terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

TRABALHADOR PODE SER DEMITIDO POR JUSTA CAUSA AO RECUSAR A VACINA

 

Trabalhador que recusar vacina pode ser demitido por justa causa, diz Ministério Público

Orientação do órgão é para que as empresas invistam em conscientização e demitam os funcionários somente em último caso; entendimento é que recusa não pode colocar em risco a saúde dos demais empregados

  •  Eduardo Rodrigues, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Os trabalhadores que se recusarem a tomar a vacina contra a covid-19 sem apresentarem razões médicas documentadas poderão ser demitidos por justa causa, de acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT). A orientação do órgão é para que as empresas invistam em conscientização e negociem com seus funcionários, mas o entendimento é de que a mera recusa individual e injustificada à imunização não poderá colocar em risco a saúde dos demais empregados.

No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, embora não possa forçar ninguém a se vacinar, o Estado pode sim impor medidas restritivas aos cidadãos que se recusarem a tomar o imunizante contra o novo coronavírus.

Apesar de nenhum governo até o momento ter anunciado sanções aos negacionistas da vacina, essas medidas poderiam incluir multa, vedação a matrículas em escolas e o impedimento à entrada em determinados lugares.

Ainda assim, MPT recomenda que demissão para trabalhador que não tomar vacina venha somente em último caso. Foto: Carl de Souza/AFP

Um guia interno elaborado pela área técnica do MPT segue o mesmo critério. “Como o STF já se pronunciou em três ações, a recusa à vacina permite a imposição de consequências. Seguimos o princípio de que a vacina é uma proteção coletiva, e não individual. O interesse coletivo sempre vai se sobrepor ao interesse individual. A solidariedade é um princípio fundante da Constituição”, diz o procurador-geral do MPT, Alberto Balazeiro.

Ainda assim, a orientação do MPT é de que as demissões ocorram apenas como última alternativa após reiteradas tentativas de convencimento por parte do empregador da importância da imunização em massa.

“Na questão trabalhista é preciso ter muita serenidade. A recusa em tomar vacina não pode ser automaticamente uma demissão por justa causa. Todos temos amigos e parentes que recebem diariamente fake news sobre vacinas. O primeiro papel do empregador é trabalhar com informação para os empregados”, afirma o procurador-geral.

Ele lembra que toda empresa precisa incluir em seu Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) o risco de contágio de covid-19 e considerar a vacina no Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), a exemplo do uso de máscaras, que já se tornou obrigação básica no ambiente de trabalho desde o começo da pandemia.

“Não são meros protocolos de papel, eles têm que ser levados a sério. É obrigação do empregador ter o fator covid-19 como risco ambiental e a vacina como meio de prevenção. Ter planejamento é fundamental e gera a simpatia de todos os órgãos de fiscalização”, recomenda.

Balazeiro enfatiza que a exigência da vacina no trabalho deve seguir a disponibilidade dos imunizantes em cada região e o Plano Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde, que determina quais grupos têm prioridade na fila da vacinação. Profissionais de Saúde, idosos e pessoas com comorbidades estão contemplados nessa primeira fase.

A partir da disponibilidade da vacina para cada grupo, caberá ao trabalhador comprovar a sua impossibilidade de receber o imunizante com a apresentação de laudo médico. Mulheres grávidas, pessoas alérgicas a componentes das vacinas ou portadoras de doenças que afetam o sistema imunológico, por exemplo, podem ser excluídas da vacinação. Nesses casos, a empresa precisará negociar para manter o funcionário em home office ou no regime de teletrabalho.

“A saúde não se negocia quanto ao conteúdo, mas sim quanto à forma. Não posso negociar para que uma pessoa não use máscara, mas posso negociar se ela vai ficar em casa. O limite é a saúde, que é um bem coletivo”, acrescenta.

Por isso, para proteger os demais funcionários, o empregador deve impedir a permanência no ambiente de trabalho de quem não se imunizar. “E sem uma recusa justificada, a empresa pode passar ao roteiro de sanções, que incluem advertência, suspensão, reiteração e demissão por justa causa. A justa causa é a última das hipóteses. O guia do MPT não é um convite à punição, mas à negociação e à informação. O que não pode é começar com justa causa e nem obrigar ninguém a trabalhar em condições inseguras”, acrescenta Balazeiro.

Na demissão por justa causa, o trabalhador fica sem vantagens da rescisão, com direito apenas ao recebimento do salário e das férias proporcionais ao tempo trabalhado. Por outro lado, fica impedido de receber o aviso prévio e 13° salário proporcional. Além disso, o empregador não precisa pagar a multa rescisória de 40% do FGTS, enquanto o trabalhador fica barrado de habilitar o seguro-desemprego e sacar o FGTS.

O procurador-geral acredita que a vacina também deve ser um tema a ser tratado nas convenções e acordos coletivos de trabalho. “O papel dos sindicatos é fundamental. Os sindicatos atuaram muito ativamente no começo da pandemia, com a migração para o trabalho remoto em muitas atividades. Então, coerentemente, eles terão um grande papel nas medidas para evitar a continuidade da propagação da doença”, conclui.

O TETO DE GASTOS NÃO É O VILÃO DO AUXÍLIO EMERGENCIAL

 

O teto não é o vilão

A suposta dificuldade de encontrar recursos para o auxílio emergencial tem alimentado um discurso irresponsável para justificar a ruptura do teto de gastos

  •  Notas&Informações, O Estado de S.Paulo

Não há dúvida de que o poder público deve se mobilizar para encontrar espaço no Orçamento para atender os milhões de brasileiros que perderam renda em razão da pandemia de covid-19. Junto com a vacinação em massa, a retomada do auxílio emergencial deve estar no topo das prioridades dos políticos e das autoridades em todas as esferas administrativas.

