Para cada cem
servidores públicos do Estado na ativa, existem 128 inativos
Tatiana Moraes
Projeto de reforma da Previdência que está no Congresso vai influenciar
o regime do funcionalismo público mineiro
A implantação da
reforma da Previdência, proposta pelo governo federal, pode dar fôlego ao caixa
do Estado. Com a imposição da idade mínima para se aposentar e o aumento da
contribuição dos servidores, a expectativa é a de que, ao longo dos anos,
aumente o número de pessoas na ativa e reduza o de aposentados e pensionistas.
Hoje, para cada 100 funcionários trabalhando na máquina púbica estadual, existem
128,7 recebendo o benefício.
O estudo é da
pesquisadora Vilma da Conceição, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre)/
Fundação Getúlio Vargas (FGV). De acordo com o levantamento, Minas Gerais é o
segundo pior estado na relação entre beneficiários e contribuintes do país, com
índice de dependência de 128,7%. Em primeiro lugar está o Rio Grande do Sul,
com razão de 167%. Significa que para cada 100 pessoas trabalhando no governo,
167,2 recebem aposentadoria ou pensão.
Sem a reforma,
conforme Vilma, haverá aceleração do resultado, piorando cada vez mais o quadro
em Minas. Hoje, o Estado conta com 198.945 servidores ativos e 256.031
aposentados e pensionistas. Como reflexo, o gasto com a Previdência tem
aumentado ano a ano. Em 2010, era de R$ 6,1 bilhões. Em 2018, saltou para R$ 16
bilhões, elevação de 162%.
Os números são
insustentáveis, afirma a pesquisadora. “Se a quantidade de beneficiários é
maior do que a de contribuintes, tudo indica que o sistema entrará em colapso.
Ele não se sustenta”.
Ela destaca, ainda,
que a implantação da idade mínima para aposentadoria (62 anos para mulheres e
65 para homens) vai inverter a razão entre contribuintes e beneficiários.
Hoje é aplicada a
fórmula 86/96 para que o direito seja concedido. Mulheres podem se aposentar
com o teto de R$ 5.839,45, desde que o tempo de contribuição mais a idade somem
86 anos. Para os homens, o número é 96. Se o novo texto passar, haverá idade mínima.
Ou seja, as pessoas vão trabalhar por mais tempo e, consequentemente, pagarão
mais.
A pesquisadora
pondera que a proposta de aumento da contribuição dos servidores é outro ponto
que pode ajudar no caixa dos estados, mas não é suficiente para resolver o
problema.
Hoje, os servidores
colaboram com 11% do salário. Se o texto da Proposta de Emenda Constitucional
(PEC) 6/2019 for aprovado, a contribuição mensal dos empregados da máquina
pública poderá chegar a 16,79%. Em contrapartida, o piso também sofrerá
alterações. Nesse caso, para baixo. “Quem ganha menos, vai contribuir com
menos. A colaboração para um salário mínimo, por exemplo, será de 7,5%”, diz
Vilma.
A proposta também
prevê que o índice poderá subir para 14% para todos, caso haja déficits financeiros
atuariais. Ou seja, se estudos mostrarem que o sistema pode falhar, levando em
consideração o cenário atual, a contribuição pode aumentar.
“Hoje, se
observarmos receita e despesa, temos déficit. Mas, se a gente trabalha com
projeções demográficas e espera um boom demográfico, esse déficit vai
sumir. Se trouxermos o cálculo ao valor presente do pagamento de inativos, o
sistema tem que ser equilibrado”, explica.
Solução financeira
ignora impacto social, sobretudo para idosos
mbora o caixa do
governo possa ganhar um reforço com a reforma previdenciária, especialistas
afirmam que faltam estudos que mostrem os impactos sociais da aplicação do novo
texto. A redução do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos que
não têm como se sustentar nem possuem família, é um dos pontos polêmicos. A
ideia é passar o valor de R$ 998 para R$ 400. Sem verba, dizem especialistas,
essas pessoas tendem a sobrecarregar o sistema de saúde e a viver da
“caridade”.
Hoje, por exemplo,
maiores de 65 anos sem família têm direito ao BPC de um salário mínimo. A
Proposta de Emenda Constitucional(PEC) 6/2019 prevê redução no valor, mas
estende o prazo. Se as novas regras forem aprovadas, os idosos que comprovarem
a necessidade poderão usufruir do direito dos 60 aos 69 anos.
O problema é que
quem usa o BPC diz que o valor de R$ 998 já é insuficiente, e que os R$ 400 não
dariam para cobrir as despesas, pois idosos demandam mais gastos com remédios e
plano de saúde.
Com insuficiência
renal crônica, a aposentada Eurides Maria de Jesus, de 84 anos, está na UTI há
alguns dias. O tratamento só foi possível porque a família que ela adotou há
muitas décadas assumiu os custos.
“O valor (do BPC) é
irrisório, não dá para nada. Ela mora conosco e não precisa pagar aluguel, uma
pessoa para ajudá-la, plano de saúde, essas coisas. E, mesmo assim, o valor é
insuficiente. Imagina se fossem R$ 400?”, critica a neta adotiva de dona
Eurides, Marcela Leite.
O presidente do
Instituto de Educação Previdenciária (Ieprev), Roberto Carvalho, afirma que uma
reforma é necessária, mas destaca que o texto, como foi apresentado, vai
prejudicar o contribuinte.
“As pessoas não vão
se aposentar. E, quando aposentarem, vão receber pouco. O texto é similar ao
que foi aplicado no Chile em 1981, quando o país era governado pelo ditador
Augusto Pinochet”, diz.
No país vizinho, 936
pessoas maiores de 70 anos se suicidaram entre 2010 e 2015, conforme o Estudo
Estatísticas Vitais, realizado pelo Ministério da Saúde, em parceria com o
Instituto Nacional de Estatística (INE). O país ocupa o primeiro lugar no
ranking de suicídios na América Latina.
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