Às vésperas da cúpula do clima organizada pelo presidente americano Joe Biden, os rivais geopolíticos emitem um raro comunicado para declarar ação contra emissão de carbono
Redação, O Estado de S.Paulo
SEUL – Os Estados Unidos e a China disseram que vão “combater as mudanças climáticas com a seriedade e a urgência que o problema exige”, intensificando os esforços para reduzir as emissões de carbono. O anúncio foi uma rara demonstração de cooperação em meio ao aumento das tensões entre os dois países em torno de uma série de outras questões.
A declaração foi feita em um incomum comunicado conjunto na noite de sábado, no encerramento da visita de John Kerry, enviado climático do presidente Joe Biden, a Xangai, às vésperas da Cúpula de Líderes sobre o Clima. O evento, organizado pela Casa Branca, reunirá 40 chefes de Estado e governo nos dias 22 e 23 de abril, entre eles o presidente Jair Bolsonaro.
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“É muito importante para nós tentarmos manter distante outras pendências, porque o clima é uma questão de vida ou morte em tantas partes diferentes do mundo”, disse Kerry em uma entrevista neste domingo, 18, em Seul, onde se reuniu com autoridades sul-coreanas para discutir o aquecimento global. “O que precisamos fazer é provar que podemos realmente nos reunir, sentar e trabalhar em algumas coisas de forma construtiva.”
O comunicado é assinado por Kerry e Xie Zhenhua, enviado especial da China para as mudanças climáticas. Os dois também disseram que irão apoiar a transição de países emergentes para formas de energia limpas “sempre que possível”, sem especificar medidas para isso.
As discussões ambientais bilaterais entre China e EUA haviam sido praticamente interrompidas durante o governo do ex-presidente Donald Trump, que abandonou o Acordo de Paris em junho de 2017, afirmando que seus termos “prejudicariam” a economia americana e poriam o país em “desvantagem permanente”.
Biden retornou ao pacto horas após a sua posse e, desde então, se concentra ativamente em transformar os EUA em uma liderança na ação contra a mudança do clima. O protagonismo também é disputado pela China, impasse que cria um obstáculo para uma maior colaboração, apesar dos compromissos traçados no comunicado conjunto.
Sinal disso veio na sexta, durante a visita de Kerry, quando o porta-voz da Chancelaria de Pequim, Zhao Lijian, disse a repórteres que os americanos “são responsáveis por atrasar o cumprimento” do Acordo de Paris. De acordo com a porta-voz, os EUA “deveriam ter vergonha” de tê-lo abandonado e “não deixam claro como farão para recuperar o tempo perdido”.
Há uma série de outras tensões entre os dois países. Na sexta-feira, enquanto os dois enviados se encontravam, o Departamento de Estado americano criticou as sentenças de prisão proferidas em Hong Kong a proeminentes líderes pró-democracia, incluindo Jimmy Lai, um magnata da mídia de 72 anos. No mesmo dia, a China alertou os Estados Unidos e o Japão contra um “conluio” quando Biden se reuniu na Casa Branca com o primeiro-ministro japonês Yoshihide Suga. As ambições geopolíticas crescentes da China foram uma das principais questões ado encontro.
O acordo chega poucos dias antes de Biden realizar a cúpula virtual do clima com líderes mundiais, a partir de quinta-feira, na esperança de estimular os países a fazerem mais para reduzir as emissões e limitar o aquecimento planetário.
O líder da China, Xi Jinping, está entre os convidados para a cúpula virtual. Embora ele ainda não tenha aceitado publicamente o convite, o acordo com Washington deve tornar sua participação mais provável.
Na sexta-feira, Xi disse que a China continua comprometida com as metas climáticas. Ao mesmo tempo, Xi sugeriu que as nações mais avançadas do mundo têm a responsabilidade de assumir a liderança em fazer cortes mais profundos. No que parecia ser uma réplica aos Estados Unidos, ele alertou que a questão climática não deveria ser “uma moeda de troca para a geopolítica” ou “uma desculpa para barreiras comerciais”.
A meta mais ambiciosa é impulsionada por Biden, que busca usar a cúpula desta semana para convencer outras nações a aumentarem os compromissos assumidos há seis anos. A intenção é que isso seja feito antes da COP-26, conferência climática da ONU que acontecerá em novembro, em Glasgow, na Escócia.
Responsável sozinha por 28% dos gases causadores de efeito estufa emitidos no planeta, a China prometeu vagamente no ano passado atingir a neutralidade de carbono até 2060. Um dos objetivos da Casa Branca com sua cúpula é que os chineses consolidem esta proposta.
Os EUA são o segundo país mais poluente, tendo sido responsáveis por 15% do total das emissões em 2020. Buscando servir como exemplo, a Casa Branca deverá anunciar durante sua cúpula uma meta atualizada para reduzir suas emissões em 50% até o fim desta década, quase o dobro da anteriormente prometida.
Kerry disse que a China estava efetivamente se comprometendo a agir de maneira mais rápida do que Xi Jinping havia prometido, “tomando medidas climáticas mais amplas que aumentam a ambição na década de 2020”, como afirma o comunicado. Os dois países continuarão a se reunir para discutir o assunto, acrescentou Kerry.
O novo plano econômico de cinco anos da China, revelado em março, ofereceu poucos novos detalhes para atingir as metas de emissões prometidas por Xi Jinping. A China continuou, por exemplo, a aprovar novas usinas a carvão, uma das principais fontes de emissão de carbono, priorizando a estabilidade social e o desenvolvimento de uma importante indústria nacional.
“Para um grande país com 1,4 bilhão de habitantes, essas metas não são facilmente alcançadas”, disse Le Yucheng, o vice-ministro das Relações Exteriores, em entrevista à Associated Press ontem. “Alguns países estão pedindo à China que faça mais em relação à mudança climática. Talvez isso não seja muito realista.” / NYT, W.POST e AP
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