Não foi por outra razão, aliás, que os novos comandantes do Congresso manifestaram que a imunização e o socorro financeiro são suas únicas preocupações no momento. Já o governo de Jair Bolsonaro expressou reticências sobre uma nova rodada de auxílio emergencial, mas é questão de tempo até que suas reservas sejam superadas pela perspectiva de potenciais ganhos eleitorais, única motivação do presidente.

Assim, a volta do auxílio emergencial é apenas uma questão de tempo – e depende, sobretudo, da formulação de uma arquitetura financeira que não agrave a periclitante situação fiscal do País. Nesse aspecto, a suposta dificuldade de encontrar recursos em razão das limitações constitucionais, em especial o teto de gastos públicos, tem alimentado um discurso irresponsável que justifica a ruptura desse teto como um imperativo moral, ante a inegável necessidade de amparar milhões de cidadãos sob ameaça de fome.

Não é à toa que muitos dos que advogam essa ruptura são os mesmos que tudo fizeram e fazem – há tempos, desde antes da pandemia – para desacreditar o teto de gastos, atribuindo a essa restrição todos os males sociais do País. Trata-se de uma questão absolutamente falsa.

É perfeitamente possível encontrar recursos, respeitando-se o teto, para atender os brasileiros ora necessitados. O presidente do Centro de Liderança Pública, Luiz Felipe D’Ávila, disse ao site Poder360 que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 147/2019, que elimina os chamados “penduricalhos” agregados aos vencimentos de funcionários públicos, por exemplo, já seria suficiente para implementar um auxílio de até R$ 250. “Temos que aprovar a PEC dos Penduricalhos, que é o fim de privilégios absurdos da elite do funcionalismo público. Isso tem um custo absurdo para a Nação. Com esse superávit, podemos financiar o programa de auxílio emergencial”, disse D’Ávila.

Essa seria apenas uma das várias maneiras possíveis de manejar o Orçamento para o socorro aos necessitados sem desrespeitar o teto de gastos. O economista Marcos Mendes, em artigo no site Brazil Journal, apresentou nada menos que oito propostas. Uma delas seria direcionar parte das emendas parlamentares excepcionalmente para o pagamento do auxílio.

Soluções como essas, contudo, exigem habilidade e vontade política, pois seria necessário enfrentar a poderosa corporação do funcionalismo e também convencer os parlamentares a mudar a destinação de parte das bilionárias verbas a que têm direito para investir em seus redutos eleitorais. Como se vê, o obstáculo não é o teto de gastos, mas a acomodação da elite política em seus feudos de poder.

É preciso lembrar, sempre, que a responsabilidade fiscal é a garantia da preservação da maior conquista econômica brasileira desde a redemocratização: o controle da inflação, cuja manutenção em patamares civilizados estimula investimentos de longo prazo, mantém o poder de compra da moeda, permite a redução dos juros e, assim, ajuda a conservar o endividamento público em nível administrável – o que, por sua vez, mantém os preços comportados, num círculo virtuoso. Sem o teto de gastos, tudo isso desmorona.

Ademais, o teto de gastos é fundamental para o debate democrático sobre as prioridades do País. Ao estabelecer um limite para a despesa pública, o instrumento obriga os brasileiros a discutirem, por meio de seus representantes políticos, qual deve ser a destinação dos impostos arrecadados, com a consciência de que os recursos são finitos. Aqueles que não gostam de controle, que preferem manter os privilégios de quem se julga dono do Orçamento e que estão somente preocupados com o atendimento de seus interesses paroquiais imediatos continuarão a vilanizar o teto de gastos. Para esses, na prática, o teto só se aplica aos pobres.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

RÚSSIA PROMOVE A SUA VACINA SPUTNIK V

 

Rússia impulsiona notícias falsas para promover vacina russa Sputnik V

Para influenciar países latino-americanos, veículos de comunicação russos ligados ao governo divulgam informações falsas sobre os imunizantes dos EUA e da Europa, ao mesmo tempo em que elogiam a Sputnik V, aponta estudo

Sheera Frenkel, Maria Abi-Habib e Julian Barnes, The New York Times, O Estado de S.Paulo

Agências de notícias russas ligadas às campanhas de desinformação durante as eleições nos Estados Unidos têm agora uma nova meta: convencer os países latino-americanos de que a vacina russa contra o novo coronavírus é melhor do que as suas concorrentes americanas e europeias. É o que afirmam pesquisadores e autoridades do Departamento de Estado dos Estados Unidos.

A campanha dos russos tem por alvo os países latino-americanos, incluindo o México, que na semana passada fechou um acordo para aquisição de milhões de doses da vacina russa, e a Argentina, que no mês passado começou a vacinar seus cidadãos com a Sputnik V.

Presidente russo, Vladimir Putin, em videoconferência;  Rússia atropelou regulamentações  Foto: Sputnik/Alexei Babushkin/Kremlin via Reuters

O governo russo nega participação na campanha, mas ela tem sido levada a cabo nas redes sociais de língua espanhola por grupos ligados a veículos de comunicação russos e reforçada pela conta no Twitter da embaixada russa na Cidade do México.

A campanha é um novo aspecto das operações de influência dos russos, promovendo sua indústria e a qualidade científica superior à dos seus concorrentes em um momento em que governos estão em uma corrida para vacinar suas populações.

