Rui e a águia
Manoel Hygino
Cinco de dezembro é
Dia Nacional da Cultura e, há dois anos, a Associação Nacional dos Escritores,
homenageou Rui Barbosa, pois também é seu aniversário. O presidente da
entidade, Fábio de Sousa Coutinho, lembrou a data, nas Quintas Literárias de
2017, em Brasília. Evocou a memória do monumental advogado, político e
intelectual baiano, cuja atuação tanto eleva nossa terra. Ao ensejo, apresentou
o orador do mês, o embaixador Carlos Henrique Cardim, diplomata e cientista
político, aplaudido especialista na produção cultural ruiana.
Para o palestrante,
Rui Barbosa, embora figura das mais citadas e referenciadas, ainda é um enigma.
Registrou que, embora haja 167 volumes contendo sua obra, ele jamais escreveu
um livro. Cardim observou: “O que se publicou são palestras, conferências,
pareceres e prefácios”. Citou, à guisa de curiosidade, que ele traduziu, um
livro “O Papa e o Concílio”, no qual o prefácio é maior que a própria obra”.
E os temas se
misturam nas obras de Rui. Sua posição sobre os Estados Unidos, por exemplo,
está ao lado de exposição crítica sobre o divórcio. Haveria muito a contar. O
palestrante Cardim, com formação em sociologia, registra que Rui nunca foi
muito prestigiado na sua faculdade. Afirmou: “Eu só vim conhecer Rui,
reconhecer Rui, quando estava no Itamaraty, a partir de um trabalho do Santiago
Dantas, em que ele mostrou a faceta desenvolvimentista de Rui. Ele foi o
primeiro ministro da Fazenda que o Brasil teve na República e tentou
industrializar o Brasil, o que não é pouca coisa. Ele foi contra todo um ciclo
de pensamento, de interesses que defendiam, logicamente, um modelo agrícola
exportador e quis implantar a indústria”.
Observou ainda
Cadim: “E depois dizem que Deus é brasileiro. Não é. Tanto que eu mesmo, em
debate com o professor Delfim e o Sérgio Amaral, disse o seguinte: Deus é mais
norte-americano. Aliás, Bismarck costumava dizer que a divina providência de
Deus tem uma especial predileção pelos tolos, pelos bêbados e pelos Estados
Unidos”.
Rui Barbosa
permaneceu pouco tempo no Ministério da Fazenda: oito, nove meses, por aí. Não
aguentou as pressões numa situação sobremodo difícil. Enfrentou problemas e
inimizades. No Brasil, à época, ou se era pró-Rui ou anti-Rui. Nada de meio
termo.
Houve um embaixador
do Brasil na ONU, antes reitor da USP, ruista doente. Ernesto Leme era seu
nome. Numa conferência, ele lembrou o grande baiano como se fora de todos
conhecido: Rui para cá, Rui para lá, a Águia de Haia, como apelidado. A certo
ponto, um embaixador inglês, muito sarcástico, perguntou ao colega brasileiro:
“Embaixador, but who is this Birdman? , que voa por todos os lados? Quem é esse
homem Águia?”.
Recordou-se mais: o
plenário do Senado em Brasília tem apenas dois bustos de Jesus Cristo e Rui Barbosa,
este “uma figura quase santificada à distância”, acrescentou Cadim. “O Rui
sofreu uma série de interpretações, as mais variadas e todas muito bem
fundamentadas, mas como diz o Santiago Dantas (acho que ele foi quem mais
estudou e colocou Rui em termos modernos, mostrando o lado não só progressista
do Rui Barbosa, mas o verdadeiro), o Rui Barbosa foi realmente, no final da
vida, só podia chamar um social liberal alinhado com o trabalhismo inglês
totalmente. Somente agora estamos chegando a uma certa serenidade para poder
ter uma visão clara”.
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