quinta-feira, 10 de novembro de 2022

NOVO GOVERNO NÃO TEM UMA POLÍTICA ECONÔMICA DEFINIDA

Editorial
Por
Gazeta do Povo

Fachada do Ministério da economia na Esplanada dos Ministérios


Fachada do Ministério da Economia, na Esplanada dos Ministérios.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Bras

A economia não é uma ciência exata, especialmente em sua vertente de política econômica, quanto às medidas de atuação do governo e as normas de regulação do mercado e intervenção no cotidiano operacional das pessoas, empresas e instituições. Ainda que haja inúmeras questões técnicas de natureza macroeconômica que já foram testadas nos últimos 300 anos e sobre as quais se conhecem causas e efeitos, há outras questões incursas nas opções de natureza política que podem ir em uma ou outra direção, com efeitos não exatos e todos válidos. Entre as questões técnicas beirando às ciências exatas está a relação entre o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB) expresso em valores monetários e o volume de meios de pagamento em circulação. Se a expansão monetária for maior que o aumento do PIB por anos seguidos, inevitavelmente a inflação aparece, corroendo o poder de compra da moeda, empobrecendo os assalariados, desorganizando o sistema de preços e, ao fim, jogando a economia em recessão.

Sobre esse primeiro ponto – o controle do estoque de moeda circulante vis-a-vis o desempenho do PIB –, é essencial que Lula e sua equipe deixem claro como será comandada a área econômica, quem estará à frente da política monetária e as demais medidas que o governo pretende implantar. Se em 2018 o Brasil sabia desde o minuto seguinte à vitória de Jair Bolsonaro que a economia estaria a cargo do liberal Paulo Guedes, hoje o arco de possibilidades vai de economistas defensores da responsabilidade fiscal até o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, nome que já deixou o mercado financeiro alarmado nos últimos dias. As escolhas para a equipe de transição também não ajudam a prever o rumo futuro, pois, se por um lado ela tem dois “pais do real” (André Lara Resende e Pérsio Arida), por outro conta também com um ex-ministro gastador (Nelson Barbosa) e pode, ainda, ter Guido Mantega, a julgar por declarações do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin.

O Brasil elegeu um candidato conhecido e uma política econômica desconhecida, cenário esse que contribui para criar um vácuo de dúvidas, incertezas e receios

Enquanto não realiza tais definições, o governo eleito contribui para aumentar as incertezas e, como consequência, induz a certa retração nos investimentos privados e pisada no freio dos negócios nacionais, sem os quais o PIB não cresce. Em um país que vem de duas crises graves – pandemia e seca prolongada –, tudo o que um presidente eleito não devia fazer é manter o país em suspense, no mínimo porque um PIB estagnado ou em crescimento lento produz o pior dos males sociais: o desemprego, que vem regredindo até o momento.

Se o próprio Lula não toma a iniciativa de eliminar as dúvidas, a sociedade em geral e os agentes de mercado em particular precisam redobrar a cobrança sobre o eleito para que diga logo qual é o plano de seu governo nessa questão. Vale lembrar que recentemente o Brasil aprovou legislação regulamentando o mandato da diretoria do Banco Central, de forma que a atual diretoria tem ainda dois anos de mandato. Como o atual presidente do banco, Roberto Campos Neto, desfruta da credibilidade do mercado e também no meio político, o normal seria estar claro para todos que ele e seus diretores seguem até o fim de seu mandato. O problema é que o Brasil não é um país habituado a seguir o normal e as leis vigentes, embora o então candidato Lula tivesse se pronunciado a favor da manutenção dos atuais dirigentes do Banco Central, conforme reza a lei.


Um segundo aspecto relevante para indicar o futuro da economia é a política fiscal, especialmente o que o governo pensa sobre o equilíbrio das contas públicas e o controle do déficit. Como ao longo da campanha Lula fez inúmeras declarações contra o teto de gastos, que limita a gastança do governo, há preocupações sobre o que realmente seu governo irá fazer, especialmente depois que começaram as negociações para a PEC da Transição. A boa gestão das contas do governo tem a ver no mínimo com duas questões essenciais para a saúde econômica do país: a inflação, pois déficits públicos crônicos são financiados por emissão de moeda ou aumento da dívida pública; e as taxas de juros, porque, se houver expansão monetária e inflação, o Banco Central eleva os juros para combatê-la ou, se o déficit for financiado por mais empréstimos tomados pelo governo, diminuem os fundos disponíveis para financiamento ao setor privado e, portanto, ocorre pressão altista sobre a taxa de juros.

O terceiro aspecto importante se refere ao fato de, caso o governo mantenha a gastança e despreze o teto de gastos, começarem ameaças para elevar impostos destinados a bancar o crescimento dos gastos públicos. A carga tributária efetivamente arrecadada pelo governo (municípios, estados e União) atingiu a marca dos 34%; logo a carga nominal é muito maior e já chegou ao limite técnico aceitável, acima do qual a tributação passa a atuar como inibidora do crescimento do PIB. Nesses três pontos, além de outros, não existe compromisso público firmado e explicado em detalhes pelo presidente nem por seus assessores conhecidos durante o período eleitoral. Lula foi eleito sem que a população soubesse qual é seu plano de governo, embora se conheçam suas ideias gerais e o que foram seus dois mandatos anteriores na Presidência, em grande parte dominados por corrupção sistêmica e constante.

O Brasil elegeu um candidato conhecido e uma política econômica desconhecida, cenário esse que contribui para criar um vácuo de dúvidas, incertezas e receios. Um cenário de incertezas e falta de definições em geral freia o ímpeto empreendedor e leva à suspensão, definitiva ou temporária, de investimentos. É hora de o governo eleito dizer a que veio e o que pretende fazer no amplo espectro da economia.


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