Ordens executivas, aprovação e economia
Por ADRIANO CERQUEIRA| DOUTOR EM HISTÓRIA E PROFESSOR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO IBMEC BH
No dia 30 de abril, Joe Biden completará cem dias de governo e, desde que assumiu, ele investiu em várias frentes para tornar os cem dias um marco político. O principal instrumento que ele usou foi a “ordem executiva”, uma prerrogativa que um presidente nos EUA possui, que basicamente é o de legislar diretamente. Esse ato pode sofrer impedimento por decisão judicial ou legislativa, mas, caso não ocorra, ele passa a ter validade. Em 20 dias de início de mandato Biden já havia assinado 25 ordens executivas, um recorde desde o governo de Roosevelt, nos anos 30 do século XX.
As ordens executivas foram dirigidas principalmente para reverter políticas implementadas por seu antecessor Donald Trump e, nesse sentido, mudaram a questão migratória e da construção do muro com México (essa mudança gerou uma crise migratória na fronteira com o México), o retorno dos EUA ao Acordo do Clima de Paris, o retorno à Organização Mundial da Saúde e ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, entre outras. Com essas ordens, Biden quer atender a pesada agenda de promessas que teve que assumir para vencer a eleição de 2020.PUBLICIDADE
No plano legislativo, Biden pôde contar com uma ligeira maioria democrata na Casa dos Representantes e no Senado para aprovar medidas econômicas de grande impacto, entre as quais se destaca o Plano de Resgate Econômico com um montante de US$ 1,9 trilhão a ser investido. A manifesta intenção desse plano é prover recursos econômicos para as famílias empobrecidas e para os desempregados, ampliar os subsídios na saúde, prover auxílio para governos locais e estaduais, entre outras ações de impacto mais imediato em uma economia bastante afetada pelas medidas de enfrentamento do Covid.
E na questão da pandemia, Biden investiu muito na ampliação da vacinação, conseguindo atingir a marca de 100 milhões de vacinações antes dos cem dias de governo, demonstrando grande esforço de mostrar resultados nessa questão.
E como a população dos EUA está reagindo a tudo isso?
Para a avaliação de governo nos EUA existe o tracking do Instituto Rasmussen que se destacou em 2020 como um dos poucos cujas pesquisas ficaram próximas dos resultados das eleições presidenciais de 2020 (fato comprovado pelo mesmo Nate Silver do site 538). De acordo com o tracking do Rasmussen, Biden variou de 47% a 53% de aprovação desde que assumiu a Presidência. E sua desaprovação variou de 43% a 51%. No dia 16 de abril, Biden teve 49% tanto de aprovação como de desaprovação. Logo, o quadro nos quase cem primeiros dias é que a população continua a manifestar uma forte polarização, resultado da campanha eleitoral de 2020. Ou seja, apesar de tantas iniciativas, elas ainda não sensibilizaram a população, e a razão está na difícil situação econômica dos EUA.
De acordo com o indicador de confiança do consumidor, medido pela Universidade de Michigan (reconhecido como um dos principais parâmetros para se medir a confiança do norte-americano na sua economia), nos meses de janeiro, fevereiro e março, os índices foram, respectivamente, 79, 76,8 e 84,9 (média de 80,2). Como comparação, nos três primeiros meses de Trump, os índices foram 92, 91,7 e 91 (média de 91,6). Pelo histórico da Universidade de Michigan, quando o índice fica abaixo de 90,0 é indicativo de baixa confiança e revela, assim, um pessimismo do americano com sua economia.
Concluindo, na economia estará a chave fundamental para Biden fazer um governo capaz de superar a forte polarização política nos EUA, afastando o fantasma de Trump, que estará sempre a postos aguardando o melhor momento para agir. O problema é que o pacote de resgate econômico gera dúvidas quanto à sua aplicabilidade, pois aumenta o preocupante endividamento estatal nos EUA e assim vai gerar forte pressão inflacionária, que penaliza o setor mais empobrecido da população, justamente o setor que o pacote pretende auxiliar. Esse paradoxo reforça o atual pessimismo.
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