Começou
domingo passado conferência sobre mudanças climáticas na Polônia
Agência Brasil
A cidade de
Katowice, na Polônia, abre neste domingo (2) a Conferência das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 24). Sob o clima gelado do inverno
polonês, a ONU começa as negociações com a expectativa de que os 196
países-membros possam fazer um plano de ação e mostrem como vão implementar o
chamado Acordo de Paris, firmado em 2015 pelas nações com o objetivo de conter
as emissões de gases de efeito estufa e manter o aumento da temperatura global
abaixo de 2º, se possível em até 1,5º.
O objetivo da
Conferência da ONU este ano é aprofundar a questão dos financiamentos de ações
climáticas, considerando a meta de doação de pelo menos US$ 100 bilhões por ano
de países desenvolvidos para as nações de menor renda. A organização também
pretende estimular que os países desenvolvam planos para dar início ao
cumprimento das metas a partir de 2020, prazo determinado pelo Acordo de Paris.
Entre as ações que
devem ser promovidas está a proteção de florestas e outros ecossistemas que têm
a capacidade de absorver gases causadores do efeito estufa, além do
fortalecimento de ações de adaptação e de redução da vulnerabilidade aos
efeitos das mudanças climáticas.
Durante a
conferência, que será encerrada em 14 de dezembro, a pequena cidade de
Katowice, que tem aproximadamente 300 mil habitantes, deve receber cerca de 11
mil delegados de vários países. A cidade tem mais de 150 anos e
tradicionalmente é associada à exploração de carvão e à indústria pesada.
Nos últimos anos, a
área de mineração de carvão, principal base energética da Polônia, foi
revitalizada na cidade, que tem se tornado referência por adotar novas
tecnologias, modernizar o setor de negócios e atrair investimentos
sustentáveis. Katowice tem se destacado nos esforços de minimizar os efeitos da
degradação ambiental e diminuir a poluição do ar, considerado um dos grandes problemas
ambientais da Polônia.
Participação
brasileira
A delegação do
governo brasileiro, representada por membros do Itamaraty e do Ministério do
Meio Ambiente, entre outros órgãos do governo federal, da academia e da
sociedade civil, está mais enxuta este ano. O grupo vai se debruçar nas
próximas duas semanas em mais de 190 itens da agenda da COP da Polônia.
Segundo o secretário
de Mudança do Clima e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Thiago Mendes,
o Brasil deve se destacar no chamado Diálogo de Talanoa, momento em que os
países compartilham diferentes experiências e esforços empreendidos para contenção
das emissões de gás carbônico. O secretário explicou que no Brasil foram
realizadas sete rodadas deste tipo de Diálogo, nas quais foram encontradas 130
iniciativas que promovem baixas emissões de CO2 do setor privado e da sociedade
civil, em todas as regiões do país.
Deste total, o MMA
escolheu 42 projetos que serão apresentados pelo ministro do Meio Ambiente,
Edson Duarte, no final do Dialogo de Talanoa global, durante a COP 24. “Isso
foi muito inovador, porque a gente não viu nenhum país trabalhando nessa mesma
linha, com o número de casos tão vastos e tão diverso”, comenta Mendes, que
também é especialista em Relações Internacionais.
“O que a sociedade
brasileira está nos indicando que é a favor do desenvolvimento sustentável e já
tem feito uma série de atividades para ao avanço dessa agenda de movimentos
resilientes com baixas emissões de CO2. Tem casos de sucesso muito fortes,
desde construção vinculada a biocombustíveis, organização de comunidades para
reflorestamento, geração de energia eólica e fotovoltaica”, completa Mendes.
O secretário disse
também que o Brasil apresentará “dados sólidos” de redução do desmatamento nos
últimos dez anos. Uma das metas assumidas pelo Brasil é reduzir a área
desmatada na Amazônia a menos de 3,9 mil km² até 2020.
“Mesmo tendo
variações que sobem e descem, essas variações são muito pequenas em relação ao
montante total da redução. Caímos mais de 20 mil km² para cerca de 7,9 mil km².
Tudo bem que a de 2018 é a maior dos últimos 10 anos, mas durante a última
década, estamos 72% abaixo do que era em 2004”, afirmou.
Metas
O
coordenador-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Alfredo
Sirkis, avalia que o Brasil ainda tem condições técnicas de cumprir as metas a
partir de 2020. Apesar das discrepâncias entre algumas metas nacionais com as
firmadas em âmbito internacional, o Brasil pode chegar a uma redução da emissão
de carbono a 1,2 gigatoneladas em 2030, segundo estudo do Fórum.
O pesquisador
ressalta que as medidas em curso na área florestal, na agricultura, no sistema
de transportes e na indústria para contenção do aumento da temperatura não
prejudicam o desenvolvimento econômico e social. A busca da redução nas
emissões também pode atrair investimentos para o país, segundo projeções dos
especialistas.
