou ensinar um exercício útil para isso, mas primeiro gostaria de indicar algumas características de um bom plano de vida. Primeiramente, ele tem de ser suficientemente concreto, para que possa auxiliá-lo nas suas decisões e julgamentos, mas também suficientemente curto e flexível. A ideia não é que você escreva um romance autobiográfico, mas apenas um esboço dos traços essenciais da vida que você gostaria de desempenhar e teria orgulho de desempenhar. Outro ponto de equilíbrio importante: seu plano de vida tem de provocar em você suficiente compromisso, de modo que você não se afaste dele por razões irrelevantes, mas também saiba que ele não é uma sina reduzida a termo. É um projeto inteligente de vida. Caso surjam razões igualmente inteligentes no futuro e suficientemente fortes e moralmente autênticas, você pode alterá-lo, sem qualquer problema. A ideia é que seja um guia; não um fardo.

Bom. Quanto ao modo prático de fazer um plano de vida, não conheço forma melhor do que o “exercício do funeral” proposto por Stephen Covey, autor do best-seller “7 Hábitos das Pessoas Muito Eficazes”. Uma versão semelhante desse exercício foi popularizada pelo filósofo brasileiro Olavo de Carvalho, sob o rótulo de “exercício do Necrológio”.

A ideia é simples: imagine que você está assistindo seu próprio funeral. As pessoas que lhe são mais queridas estão ali falando a seu respeito, logo após a sua morte. Ou então, imagine o necrológio que alguém escreveu sobre você um dia após a sua morte.

Agora pergunte-se após refletir: o que você quer que as pessoas digam ou escrevam que você foi? Qual o seu legado? Quem era você no dia em que faleceu?

O empresário e autor André Faria gravou um vídeo interessante, com algumas dicas sobre esse exercício.

Acerca da versão do necrológio, você pode encontrar mais orientações clicando aqui.

3) Aprenda inglês

O ambiente cultural brasileiro, embora contenha riquezas e tenha contado com autores de singular grandeza durante sua história, encontra-se em crise. Essa crise manifesta-se pelo vazio literário atual, pela pobreza da produção acadêmica e pela irrelevância científica. Para ter acesso ao melhor material, sem precisar esperar as traduções, é importante aprender inglês. Essa dica me parece particularmente relevante para acadêmicos, pois permite transcender o ambiente universitário brasileiro que foi – em larga medida – fagocitado por ideologias políticas.

4) Estabeleça um plano de estudos sobre história: geral e da sua área.

Estou convencido de que algo muito importante na vida intelectual é a percepção de que vivemos num ponto dentro de uma linha. Isso ajuda a prevenir contra todas as espécies de provincianismo temporal que leva a crer – equivocadamente – que as ideias da moda são as únicas relevantes ou que seriam completamente inovadoras ou ainda necessariamente superiores às do passado.

Na verdade, as ideias surgem dentro de uma tradição. Compreender essa tradição é importantíssimo para uma cognição mais profunda das várias correntes de pensamento de nossa própria época. Nesse sentido, o falecido e conceituado professor de Ciências Sociais da Universidade de Columbia Charles Tilly, em artigo sobre por que e como o estudo da história importa para o estudo de temas políticos, defende que a análise política dificilmente pode chegar a lugar algum sem uma análise histórica cuidadosa, uma vez que todo fenômeno político significativo vive na história e requer uma análise historicamente fundamentada para sua explicação. Minha experiência pessoal me leva a concluir que ele não poderia estar mais correto.

Por isso, uma ferramenta que me ajuda bastante e que me parece poderosa é começar o estudo sobre qualquer assunto pelo estudo da história do tema, tanto dos fatos, quanto dos autores, obras e conceitos. Se quer aprender literatura: comece por mapear os escritores, livros importantes e estilos. Quando você tiver essa lista, você já saberá muito mais do que se houvesse lido meia dúzia de livros a esmo sem ter essa visão panorâmica da matéria.

