Quem é John Bolton, assessor de segurança nacional demitido por Trump
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AFP/Getty Images Bolton foi a primeira autoridade do governo americano a
apertar as mãos de Bolsonaro
Um dos principais nomes do governo de Donald Trump
foi demitido nesta terça-feira (10/9).
John Bolton, conselheiro nacional de segurança do
presidente dos EUA, deixará o governo em meio a relatos de discordância em
torno de um plano (já cancelado) de convidar o grupo radical afegão Talebã para
um encontro em solo americano.
A demissão do membro do círculo de conselheiros
próximos foi anunciada pelo próprio Trump pelo Twitter. "Informei a John
Bolton na noite passada que seus serviços não são mais necessários na Casa
Branca. Eu discordei veementemente de muitas de suas sugestões, assim como
outros no governo, e portanto pedi sua renúncia, que ele me concedeu nesta
manhã. Agradeço muito por seu trabalho. Nomearei um novo conselheiro de
segurança nacional na semana que vem", afirmou o presidente americano.
Bolton se opunha a negociações de paz
com o Talebã, grupo convidado por Trump para dialogar. O plano, abandonado no
último final de semana, foi alvo de críticas sobretudo por causa do timing:
a proximidade com o aniversário dos atentados de 11 de setembro de 2001,
realizados pela Al-Qaeda, organização extremista que o Talebã permitiu operar
no Afeganistão.
Bolton foi o terceiro conselheiro de Trump na
função, depois de Michael Flynn e HR McMaster.
Um ex-funcionário sênior do governo disse à BBC, em
condição de anonimato, que Bolton "operava separadamente em relação à Casa
Branca", sem comparecer a reuniões.
Segundo a publicação Foreign Policy, Bolton se
opunha à visita do Talebã também porque receber um grupo considerado radical
"abriria um terrível precedente", em sua opinião.
Isso alimentou uma já crescente discordância com o
secretário de Estado, Mike Pompeo, que defendia a reunião com o grupo afegão.
"Se você vai negociar a paz, tem muitas vezes
de lidar com agentes do mal", defendeu Pompeo em entrevista à rede ABC.
Bolton também chegou a ser embaixador temporário
dos EUA nas Nações Unidas (abandonou o posto quando percebeu que não teria sua
nomeação ratificada pelo Senado americano) e ocupou cargos nos últimos três
governos conduzidos por políticos republicanos, desde a gestão de Ronald Reagan
(1981-1989).
A maioria dos postos foi nos departamentos de
Justiça e de Estado (este último, o equivalente americano ao Ministério das Relações
Exteriores).
É um árduo defensor do direito ao
porte de armas por cidadãos comuns - Bolton é ligado à NRA (Associação Nacional
do Fuzil, principal grupo de lobby pró-armas dos EUA), onde comandou o
Subcomitê de Assuntos Internacionais em 2011.
No primeiro semestre de 2018, após assumir o cargo
no governo Trump, um vídeo gravado em 2013 veio à tona e ganhou manchetes nos
EUA. No filme, patrocinado pela NRA, Bolton pede que a Rússia garanta o porte
de armas em sua Constituição, como acontece nos EUA.
"Isso criaria uma parceria entre o governo
nacional russo e seus cidadãos, que poderiam proteger melhor mães, crianças e
famílias sem comprometer a integridade do Estado russo", afirmou.
Encontro com
Bolsonaro
Bolton esteve no Brasil em novembro passado para um
encontro com Jair Bolsonaro, na época presidente eleito do Brasil. Foi a
primeira autoridade americana com quem Bolsonaro se encontrou, e a portas
fechadas.
Pouco antes da visita, Bolton classificou o governo
do brasileiro como uma "oportunidade histórica".
"O encontro com o presidente eleito Bolsonaro
surgiu como resultado da ligação do presidente Trump na noite das eleições no
Brasil para parabenizar o presidente eleito. O telefonema foi realmente
excelente. Acho que criou um relacionamento pessoal, mesmo de forma remota. O
presidente Trump foi o primeiro líder estrangeiro a telefonar ao presidente
eleito Bolsonaro", afirmou.
O então assessor de segurança nacional continuou:
"Então, pensamos que seria bom e certamente muito útil para os EUA ouvirem
do presidente eleito quais são suas prioridades e o que ele está procurando no
relacionamento. Do nosso ponto de vista, vemos isso como uma oportunidade
histórica para o Brasil e os Estados Unidos trabalharem juntos em uma série de
áreas: economia, segurança e várias outras."
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Reuters Especula-se sobre a vinda de Donald Trump para a posse de Bolsonaro,
mas as chances ainda são remotas
Militarismo e
guerras
Bolton é conhecido especialmente por sua linguagem
diplomática heterodoxa: já defendeu o "fim da Coreia do Norte" e foi
chamado pelo país, em resposta, de "sanguessuga", e teceu críticas à
ONU.
"O prédio do Secretariado (da ONU) em Nova
York tem 38 andares. Se perdesse 10, não faria diferença alguma. As Nações
Unidas são uma das organizações intergovernamentais mais ineficientes em
atividade (...) Não existe isso de Nações Unidas", declarou em 1994, na
que seria por anos sua frase mais conhecida.
Mais tarde, em 1º de novembro do ano passado, outra
frase ganhou protagonismo.
"A 'troika da tirania', esse triângulo de
terror que se estende de Havana (Cuba), a Caracas (Venezuela) e a Manágua
(Nicarágua), é a causa do imenso sofrimento humano, motivo de enorme
instabilidade regional e a origem de um sórdido berço do comunismo no
hemisfério ocidental", afirmou Bolton em discurso em Miami.
"Os Estados Unidos estão ansiosos para ver
cada vértice deste triângulo cair. A troika vai desmoronar."
Os comentários mostravam a sintonia entre o
emissário do governo americano e o presidente brasileiro – que disse durante a
campanha que a ONU "não serve para nada" e constantemente critica os
governos de esquerda dos países vizinhos latino-americanos, a quem classifica
como "ditaduras corruptas e assassinas".
Bolton foi um dos principais articuladores da
invasão americana no Iraque, durante o governo de George W. Bush, sob o
argumento de que o então regime de Saddan Hussein mantinha um programa secreto
de armas de destruição em massa.
Em 2005, porém, dois anos após o ataque, um
relatório divulgado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)
desmentiu a informação.
O Irã também esteve entre os alvos preferidos do
então assessor de Trump, que defendeu bombardeios americanos contra o país
árabe em 2008 e em 2015, enquanto o então presidente Barack Obama costurava um
acordo de paz entre os dois países – desfeito neste ano por Trump.
Durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York,
Bolton ameaçou o governo do aiatolá Ali Khamenei sobre "sérias
consequências" caso o país desafiasse os EUA - aspas descritas como as
mais agressivas da diplomacia americana contra o Irã "em décadas".
A postura diplomática de Bolton fica clara em seu
livro de memórias, publicado em 2007.
Em Surrender is nota an option
(A redenção não é uma opção, em tradução livre), ele defende que organizações
multilaterais como a ONU vão além de reger relações entre países e interferem
na soberania nacional.
Ativistas de esquerda "incapazes de vencer uma
luta justa dentro do sistema de governo representativo agora buscam fóruns
internacionais para discutir suas posições", diz a publicação.


