Em vez de sofrer cortes, como outros ministérios, recursos para as Forças Armadas subiram e chegaram a R$ 8,32 bi; para a área de saúde, houve um aumento de apenas R$ 1,2 bi em relação ao projeto que foi enviado no ano passado
Adriana Fernandes e Daniel Weterman, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – O Orçamento de 2021, previsto para ser votado esta semana com quatro meses de atraso, destina R$ 8,3 bilhões para investimentos do Ministério da Defesa, um quinto (22%) do total para todo o governo federal, segundo relatório do senador Márcio Bittar (MDB-AC) apresentado ontem. Os militares também são a única categoria que deve ser contemplada este ano com reajuste, o que deve consumir outros R$ 7,1 bilhões dos cofres públicos, enquanto todo o restante do funcionalismo está com o salário congelado até dezembro.
No momento de colapso do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo agravamento da pandemia da covid-19, o parecer aumentou em apenas R$ 1,2 bilhão a destinação de recursos para a saúde em relação ao projeto que foi enviado pelo governo no ano passado.
Em vez de sofrer cortes, como outros ministérios, o orçamento de investimentos das Forças Armadas até mesmo subiu de R$ 8,17 bilhões para R$ 8,32 bilhões de um total de R$ 37,6 bilhões previstos no parecer. A lista dos projetos dos militares é extensa e inclui recursos para a construção de submarinos nucleares e convencionais, aquisição de aeronaves de caça, desenvolvimento de cargueiro tático e compra de veículos blindados.
O incremento tímido de recursos para a saúde, na maior crise sanitária da história, põe em xeque o discurso de parlamentares de reforço da área, mas antecipa um movimento de senadores e deputados aliados: a expectativa de que serão editados mais créditos extraordinários para financiar despesas extras para a saúde, que ficam fora do teto de gastos, a regra que trava o crescimento das despesas à inflação.
Mesmo com o Orçamento aprovado, o governo federal pode bloquear gastos não obrigatórios, incluindo os investimentos, como estratégia para cumprir a meta fiscal deste ano, que permite rombo de até R$ 247 bilhões.
Segundo cálculos do assessor no Senado e especialista em gastos de saúde, Bruno Moretti, o orçamento para ações e serviços públicos de saúde, o que é contabilizado para apuração do mínimo e não leva em conta os gastos com aposentadorias e pensões, ficou em R$ 125 bilhões, abaixo do valor inicial do Orçamento de 2020, que foi de R$ 125,2 bilhões, sem os recursos extraordinários da pandemia. “Em meio à pandemia, há queda nominal e real de recursos para o SUS. Se observarmos o Orçamento aplicado em 2020. Incluindo os créditos extraordinários, a queda em 2021, considerando a Lei Orçamentária, é de R$ 36 bilhões”, calcula Moretti. Nesse contexto, afirma ele, serão reduzidas as transferências aos Estados e municípios e as compras centralizadas para aquisição de medicamentos de UTI, manutenção e expansão de leitos, entre outras despesas.
A presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), Flavia Arruda, criou uma ação especial do Orçamento para reforçar as emendas e conseguiu cerca de R$ 900 milhões a mais para a área. O problema é que o governo enviou o projeto de Orçamento com a previsão de gastos com o valor do piso constitucional de R$ 123,8 bilhões e colocando na conta as emendas dos parlamentares, o que dificulta o espaço para aumento dos recursos para a saúde.
Ano eleitoral
O Congresso decidiu turbinar as áreas de interesse eleitoral. O volume de recursos com a digital dos parlamentares neste ano vai chegar a R$ 22,2 bilhões. O valor das emendas representa um aumento de quase R$ 6 bilhões em relação ao proposto inicialmente pelo Executivo. Só de emendas indicadas diretamente pelo relator-geral do Orçamento, o valor é de R$ 3 bilhões.
A maior parte das indicações nas mãos do relator (R$ 1,129 bilhão) ficou vinculada a projetos do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, apontados como estratégicos para Bolsonaro recuperar índices de popularidade, além da área social. Na prática, a destinação desse dinheiro poderá ser negociada com parlamentares em troca de apoio ao Executivo. A pasta saiu de um orçamento de R$ 6,5 bilhões para R$ 10,7 bilhões em 2021.
Além de obras, o Senado quer mais recursos para o Pronampe, que financiou micro e pequenas empresas no ano passado em função do novo coronavírus. Recentemente, os senadores aprovaram um projeto para tornar a nova linha de financiamento do programa permanente. Dos R$ 4,8 bilhões solicitados no Orçamento para irrigar o Pronampe, porém, o relator aprovou apenas R$ 1 bilhão.
Para o consultor da Câmara, Ricardo Volpe, o relator Bittar foi “comedido” no parecer diante da pressão política, mas houve uma revisão de estimativas de receitas para cima, em R$ 14 bilhões, não acompanhada pela revisão nas projeções de gastos. “Diante dessa pressão gerada pelas reestimativas e pela falta de espaço no teto, ele cortou R$ 1,75 bilhão do Censo, que nesse momento de pandemia provavelmente não deve sair de novo”, disse.
Volpe chama a atenção para o fato de o relatório não ter reestimado o gasto da Previdência. Pelos cálculos, só na Previdência a estimativa de pagamento deveria ser elevada em R$ 8,3 bilhões por causa do impacto do aumento do salário mínimo. Esse quadro já antecipa um bloqueio à vista do Orçamento, que deverá ocorrer em abril.
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