Cada disciplina possui bons livros sobre sua história. Gostaria aqui apenas de registrar uma coletânea de livros sobre história geral: a coleção da autora Susan Wise Bauer. A versão mais simples da obra foi recentemente traduzida para o português, pela editora É Realizações, basicamente visando auxiliar os pais educadores do homeschooling. Os pontos positivos dessa coleção são: está traduzida; é mais barata; é mais simples e resumida; abarca toda a história. É uma interessante dica para um olhar inicial sobre a história universal. De todo modo, há uma coleção bem mais completa da mesma autora e é essa que eu gostaria de indicar. Esse livro é de uma qualidade realmente singular pela didática, completude e também por já abarcar a história do Oriente, particularmente da China e da Índia, o que se torna cada vez mais relevante, uma vez que os países despontam no cenário global. Creio que essa é uma dica valiosa. Tive de verificar muitas obras antes de encontrar essa que adotei como manual de história e tem me ajudado bastante a contextualizar fatos, autores e obras dentro da história universal. O ponto negativo é que a coleção abrange apenas a Idade Antiga, Média e a Renascença. Daí pra frente tem de ser complementada pelo 4º livro da coleção mais enxuta que citei anteriormente.

5) Planeje para fazer atividades com a sua família

A vida intelectual não é uma vida ensimesmada. Em seu clássico livro de introdução aos estudos de humanidades, “A Vida Intelectual”, o tomista Sertillanges dedica alguns tópicos da obra a explicar por que o intelectual não é um isolado, mas deve buscar impactar positivamente seu ambiente social e atuar coletivamente.

Quanto a esse tema, um ponto que reputo muito importante para intelectuais humanistas modernos é o do tempo em família. A família é a célula básica da sociedade. Além de um valor intrínseco (o qual ela possui independente de qualquer resultado que produza na sociedade, um intrinsic common good, para me valer de uma expressão do intelectual conservador americano e professor da Universidade de Princeton Robert P. George), ela possui um papel insubstituível na vida social. Inúmeras pesquisas demonstram os impactos positivos que a saúde da vida familiar traz para a sociedade.

Mas como posso melhorar a minha família? Há várias formas. O tema é inabarcável. Há um ponto, contudo, que me parece singelo e ao alcance de todos: passar tempo juntos em atividades divertidas. Já escrevi artigos demonstrando, com base em vasto material científico, que a presença dos pais e a prática dos rituais familiares (refeições, festas, encontros anuais de Natal etc.) possuem profundos impactos nos indicadores de felicidade e realização. Por isso, creio que uma boa meta para este ano de 2022 é: estabelecer um horário diário e algumas práticas simples semanais, assim como alguns eventos mensais para a família. Crie hábitos, estabeleça rotinas, desenvolva atividades divertidas. Voltaremos a esses tópicos em textos futuros.

Com isso, encerro meu artigo de hoje. Espero que essas dicas sejam úteis e proveitosas para você. É um prazer estar de volta à Gazeta do Povo. Desejo a você, leitor, e a toda sua família, um 2022 cheio de lutas e conquistas.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/andre-uliano/2022-propositos-para-intelectuais-que-vao-alem-do-estudo/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

MUDANÇAS NO RECONHECIMENTO DA CIDADANIA ITALIANA

 

ALM Advogadas Associadas

Processo para conseguir a cidadania italiana sofre mudanças em 2022

ALM Advogadas Associadas destaca alterações que têm o objetivo de diminuir em 40% os tempos processuais.

 O processo de reconhecimento de cidadania italiana sofrerá mudanças a partir de 1° de julho de 2022. Uma reforma no Código de Processo Civil foi aprovada pelo Parlamento italiano e impactará os pedidos de reconhecimento de cidadania pela via judicial (contra às filas e via materna).

Assim sendo, o tribunal competente para julgar as ações de cidadania solicitadas pela via judicial diretamente na Itália não será mais exclusivamente o tribunal de Roma, e sim o tribunal da região do nascimento do antepassado italiano, o chamado Dante Causa do processo. Por exemplo, caso o seu Dante Causa tenha nascido em Rovigo, o tribunal competente será o Tribunal de Venezia.

Para quem já possui processo em andamento ou dará entrada em 180 dias, nada muda, ou seja, continua sendo o Tribunal de Roma o encarregado por julgar essas ações.

Com a alteração no trâmite aprovada, vai se tornar mais difícil o reconhecimento da cidadania italiana ou mais fácil? Vai demorar mais? A Itália será mais exigente com relação a documentação necessária? Esta reforma trará também novidades para o procedimento de reconhecimento administrativo do tão almejado direito à cidadania?

Segundo Rebeca Albuquerque, especialista em compliance e em direito internacional e sócia-diretora do ALM Advogadas Associadas, escritório com sede no Brasil, Portugal e Itália, que auxilia estrangeiros na busca pela cidadania europeia, “a descentralização da competência dos Tribunais pode trazer uma celeridade importante ao julgamento dos processos, mas poderá fazer com que haja decisões de entendimentos variados sobre uma mesma questão, o que já não acontecia no Tribunal de Roma”, destacou a especialista.

