Mulheres são
minoria nas ciências, diz pesquisadora da Unesco
Agência Brasil
Casal Curie
As mulheres são
cerca de metade da população mundial, mas quando se trata de representação em
ciência, tecnologia, engenharia e matemática, elas estão em número bem menor.
Atualmente, 28% dos pesquisadores de todo o mundo são mulheres. Elas também têm
menos reconhecimento - apenas 17 receberam o Prêmio Nobel de Física, Química ou
Medicina desde Marie Curie, em 1903, em comparação a 572 homens.
O estudo Decifrar o código: educação de meninas e mulheres em ciências, tecnologia, engenharia e matemática - áreas que juntas são representadas em inglês pela sigla STEM -,da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), mostra que as diferenças entre meninos e meninas nada têm a ver com a capacidade intelectual de cada gênero. São construções sociais que começam desde cedo e são reforçadas na família e na escola que afastam as meninas dessas áreas.
A reportagem conversou com a autora do estudo, a especialista da Seção de Educação para a Inclusão e Igualdade de Gênero da Unesco Theophania Chavatzia.
Segundo ela, se continuarmos “excluindo metade da população, isso significa que metade da produção e metade potencial não serão aproveitadas no futuro. Reconhecemos, cada vez mais, a importância de STEM, da ciência e tecnologia para os avanços e para as soluções dos problemas da nossa era”, diz.
O estudo Decifrar o código: educação de meninas e mulheres em ciências, tecnologia, engenharia e matemática - áreas que juntas são representadas em inglês pela sigla STEM -,da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), mostra que as diferenças entre meninos e meninas nada têm a ver com a capacidade intelectual de cada gênero. São construções sociais que começam desde cedo e são reforçadas na família e na escola que afastam as meninas dessas áreas.
A reportagem conversou com a autora do estudo, a especialista da Seção de Educação para a Inclusão e Igualdade de Gênero da Unesco Theophania Chavatzia.
Segundo ela, se continuarmos “excluindo metade da população, isso significa que metade da produção e metade potencial não serão aproveitadas no futuro. Reconhecemos, cada vez mais, a importância de STEM, da ciência e tecnologia para os avanços e para as soluções dos problemas da nossa era”, diz.
Os dados
apresentados no estudo mostram ainda que, desde cedo, as meninas são afastadas
dessas áreas. No Brasil, resultados do Terceiro Estudo Regional
Comparativo e Explicativo (Terce), realizado pelo Laboratório Latino-americano
de Avaliação da Qualidade da Educação, revelam que no 4º ano do ensino
fundamental as meninas têm desempenho melhor que os meninos em matemática, com
uma diferença de pouco menos de 15 pontos. No 7º ano do ensino fundamental, o
cenário é invertido, os meninos passam a ter desempenho melhor que o
das meninas, com aproximadamente 15 pontos a mais.
“Sabemos que meninas
perdem o interesse em STEM quando crescem porque os estereótipos de gênero
ficam mais e mais fortes, fazendo com que elas tendam a não se identificar com
STEM, a prestar mais atenção em outras aulas e a escolher outras carreiras”,
diz a pesquisadora.
Diante desse
cenário, Theophania diz que são necessárias políticas específicas para evitar
que meninas se afastem de STEM. Em países em que as diferenças entre meninos e
meninas não é significativa nessas áreas, elas têm, em ciências, um desempenho
três vezes melhor do que nos casos em que os meninos se destacam. A constatação
é feita com base nos resultados do Estudo Internacional de Matemática e
Ciências, que mostram que nos países em que os meninos vão melhor que as
meninas, a diferença em ciências é de oito pontos. Nos países em que ocorre o
inverso, a diferença é de 24 pontos. Leia abaixo os principais trechos da
entrevista:
O que afasta as meninas desde cedo de STEM?
Theophania
Chavatzia: A resposta é mais complexa do que se pensa. Há uma série de fatores
que se sobrepõem uns aos outros, que têm a ver com o nível individual e também
com a interação social e socialização no processo de aprendizagem, na família,
na escola e na sociedade em geral. Estudos mostram as diferenças, por exemplo,
na maneira como somos criados, como meninas ou meninos, pelos nossos pais e até
as diferenças na atenção e nas oportunidades em brincadeiras e na aprendizagem.
Por causa disso e da presença majoritária masculina, essas carreiras não são
consideradas apropriadas para meninas. Meninas tendem a crescer acreditando que
STEM não é para elas, que não é um campo apropriado.
