terça-feira, 2 de abril de 2019

O PROBLEMA DAS BARRAGENS DE MINÉRIO EM MINAS GERAIS É MAIS SÉRIO DO QUE SE PENSA


Vale perde declaração de estabilidade de dez novas barragens; 17 estruturas estão sob risco em Minas

José Vítor Camilo











Entre as 17 barragens interditadas, duas estão no complexo Vargem Grande, em Nova Lima



O número de barragens da Vale em Minas Gerais interditadas por conta da elevação do risco de rompimento subiu de sete para 17 nesta segunda-feira (01).  A própria mineradora divulgou nesta segunda-feira (1º) que as Declarações de Controle de Estabilidade (DCE) - documento que garante a manutenção das operações - de outras dez estruturas venceram levando à elevação ao nível 1 de emergência nestas estruturas. Dntre todas as estruturas sob risco, sete delas estão em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Entre as represas que não conseguiram ter o documento renovado, estão as sete que tiveram o nível de emergência elevados e onde já ocorreram evacuações nas Zonas de Auto Salvamento (ZAS), sendo elas: Sul Superior, da mina Gongo Soco, em Barão de Cocais (nível 3); B3/B4, da mina Mar Azul, em Macacos (nível 3); Forquilha I (nível 3), II (nível 2) e III (nível 3) e barragem Grupo (nível 2), todas na mina Fábrica, em Ouro Preto; e a barragem Vargem Grande, do Complexo Vargem Grande, em Nova Lima (nível 2).
Agora, ainda de acordo com a Vale, a não obtenção dos DCEs ocasionou a elevação para o nível de emergência 1 em outras dez estruturas. Confira a lista das dez novas barragens que foram interditadas:
- Dique Auxiliar da Barragem 5, da Mina de Águas Claras, na divisa de BH e Nova Lima
- Dique B e barragem Capitão do Mato, da mina de Capitão do Mato, em Nova Lima
- Barragem Maravilhas II, do complexo de Vargem Grande, em Nova Lima
- Dique Taquaras, da mina de Mar Azul, em Macacos (Nova Lima)
- Barragem Marés II, do complexo de Fábrica, em Ouro Preto
- Barragem Campo Grande, da mina de Alegria, em Mariana
- Barragem Doutor, da mina de Timbopeba, em Ouro Preto
- Dique 02 do sistema de barragens de Pontal, do complexo de Itabira
-  Barragem VI, da mina do Córrego de Feijão, em Brumadinho.
Ainda conforme a nota divulgada pela mineradora, apesar das interdições e elevação do nível de risco, ainda não é necessária a evacuação das populações das zonas de autossalvamento nestas dez novas barragens em risco.
"Os auditores externos reavaliaram todos os dados disponíveis das estruturas e novas interpretações foram consideradas em suas análises para determinação dos fatores de segurança, com a adoção de novos modelos constitutivos e parâmetros de resistência mais conservadores. Para assegurar a estabilidade das estruturas, diante dos novos parâmetros e seguindo as orientações do poder público, em especial da Agência Nacional de Mineração (ANM), a Vale está trabalhando com seus técnicos e especialistas de renome mundial em investigações complementares para garantir que o modelo utilizado pelos auditores externos está adequado e já está planejando medidas de reforço para o incremento dos fatores de segurança destas estruturas", alega a empresa.
No texto divulgado, a Vale chega a afirmar que a perda dos documentos que garantem operação e a consequente elevação do nível de risco das 17 estruturas "não agrava seu fator de segurança, nem altera a projeção de vendas de minério de ferro e pelotas entre 307 e 332 milhões de toneladas".
Após tranquilizar seus investidores com a informação de que o volume de vendas da empresa não será afetado, a Vale então reiterou que a sua prioridade "é com a segurança de todas as suas estruturas e, consequentemente, da população e trabalhadores a jusante. A produção dessas localidades somente será retomada quando a segurança das estruturas estiver assegurada".
Dezoito cidades, incluindo a capital mineira, sete rodovias, seis cursos d’água e um bom pedaço da mata atlântica. Tudo isso pode sofrer impactos caso as barragens Forquilha I e III, em Ouro Preto, região Central de Minas, e B3/B4, em Macacos, distrito de Nova Lima, na Grande BH, se rompam. As estruturas, de propriedade da Vale, tiveram o nível de risco elevado de 2 para 3, o patamar máximo, na noite de quarta-feira (27).
A possível chegada dos rejeitos ao rio das Velhas, em caso de colapso de qualquer uma delas, afetaria o abastecimento de água na região metropolitana. Outros municípios no entorno, banhados pelo afluente, também seriam afetados. Em fevereiro, os reservatórios haviam sido classificados pela Agência Nacional de Mineração (ANM) como de baixo risco.
Porém, na avaliação de Marcus Vinícius Polignano, coordenador do Projeto Manuelzão e presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, o cenário é “catastrófico” e, caso a ruptura aconteça, áreas de preservação da mata atlântica serão devastadas tanto em Nova Lima quanto em Ouro Preto.
O ambientalista também destaca o desabastecimento de água de 60% dos moradores de BH atendidos pelo Velhas, além de outras cidades. “Já não contamos mais com o rio Paraopeba (atingido pelos rejeitos de Brumadinho). Nunca imaginei que chegaríamos a uma situação tão crítica e absurda como esta”, lamenta.
Em caso de rompimento das três estruturas em Macacos e Ouro Preto, a lama de rejeitos poderá atingir os ribeirões; Mata Porcos e Macacos, os rios Itabirito e das Velhas e o córrego dos Fechos. Áreas de florestas e de preservação permanente também serão afetadas
Rodovias
A ruptura de Forquilha I, conforme o documento, também afetaria a MG-010, na Grande BH. Já um desastre em Forquilha III se estenderia por 111 quilômetros de áreas com potencial para alagamentos.
No caso da barragem em Macacos, além da área que as autoridades consideram não ter tempo suficiente para o resgate em caso de tragédia, os rejeitos também atingiriam os vilarejos de Honório Bicalho e Santa Rita, em Nova Lima, e os municípios de Raposos e Rio Acima.
A contaminação do rio das Velhas seria justamente nesse último município, no leito antes da Usina de Bela Fama, ponto de captação da água que abastece a metrópole.
Falhas
Professora do curso de engenharia civil das Faculdades Kennedy, Rafaela Baldí acredita que os recorrentes casos de elevação do nível de alerta sobre as barragens demonstram falhas de gestão. “Não é normal uma estrutura apontada como estável estar caindo de uma hora para outra. Isso evidencia que não houve boa gestão de segurança”, diz.
Para Carlos Barreira Martinez, do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Itajubá, é necessário que o Estado dialogue com as mineradoras, auditorias independentes e poder judiciário para amenizar os problemas da emissão de laudos de estabilidade de barragens e evacuações de comunidades. “É preciso sentar e conversar para se chegar a uma solução. O Estado precisa da mineração economicamente. Mas as empresas devem operar respeitando as leis e a população”, frisa o professor.
Conforme Martinez, apontar o processo de descomissionamento das barragens como única alternativa é uma falha. “Não é como demolir uma casa. Pode haver interferência e gerar um rompimento do reservatório”, alerta.
A Agência Nacional de Mineração (ANM) e a Vale foram procuradas pela reportagem, mas não se manifestaram sobre o assunto. O governo de Minas não se posicionou sobre a possibilidade de uma conversa com mineradoras e auditorias.

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