A reforma é prevista pelo PNNR (Plano Nacional de reinício e resiliência – “Piano Nazionale di Ripresa e Resilienza”) no âmbito do Poder Judiciário italiano e tem como foco a eficiência do processo civil. O objetivo principal da reforma, de acordo com o Ministério da Justiça Italiana, é diminuir em 40% os tempos processuais, proporcionando, de tal modo, a simplicidade, a concentração e a efetividade das tutelas, além da garantia de uma duração razoável do processo.

A lei aprovada modificou dispositivos especificamente relativos a procedimentos que tratam de direito de família, execução obrigatória e constatação/avaliação do status de cidadania.

Sabe-se que o brasileiro possui basicamente três caminhos para o seu processo de cidadania italiana: a via consular, a via administrativa na Itália e a via judicial junto ao Tribunal italiano competente.

“A via judicial tem sido o caminho mais procurado especialmente a partir de 2018 e depois da recente pandemia do Covid-19, por ser uma via considerada célere em comparação com o tempo das filas consulares e menos custosa do que a via administrativa por fixação de residência na Itália”, informa Rebeca Albuquerque.

Além disso, a via judicial pode ser coletiva, sendo, portanto, processos familiares em que os descendentes de um mesmo Dante Causa compartilham a mesma pasta e são declarados italianos numa mesma sentença.

As mudanças na Lei

Quanto ao direito à cidadania italiana iure sanguinis, o texto da reforma prevê a introdução de medidas de racionalização no que diz respeito às controvérsias relativas à constatação/avaliação do status de cidadania italiana.

Na prática, a principal alteração se dá quanto aos critérios de definição do foro competente para o ajuizamento das ações de reconhecimento de cidadania italiana iure sanguinis, trazendo uma relevante descentralização dos processos.

Atualmente, o único foro competente é o Tribunal de Roma e a sua vara especializada em matéria de imigração, proteção internacional e livre circulação dos cidadãos da União Europeia. A ação de reconhecimento do status de cidadão italiano com descendência iure sanguinis, sendo o(s) autor(es) da ação pessoas que não residem na Itália e sendo o réu/requerido, o Ministério do Interior, representado pela Advocacia Geral da União, um órgão da Administração pública italiana, os pedidos devem ser todos impetrados junto a vara especializada em matéria de imigração, proteção internacional e livre circulação dos cidadãos da União Europeia que hoje existe somente no Tribunal de Roma, o qual é o Foro Financeiro competente.

Alteração no trâmite vai “desafogar” Tribunal de Roma e agilizar processos

Nos últimos três anos, as ações de reconhecimento de cidadania italiana iure sanguinis que foram impetradas no Tribunal de Roma aumentaram significativamente e é notório que sobrecarregaram tanto a parte administrativa dessa vara, quanto os próprios juízes, prejudicando o julgamento célere desse tipo de pedido, conforme determinação legal.

As Audiências, etapa obrigatória do processo judicial, que por lei deveriam ser fixadas em breve tempo após o ingresso do pedido, e que inicialmente eram fixadas em poucos meses, passaram a demorar três anos para serem fixadas por parte de alguns juízes.

Este tempo também foi influenciado pelo processo de transição de processos burocráticos físicos para o mundo virtual, acelerados pela pandemia do Covid-19, chegando a impactar procedimentos relativamente simples, como por exemplo, a emissão das certidões em trânsito em julgado, que passaram a demorar 6 meses para serem emitidas.

“A novidade da Lei 206 é, portanto, principalmente desafogar a situação de demora e de incerteza temporal no julgamento e conclusão de uma ação que é puramente documental, garantindo assim uma razoável duração do processo com a possibilidade de impetrar as ações de reconhecimento da cidadania italiana diante de demais foros”, disse Karla Leal Macedo, advogada italiana, mestre em direito pela Universidade de Bolonha e sócia-diretora do ALM Advogadas Associadas.

Escritório de advocacia escolhido precisa estar preparado para as mudanças

O que isso afeta aos futuros requerentes e aos pleiteadores da cidadania Italiana? O advogado escolhido deverá ser extremamente organizado e ter uma equipe preparada, correspondendo a diversas demandas em variados tribunais, o que tende a diminuir o prazo de conclusão dos processos.

Os advogados tem 180 dias para se ajustar às novas normativas. Com todas estas mudanças, é preciso ter um escritório com competência, fluxo processual e que esteja preparado para este novo capítulo da cidadania na Itália.