A vacina russa é a mais barata e a mais fácil de transportar se comparadas com as produzidas pela Pfizer e a Moderna, ambas empresas americanas. No entanto, segundo alguns pesquisadores, os ataques das agências russas contra as vacinas ocidentais são desleais.

Argentina começou a vacinar sua população com o imunizante russo Sputnik V Foto: Russian Direct Investment Fund (RDIF)/Handout via REUTERS

“Quase tudo que vêm promovendo sobre a vacina é manipulado e sem contexto”, disse Bret Schafer, membro da Alliance for Securing Democracy, grupo de defesa que monitora a desinformação que parte da Rússia. “Cada notícia ou questão negativa envolvendo a vacina fabricada nos Estados Unidos é amplificada, ao mesmo tempo que eles trazem uma enxurrada de matérias positivas sobre a vacina russa”.

Agências de mídia respaldadas pelo governo russo postaram no Facebook e no Twitter centenas de links para notícias e reportagens que sugeriam que as vacinas americanas poderiam ter tido um papel em algumas mortes, disseram os pesquisadores. Por outro lado, elas omitiam notícias veiculadas posteriormente segundo as quais  as vacinas provavelmente não tinham nada a ver com as mortes.

“Trata-se de um esforço coordenado que em parte é uma campanha de relações públicas e em parte desinformação. É uma das mais vastas operações que já vimos para promover uma narrativa em torno da vacina na América Latina e parece que tem tido efeito”, disse Jaime Longoria, pesquisador da entidade sem fins lucrativos First Draft, que dá suporte a jornalistas e pesquisadores independentes. “A Rússia criou um discurso que vem se desenvolvendo e até certo ponto tem sido aceito”.

Presidente argentino Alberto Fernández recebe a primeira dose da vacina russa Sputnik V  Foto: Esteban Collazo/Argentine Presidential Press Office via AP

Os pesquisadores rastrearam esforços similares dos russos em países da Europa Oriental que ainda vêm negociando com a Rússia a compra da vacina. Os pesquisadores especialistas em rastrear a desinformação também verificaram que a Rússia adota um discurso similar em várias línguas tendo por alvo países da África Central e Ocidental.

A China também entrou na briga, adotando um tom similar antiamericano no caso da vacina com vistas ao público doméstico. Embora Rússia e China ao que parece não estejam trabalhando juntas, os dois países compartilham interesses que levam ao mesmo tipo de discurso. No mês passado, uma conta no Twitter dedicada à Sputnik V incluiu uma notícia chinesa que afirmava, falsamente, que a mídia dos Estados Unidos se manteve calada sobre as mortes relacionadas à vacina da Pfizer.

Membros da inteligência dos Estados Unidos observaram pela primeira vez um aumento dos esforços russos com foco em comunidades de língua espanhola em agosto, quando o presidente Vladimir Putin anunciou a aprovação da vacina. Desde então a campanha russa tem se intensificado, segundo dois oficiais da inteligência.

Membros do Departamento de Estado descreveram a campanha de influência dos russos como uma combinação de agências de mídia financiadas pelo Estado destacando notícias sobre os perigos das vacinas americanas e ao mesmo tempo promovendo informações entusiasmadas sobre a vacina produzida na Rússia.

No mês passado circulou no Departamento de Estado um informe descrevendo os esforços da Rússia. Segundo o porta-voz do departamento, a Rússia tenta promover sua própria vacina ao mesmo tempo que procura “disseminar a desconfiança” das vacinas ocidentais nos Estados Unidos.

Ao analisar mais de mil contas de origem russa no Twitter, o Global Engagement Center, órgão do Departamento de Estado americano, verificou que as contas em língua espanhola estão fortemente engajadas na campanha russa, o que “prejudica o esforço global coletivo para pôr fim à pandemia”, disse o porta-voz.

A campanha de influência no México foi a que deixou mais evidentes os esforços das agências ligadas ao Kremlin. Ela foi diferente de outras campanhas de desinformação russas. As companhias de mídia social se tornaram mais agressivas nas medidas para extirpar a desinformação. As operações russas têm se concentrado em promover reportagens seletivas que fogem à verdade em vez de rejeitá-las.

Ascensão de grupos extremistas, tentativas de golpes, eleições questionadas: como está o sistema democrático em diferentes países

A nova estratégia foi particularmente eficaz porque as contas em língua espanhola no Twitter e Facebook do Russia Today e Sputnik, duas agências controladas pelo Estado, regularmente são classificadas como algumas das mais influentes na América Latina, disseram os pesquisadores da entidade First Draft.

Em dezembro o Facebook informou ter removido uma campanha de desinformação russa com postagens em língua francesa, inglesa, portuguesa e árabe, contemplando vários assuntos, incluindo o apoio à vacina russa.

“Sabemos que essas operações de influência adquirem diferentes formatos, incluindo mensagens claras promovidas pela mídia estatal. Colocamos rótulos nítidos no caso desses editores de maneira que as pessoas saibam de onde partiu a informação”, disse Liz Bourgeois, porta-voz do Facebook.

Segundo ela, o Facebook observou algumas operações russas clandestinas mencionando a Covid-19 no passado, mas não descobriu campanhas desse tipo atualmente. As postagens de agências de notícias russas não são consideradas clandestinas e não foram removidas pelo Facebook.

O Twitter se recusou a comentar sobre qualquer operação russa destinada a públicos falantes de espanhol, mas disse que ainda está investigando.

