Análise: Bolsonaro mostra que não hesitará em descartar quem atrapalhar reeleição
No mesmo dia, presidente lavou as mãos na votação pela prisão de Daniel Silveira e substituiu a chefia da Petrobrás
Marcelo de Moraes, O Estado de S.Paulo
Jair Bolsonaro mostrou que não pensará duas vezes em descartar aliados ou integrantes do governo que possam atrapalhar seu projeto político de reeleição. Ao mesmo tempo em que lavou as mãos e não se moveu para impedir que a Câmara mantivesse a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), o presidente decidiu também jogar ao mar o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, o substituindo pelo general Joaquim Silva e Luna.
Em comum, os dois movimentos expõem que Bolsonaro vai priorizar seu caminho para a reeleição em 2022. Mesmo sendo integrante da ala mais radical – e fiel – do bolsonarismo, Silveira foi deixado de lado pelo presidente, que não quis comprar briga com o Supremo Tribunal Federal e muito menos atrapalhar o andamento da agenda de votações do Congresso. O presidente reconheceu que a crise causada pelo deputado precisava ser resolvida rapidamente. Do contrário, poderia travar a votação dos projetos da agenda econômica, incluindo a proposta que volta a pagar o auxílio emergencial e que garantiu maior aprovação popular para Bolsonaro. Sem apoio do presidente, Silveira viu sua prisão ser mantida pela Câmara por expressivos 364 votos.
O presidente Jair Bolsonaro e o general Joaquim Silva e Luna, indicado para a chefia da Petrobrás Foto: MAURO PIMENTEL / AFP (19/2/2020)
Em relação à mudança na Petrobrás, Bolsonaro mandou seguidos recados de que estava insatisfeito com a sucessão de aumentos nos preços dos combustíveis. A maior preocupação do presidente era com a reação negativa dos caminhoneiros. Há duas semanas, o governo conseguiu conter o movimento de greve que a categoria ameaçava fazer, mas com os novos aumentos do diesel, Bolsonaro perdeu a paciência e decidiu defenestrar o presidente da Petrobras.
Não é uma troca qualquer. Castello Branco é um dos membros originais do chamado supertime montado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, com nomes fortes do mercado. Mesmo sabendo que a repercussão da troca seria péssima, Bolsonaro preferiu colocar no lugar um general que possa seguir suas orientações sobre o preço dos combustíveis. O presidente ficou especialmente irritado com uma fala de Castello Branco que afirmou que não tinha nada a ver com os caminhoneiros, ao justificar que a política de preços da companhia variava conforme o mercado no exterior.
“‘Eu não tenho nada a ver com caminhoneiros, eu aumento preço aqui e não tenho nada a ver com caminhoneiro’. Foi o que ele falou. Isso vai ter uma consequência, obviamente”, reclamou Bolsonaro, na sua live, essa semana.
A questão é que os dois movimentos podem trazer mais problemas do que benefícios para Bolsonaro. A intervenção no comando da Petrobras causou enorme mal-estar no mercado e mostrou o presidente se afastando a galope do liberalismo. Mais: trouxe também de volta a lembrança ruim de como a Petrobras tinha suas decisões definidas pelo Planalto, durante o governo Dilma. Ao colocar um general à frente da estatal, a leitura é que o presidente da companhia, de fato, passa a ser o próprio Bolsonaro.
Já ao virar as costas para o deputado Daniel Silveira, Bolsonaro passa um recado para seus outros aliados no Congresso: vocês estão por conta própria e risco. Por mais insanos que tenham sido os ataques e ameaças feitas pelo parlamentar aos ministros do Supremo, os bolsonaristas esperavam que o presidente não o abandonasse. Essa confiança irrestrita desse grupo Bolsonaro perdeu hoje.
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