Após julgamento do STF, parlamentares pressionam por PEC, mas Alcolumbre
resiste
Daniel Weterman e Camila Turtelli
© Dida Sampaio/Estadão O presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (DEM-AP)
BRASÍLIA –
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre
(DEM-AP), rejeita pautar uma proposta para autorizar a prisão de condenados em segunda instância. Nesta quinta-feira, 5, o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu derrubar a possibilidade, medida considerada um dos
pilares da Operação Lava Jato. No Congresso, parlamentares pressionam
a votação de uma proposta nesse sentido após o resultado do julgamento.
Em seu voto decisivo, o presidente do Supremo, Dias Toffoli,
lembrou que o Congresso tem autonomia para mudar o entendimento que garante um
acusado responder em liberdade até o fim da tramitação de um processo na
Justiça. Na quarta-feira, 6, um dia antes do término do julgamento, Alcolumbre
já deu o recado. "Isso aí não tem nem perspectiva", afirmou.
Já a presidente da Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet,
adiantou ao Broadcast Político, serviço de cobertura em tempo real do
Grupo Estado, que pretende colocar em discussão uma PEC que autoriza a execução
da pena após condenação em segundo grau. "Mas alterando efeito dos
recursos especial (no STJ) e extraordinário (STF). Alguns
senadores estão trabalhando no texto ideal", afirmou. A proposta deve ser
fechada na segunda-feira, 11. A votação, no entanto, deve ocorrer só a partir
do dia 20.
Na Câmara, a votação de uma PEC com o mesmo teor
foi anunciada para semana que vem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
"A decisão do STF é frustrante", afirmou o deputado Alex Manente
(Cidadania-SP), destacando que parlamentares vão acelerar a votação do tema.
Líderes partidários, entre eles do PSDB e do Novo, prometeram esforços para votar
a proposta na Câmara. "Vou torcer para que o parlamento mude", disse
o líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP). "Vamos fazer de tudo para que mude.
É nossa obrigação", afirmou o líder do Novo, Marcel Van Hattem (RS).
Com a possibilidade de soltura do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, integrantes da oposição comemoraram a decisão do
Supremo. “A decisão é também o reconhecimento, depois de um ano e se meses, de
que o ex-presidente Lula ficou preso durante todo esse período de forma ilegal
por uma decisão política", afirmou a presidente nacional do PT, deputada
Gleisi Hoffmann (PR). O partido cobra agora do Supremo a anulação da condenação
que levou Lula à prisão.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio
Moro, defensor da prisão após condenação em segundo grau e juiz da sentença de
Lula no caso do triplex do Guarujá, evitou comentar os resultados do julgamento
do STF. Conforme o Broadcast Político antecipou, ele pediria a retirada do
trecho que prevê a prisão em segunda instância no pacote anticrime em tramitação
no Senado.
'Antídoto'
O presidente do Senado concorda em pautar um
projeto considerado como "antídoto" para o fim da prisão após
condenação em segundo grau. Toffoli sugeriu alterar o Código Penal e impedir a
prescrição de casos que chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ)
e ao Supremo. Alcolumbre já liberou para votação em plenário um projeto
apresentado pelo senador Alvaro Dias (Pode-PR) com a revisão na prescrição. Nas
próximas duas semanas, a proposta deve ser adequada nos termos da "emenda
Toffoli".
Apesar da sugestão de Toffoli, a pressão pela PEC
da segunda instância continua. "Os ministros do Supremo, chamados de
garantidas, mais uma vez flexibilizam para os criminosos e a população vai
pagar a conta disso", comentou o líder do PSL no Senado, Major Olimpio
(SP). A revisão do prazo de prescrição é defendida por senadores
"lavajatistas", mas o grupo fala que isso não é suficiente. "Ele
(Toffoli) está buscando um remédio que não cura, só diminui a dor. É um pretexto
para se acabar com a prisão em segunda instância. O fim da prescrição é
importante independentemente da prisão após segunda instância", afirmou
Alvaro Dias.
Reações
Nas redes, parlamentares e integrantes da
força-tarefa da Operação Lava Jato reagiram ao resultado do julgamento no STF.
Houve desde críticas, que preveem "número elevado de presos" nas
ruas, até elogios de que a decisão a "fortalece democracia e a
Constituição".