A campanha russa se baseia em notícias selecionadas criteriosamente, disseram os pesquisadores. Em 17 de janeiro o Russia Today em língua espanhola, em seu Twitter, informou que a Noruega estava investigando as razões pelas quais 23 pessoas idosas haviam morrido após receberem a vacina da Pfizer. Três semanas antes, a mesma conta postou várias notícias sobre seis pessoas que morreram durante testes também com a vacina da Pfizer. As notícias não incluíram explicações de especialistas médicos, segundo os quais as mortes não tiveram nenhuma relação com a vacina.

E informações similares circularam no Facebook do Russia Today. Em cinco de janeiro, em sua página em espanhol na plataforma, a agência divulgou para seus 17 milhões de seguidores notícia segundo a qual uma enfermeira portuguesa morreu dois dias depois de receber a vacina da Pfizer. A informação dava a entender que a vacina havia sido a responsável, apesar de os médicos e a autópsia realizada concluírem que a vacina não teve nenhum papel na morte da mulher.

Os corpos diplomáticos da Rússia também usam a mídia social para promover uma imagem de que a vacina russa estava sendo submetida a um escrutínio desleal.

O volume de postagens é notável, disse Longoria e outros que vêm estudando essas operações de influência da Rússia. No On CrowdTangle, ferramenta de propriedade do Facebook que analisa as interações no site, eles descobriram que as páginas da Russia Today e Sputnik direcionadas ao público de língua espanhola, geraram mais de mil postagens com mais de seis milhões de interações durante o ano passado com a palavra “vacuna”, que significa vacina em espanhol. /Tradução de Terezinha Martino

POLÍTICA DE PREÇOS DE COMBUSTÍVEIS DA PETROBRAS DEVE MUDAR

 

Mercado questiona preços da Petrobrás

Alteração na política de preços feita no ano passado, mas só anunciada na sexta, põe em xeque transparência e independência da estatal

Denise Luna, O Estado de S.Paulo

RIO – A mudança da política de preços da Petrobrás, anunciada em fato relevante na sexta-feira – mas na verdade modificada no primeiro semestre de 2020 –, pegou o mercado de surpresa e levantou dúvidas sobre a transparência da decisão, que ao contrário de outras alterações feitas pela companhia desde 2019, não foi comunicada ao mercado.

A Petrobrás só emitiu o fato relevante sobre o tema após a informação ter sido revelada pela agência Reuters, na tarde de sexta-feira. No documento, a estatal admitiu que alterou a política de preços de trimestral para anual “estritamente para fins de gestão e diagnóstico interno” em março de 2020, mas que isso nada interfere nas decisões sobre ajuste de preços, que continuam a seguir a paridade internacional. A empresa alega que “não divulga os detalhes de sua política de preços em razão de sensibilidade comercial”.

Segundo a Petrobrás, após a revisão de junho foram aplicados 22 reajustes de gasolina. Foto: Geraldo Falcão/Petrobrás

“Em 2019, estabeleceu-se indicador gerencial com apuração trimestral. Em 2020, dada a volatilidade dos preços internacionais e da taxa de câmbio, esse indicador passou a ser anual, sem impacto nas decisões de preços”, explicou a Petrobrás em nota. “Prova disso é que a mudança foi implantada em junho de 2020, sem que tivesse sido observado maior espaçamento nos reajustes de preço. Após a revisão de junho, por exemplo, foram aplicados 22 reajustes de gasolina (9 reduções e 13 aumentos) e 18 reajustes no diesel (4 reduções e 14 aumentos)”, reforçou a estatal.

Apesar disso, pelo menos em duas ocasiões a companhia avisou de outras mudanças na política de preços. Em março de 2019, informou que o diesel não teria ajuste no prazo inferior de 15 dias; e em junho do mesmo ano avisou que não teria mais periodicidade para ajustes nos preços do óleo diesel e gasolina.

A notícia teve ainda mais peso por ocorrer horas depois do presidente Jair Bolsonaro ter reafirmado a independência da empresa em sua política de preços, e em meio à insatisfação dos caminhoneiros em relação à alta do diesel.

Para o presidente da Associação dos Acionistas Minoritários (Aidmin), Aurélio Valporto, a empresa escondeu a informação e deveria ter publicado fato relevante na época da mudança. Valporto avalia que a decisão foi tomada no início da pandemia para evitar repassar a forte queda do preço do petróleo no mercado internacional, que chegou a ser cotado a US$ 20 o barril em abril do ano passado.

Barato

“Na época, o combustível deveria ser mais barato do que foi no Brasil. Eles devem ter pensado que se continuassem a seguir essa política (trimestral) poderiam ter prejuízo. Reduziram o preço dos combustíveis, mas não na mesma proporção que o mercado externo”, disse Valporto.

Para o analista de petróleo e gás da consultoria StoneX, Thadeu Silva, o aumento de prazo para avaliação de ajustes pode ser uma política danosa para a empresa, principalmente diante dos preços defasados que mantém no mercado interno: “Ela não comunicou ao mercado. Do ponto de vista econômico o prazo de até 12 meses para seguir o preço internacional, é um prazo muito longo, não existe isso no mercado.”

Segundo Silva, com os preços defasados atuais, a estatal é obrigada a abastecer todo o mercado com prejuízo. “Ela (Petrobrás) falar que está seguindo o mercado internacional em até 12 meses é a mesma política da Dilma (Rousseff, ex-presidente da República). Vai reajustar o preço de vez em nunca, e é um mercado grande, que está crescendo, e vai ter de importar mais”, explicou.

Depois de forte queda na pandemia, o mercado de petróleo tem registrado sucessivas altas, e na sexta-feira fechou a US$ 55/barril o tipo Brent, influenciado pela expectativa de uma nova rodada de estímulos fiscais nos Estados Unidos.

