Por que o encontro entre
Trump e Putin importa
14/07/201804h00 – UOL NOTÍCIAS
Em novembro de 2017,
Trump e Putin se reuniram no encontro de líderes de Ásia e Pacífico
Na segunda-feira (16), os líderes dos Estados Unidos e da Rússia se
encontram em Helsinque, capital da Finlândia. A cúpula entre Donald Trump e
Vladimir Putin chama a atenção não só pelo fato de serem dois países
historicamente rivais, mas também porque as relações entre eles ficaram ainda
mais intricadas desde que Trump assumiu a Presidência, em 2017.
A anexação da Crimeia, a guerra no leste da Ucrânia, a intervenção
militar russa na Síria, a investigação sobre a interferência do Kremlin nas
eleições que colocaram Trump na Casa Branca, as sanções e as expulsões
recíprocas de diplomatas são alguns dos problemas que abalaram as relações
bilaterais. Contudo, Trump e Putin tendem a adotar uma retórica amistosa.
Entre as declarações contraditórias feitas por ambos os líderes, é
difícil distinguir em que pé de aproximação os dois países se encontram. Neste
cenário, entenda por que a cúpula é importante e no que ficar de olho:
Encontro acontece em
Helsinque
A cidade já foi escolhida como sede de cúpulas similares à desta
segunda-feira, como a realizada entre os presidentes George H. W. Bush e
Mikhail Gorbachov, em 1990, e entre Bill Clinton e Boris Yeltsin, em 1997.
Bush e Gorbachov discutiram a situação no Kuwait após a
invasão do Iraque e a chegada de tropas americanas ao conflito. Clinton
e Yelstin se encontram para debater a ampliação da Organização do
Tratado do Atlântico Norte (Otan) para o Leste Europeu e para os países
bálticos que fizeram parte da União Soviética.
A tradição da Finlândia como local de reuniões de missões de paz,
desarmamento e segurança tem também exemplos mais próximos. Neste ano,
representantes das duas Coreias e dos EUA iniciaram em Vaanta, sul do
país, uma rodada de negociações não oficiais para reduzir as tensões
diplomáticas entre Kim Jong-un e Trump.
20.mar.1997 - O
então presidente russo, Boris Yeltsin, com o norte-americano Bill Clinton, em
Helsinque
Discurso conciliador
x sanções
Trump, no geral, adota uma retórica amistosa em relação ao presidente
russo. Em contrapartida, Washington adota uma política linha dura para a
Rússia.
"Se você está em Moscou tentando desvendar a política dos EUA sobre
a Rússia, não é uma tarefa fácil", disse à Agência Efe o ex-diplomata
americano Steven Pifer, um especialista em Rússia que trabalha no centro
de estudos Brookings.
"Não está claro se Trump concorda com tudo isso. A reticência do
presidente em criticar Putin, quando muitas ações russas do último ano e meio
merecem ser criticadas, é algo muito desconcertante e muito difícil de entender",
explica o ex-diplomata.
Desde a campanha eleitoral, Trump elogiou Putin várias vezes e
minimizou a possibilidade de a Rússia ter interferido nas eleições de 2016 para
ajudá-lo a vencer, até o ponto de desafiar as conclusões das agências de
inteligência americanas.
Por trás das declarações do presidente norte-americano, no
entanto, seu governo manteve pulso firme em relação à Rússia, algo que
começou nos últimos anos do mandato de Barack Obama. A gestão
Trump inclusive "foi além", como na sua "decisão de
proporcionar ajuda militar letal à Ucrânia", algo que o ex-presidente não
fez por "cautela", lembrou Pifer.
Em abril, a Casa Branca tomou sua ação mais dura até agora ao sancionar
sete oligarcas e 17 funcionários russos, entre eles o genro de Putin. Mas Trump
suspendeu nesse mesmo mês outra rodada de sanções relacionadas com a Síria que
a embaixadora americana na ONU, Nikki Haley, tinha anunciado um dia antes.
