Sínodo da Amazônia começa neste domingo sob o olhar atento do governo
Letícia Alves
© Prensa Total/Flick Papa Francisco presidirá o
evento
O
Sínodo da Amazônia começa neste domingo (6.out.2019), no Vaticano. A
tradicional assembleia dos bispos, que é convocada pelo chefe da Igreja
Católica sempre que há 1 assunto específico a ser discutido com o clero, não
tem interessado só religiosos e estudiosos do assunto, mas também o governo
brasileiro.
Em
agosto, o presidente Jair Bolsonaro admitiu que monitora o evento, alegando que
há influência política nas discussões. A preocupação é de que as soluções
apresentadas pelos bispos toquem, em alguma medida, na soberania nacional sobre
a Amazônia.
Desde
o início do ano, o general Augusto Heleno, ministro-chefe do GSI (Gabinete de
Segurança Institucional), concedeu diversas entrevistas demonstrando incômodo
com o tema do Sínodo. Em fevereiro, ele disse à Folha de S.Paulo que “quem
cuida da Amazônia brasileira é o Brasil”.
“[O Sínodo] quer falar de terra indígena, quer
falar de exploração, de plantação, quer falar de distribuição de terra. Isso
são assuntos do Brasil”, reclamou. Na
ocasião, o ministro ainda negou qualquer “espionagem” do evento por
parte do GSI ou da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
Em
nota enviada ao Poder360, o GSI admitiu que “acompanha o tema
demandado”, mas que “não há previsão de participação de representante do
Governo neste evento”. De fato, o papa Francisco vetou a participação de
quaisquer políticos com mandatos e militares no Sínodo.
50A
manifestação do GSI, aliás, contradiz a declaração do General Heleno feita em
fevereiro ao afirmar que “a expectativa é de que o Sínodo aborde, apenas,
aspectos referentes à religiosidade e não tópicos relacionados com a soberania
do Brasil”.
O
texto também é contraditório com nota do próprio GSI
divulgada em 10 de fevereiro, que afirmava que “parte dos temas do referido
evento tratam de aspectos que afetam, de certa forma, a soberania nacional”.
Principais assuntos discutidos
Ao
menos na teoria, a preocupação do governo com uma interferência da Igreja na
soberania nacional é infundada. Isso porque, de acordo com artigos do Código de
Direito Canônico, o Sínodo deve tratar de assuntos para “consolidar a
incolumidade e o incremento da fé e dos costumes, a observância da disciplina
eclesiástica”. Além disso, não compete à assembleia fazer decretos sobre os
temas deliberados.
Na
prática, porém, alguns assuntos de interesse exterior à Igreja foram inseridos
no documento de trabalho produzido para embasar as discussões. O Instrumentum
Laboris, publicado em 17 de junho, tem 21 capítulos divididos em 3 partes: “A
voz da Amazônia”, “Ecologia integral: o clamor da terra e dos pobres”
e “Igreja profética na Amazônia: desafios e esperanças”.
É
a 2ª parte que pode preocupar o governo Bolsonaro. O texto menciona termos como
a “destruição extrativista”. Outros temas como a migração, urbanização,
família e comunidade, saúde, educação integral e corrupção.
No
documento consta a proposta de que “se alterem os critérios para selecionar
e preparar os ministros autorizados para celebrá-la (Eucaristia)”. O
documento também fala em garantir a “liderança” de mulheres nas
comunidades.
Os
temas citados, no entanto, não necessariamente serão levados em consideração
pelo papa Francisco ou gerar alguma consequência prática na Igreja.
Na
última semana do evento, os membros do Sínodo farão a redação final do
documento. Ele não terá, porém, nenhum efeito jurídico.
Quem participará
Os
participantes das reuniões serão bispos diocesanos das 9 províncias
eclesiásticas da região pan-amazônica, incluindo o Brasil. Também participarão
alguns membros a Cúria Romana e do conselho que prepara o Sínodo, além de
membros da Repam (Rede Eclesial Pan-Amazônica).
Religiosos
com trabalho pastoral desenvolvido na floresta e alguns leigos escolhidos pelo
papa também estarão presentes. Alguns representantes de outras igrejas de
denominação cristã e não cristã que atuam na Amazônia, além de líderes indígenas,
também terão assento.
O
relator do Sínodo é o cardeal Cláudio Hummes, presidente da Repam.
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