O presidente da Associação dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, há meses reclama da falta de paridade dos preços da estatal com o mercado externo. Segundo ele, os últimos valores apurados mostram que para se equiparar ao mercado internacional a gasolina deveria estar R$ 0,19/litro mais caro e o diesel, R$ 0,36/litro: “Com a confissão feita pela Petrobrás, considerando os fatos relevantes, o Conselho de Administraçãonão pode deixar de se posicionar. Afinal, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) deve estar atenta às condutas e aos impactos gerados para os acionistas e ao mercado em geral.”

Já para o analista da Mirae Asset Pedro Galdi, o mercado vai absorver bem a mudança de estratégia da companhia, mesmo que tenha sido pego de surpresa, respaldados pelo aumento de produção no pré-sal e da alta do preço do petróleo, que segundo ele pode chegar a US$ 60 o barril: “O pessoal pode ficar desconfiado, já que a mudança veio em cima da hora de ameaça de greve de caminhoneiros. Vejo o anúncio mais como uma forma de acalmar o mercado, mas sem impor perdas para a Petrobrás.”

Na sexta-feira, a notícia da mudança de política derrubou, no espaço de uma hora, as ações ordinárias da estatal em 4,5% e as preferenciais, em 3,7%. No final do pregão, no entanto, após o fato relevante, elas subiram e fecharam em alta de 1,40% e 0,69%, respectivamente.

ESPERA-SE QUE O GOVERNO BOLSONARO FAÇA ALGUMA COISA AGORA COM O APOIO DO CONGRESSO

 

Por que apenas sobreviver?

Uma coalizão reformista requer uma gerência profissional e não amadora

Carlos Pereira*, O Estado de S.Paulo

A decisão de montar uma coalizão com os partidos que fazem parte do Centrão e a vitória de seus candidatos, Arthur Lira (Progressistas-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), à presidência da Câmara e do Senado, trouxe para o presidente Jair Bolsonaro um desafio ainda maior pela frente: o de escolher como vai gerenciar sua coalizão.

Minhas pesquisas sobre gerência de coalizões indicam que quanto maior o número de partidos participando da coalizão, maior a heterogeneidade entre eles, menor a proporcionalidade na alocação de recursos, e maior a incongruência entre as preferências da coalizão e do Congresso, maiores serão os problemas de coordenação e os custos de governabilidade e menor o sucesso legislativo.

A coalizão construída por Bolsonaro é, até o momento, minoritária. O número de cadeiras ocupadas pelos dez partidos que fazem parte do Centrão totaliza apenas 204 das 513 existentes. Ou seja, nos termos atuais, é fundamentalmente uma coalizão “negativa”, com capacidade apenas de veto às iniciativas legislativas indesejáveis para o governo (impeachment, por exemplo). Não é uma coalizão proativa ou promotora de reformas.

Apesar de ser minoritária, a coalizão de Bolsonaro possui um número muito alto de partidos, o que dificulta a sua coordenação. Entretanto, ela é relativamente homogênea do ponto de vista ideológico, composta basicamente por partidos de centro-direita, o que diminui os custos de transação. Outro aspecto facilitador de governabilidade da coalizão do presidente é que seus partidos estão muito próximos da preferência mediana da Câmara dos Deputados, que é de direita.

Se a ambição de Bolsonaro fosse a aprovação de uma agenda ampla de reformas no Congresso, ele teria plenas condições de montar uma coalizão majoritária, convidando alguns dos partidos próximos da mediana da Câmara. Poderia, por exemplo, fazer uma oferta a potenciais partidos aliados como Podemos (13), Novo (8), Democratas (29) e PSL (55), ou mesmo a partidos supostamente neutros como PV (4), Cidadania (7) e MDB (34).

Distribuição ideológica dos partidos na Câmara dos Deputados. Foto: Reprodução

A principal fragilidade da coalizão do governo Bolsonaro é a desproporcionalidade na alocação de poder e de recursos entre os parceiros, pois o presidente não tem levado em consideração o peso político de cada um deles na Câmara. Dos 23 ministérios, apenas sete são alocados para ministros filiados a partidos políticos, dos quais três não pertencem aos que fazem parte formalmente da sua coalizão. Uma reforma ministerial se faz urgente e necessária.

Se Bolsonaro não corrigir essa desproporcionalidade, animosidades vão surgir e a coalizão vai apresentar fissuras e ressentimentos. Os partidos não se sentirão comprometidos com o governo e terão incentivos a inflacionar o preço do apoio a cada nova votação que o presidente sinalizar como prioridade na sua agenda.

A estratégia anunciada, de “esperar para ver” como o Centrão se comporta primeiro e premiá-los depois, certamente aumentará os custos de gerência. Como o jogo é de repetição, a melhor estratégia é premiar os parceiros proporcionalmente ex ante para comprometê-los com uma agenda de votações em vez de recompensá-los ex post a cada votação.

Estando o presidente disposto a jogar o jogo do presidencialismo multipartidário, precisa aprender a gerir sua coalizão de forma profissional e não amadora.

*CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS (FGV EBAPE)

A PANDEMIA E O MARKETING DIGITAL

 

A pandemia, a aceleração e o marketing digital

Johnny Soares*

Aceleração. Taí uma das palavras mais usadas pelas startups, por investidores-anjo, por coachs de negócios, conselheiros ou “tubarões” em programas televisivos. “Vamos acelerar o seu negócio” virou praticamente um mantra dos consultores e um desejo dos empreendedores na busca de se tornarem os novos “unicórnios” do planeta. Contudo, até o momento, nada conseguiu acelerar mais os negócios – em escala global – do que a pandemia do novo coronavírus. A covid-19 já transformou 2020 no ano da aceleração dos negócios.

