De meio bilhão
de reais em multas após tragédia, nada foi pago pela Vale
Simon Nascimento
Tragédia completou um mês nesta segunda-feira (25)
Passado um mês do
rompimento da barragem em Brumadinho, na Grande BH, nenhum centavo dos R$ 507
milhões em multas foi pago pela Vale. As atuações foram aplicadas por
diferentes órgãos públicos devido aos estragos provocados pelos rejeitos de
minério. Há punições por descumprimento de medidas ambientais, riscos à saúde,
contaminação de cursos d’água e destruição de áreas urbanas e rurais.
A chance de recorrer
na Justiça é apontada como o principal motivo para a demora. O infrator tem até
30 dias para contestar a sanção e, mesmo após um possível indeferimento, novas
contestações podem ser feitas nos tribunais. A estimativa de especialistas é
que a lentidão se prolongue até mesmo “por anos”.
Além do meio bilhão
de reais imposto após o desastre, a empresa deve ao governo de Minas R$ 297,4
mil por falhas detectadas desde 2011 justamente na mina do Córrego do Feijão.
Conforme a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
(Semad), a Vale foi multada sete vezes nos últimos oito anos por não apresentar
relatórios ambientais sobre a operação do complexo e ignorar ações previstas.
Já as punições
aplicadas pela Semad após a tragédia somam R$ 99 milhões. Segundo a secretaria,
a mineradora recorreu. Ainda conforme a pasta, “a empresa informou que pagará o
valor à vista”, durante audiência ocorrida na 6ª Vara da Fazenda Pública e
Autarquias de BH.
Maior
O órgão que anotou a
maior infração é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama). Foram cinco penalidades, totalizando R$ 250
milhões. Segundo o Ibama, a multa ainda está no prazo para a homologação de
recurso.
Professora de
direito ambiental nas Faculdades Promove, em BH, Juliana Barros Pereira explica
que os recursos impetrados pela Vale podem perdurar anos, como é o caso das
multas registradas desde 2011. “É uma empresa que exerce influência política e
econômica no país. A constituição diz que o recurso tem de ser julgado em prazo
razoável pelo judiciário, mas não é o que acontece”.
Outras multas
As prefeituras de
Brumadinho e Juatuba também aguardam a quitação de débitos. Na cidade onde
ocorreu a tragédia o valor imposto é de R$ 100 milhões devido aos impactos
causados. “Deram previsão para pagar o Estado, mas não ao município mais
afetado. Estamos devendo fornecedores e o desemprego aumentou com a paralisação
da mineração. Já estávamos em crise e agora piorou”, disse o prefeito da
cidade, Avimar de Melo Barcelos.
Em Juatuba, também
na região metropolitana, a sanção de R$ 50 milhões foi feita sob a
justificativa de contaminação do rio Paraopeba, o que impossibilitou o uso da
água na produção rural.
“Ainda não recebemos
e vamos entrar na Justiça para reter diretamente das contas da Vale”, informou
Heleno Maia, presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental
(Codema), vinculado à prefeitura de Juatuba.
Justiça
Diretor do Foro de
BH, o juiz Christyano Lucas Generoso explica que a morosidade está ligada aos
trâmites legais. Ele ressalta que as penalidades podem ser questionadas
administrativa e judicialmente, tanto pelo valor quanto pelo cálculo usado para
definir os valores. “Isso sem falar que a Vale pode querer judicializar o
problema, o que aumentaria ainda mais esses prazos”, avalia. “Judicialmente, o
Tribunal de Justiça (TJMG) já criou um grupo para monitorar processos, como as
perícias, e a buscar mais agilidade”, garante o magistrado.
A Vale pode ter que
pagar um valor ainda maior em multas. O Ministério Público de Minas Gerais
estabeleceu punição de R$ 1 milhão, ao dia, até que a empresa apresentasse
medidas de segurança e estabilidade de oito barragens da mineradora com alto
risco de rompimento no Estado. A reportagem questionou o MP sobre o valor
atualizado do débito, mas não houve retorno.
A Vale foi
procurada, mas não se manifestou até o fechamento desta edição. Por meio da
assessoria de imprensa, foi dito que uma resposta seria dada após o meio-dia de
hoje, o que não ocorreu.
