segunda-feira, 4 de novembro de 2024

IMPRENSA DOS EUA VAI ANUNCIAR O VENCEDOR POR TRADIÇÃO

 

História de Matthew Ward Agius – DW Brasil

“Call the race” é o jargão para uma peculiaridade dos pleitos americanos: antes mesmo dos resultados oficiais, os meios de comunicação se encarregam de anunciar quem venceu. Uma convenção com vantagens e desafios.

Pesquisas de boca de urna são um dos instrumentos usados para a imprensa antecipar os resultados oficiais

Pesquisas de boca de urna são um dos instrumentos usados para a imprensa antecipar os resultados oficiais© Sara D. Davis/Getty Images

Como os Estados Unidos costumam ser classificados como a democracia mais antiga do mundo, não é surpresa que um sistema construído em cima de convenções e tradições tenha as suas excentricidades. Uma delas, mantida desde 1848, é o papel da imprensa em “anunciar a corrida” (call the race) em milhares de eleições por todo o país, ou seja: relatar sobre quem será declarado vencedor pelas autoridades.

Quando essa tradição começou, não havia internet, TV, nem rádio, e o telégrafo estava apenas começando a ser usado. Sem autoridade federal para coordenar os pleitos, os jornalistas decidiram assumir a função, a começar pela Associated Press (AP), que comunicava os resultados em nível nacional.

Embora o número de agências de notícias e a tecnologia tenham aumentado desde o século 19, a papel da imprensa como relatora eleitoral não oficial continuou entregar a estimativa mais rápida de quem será o próximo presidente americano.

Mas o sistema tem seus engasgos: no século 21, os eleitores chegando às urnas no extremo oeste do país talvez já saibam alguns resultados do litoral leste.

Por outro lado, certos estados – especialmente os “estados-pêndulo” (swing states), cujo papel será decisivo – podem ter que esperar dias até seus votos serem meticulosamente apurados.

As pesquisas boca de urna são realizadas ao longo de todo o processo eleitoral, já que nos EUA é possível votar antecipadamente em alguns estados

As pesquisas boca de urna são realizadas ao longo de todo o processo eleitoral, já que nos EUA é possível votar antecipadamente em alguns estados© Sara D. Davis/Getty Images

Informação na mão de NEP e AP VoteCast

Os 50 estados e a capital Distrito de Colúmbia são responsáveis pela realização dos escrutínios para o presidente, o Senado e a Câmara dos Representantes dentro de suas divisas. Os resultados são anunciados oficialmente por cada estado, porém a mídia empacota tudo para seu público por meio de uma combinação de resultados oficiais ao vivo, pesquisas de intenção de voto e um conhecimento profundo da colcha de retalhos das regras eleitorais e tendências históricas americanas.Vídeo relacionado: Eleição presidencial dos EUA: como funciona? (Dailymotion)

A partir de 1990, a maioria das organizações de imprensa americanas formou a associação National Election Pool (NEP), que emprega dados de boca de urna para transmitir aos parceiros jornalísticos a atualização ao vivo de todas as votações realizadas. A NEP ainda existe, transmitindo dados para os canais de comunicação ABC, CBS, CNN, NBC e Reuters através da empresa de pesquisa de mercado Edison Research.

Em 2016, porém, a Associated Press se separou desse grupo para criar seu próprio produto, AP VoteCast, atualmente usado por diversos veículos, como Fox News, NPR, PBS, Univision, USA Today e o Wall Street Journal. A DW divulga seus resultados alinhada com a Associated Press.

Divulgação do resultado pela imprensa impede um candidato de alegar vitória antes da análise total das urnas, especialmente em eleições apertadas

Divulgação do resultado pela imprensa impede um candidato de alegar vitória antes da análise total das urnas, especialmente em eleições apertadas© AP Photo/picture alliance/dpa

Embora cada uma dessas associações empregue uma metodologia diferente, seu princípio é o mesmo: anunciar o resultado quando estiver claro que o detentor da dianteira não pode mais ser derrotado naquela votação.

Ao empregar todos os dados para anunciar o vencedor corretamente, essa convenção jornalística também representa uma certa proteção contra candidatos declararem vitória prematuramente. Por outro lado, também ajuda a manter a confiança no sistema eleitoral — a qual tem decaído significativamente.

Boca de urna, intenções de voto e anúncio do vencedor

Joe Lenski, cofundador e vice-presidente executivo da Edison Research, explica como é possível a imprensa afirmar que um candidato venceu em determinado estado, se não há uma declaração oficial na noite da eleição: “Tudo o que relatamos é inoficial, mas parte de uma fonte oficial.”

Mais de 3 mil funcionários de sua companhia enviam para a equipe central os resultados das apurações, seja das seções eleitorais de cidades menores ou dos grandes centros estaduais.

Além disso, realizam pesquisas de boca de urna — simplesmente perguntando aos eleitores em que votaram, assim que deixam a cabine, a fim de obter uma impressão direta. Esses e outros dados são digitados num modelo de computador que ajuda a determinar quando a disputa está decidida.

A julgar pelas consultas populares, pode levar alguns dias até certos estados apresentarem resultados claros. Em meio a tantas disputas apertadas, pode ocorrer de um órgão de imprensa romper com a NEP ou a AP VoteCast e anunciar os resultados mais cedo: seria altamente atípico, mas cada meio de comunicação tem independência editorial para tomar suas próprias decisões.

Autor: Matthew Ward Agius

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