Quando faço essa afirmação, nem de longe quero parecer defender que a Covid-19 tenha algo de positivo. Porém, é inegável notar que diante da crise causada pelo novo coronavírus, as empresas tiveram que acelerar. Talvez seja impossível mensurar o impacto que a pandemia trará aos mais diversos setores da sociedade, mas é possível afirmar que ela forçou as empresas a acelerarem a entrada no mercado digital para sobreviverem. O que era tendência, o que era aposta, o que era um plano para daqui a pouco, de repente, teve que virar realidade.

E assim, estamos vendo mercadinhos de bairro aderindo ao comércio eletrônico; lojistas vendendo pelo WhatsApp Businness e por aplicativos próprios; academias de ginástica instruindo aulas através de ferramentas como o Google Meets e Zoom; faculdades adaptando-se ao ensino remoto em plataformas como o Moodle; bares e restaurantes locais, até então estritamente offline, ingressando em aplicativos de entregas como o Ifood, Rappi, Uber Eats, Zé Delivery; terapeutas atendendo pelo Skype; empresas dos mais diversos segmentos e tamanhos passando a vender pelas redes sociais, através de marketplaces virtuais, criando grupos no Telegram; artistas e empresas realizando lives no Youtube, Facebook, Instagram, Linkedin, entre outras plataformas. Enfim, praticamente de um dia para o outro fomos todos forçados a viver, a interagir e a vender e comprar de forma on-line. Fomos todos empurrados para o digital. O isolamento social fez crescer a necessidade de conexão emocional. E, nesse sentido, a proximidade se tornou o grande trunfo dos pequenos sobre os grandes. As lives viraram a nova vitrine, em um palco que agora, mais do que nunca, é 4.0.

Recusar-se a desaprender antigos modelos, processos, crenças e aprender com a nova realidade imposta, adaptando-se de forma veloz às mudanças farão a diferença entre as empresas que melhor sobreviverão à pandemia. Em muitos casos, o auxílio emergencial do Governo será importantíssimo, mas isso não é tudo. É preciso acelerar a mudança, é preciso conectar-se, é urgente adaptar-se ao digital.

É evidente que algumas indústrias e mercados estão sendo mais impactados, não obstante a presença no meio digital, do que outros. É o caso do turismo, das companhias aéreas e dos setores automotivo, imobiliário e de entretenimento. Mas, novamente, é fundamental acelerar mudanças, muitas vezes estruturais e de posicionamento, nesses modelos de negócios, envolvendo-se no processo inevitável de transformação digital. Até porque o consumo, de maneira geral, deve cair e o consumidor deve se tornar ainda mais seletivo, crítico e consciente.

O “novo normal” certamente será digital. Isso não quer dizer que as lojas físicas deixarão de existir. Basta lembrar que o videocassete ou a Netflix não acabou com o cinema. Aliás, a única ameaça que, pela primeira vez fechou todas as salas de cinema do mundo, foi a Covid-19. Sabemos que a vida acontece, sobretudo, no ambiente físico, nas relações interpessoais, no chamado mundo real. Mas, com a adesão acelerada dos consumidores ao digital, os negócios deverão cada vez mais proporcionar no mundo físico experiências diferenciadas e valiosas que reforcem a relação entre a marca e o consumidor. Um consumidor que terá um novo comportamento em um mercado que será impactado por novas tendências e em um mundo que terá novos valores e protocolos de segurança e convívio.

Esse mundo será de um consumidor mais digitalizado, mais informado, mais adepto de ferramentas sobre as quais nunca antes havia ouvido falar. Pesquisas recentes do Google, por exemplo, apontam um crescimento de 198% pela busca com a frase “Como fazer compras on-line” e de 200% por “entrega de mercado perto de mim”. Embora não haja um manual de instruções para orientar as iniciativas de marketing das empresas, nesse momento é preciso prestar ainda mais atenção à necessidade de orientar, ensinar, simplificar e guiar o consumidor por esse universo on-line. Esse é um papel que as marcas devem assumir. Não só de tutoriar o consumidor como de, sobretudo, humanizar a comunicação fortalecendo seu propósito na sociedade, atuando de maneira empática e verdadeira. E é aí que o marketing digital ganha maior importância. Profissionais de criação e produção de conteúdo, monitoramento e métricas, que entendam o comportamento do novo consumidor, a dinâmica do digital, as estratégias, experiências e ferramentas mais adequadas ao virtual são e serão ainda mais essenciais para as empresas no pós covid-19.

Para atender e facilitar as empresas entrarem no mundo digital, a Startup Valeon aqui do Vale do Aço, coloca os seus serviços à disposição dos lojistas e empresários da região para divulgarem os seus produtos, suas promoções, serviços e também os profissionais liberais suas Especialidades na Plataforma Comercial Marketplace criada para atender essa carência do mercado. Nos consulte:

Site: https://valedoacoonline.com.br/ e Telefone: (31) 98428-0590

*É professor e coordenador da Pós-graduação em Gestão de Marketing e Estratégias Digitais

PT QUER DESGASTAR O GOVERNO E A NAÇÃO TAMBÉM

 

A estratégia do PT para desgastar o governo nos próximos dois anos

Nonato Viegas – Veja

A edição de VEJA deste fim de semana mostra a falta de rumo da oposição — isolada, sem discurso, sem proposta, sem alternativa para fazer frente ao governo Bolsonaro. O desafio agora tornou-se ainda maior, porque dois aliados do presidente assumiram o comando das duas Casas que compõem o Congresso. Na Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL) é o presidente para os próximos dois anos. No Senado, assumiu o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

Mas, para o PT, houve uma mudança estratégica de atuação da bancada do partido na Câmara e no Senado que deve surtir resultados políticos. Enquanto na primeira os petistas ganharam apenas um cargo burocrático na Mesa Diretora, uma concessão de Arthur Lira ao partido que não o apoiou, na segunda, a bancada conquistou duas comissões, a do Meio Ambiente e a dos Direitos Humanos.

