Empurrado pelo silêncio
Vittorio Medioli
As circunstâncias levaram o presidente a um repentino silêncio, que diminui a possibilidade de errar, de arrogar-se a verdade, de mostrar-se no papel de brigador
Numa série de pesquisas realizadas a cada 30 dias para seguir as opiniões no período da pandemia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), na última semana, registrou uma evolução de tendência que pode ser surpreendente em relação ao momento adverso do chefe de Estado. No mês de junho aconteceu a prisão de Queiroz, ganhou cobertura a saída hostil de Sergio Moro, a queda do então ministro da Educação, Weintraub, dispararam os óbitos decorrentes da Covid-19, aconteceram decisões contrárias do STF, os noticiários negativos levitaram até fora do forno, o clima contrário no Congresso cresceu. O conjunto em sentido oposto deixava imaginar uma perda de apoio popular do presidente e até um aumento das possibilidades de impeachment. Na região metropolitana de Belo Horizonte, isso não aconteceu.
Com tudo adverso, com um vendaval de denúncias, os entrevistados que aprovam o presidente evoluíram do final de maio, quando eram 48,7%, para 52,1%, na última semana de junho. Quem o desaprova encolheu de 46,2% para 42,2%, e o resto, 5,7%, não opinou. A diferença positiva subiu de 2,5% para 9,9% em apenas 30 dias. Quem achava o governo Bolsonaro ruim ou péssimo diminuiu de 35,0% para 29,1%, uma queda de 5,9% em apenas um mês. Quem o acha bom ou muito bom subiu de 37,4% para 41,4%.
Além dos bilhões distribuídos à população mais carente, o que mais aconteceu para levantar a moral de Bolsonaro? Parece que valeu um sábio ditado popular: “Em boca fechada não entra mosquito”. As circunstâncias levaram o presidente a um repentino silêncio, que diminui a possibilidade de errar, de arrogar-se a verdade, de mostrar-se no papel de brigador.
Foi provavelmente forçado a calar-se para não se afogar na onda de água e de lama que o atingiu. Adotou a postura mais inédita de seu mandato, o silêncio. Deixou os adversários e o mundo sem respostas, ficou inerte, apanhando de acusações, críticas e ataques sem precedentes. Um volume de ataques e negatividades igual ou maior do que aquele que outros presidentes, em momentos de crise, não suportaram, o que os levou a cair do cargo.
O episódio culminante para a mudança de postura foi a prisão de Queiroz. Fechou a capacidade verbal de reação, levou Bolsonaro ao recolhimento, a medir melhor seus gestos e palavras.
Pois bem, se “há males que vêm para bem”, Bolsonaro pode “agradecer” o episódio Queiroz, que o fez recuar da linha dos holofotes, justamente com os três filhos.
Negando seu instinto, Bolsonaro experimentou um novo momento.
Entre os inúmeros defeitos de Bolsonaro, popularmente o salva a virtude que mostrou de não dar espaço, até o momento, à corrupção “de Estado” que marcou os últimos governos.
Com a saída de Moro, as operações da PF e as prisões de corruptos, que estavam paradas desde 2018, voltaram a ocorrer. Semanalmente, novas e cortantes revelações passam a pautar os noticiários. A última delas foi a prova de um depósito de R$ 40 milhões realizado pela Odebrecht nas contas do senador José Serra (PSDB-SP).
O MP, além de investigar, corretamente, “rachadinhas” e outras encrencas do filho do presidente, voltou a recuperar as fortunas depositadas em contas de larápios e figuras políticas de proa.
A um chefe de Estado é mais prudente se preservar, esconder a família, não banalizar seu cargo, deixar um porta-voz, os ministros e os fatos falarem por ele.
A tendência revelada pela sondagem em relação à Covid-19, de recuperação da imagem de Bolsonaro, no momento mais “infeliz” de seu mandato, pode ser uma lição valiosa para o presidente, sempre que saiba compreendê-la e aproveitá-la.
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