Se por um lado, acredita-se que abrir a competência para outros foros ajudará o desafogamento da vara de Roma, e provavelmente trará um aceleramento no julgamento das ações nos outros foros, sendo fixadas as audiências dentro de um prazo mais célere do que o atual; por outro lado, existe o desconhecimento se os novos juízes aceitarão práticas de entendimento aplicadas atualmente nos processos de cidadania já consolidadas entre os juízes do Foro Romano”.

O Foro Romano, tendo sido o único nos últimos anos, havia criado um entendimento pacífico em alguns pontos da análise (tais como: exigências documentais, necessidade ou não de retificações, refutação da tese da grande naturalização, etc.), bem como de interpretação e aceitação documental, e, com a entrada em vigor da reforma e de seus novos critérios, “existe a incerteza se tais parâmetros serão também aceitos e aplicados pelos novos juízes dos novos Foros” afirma Karla Leal Macedo. Portanto, acredita-se em um maior rigor na avaliação da constatação da cidadania italiana por parte dos Tribunais locais.

Como e onde serão definidos os novos foros de competência?

O critério de definição da competência será a cidade de origem do Dante Causa (ascendente italiano nascido na Itália) do(s) autor(es) da ação. Portanto, o foro competente será o Tribunal da cidade capital da região de origem (“capoluogo regionale”).

Ainda existem questionamentos pragmáticos de como serão atuadas algumas modificações previstas, e com certeza, muitos novos surgirão, mas acredita-se que tudo venha a melhorar e transformar a efetivação de garantias e direitos.

A nova reforma do processo civil italiano irá trazer novidades para a constatação da cidadania italiana, impactando diretamente a atuação dos profissionais do setor.

Espontaneamente, surge o questionamento se tal reforma trará novidades também no âmbito administrativo, ou seja, se a definição da competência judicial passará a ser aplicada também no âmbito do pedido de reconhecimento administrativo junto ao Comune. Mas somente com a aplicação prática das novas decisões é que se poderá delinear novos caminhos, e por agora este resta come um ponto para se ter em mente.

Segundo o ALM Advogadas Associadas, o mais importante, portanto, é estar sempre em primeira linha se atualizando diariamente com os novos aspectos e os novos entendimentos, e diante do estudo específico de cada caso, escolher qual o melhor caminho para a obtenção e reconhecimento da cidadania italiana iure sanguinis, pois acredita-se que tudo venha a melhorar e a transformar a efetivação de garantias e direitos.

E como fica a tese da Grande Naturalização?

Já há alguns anos em que a Advocacia Geral do Estado italiano tem invocado a tese da Grande Naturalização (GN) contra processos de reconhecimento de cidadania italiana iure sanguinis cujo Dante Causa estava no Brasil no período de vigência do Decreto presidencial brasileiro da Grande Naturalização (entre os anos de 1889 e 1891) e cujos filhos tenham nascido em solo brasileiro antes do ano de 1912, ano da primeira lei ordinária italiana que tratou da dupla cidadania.

Os juízes do Tribunal de Roma, em primeira instância, não acataram a tese da GN e em 2021 a maioria dos recursos julgados em segunda instancia, pelas Corte D’Appello de Roma e de L’Aquila, também não acataram a tese da GN.

Com a reforma que traz a descentralização dos processos de cidadania italiana, não se sabe como serão os entendimentos dos Tribunais locais a esse respeito. É uma lacuna cujo resultado somente poderá ser reconhecido com o tempo. Mas acredita-se que em breve novidades serão determinadas pelo posicionamento da Corte di Cassazione italiana.

Sobre o ALM Advogadas Associadas

O ALM Advogadas Associadas é um escritório com sede no Brasil, Portugal e Itália, que auxilia estrangeiros na busca pela cidadania europeia. Comandada pelas advogadas no Brasil, na Itália e em Portugal, Karla Leal Macedo, mestre em direito pela Universidade de Bolonha, que se dedica principalmente aos processos no Tribunal de Roma, e Rebeca Albuquerque, especialista em compliance e em direito internacional, o ALM Advogadas Associadas nasceu para ser o elo entre história e o futuro, entre o Brasil e a Europa, e para auxiliar no processo que envolve histórias, documentos, pesquisa e aspectos jurídicos ligados ao processo de reconhecimento da cidadania.

DELEGADOS DA POLÍCIA FEDERAL CONTRA OS CORTES NO ORÇAMENTO DA PF

  Brasil e Mundo ...