“Por exemplo, na
área de agricultura, as medidas de baixo carbono são todas muito boas para
negócios, fazem muito sentido do ponto de vista empresarial. A redução do
desmatamento é fundamental, porque garante o clima que permite a agricultura
continuar crescendo sem grandes problemas. Muitos agricultores já perceberam
claramente que o desmatamento é muito ameaçador pra eles. Por outro lado, do
ponto de vista da indústria, dos transportes, optar por biocombustíveis, onde o
Brasil tem uma vantagem competitiva, e mesmo acelerar a eletrificação dos
veículos, são coisas positivas do ponto de vista econômico”, explica.
Discussões
Durante a COP 24, os
delegados esperam que sejam discutidas estratégias concretas de longo prazo que
devem ser adotadas pelos países para descarbonizar suas atividades econômicas.
Sirkis acredita, no entanto, que este ano não sairá uma grande decisão das
rodadas de negociação de alto nível, como ocorreu nas conferências de Paris
(2015) ou de Copenhage (2009).
O pesquisador
comenta que, devido a alguns fatores negativos do contexto mundial no momento,
a COP da Polônia terá uma importância de natureza política. Ele cita que
poderão ter certo peso durante as discussões o anúncio feito pelo presidente
norte-americano, Donald Trump, de tirar os Estados Unidos do Acordo de Paris,
além dos acenos similares do futuro governo brasileiro. Resultados dos últimos
relatórios da comunidade científica apontam que os países devem triplicar os
esforços de descarbonização de suas economias para atingir as metas de contenção
do aquecimento extremo do clima.
“Até um tempo atrás
se julgava que iríamos chegar até 2050 com reduções de cerca de 60%, 70% das
emissões, comparado com 1990, que é um ano base que a União Europeia usa. E
hoje se chega à conclusão de que é necessário zerar as emissões líquidas em
algum ponto entre 2050 e 2060, isso pra poder realmente garantir o cenário de 2
graus e uma chance pra termos o cenário de 1,5 grau”, comenta.
O pesquisador
ressalta que ainda assim o evento é importante para chamar a atenção do mundo
para o problema do aquecimento da temperatura. “A COP é um momento de atenção
mundial sobre o que está acontecendo com o clima, um momento de mobilização da
mídia e da opinião pública em nível internacional. Nesse sentido, a COP é
sempre importante porque é quando que você faz o balanço de tudo o que ocorreu
e como você vê o futuro”.
Preocupação
Para o ambientalista, o Brasil terá uma participação mais tímida este ano,
devido ao cenário político interno e à retirada da candidatura do país para sediar
a COP 25 no ano que vem. Ele avalia que o Brasil poderá perder o papel de
articulador que construiu ao longo dos últimos anos e que a delegação
brasileira estará em situação difícil pela primeira vez na história, desde
1992, quando sediou a Rio 92
“A delegação
brasileira vai estar profundamente constrangida e inibida com a situação. E o
Brasil que sempre foi vanguarda nos processos negociadores, sempre teve um
grande papel de articulação dos outros países, possivelmente será o mais
discreto possível”, avalia.
Na opinião de
Sirkis, o Brasil tinha condições financeiras de realizar a COP e poderia
recuperar grande parte das despesas pela movimentação turística de 30 mil
pessoas que participariam do evento no país. “Ou seja, não havia uma equação
econômica que justificasse a não realização da COP. O problema foi
essencialmente de natureza política”, opinou.
Para o secretário de
Mudança do Clima do MMA, Thiago Mendes, o Brasil tem ainda condições de manter
sua influência. Contudo, ele reconhece que há uma preocupação sobre o impacto
de intenções de não cumprimento do Acordo de Paris possa ter sobre outros
países, principalmente desenvolvidos.
“Eu não acredito que
nossa participação vá ser alterada, porque historicamente o Brasil sempre teve
uma delegação com um nível de qualificação muito forte e alto. Isso não mudou.
O que há é uma ausência de liderança dos países desenvolvidos. Com o
posicionamento da administração Trump, você tem uma sinalização para outros
países desenvolvidos seguirem o mesmo caminho [de sair do Acordo de Paris]”,
diz.
Compromissos
O secretário do MMA
reforça que percebeu uma baixa adesão de países desenvolvidos aos compromissos
e esforços de redução das emissões. Mendes espera que durante a Conferência os
países assumam compromissos mais fortes para que os países em desenvolvimento
também tenham condições de fortalecer suas ações.
“A gente está
percebendo é que os países desenvolvidos não estão cumprindo com as regras que
estão debaixo da convenção. Isso gera um desconforto muito grande, porque eles
não estão cumprindo nem suas metas de redução de carbono, nem as metas de
apresentação de doações financeiras. A nossa preocupação é que isso possa gerar
uma falta de ambição na construção das regras de Paris”.
Para Sirkis, as
discussões em torno das mudanças climáticas devem focar na realidade e nas
informações que têm sido divulgadas por importantes estudos da área climática.
Ele considera preocupantes os posicionamentos que menosprezam os esforços dos
cientistas e que avaliam suas projeções como alarmistas.
“Eu acho que é
urgente desideologizar essa discussão da questão climática. E remover coisas
que são absolutas fantasias. Essa história, por exemplo, de que o acordo de
Paris em alguma coisa ameaça a nossa soberania, é totalmente descabida. O
acordo de Paris foi muito cioso em levar em consideração a soberania de todos
os países, tanto que as metas apresentadas são voluntárias”, avalia Sirkis.