Sem
manutenção, infraestrutura do País é corroída pelo tempo
Segundo dados do economista Cláudio Frischtak, estoque
de tudo que já foi investido no País caiu de 60% para 36% do PIB
Renée Pereira, O Estado de S.Paulo
Durante anos, o trecho
ferroviário entre Santos e Cajati, no Vale do Ribeira, foi usado
como importante corredor para o transporte de carga e de passageiros. Com o
decorrer dos anos, a falta de manutenção – e a desativação do ramal – devastou
os trilhos. O mato tomou conta da ferrovia, os dormentes apodreceram e os
vagões abandonados estão sendo corroído pela ferrugem. Na BR-010, no Pará, o
cenário é semelhante, com a diferença de que a estrada está em operação.
Crateras no acostamento e a má qualidade do pavimento ameaçam a vida dos motoristas
que passam por ali – resultado da falta de manutenção da rodovia.
Os
dois exemplos são prática comum Brasil afora. Nos últimos anos, o País não só
tem investido menos que o necessário para expandir a infraestrutura como não
consegue manter os ativos existentes. O resultado é a deterioração de rodovias,
ferrovias, pontes, viadutos, sistema de transporte urbano e saneamento básico.
Antes: rodovia BR- 010 em 2015 Foto: CNT - 8/7/2015
Estudo do economista, Claudio Frischtak, presidente
da consultoria InterB, mostra que o estoque de tudo que já foi investido em
infraestrutura despencou de quase 60% do Produto Interno Bruto (PIB) na década de 80 para 36,3% no
ano passado. Na prática, esses números indicam que os ativos estão se
deteriorando com o baixo volume de investimentos
e perdendo valor.
Segundo
o trabalho, parte significativa da infraestrutura brasileira tem entre 30 e 40
anos e baixo nível de manutenção, o que se traduz em perdas de eficiência,
elevado custo de operação e risco de integridade física. O razoável, diz
Frischtak, seria o País alcançar a marca de 60% do PIB em estoque de
infraestrutura. Em países com economia mais madura o porcentual varia entre 65%
e 85% do PIB.
Depois: dois anos sem investimento adequado, rodovia
põe motoristas em risco Foto: CNT - 19/7/2017
Saneamento
“Não
estamos falando em investir para chegar ao nível de Japão e Finlândia. Estamos
falando em investir na cobertura de serviços básicos como água e esgoto”, diz o
economista. Pelos dados de Frischtak, entre 2001 e 2017, o Brasil investiu, em
média, 0,18% do PIB em saneamento enquanto o ideal seria 0,45% ao ano. Esse
hiato de investimento se reflete em números alarmantes: atualmente, 100 milhões
de brasileiros não têm acesso a rede de esgoto e 35 milhões não são abastecidos
com água potável. “Há uma carência muito grande de investimentos e ainda assim
não vemos nada muito significativo sendo feito. É muito preocupante”, diz
Marina Aidar, advogada do escritório Vieira Resende.
Além
de a expansão desses serviços serem lentos, a estrutura atual não recebe manutenção
adequada. Um pesquisa recente do Instituto Trata Brasil mostra que 38,3% de
toda água potável, tratada e pronta para ser distribuída, se perde pelo caminho
especialmente por causa de vazamentos e dos chamados “gatos”. “Com a falta de
investimentos, o sistema envelhece e o volume de vazamento aumenta”, afirma o
sócio da GO Associados Pedro Scazufca, consultor técnico do estudo.
Rodovias Esquecidas. No setor de transporte, a
situação segue o mesmo caminho. Entre 2001 e 2017, segundo Frischtak, o investimento
médio foi de 0,67% do PIB por ano enquanto o ideal seria 2%. A pior situação é
verificada nas estradas, cuja qualidade vem se deteriorando nos últimos anos
por causa dos baixos investimentos. Um levantamento feito pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), com os 15
piores trechos rodoviários, exemplifica bem essa realidade.
Intitulado
“Rodovias Esquecidas do Brasil”, o trabalho mostra que, nessas estradas, o
investimento médio por quilômetro equivale a R$ 66,51 mil por ano enquanto a
média nacional é de R$ 144,27 mil. O pior resultado foi verificado na ligação
Marabá – Dom Eliseu, no Pará. Essa ligação obteve a menor parcela dos investimentos,
de apenas R$ 32,19 milhões nos 14 anos considerados, entre 2004 e 2017.
“Essas
rodovias recebem menos recursos que o mínimo previsto para fazer a manutenção.
Por isso, não conseguem ter melhora na sua qualidade”, afirma o diretor
executivo da CNT, Bruno Batista. Segundo ele, um dos principais problema é que
os governos se preocupam mais em construir do que em manter os ativos. “A
questão é que o investimento feito no passado está se deteriorando. Pior: a
despesa gerada pela infraestrutura ruim já é maior que o investimento feito nas
estradas.”
Ele se refere ao custo hospitalares e a sobrecarga
na Previdência com os acidentes rodoviários. Em 2017, destaca o executivo, o
Brasil investiu R$ 7,9 bilhões nas rodovias federais. O custo com os acidentes
foi de R$ 11 bilhões. “Não é uma lógica muito inteligente.”
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