Na avaliação dos petistas, ambas têm o potencial de causar incômodo ao governo e constrangimentos internacionais à administração Bolsonaro, já estigmatizada no exterior como um presidente que não respeita os direitos humanos nem o meio ambiente. Bolsonaro é, inclusive, alvo, de ação na Corte de Haia por violar direitos dos povos tradicionais e já trocou acusações com lideranças políticas por conta da Amazônia.

“Vamos com tudo para cima do governo. Vamos dar trabalho, utilizando todos os instrumentos legislativos para cobrar ações responsáveis do governo, ainda que tenha de constrangê-lo internacionalmente”, afirmou o senador Humberto Costa (PT-PE), que vai presidir a Comissão de Direitos Humanos. Na Comissão de Meio Ambiente, o PT escalou outro político hábil e com trânsito não apenas político mas com empresários, o senador Jaques Wagner (BA). A liderança da Minoria, que é a oposição, vai ficar com outro petista, o senador Jean Paul Prates (RN).

TESTES VENCIDOS SERÃO DOADOS PARA O HAITI

 

Brasil quer doar 1 milhão de testes de covid quase vencidos ao Haiti

Pacote é parte dos cerca de 5 milhões de testes que ainda se encontram encalhados em um armazém federal; Itamaraty e Ministério da Saúde dizem que pedido foi feito pelo governo caribenho, mas ainda se avalia a capacidade local de processar as análises

 

  • Mateus Vargas, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O Ministério da Saúde tenta doar parte dos cerca de 5 milhões de testes para detecção da covid encalhados em um armazém federal e que vencem a partir de abril. Num esforço de reduzir o estoque e evitar mais desgaste à imagem do general Eduardo Pazuello, chefe da pasta, o governo pretende entregar ao Haiti um 1 milhão desses exames. Outro lote foi oferecido a hospitais filantrópicos e Santas Casas, que devem recusar.

Como o Estadão revelou em novembro, o ministério guardava 7,1 milhões de exames do tipo RT-PCR, o mais indicado para diagnóstico da doença, e a maior parte (96%) teria de ir ao lixo entre dezembro e janeiro. O produto ganhou mais 4 meses de validade e 2,1 milhões de exames foram entregues até agora, mas a gestão de Pazuello continua com dificuldade para consumir o estoque.

O processo de detecção da doença exige também a disponibilidade de cotonetes swab, tubos coletores, reagentes de extração do RNA e outros insumos que nem sequer o Brasil conseguiu comprar em grande escala. Uma equipe de Pazuello está em Porto Príncipe para negociar a entrega e avaliar se o país tem condições de receber o material.

No estoque. O produto ganhou mais 4 meses de validade e 2,1 milhões de exames foram entregues até agora, mas há dificuldade em encontrar destinação Foto: Felipe Rau/Estadão

A negociação para a entrega dos exames ocorre no momento em que Pazuello está sob pressão e tenta evitar novos fracassos de logística. O general é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta omissão na ajuda ao Amazonas e precisou depor à Polícia Federal. Além disso, recebe críticas pela demora para comprar vacinas, pelo avanço da pandemia no País e por causa da aposta em medicamentos sem eficácia, como a cloroquina.

Itamaraty e o Ministério da Saúde afirmam que o governo haitiano pediu a doação dos testes. Não está claro se a quantidade ofertada foi proposta pelo Brasil ou pelo país caribenho. “A área da saúde, por estar entre os temas prioritários para a reconstrução e a estabilização do Haiti, constitui um dos principais eixos da cooperação com o país, bem como é objeto de diálogo constante entre os dois países. O governo do Haiti solicitou ao Brasil doação de testes para detecção e está finalizando os trâmites administrativos correspondentes”, afirma o Itamaraty, em nota.

Com população cerca de 19 vezes maior que a do Haiti, o Brasil patina para realizar testes no Sistema Único de Saúde (SUS). A meta do governo era fechar 2020 com mais de 24 milhões de amostras analisadas, mas cerca de 10,2 milhões de exames RT-PCR foram feitos na rede pública até agora. Mesmo os exames entregues aos Estados e municípios não foram totalmente consumidos, entre outras razões pela falta de todos os insumos de análise.

Além disso, o produto hoje encalhado não é compatível com toda a rede de laboratórios do SUS. Esse exame é da marca coreana Seegene e foi comprado por meio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), por R$ 42 a unidade. A validade original era de 8 meses, mas foi estendida por mais 4 meses pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com base em estudos da fabricante.

O Brasil tem fortes laços com o Haiti e chefiou uma missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no país caribenho, entre 2004 e 2017. Nesse período, generais que apoiam e têm cargos no governo Bolsonaro comandaram as tropas internacionais, como os ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e o comandante do Exército, Edson Pujol. A Saúde também participou de ações para reconstruir o sistema de vigilância sanitária, destruído pelo terremoto de 2010.