Nos últimos anos de
seu mandato, Obama adotou uma postura linha dura em relação à Rússia
Embora a Casa Branca tenha reagido ao suposto ataque contra o ex-espião
russo Sergei Skripal com a expulsão dos EUA de 60 funcionários
do governo russo, Trump ficou furioso quando foi informado que a resposta de
seu governo tinha sido muito mais agressiva que a dos países europeus.
"Estes incidentes traçam um perfil preocupante de um presidente
fora de sintonia com o próprio governo, às vésperas de uma cúpula com Putin
cujos objetivos não estão claros", escreveu o analista Brian O'Toole,
do Atlantic Council.
Ingerência nas
eleições
Trump prometeu abordar esse tema em Helsinque, mas não parece ter
planos de estender demais a conversa se Putin negar qualquer ingerência, como
fez nas duas reuniões prévias entre ambos, em julho de 2017, na Alemanha, e em
novembro do mesmo ano, no Vietnã.
"Pode ser que (Putin) negue. Tudo o que posso dizer é 'você fez
isso?' e 'não faça outra vez', mas pode ser que negue", disse Trump em
entrevista coletiva na quinta-feira (12), em Bruxelas.
As agências de inteligência americanas temem uma possível interferência
russa nas eleições legislativas de novembro nos EUA, mas Trump não esclareceu
se também tem essa inquietação.
"O presidente fala sobre este assunto à sua maneira", defendeu
na semana passada o embaixador americano em Moscou, Jon Huntsman.
O incômodo de Trump nesse âmbito parece se dever à sua frustração com a
investigação do procurador especial Robert Mueller sobre a ingerência eleitoral
russa, que continua aberta e que o presidente considera uma "caça às
bruxas" contra ele.
Rod Rosenstein (centro), vice-secretário de Justiça
e procurador-geral adjunto dos EUA, denuncia 12 agentes de inteligência da
Rússia
Crimeia e retorno da
Rússia ao G7
Apesar das controvérsias, Trump defendeu em mais de um discurso o
retorno da Rússia ao fórum do qual foi expulsa em 2014, após a anexação do
território ucraniano da Crimeia.
Alguns observadores temem que Trump mude a posição oficial dos EUA
em relação à Crimeia, já que, durante a cúpula do G7, em junho, o presidente
americano teria dito que a península deveria continuar nas mãos de Moscou,
porque lá todos falam russo.
"O que acontecerá a partir de agora com a Crimeia? Não posso
dizer", afirmou na quinta Trump, que reiterou que a culpa de a Rússia ter
invadido o território foi do seu antecessor, Barack Obama.
Esta possibilidade é levantada por alguns veículos da imprensa russa,
como o site Gazeta.ru, que apontou que a Crimeia é um tema em aberto
para o presidente americano.
Para o historiador e analista político russo ValerySolovey, os dois
líderes não farão concessões em Helsinque, especialmente no que se refere
ao caso da Ucrânia.
"É evidente que não haverá reconhecimento da reunificação com a
Crimeia e que as sanções contra a Rússia não serão suspensas",
disse Solovey ao jornal Moskovski Komsomolets.
O historiador prevê que sairá de Helsinque um resultado
similar ao da cúpula entre Trump e o líder da Coreia do Norte,
Kim Jong-un. "Foi um encontro transcendental, mas quase nada mudou
depois dele", ressaltou.
Em 12 de junho, um
encontro histórico reuniu Donald Trump e Kim Jong-un, porém sem resultados
concretos
Síria
Putin precisa chegar a algum tipo de acordo com Trump, para pelo menos
conter a degradação das relações bilaterais. A imprensa russa sugere que a
Síria pode ser o ambiente propício para um pacto, levando em consideração
as declarações de Trump sobre seu desejo de retirar as tropas americanas no
país.
O presidente dos EUA poderia se apresentar para a opinião pública como
um paladino da paz, enquanto Putin seria o vencedor de uma batalha geopolítica,
embora as ambições russas na Síria ainda sejam restringidas pela presença de
Irã, Turquia e Arábia Saudita.
De qualquer forma, a imprevisibilidade de Trump é um fator que poderia
jogar por terra todas as previsões sobre a cúpula de Helsinque.