Câmara aprova 'brecha' para aumentar valor do fundo eleitoral
Mariana Haubert e Camila Turtelli
© Gabriela Biló / Estadão O plenário da Câmara dos
Deputados, em Brasília
BRASÍLIA – O plenário da Câmara
aprovou na noite desta terça-feira, 3, projeto de lei que abre brecha para aumentar o valor do fundo eleitoral a ser usado no financiamento das campanhas
de candidatos a prefeitos e vereadores, em 2020. A votação ocorreu horas depois
de o governo admitir revisar para baixo, após constatar um erro, o valor de R$ 2,5 bilhões que havia destinado ao fundo na
proposta orçamentária enviada na sexta-feira ao Congresso.
Foram 263 votos a favor e 144 contra. Embora o
texto-base aprovado não fixe um valor para o fundo, os congressistas esperam
engordar esse caixa, mesmo com a crise fiscal enfrentada pelo País. A ideia dos
parlamentares foi deixar a quantia em aberto para definição na discussão do Orçamento.
O
projeto que passou pelo crivo da Câmara também amenizou punições, ressuscitou a
propaganda partidária no rádio e na TV e alterou regras eleitorais e
partidárias. A votação foi uma resposta ao anúncio da equipe econômica de que
corrigiria a previsão do valor que será usado para bancar campanhas em 2020.
A
estimativa do governo é de que a cifra caia para R$ 1,86 bilhão, uma redução de
27% em relação aos R$ 2,5 bilhões da proposta orçamentária enviada ao
Congresso.
Foi
depois disso que partidos do Centrão se juntaram à oposição e fecharam um
acordo para aprovar o projeto que deixa em aberto os valores para o fundo. Os
destaques, que podem alterar o texto, deverão ser votados nesta quarta-feira.
Depois disso, o texto seguirá para o Senado.
As mudanças no projeto foram articuladas pelo
deputado Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade. O
parlamentar propôs mudança na regra que define o fundo eleitoral, que hoje tem
seu valor determinado por, no mínimo, 30% das emendas de bancadas estaduais,
além da compensação fiscal de propaganda partidária na TV e rádios. O texto
aprovado também estabelece que, se um partido abrir mão do dinheiro do fundo
eleitoral, esse montante será redistribuído entre as demais legendas.
O
texto aprovado deixa indefinido o montante das emendas que irá compor o fundo –
determinado pela Lei Orçamentária Anual (LOA) –, abrindo brecha para que seja
mais do que os atuais 30%. Caberá ao relator do projeto de lei da LOA
estabelecer o valor.
O
acordo foi costurado com aval de líderes do Centrão – bloco informal que reúne
partidos como DEM, PP, PL, Republicanos (ex-PRB), Solidariedade – e também do
PT.
Uma manobra para construir um “plano B” e aumentar
o valor destinado a campanhas eleitorais já havia sido discutida antes pelos
parlamentares, sem avanços. Durante a negociação da Lei de Diretrizes
Orçamentária (LDO), o deputado Cacá Leão (PP-BA) chegou a anunciar a retirada
de um projeto de aumento do fundo, que poderia chegar a R$ 3,7 bilhões. O recuo
foi motivado pela reação das redes sociais e também por críticas do presidente Jair Bolsonaro
ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM-RJ).
No ano passado, os partidos receberam R$ 1,7 bilhão
de fundo eleitoral. O Ministério da
Economia chegou a divulgar uma previsão de R$ 2,5 bilhões para
2020 na sexta-feira, mas depois mudou os números, alertado para um erro no
cálculo pelo líder do Novo na Câmara, Marcel Van Hattem
(RS).
Líderes
partidários se reuniram ao longo do dia para fechar os últimos detalhes do novo
texto. Partidos como o PSL – sigla de Bolsonaro –, Novo e PSOL se manifestaram
contra o aumento dos gastos do fundo eleitoral. "O Novo é contra o uso do
fundo eleitoral por princípio. É um deboche essa regra", disse Van Hattem.
Despesas
Além
de afrouxar regras para as legendas, o texto aprovado prevê alterações que
podem trazer novos custos indiretos à União, como a volta do programa
partidário no rádio e na TV, extinto em 2017 para criação do fundo eleitoral. A
proposta permite, ainda, que as siglas usem o dinheiro para impulsionar
postagens na internet, previstas apenas como gastos eleitorais.
Outra
regra que pode ser flexibilizada se refere ao pagamento de advogados em defesa
de filiados. Em maio, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) endureceu as penas
impostas aos partidos no julgamento das contas anuais e proibiu que partidos
paguem a defesa de investigados.
Para
exibir as peças publicitárias dos partidos, o governo concedia benefícios
fiscais a emissoras de TV e rádio. De acordo com a lei que criou o fundo
eleitoral, esse valor da compensação fiscal seria revertido para as despesas de
campanhas.
Cálculos
Segundo
nota técnica do partido Novo, porém, o governo somou um valor errado e
considerou todo o ano de 2016, ano em que só houve propaganda dos partidos no
primeiro semestre. Como era ano eleitoral, no segundo semestre foi ao ar a
propaganda eleitoral dos candidatos. De acordo com o Ministério da Economia,
quando a Receita Federal enviou os cálculos da compensação da propaganda de televisão
os dados não estavam desagregados, o que acabou inflando o número.
Em
postagem no Twitter, na noite de sábado, Bolsonaro afirmou que o valor maior em
relação a 2018 estava previsto em lei e levava em consideração a compensação
fiscal da propaganda partidária de rádios e televisões corrigida para 2020. Ele
disse ser fake news que tenha aumentado em R$ 800 milhões o fundo eleitoral e
publicou documentos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que tratavam sobre o
cálculo do fundo.
Na prática, é a partir da proposta enviada pelo
governo que o Congresso define como serão gastos os recursos públicos no
próximo ano. Com o valor de R$ 2,5 bilhões, proposto anteriormente, o PSL de
Bolsonaro poderia receber uma quantia 26 vezes maior do que a obtida no ano
passado para custear gastos de campanhas eleitorais. Seriam R$ 251,1 milhões,
de acordo com cálculo do Estado. O PT, em segundo no ranking, seria
contemplado com um montante parecido, de R$ 251 milhões.