A Embaixada do Haiti no Brasil afirma que não “está a par” das conversas. O Estadão apurou que o diálogo está sendo feito entre o governo brasileiro e o Ministério da Saúde do Haiti. Depois de duas semanas sendo questionado sobre o tema, a pasta de Pazuello respondeu que o pedido de doação foi apresentado pelo governo caribenho. Disse ainda que pediu ao país para confirmar se tem estrutura.

O governo brasileiro não doará reagentes de extração e outros insumos usados durante as análises das amostras. “Se os haitianos não tiverem como fazer essas análises ou como realizar coletas, não será possível ao Brasil dar início a alguma eventual doação”, afirma nota do ministério. Auxiliares de Pazuello, reservadamente, negam que a ideia é empurrar ao país os exames que estão prestes a vencer.

Na nota, a pasta afirma ainda que avaliará a quantidade que pode ser doada – a reportagem apurou que se fala, hoje, em 1 milhão de exames. “É necessário recordar que, desde o terremoto, o Brasil intensificou a cooperação humanitária em diversas frentes e três hospitais em território haitiano são mantidos com auxílio brasileiro”, afirma o ministério, que observa ainda que enviou 100 ventiladores pulmonares durante a pandemia ao Haiti.

DEPUTADOS GASTADORES DO DINHEIRO PÚBLICO

 

Em ano de pandemia, deputados gastam até R$ 347 mil com transporte

Ano de distanciamento social não impediu gastos altos com deslocamentos pelo País; 12 parlamentares chegaram a ampliar despesas mesmo com sessões online

Adriana Ferraz, Bianca Gomes e Marianna Gualter, O Estado de S.Paulo

O ano foi de pandemia, mas, apesar das recomendações de distanciamento social, teve deputado federal que gastou até R$ 347 mil em despesas de transporte, como fretamento de jatinho, aluguel de carro, combustível e passagens aéreas. Levantamento feito pelo Estadão mostra que 12 parlamentares ainda aumentaram esse tipo de pagamento em 2020 mesmo com a Câmara funcionando em esquema remoto.

A orientação para que os deputados ficassem em casa ocorreu em março, quando a Câmara regulamentou o uso da tecnologia para reduzir o risco de contágio do novo coronavírus. Desde então, a regra é realizar sessões online, evitando o deslocamento até mesmo para Brasília.

Silas Câmara teve gastos de ao menos R$ 206 mil Foto: INSTAGRAM @DEPSILASCAMARA

Se a aglomeração no plenário foi reduzida até a semana passada, quando os deputados voltaram presencialmente para eleger a nova Mesa Diretora, o mesmo não se pode dizer das atividades realizadas por parte dos parlamentares em suas bases.

Em dezembro, mês em que os casos de covid-19 voltaram a crescer no Brasil e, especialmente no Amazonas, o deputado Sidney Leite (PSD-AM) alugou uma aeronave, por R$ 82 mil, para rodar o interior do Estado e participar de festas natalinas. Ele é o campeão de gastos com transportes: R$ 347,1 mil.

Também do Amazonas, Silas Câmara (Republicanos) seguiu fazendo uso regular de aeronaves para visitar aliados político-partidários e também religiosos. Durante o ano, ele gastou ao menos R$ 206 mil em bimotores e até um hidroavião.

Além de estar na lista dos que mais pediram reembolso com deslocamentos (é o terceiro), Silas também faz parte do grupo de 12 parlamentares que aumentaram esse tipo de despesa na comparação com 2019.

A alta foi de 47%, iniciada já em janeiro de 2020, quando ele pagou R$ 22,5 mil para cumprir, num hidroavião, agenda de dois dias com pastores das igrejas do Evangelho Quadrangular e Assembleia de Deus – ele é o líder da Frente Parlamentar Evangélica da Câmara.

Cota

Deputados do Norte têm valores de cota parlamentar maiores por causa da distância de seus Estados para Brasília. A base é o preço das passagens entre as capitais – as dificuldades de travessia, impostas pelas particularidades da região, não são levadas em conta. E, apesar de mais raros, há voos de carreira entre os principais municípios.

Mas o fato de a Câmara reembolsar quem escolhe a viagem mais curta fez com que o deputado Jesus Sérgio (PDT-AC) pagasse R$ 12,6 mil para ir, em um bimotor, de Rio Branco a Tarauacá, sua cidade natal, no mês de novembro. Distante 409 km da capital do Acre, a passagem de ônibus até lá custa cerca de R$ 200, ida e volta. De carro, são seis horas de viagem.

Jesus Sérgio ainda desembolsou R$ 50 mil para custear o aluguel de quatro veículos Gol, de agosto a novembro – mais do que o suficiente para comprar o mesmo modelo zero km.

Gasolina

A desobediência em relação ao isolamento social não ocorreu só com deputados do Norte, conforme dados da Câmara. Gurgel (PSL-RJ) usou R$ 265 mil de sua cota para custos de transporte – desse total, R$ 112 mil foram empregados em locação de carros e outros R$ 20 mil em gasolina. O restante (R$ 131 mil) foi usado em passagens aéreas, apesar de o parlamentar só ter participado de sessões virtuais desde março.

Quando se analisam apenas as notas de combustível, no entanto, ninguém supera Claudio Cajado (PP-BA). O deputado gastou R$ 71 mil em 2020, quase o limite permitido, que é R$ 72 mil por ano. Com base no preço médio do litro de gasolina na Bahia, o recurso permitira ao deputado ir de Salvador a Brasília 146 vezes em um carro popular.

No geral, o recurso empenhado pela Câmara em transportes caiu 50% de 2019 para 2020, mas mesmo assim alcançou R$ 49 milhões – suficiente para atender 81 mil pessoas com auxílio emergencial de R$ 600 por um mês.