Isso é reforçado
pelo fato de que elas não veem pessoas que se destacam nessas carreiras que
sejam mulheres, isso tanto na mídia, quanto na escola. As meninas tendem a
acreditar que elas não são tão boas em STEM quanto os meninos. São
estereótipos. Tendem a acreditar que são melhores em humanidades, por exemplo,
e que não são boas em ciências ou que não são tão boas quanto os homens. Tendem
a assimilar esse estereótipo e a ficar longe. Quando elas vão para a escola, ao
invés de quebrar o estereótipo, muitas vezes isso é reforçado pelas atitudes
dos professores, que também carregam esses estereótipos e até mesmo pelo
currículo. Estudos mostram que não existem fatores biológicos ou psicológicos
que justifiquem essa diferença em STEM, isso é reflexo da socialização.
Poderíamos falar sobre isso por horas, mas acredito que esses sejam os
principais fatores que afastam as meninas de carreiras em STEM.
Agência Brasil: Há diferenças entre países ricos e pobres?
Theophania Chavatzia: Os dados mostram que isso não é baseado na riqueza de um país. Afeta tanto países em desenvolvimento quanto países desenvolvidos. Todos são afetados pelos mesmos estereótipos.
O que o mundo perde com menos meninas em STEM?
Agência Brasil: Há diferenças entre países ricos e pobres?
Theophania Chavatzia: Os dados mostram que isso não é baseado na riqueza de um país. Afeta tanto países em desenvolvimento quanto países desenvolvidos. Todos são afetados pelos mesmos estereótipos.
O que o mundo perde com menos meninas em STEM?
Theophania
Chavatzia: Se continuarmos excluindo metade da população, isso significa que
metade da produção e metade potencial não serão aproveitados no futuro.
Reconhecemos, cada vez mais, a importância de STEM, da ciência e tecnologia
para os avanços e para as soluções dos problemas da nossa era. Se deixamos
metade da população de fora, isso significa que teremos metade da população que
não estará olhando e não apresentará soluções. Essa é uma perspectiva. Outra é
que estamos mantendo as desigualdades de gênero em geral. Se considerarmos STEM
como o trabalho do futuro, com melhores salários e reconhecimento, e excluirmos
as mulheres, estamos reforçando as desigualdades.
O que pode ser feito para reverter esse cenário?
O que pode ser feito para reverter esse cenário?
Theophania
Chavatzia: Países que têm políticas de inclusão de ciência, tecnologia e STEM,
em geral, mostram que meninas podem ter um desempenho três vezes
melhor que o dos meninos. Precisamos de políticas apropriadas, que encorajem a
participação das meninas. A Austrália está investindo milhões para promover
educação em STEM para meninas, ofertando bolsas de estudos e programas que
encorajam a participação feminina. Tratam-se de áreas em que sabemos que as
meninas são afetadas por estereótipos, tem que ter um esforço para
engajá-las. Quando elas têm oportunidade, veem que, na verdade, não são ruins,
que podem gostar e que podem fazer isso. Temos que desmistificar STEM, desafiar
os estereótipos e prover oportunidades para as meninas aprenderem.
Temos que olhar também para a qualidade da educação em STEM e para a qualidade na formação dos professores. Eles precisam ser bem treinados em STEM e também bem treinados em abordagens de gênero, têm que reconhecer o que afasta as meninas, têm que balancear isso e encorajá-las. Se fosse preciso destacar uma ação para reverter o quadro atual, eu destacaria a capacitação dos professores, tanto a formação inicial, antes de começar a dar aulas, quanto a formação continuada, ao longo da carreira.
O que você destacaria sobre o Brasil?
Temos que olhar também para a qualidade da educação em STEM e para a qualidade na formação dos professores. Eles precisam ser bem treinados em STEM e também bem treinados em abordagens de gênero, têm que reconhecer o que afasta as meninas, têm que balancear isso e encorajá-las. Se fosse preciso destacar uma ação para reverter o quadro atual, eu destacaria a capacitação dos professores, tanto a formação inicial, antes de começar a dar aulas, quanto a formação continuada, ao longo da carreira.
O que você destacaria sobre o Brasil?
Theophania
Chavatzia: Antes de ir para a educação em STEM, todas as crianças e
adolescentes têm que estar na escola. Tem que haver medidas para isso, para
incluir tanto meninos e meninas. Estudos sobre o Brasil confirmam os achados
gerais. As meninas têm melhor performance que os meninos no primeiro ano
avaliado em ciências. Três anos depois, são os meninos que têm performance
melhor. Temos que examinar o que está acontecendo no sistema educacional, que
em três anos reverte a situação. Sabemos que meninas perdem o interesse em STEM
quando crescem, porque os estereótipos de gênero ficam mais e mais fortes,
fazendo com que elas tendam a não se identificar com STEM, a prestar mais
atenção em outras aulas e a escolher outras carreiras.