Sem citar diretamente a decisão, o deputado federal
Eduardo Bolsonaro
(PSL-SP) criticou a soltura de "bandidos" – e relacionou o tema com o
porte de armas de fogo, uma de suas bandeiras. "Soltam bandidos e desarmam
o cidadão. Pobre do brasileiro", ele escreveu.
O senador Major Olímpio
(PSL-SP) atacou o resultado, mas também lembrou que o Congresso Nacional teve
responsabilidade na aprovação, em 2011, de um dispositivo no Código de Processo
Penal que garante a liberdade até o esgotamento de todas as instâncias – o
chamado "trânsito em julgado".
"O Congresso falhou na elaboração do artigo
283 do Código de Processo Penal, em 2011", disse Major Olímpio, em um
vídeo divulgado nas redes sociais. "Os ministros do Supremo Tribunal
Federal chamados de garantistas, mais uma vez, flexibilizaram para os
criminosos, e a população vai pagar a conta disso. Seis a cinco contra o povo
brasileiro."
A Lava Jato divulgou uma nota oficial em que pondera que a decisão
"deve ser respeitada, mas como todo ato judicial pode ser objeto de debate
e discussão". A força-tarefa considera que a mudança de jurisprudência
impactará os trabalhos da operação, e critica a "existência de quatro
instâncias de julgamento, peculiar ao Brasil, associada ao número excessivo de
recursos".
A presidente do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann,
divulgou nota oficial na qual diz que a "decisão do STF é muito importante
para fortalecer a democracia e a Constituição, no momento em que são ameaçadas
pelo governo de extrema-direita no Brasil". Ela também argumenta que o
resultado "é também o reconhecimento, depois de 1 ano e 7 meses, de que o
ex-presidente Lula ficou preso durante todo esse período de forma ilegal, por
uma decisão política". Gleisi defendeu, ainda, a anulação da sentença de
Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça, que condenou o ex-presidente.
A deputada federal Carla Zambelli
(PSL-SP), integrante da ala bolsonarista do PSL, criticou pessoalmente o
presidente do STF, ministro Dias Toffoli. Ela destacou que Toffoli já havia
votado a favor da prisão após condenação em segunda instância, mas mudou de
entendimento nesta quinta, 7.
"Como presidente do STF, deveria se posicionar
pelo bem supremo do Brasil, e não tomar uma decisão que pode trazer insegurança
jurídica ao País", escreveu a deputada em sua conta oficial no Twitter.
"É uma vergonha o voto do ministro Dias Toffoli."
Já o deputado Coronel Tadeu
(PSL-SP) gravou um vídeo exaltado, em que fala em "caos na sociedade"
como consequência da mudança de entendimento do STF. "As consequências da
decisão em não permitir a prisão após a segunda instância trará sérios
problemas para a segurança pública do nosso País", disse. "Imaginem a
festa de políticos que estavam na iminência de irem presos, e esses que estão
presos e agora irão para as ruas. Pessoas que solaparam o erário público agora
estão dando risada de todos os brasileiros."
Candidato à Presidência pelo PSOL em 2018, Guilherme Boulos
opinou que "a Constituição prevaleceu". Ele ressaltou que a decisão
não vale apenas para o ex-presidente Lula. "O direito de defesa começa a
ocupar o lugar do linchamento de um Judiciário partidarizado. Vale pra Lula e
pra qualquer cidadão brasileiro."
Na direção contrária, o presidente do Novo, João Amoêdo,
usou sua conta oficial no Twitter para criticar o resultado do julgamento.
"Infelizmente o STF tomou uma decisão contrária a um Brasil sem
impunidade", escreveu. "Cabe agora ao Congresso reverter e
possibilitar, mais uma vez, a possibilidade de prisão em segunda
instância."
Argentina
A decisão do Supremo também repercutiu na
Argentina. O presidente eleito do país, Alberto Fernández,
publicou uma foto em que aparece junto a cartazes que pedem a soltura de Lula,
e uma mensagem que termina com a hashtag #LulaLivreAmanhã. "O Supremo
Tribunal Federal do Brasil decidiu que as condenações a prisão só são
executáveis uma vez que tenham mais recursos", escreveu. "É o mesmo
que temos pedido na Argentina há anos."
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