(Colaborou Raul
Mariano)
Foi negado pelo
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) o pedido feito pela Vale para
retomar atividades nas barragens cuja estruturas não foram consideradas
seguras. Conforme nota divulgada pelo Ministério Público de Minas Gerais
(MPMG), a mineradora recorreu da decisão oriunda da Ação Civil Pública (ACP)
proposta pela promotoria, que determinou a paralisação das atividades e do
lançamento de rejeitos nas estruturas em situação de risco, além de estipular a
adoção de medidas cautelares, como contratação de novas auditorias externas
independentes para avaliar as barragens.
Ainda de acordo com
o MPMG, a decisão ressalta a necessidade de esclarecimento da situação de cada
uma das barragens tratadas na ACP. "Resulta imprescindível que auditorias
externas e confiáveis sejam realizadas antes da retomada da exploração de
minério pela agravante", disse a decisão da Justiça.
Já sobre o argumento
da Vale de que a decisão lhe traria prejuízos financeiros, o relator do
processo afirmou que “está convicto de que, por ora, eventuais prejuízos
financeiros são preferíveis a novas tragédias”.
Por fim, a decisão
esclarece que as auditorias devem ser realizadas em todas as estruturas,
independentemente do método de construção da barragem, e que os relatórios e
planos de ação devem ser elaborados com urgência.
A ACP
O Ação proposta pelo
MPMG tinha como objetivo a garantia das condições de segurança e estabilidade
das seguintes barragens da Vale: Laranjeiras; Menezes II; Capitão do
Mato; Dique B; Taquaras; Forquilha I; Forquilha II e Forquilha III.
"A ação foi
proposta com base em documentos obtidos pelo MPMG em razão de requisição à
Vale. Os documentos fornecidos pela empresa noticiam que as estruturas acima
mencionadas – bem como a Barragem I e IV-A que ficavam em Brumadinho - estão em
zona de Atenção (ALARP ZONE) e que essa informação era do conhecimento da
empresa desde outubro de 2018", disse o órgão no início de fevereiro.
Todas as oito
barragens que fazem parte da ACP estão localizadas nas proximidades de núcleos
urbanos, com pessoas morando ou transitando na zona de autossalvamento - região
onde o tempo de chegada da onda de rejeitos é de até 30 minutos ou 10 km de
distância.
Subiu para 179 o
número de óbitos identificados em decorrência do rompimento da barragem da Mina
do Feijão, administrada pela Vale, em Brumadinho, na Grande BH. Trinta dias
após a tragédia varrer parte do município, 131 pessoas ainda estão desaparecidas
e 185 estão desabrigadas. Os números foram apresentados pela Defesa Civil na
tarde desta segunda-feira (23), durante uma coletiva de imprensa.
Segundo o capitão
Junior Silvano, diretor de Resposta à Desastres da Defesa Civil Estadual, na
semana passada, foi encaminhada para a Secretaria Nacional de Defesa Civil um
processo para determinar situação de calamidade pública no município. "É
condição para que a Caixa Econômica Federal faça a liberação do FGTS aos
atingidos pelo rompimento", disse. A princípio, esse pedido foi só para
Brumadinho e não para outras cidades que tiveram barragens com risco de
rompimento nas últimas semanas.
O capitão ainda
comunicou que moradores de cerca de 40 comunidades, que tiveram o acesso à
cidade prejudicado após o mar de lama invadir parte do município, terão um novo
acesso provisório a outras localidades de Brumadinho. A estrada, que deverá ser
entregue nos próximos dias, vai substituir, temporariamente, a ponte que estava
com previsão de ser entregue no dia 1º de março. O atraso ocorreu, segundo
capitão Junior, por conta das chuvas.
"Já tivemos
retorno, e o acesso está construído. Mas, encontramos situações de risco no
local. Colocamos como condições que a empresa faça a retirada de caminhões,
sinalize o local e instale iluminação noturna para que as pessoas passem de
forma segura", acrescentou o capitão, que deverá ir até o local nesta
terça-feira (26) para apurar a situação.
Outras cidades
Ainda no
pronunciamento, o capitão atualizou os números de desabrigados de outras
cidades que passaram pelo temor de um novo rompimento de barragem. Segundo ele,
cerca de mil pessoas tiveram que deixar suas casas, além de Brumadinho, em Nova
Lima, Itatiaiuçu e Barão de Cocais. "Em Nova Lima, 70 pessoas foram
evacuadas. No distrito de Macacos, 317. Em Itatiaiuçu, 206 deixaram suas casas
e 450 em Barão de Cocais", enumerou. Já em Brumadinho, o número da Defesa
Civil municipal mostra que 185 estão nessa condição.