'Não tenho receio de depor no Congresso', diz Dallagnol
Estadao Conteudo
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ABr O procurador disse que não tem medo do que possa ser apresentado pela
imprensa no caso das mensagens reveladas pelo The Intercept
Alvo de questionamentos após a divulgação de
supostas mensagens que sugerem conluio com o ex-juiz Sérgio Moro (atual
ministro da Justiça) na Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol,
coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba, diz que
não tem medo do que possa ser apresentado. "Todos os atos da força-tarefa
são fundamentados em fatos, em provas e na lei e foram validados por diversas
instâncias da Justiça."
A seguir, trechos da entrevista:
Só a PF pode dar essa resposta. Mas houve invasão
de sistemas telefônicos e sequestro de contas de aplicativos, o que sugere o
uso de métodos sofisticados. Sabemos que muitas autoridades foram atacadas, mas
só as da Lava Jato são alvo de divulgação, o que dá pistas sobre os interesses
envolvidos.
Quem tem interesse nesse hackeamento?
O interesse é anular condenações e barrar o avanço
da investigação. A operação atingiu muitos poderosos. Poderia ser qualquer um
deles, além dos corruptos que ainda não foram alcançados pela Lava Jato.
Por que o sr. não aceitou o convite
para depor sobre o caso na Câmara? Tem algum receio?
Não tenho receio porque todos os atos da Lava Jato
estão justificados em fatos, provas e na lei e foram validados por diversas
instâncias da Justiça. O Congresso é palco de discussões relevantes, mas de
natureza política. Meu trabalho é técnico e feito perante a Justiça.
A força-tarefa não tem reconhecido as mensagens,
mas o The Intercept Brasil também divulgou um áudio e diz ter outros. Isso não
confirma a autenticidade?
É realmente possível que o criminoso tenha obtido
mensagens do aplicativo Telegram. Entretanto, isso não afasta a possibilidade
de edição ou falsificação das mensagens de texto ou áudio, o que pode ter
ocorrido até mesmo antes de o material ser entregue ao site, que não o submeteu
a nenhuma autoridade para verificação.
O que é verdade ou mentira nessas
mensagens?
Não temos as mensagens originais para comparar.
Antes da divulgação do hackeamento, encerramos as contas no aplicativo para
proteger investigações em andamento e nossa segurança. Isso apagou as mensagens
nos celulares e na nuvem. É impossível lembrar detalhes de milhares de
mensagens trocadas ao longo de anos. A mudança de uma palavra, a inserção de um
"não" ou a abstração de contextos podem mudar significados. E o que
temos visto são indícios de edição e evidências de que supostas mensagens, na
forma como são apresentadas, contrastam com a realidade.
Reportagem da revista Veja mostra
supostos diálogos em que o sr. teria enviado versão inacabada de denúncia a
Moro. Reconhece este diálogo?
Apresentamos aos juízes e aos tribunais análises e
argumentos, em reuniões e por escrito, sempre que necessário para defender o
interesse público. Mas jamais existiu prática de antecipar peças em elaboração.
O ex-juiz orientou a Procuradoria a publicar uma
nota oficial criticando a defesa de Lula?
Não tenho como comentar diálogos que não tiveram o
contexto e a veracidade comprovados. O interesse do MP não é condenar, mas buscar
a Justiça, o que implica a absolvição dos inocentes. Não fazemos notas contra
ou a favor de pessoas.
Há outro caso em que o ex-juiz teria
orientado a incluir um dado de depósito bancário em uma denúncia, antes de ser
recebida. Ele orientava os procuradores?
Ainda que essa mensagem fosse verdadeira, ela não
mostra atuação enviesada. Na falta de manifestação do MP sobre o tal depósito,
o juiz poderia ter despachado nos autos, questionando o órgão sobre o eventual
arquivamento implícito do fato. Ou poderia suscitar o aditamento da denúncia,
como permite o Código de Processo Penal no artigo 384. Sobre o caso em questão,
o juiz absolveu os réus em relação ao depósito.
Mensagem atribuída a Moro expõe
suposta preocupação em não "melindrar" o ex-presidente Fernando Henrique
com a abertura de investigação, pois ele seria "um aliado
importante". O sr. se recorda desse episódio?
Se buscássemos aliados, seriam importantes Lula,
Eduardo Cunha e Sérgio Cabral, políticos influentes, mas que foram condenados e
presos. Os fatos deixam claro que influência, dinheiro e poder jamais foram
critérios para aferir responsabilidade na Lava Jato.
Como vê as críticas do ministro Gilmar
Mendes, do Supremo, à atuação do MPF na Lava Jato?
Prefiro não comentar ataques e grosserias de
autoridades contra a Operação Lava Jato.
Como avalia a acusação de que havia o
objetivo deliberado de tirar Lula do cenário político?
Essa é uma teoria dos que querem forçar anulações.
A Lava Jato não se resume a um ou outro caso. São centenas de casos que atingiram
todo o espectro ideológico. Só na força-tarefa de Curitiba já passaram 19
procuradores e mais de 30 servidores. A equipe inclui eleitores do PT. Os atos
judiciais são revisados por três instâncias. A teoria da conspiração não se
verifica.
O que o levou a fechar a denúncia
contra o ex-presidente?
O mesmo motivo que embasou denúncias contra outros
réus: a existência de provas de um crime e de sua autoria. Ninguém tem prazer
em acusar alguém ou ao constatar tanta corrupção no País, ainda mais quando
praticada por quem deveria dar o bom exemplo.
Tem medo do teor de novas mensagens?
Não. O que receio é de que a luta contra a
corrupção pare.