Vale perde
declaração de estabilidade de dez novas barragens; 17 estruturas estão sob
risco em Minas
José Vítor Camilo
Entre as 17 barragens interditadas, duas estão no complexo Vargem
Grande, em Nova Lima
O número de barragens
da Vale em Minas Gerais interditadas por conta da elevação do risco de
rompimento subiu de sete para 17 nesta segunda-feira (01). A própria
mineradora divulgou nesta segunda-feira (1º) que as Declarações de Controle de
Estabilidade (DCE) - documento que garante a manutenção das operações - de
outras dez estruturas venceram levando à elevação ao nível 1 de emergência
nestas estruturas. Dntre todas as estruturas sob risco, sete delas estão em
Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Entre as represas
que não conseguiram ter o documento renovado, estão as sete que tiveram o nível
de emergência elevados e onde já ocorreram evacuações nas Zonas de Auto
Salvamento (ZAS), sendo elas: Sul Superior, da mina Gongo Soco, em Barão de
Cocais (nível 3); B3/B4, da mina Mar Azul, em Macacos (nível 3); Forquilha I
(nível 3), II (nível 2) e III (nível 3) e barragem Grupo (nível 2), todas na
mina Fábrica, em Ouro Preto; e a barragem Vargem Grande, do Complexo Vargem
Grande, em Nova Lima (nível 2).
Agora, ainda de
acordo com a Vale, a não obtenção dos DCEs ocasionou a elevação para o nível de
emergência 1 em outras dez estruturas. Confira a lista das dez novas barragens
que foram interditadas:
- Dique Auxiliar da
Barragem 5, da Mina de Águas Claras, na divisa de BH e Nova Lima
- Dique B e barragem
Capitão do Mato, da mina de Capitão do Mato, em Nova Lima
- Barragem
Maravilhas II, do complexo de Vargem Grande, em Nova Lima
- Dique Taquaras, da
mina de Mar Azul, em Macacos (Nova Lima)
- Barragem Marés II,
do complexo de Fábrica, em Ouro Preto
- Barragem Campo
Grande, da mina de Alegria, em Mariana
- Barragem Doutor,
da mina de Timbopeba, em Ouro Preto
- Dique 02 do
sistema de barragens de Pontal, do complexo de Itabira
- Barragem VI,
da mina do Córrego de Feijão, em Brumadinho.
Ainda conforme a
nota divulgada pela mineradora, apesar das interdições e elevação do nível de
risco, ainda não é necessária a evacuação das populações das zonas de
autossalvamento nestas dez novas barragens em risco.
"Os auditores
externos reavaliaram todos os dados disponíveis das estruturas e novas
interpretações foram consideradas em suas análises para determinação dos
fatores de segurança, com a adoção de novos modelos constitutivos e parâmetros
de resistência mais conservadores. Para assegurar a estabilidade das
estruturas, diante dos novos parâmetros e seguindo as orientações do poder
público, em especial da Agência Nacional de Mineração (ANM), a Vale está
trabalhando com seus técnicos e especialistas de renome mundial em
investigações complementares para garantir que o modelo utilizado pelos
auditores externos está adequado e já está planejando medidas de reforço para o
incremento dos fatores de segurança destas estruturas", alega a empresa.
No texto divulgado,
a Vale chega a afirmar que a perda dos documentos que garantem operação e a
consequente elevação do nível de risco das 17 estruturas "não agrava seu
fator de segurança, nem altera a projeção de vendas de minério de ferro e
pelotas entre 307 e 332 milhões de toneladas".
Após tranquilizar
seus investidores com a informação de que o volume de vendas da empresa
não será afetado, a Vale então reiterou que a sua prioridade "é com a
segurança de todas as suas estruturas e, consequentemente, da população e
trabalhadores a jusante. A produção dessas localidades somente será retomada
quando a segurança das estruturas estiver assegurada".
Dezoito cidades,
incluindo a capital mineira, sete rodovias, seis cursos d’água e um bom pedaço
da mata atlântica. Tudo isso pode sofrer impactos caso as barragens Forquilha I
e III, em Ouro Preto, região Central de Minas, e B3/B4, em Macacos, distrito de
Nova Lima, na Grande BH, se rompam. As estruturas, de propriedade da Vale,
tiveram o nível de risco elevado de 2 para 3, o patamar máximo, na noite de
quarta-feira (27).
A possível chegada
dos rejeitos ao rio das Velhas, em caso de colapso de qualquer uma delas,
afetaria o abastecimento de água na região metropolitana. Outros municípios no
entorno, banhados pelo afluente, também seriam afetados. Em fevereiro, os
reservatórios haviam sido classificados pela Agência Nacional de Mineração
(ANM) como de baixo risco.
Porém, na avaliação
de Marcus Vinícius Polignano, coordenador do Projeto Manuelzão e presidente do
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, o cenário é “catastrófico” e,
caso a ruptura aconteça, áreas de preservação da mata atlântica serão
devastadas tanto em Nova Lima quanto em Ouro Preto.
O ambientalista
também destaca o desabastecimento de água de 60% dos moradores de BH atendidos
pelo Velhas, além de outras cidades. “Já não contamos mais com o rio Paraopeba
(atingido pelos rejeitos de Brumadinho). Nunca imaginei que chegaríamos a uma
situação tão crítica e absurda como esta”, lamenta.
Em caso de
rompimento das três estruturas em Macacos e Ouro Preto, a lama de rejeitos poderá
atingir os ribeirões; Mata Porcos e Macacos, os rios Itabirito e das Velhas e o
córrego dos Fechos. Áreas de florestas e de preservação permanente também serão
afetadas
Rodovias
A ruptura de
Forquilha I, conforme o documento, também afetaria a MG-010, na Grande BH. Já
um desastre em Forquilha III se estenderia por 111 quilômetros de áreas com
potencial para alagamentos.
No caso da barragem
em Macacos, além da área que as autoridades consideram não ter tempo suficiente
para o resgate em caso de tragédia, os rejeitos também atingiriam os vilarejos
de Honório Bicalho e Santa Rita, em Nova Lima, e os municípios de Raposos e Rio
Acima.
A contaminação do
rio das Velhas seria justamente nesse último município, no leito antes da Usina
de Bela Fama, ponto de captação da água que abastece a metrópole.
Falhas
Professora do curso
de engenharia civil das Faculdades Kennedy, Rafaela Baldí acredita que os
recorrentes casos de elevação do nível de alerta sobre as barragens demonstram
falhas de gestão. “Não é normal uma estrutura apontada como estável estar
caindo de uma hora para outra. Isso evidencia que não houve boa gestão de
segurança”, diz.
Para Carlos Barreira
Martinez, do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de
Itajubá, é necessário que o Estado dialogue com as mineradoras, auditorias
independentes e poder judiciário para amenizar os problemas da emissão de
laudos de estabilidade de barragens e evacuações de comunidades. “É preciso
sentar e conversar para se chegar a uma solução. O Estado precisa da mineração
economicamente. Mas as empresas devem operar respeitando as leis e a
população”, frisa o professor.
Conforme Martinez,
apontar o processo de descomissionamento das barragens como única alternativa é
uma falha. “Não é como demolir uma casa. Pode haver interferência e gerar um
rompimento do reservatório”, alerta.
A Agência Nacional
de Mineração (ANM) e a Vale foram procuradas pela reportagem, mas não se
manifestaram sobre o assunto. O governo de Minas não se posicionou sobre a
possibilidade de uma conversa com mineradoras e auditorias.
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