Desdobramento
da “Lava Jato” leva vice-governador Antonio Andrade de Minas Gerais e mais 15 à
cadeia
Lucas Simões
Em um desdobramento
da operação “Lava Jato”, a Polícia Federal prendeu ontem 16 pessoas, entre elas
o empresário Joesley Batista, o vice-governador de Minas Gerais Antonio Andrade
(MDB) e o deputado estadual João Magalhães (MDB). Eles são investigados em um
suposto esquema de corrupção no Ministério da Agricultura, entre 2013 e
2015. Todas as prisões são temporárias, ou seja, com validade de apenas
cinco dias, mas a Polícia Federal informou que vai pedir a prisão preventiva de
todos os acusados.
Segundo a denúncia,
o ex-deputado federal Eduardo Cunha, que cumpre pena em Curitiba (PR) no âmbito
da “Lava Jato”, seria o principal intermediário do esquema junto com Joesley
Batista. Cunha teria recebido R$ 30 milhões do empresário para iniciar um
processo de aprovação de medidas ilícitas junto ao Ministério da Agricultura,
que beneficiassem a J&F Investimentos, incluindo a JBS, principalmente em
relação à concorrência na exportação de carnes.
Nesse contexto,
parte da propina de R$ 30 milhões foi usada por Cunha para custear a própria
campanha à Presidência da Câmara dos Deputados, em 2014, da qual saiu
vitorioso. Outros R$ 15 milhões serviram para financiar a candidatura de
deputados estaduais e federais do MDB por Minas.
Segundo o delegado da Polícia Federal Mário Veloso, presidente do inquérito, o dinheiro para pagamento das propinas foi transportado pelos acusados “em malas de viagem e até mesmo em caixas de sabão em pó”.
Segundo o delegado da Polícia Federal Mário Veloso, presidente do inquérito, o dinheiro para pagamento das propinas foi transportado pelos acusados “em malas de viagem e até mesmo em caixas de sabão em pó”.
De acordo com a PF,
o vice-governador Antonio Andrade teria recebido R$ 15 milhões por intermédio
do deputado estadual João Magalhães (MDB), também preso ontem no bojo da
Operação Capitu.
O objetivo era
repartir o dinheiro para financiar as candidaturas do MDB nas eleições de 2014.
Além disso, a PF ainda apura o envolvimento de parlamentares mineiros que
teriam recebido propina.
Para favorecer a
JBS, uma das propinas recebidas por Antonio Andrade, de R$ 3 milhões, teve o
objetivo de proibir o medicamento ivermectina, usado no combate de parasitas de
longa duração em gado bovino, após reclamações de empresários americanos sobre
a qualidade da carne exportada ao país pela JBS. A mudança, que revogou a
circular nº279/2004, foi feita pelo então secretário de Defesa Agropecuária,
Rodrigo Figueiredo, a pedido de Andrade.
Em nota, a
assessoria de Andrade se limitou a dizer que “haverá manifestação tão logo a
defesa tome conhecimento do conteúdo do inquérito” e reforçou que “Antônio
Andrade respondeu tudo o que lhe foi perguntado e colaborou com o trabalho da
Polícia Federal”.
Já na gestão de Neri
Geller à frente do Ministério da Agricultura, deputado federal eleito pelo PP
do Mato Grosso, foram pagos R$ 5 milhões para impedir que frigoríficos de menor
porte exportassem despojos — partes de carnes bovinas não consumidas no Brasil,
mas com forte mercado consumidor na Ásia. A medida foi uma das mais benéficas
para a JBS, segundo a Polícia Federal.
Em outra frente da
investigação, o vice-prefeito de João Pessoa, Manoel Junior (MDB), é acusado de
receber R$ 50 mil em propinas para manipular a Medida Provisória (MP) 653/2014
em favor da JBS, quando ainda era deputado federal. Apesar de dispor sobre
regulações para o setor farmacêutico, a MP recebeu uma cláusula fora do objetivo
regulatório, que obrigava as inspeções frigoríficas a serem realizadas apenas
pelo Ministério da Agricultura, beneficiando a JBS.
Investigação aponta
doações ilegais a campanhas eleitorais
Para maquiar a
origem das propinas recebidas no suposto esquema no Ministério da Agricultura,
seis empresas de advocacia de Belo Horizonte eram usadas para gerar notas frias
em cima do recebimento do dinheiro.
Em relação aos R$ 30
milhões que teriam sido entregues a Eduardo Cunha, a investigação revela que os
escritórios de advocacia forjaram notas fiscais frias de serviços nunca
prestados, justamente para “dar contornos de legalidade ao dinheiro”, segundo o
delegado Mário Veloso, presidente do inquérito.
Além disso, as
investigações apontam que o Supermercado BH e o Supermercado MG colaboraram com
doações de pelo menos R$ 9 milhões ilegais a campanhas políticas. Apesar disso,
a PF não soube precisar qual a vantagem que os frigoríficos tiravam desse
suposto esquema.
Em outra frente para
maquiar as propinas, os supermercados compravam produtos da JBS, mas ao invés
de pagar ao frigorífico, repassavam apenas parte do dinheiro ao intermediário
João Magalhães (MDB), conseguindo uma espécie de “desconto financeiro”.
“Havia uma
simulação. As empresas de supermercado compravam das frigoríficas. Mas as redes
não faziam o pagamento devido aos frigoríficos. Só que os frigoríficos davam a
quitação. O problema é que o dinheiro saía da rede de supermercados para os
agentes políticos”, disse o delegado.
Um dos acusados,
sócio do Supermercado BH, está em viagem ao Uruguai, mas negocia com a PF para
se entregar. Em nota, a assessoria do Supermercados BH informou que o
cumprimento dos mandados deu-se de maneira tranquila e em ambiente de
cooperação. “Não foi possível conhecer a integralidade dos autos dos pedidos de
medidas cautelares que determinaram tais diligências”, diz. A rede afirmou
ainda que irá contribuir com as investigações. A assessoria do Supermercado MG
não se manifestou.
Para o delegado
Veloso, há indícios de que houve irregularidades na campanha de 2014 com apoio
das redes alimentícias. “As doações eleitorais (em 2014) foram feitas por
supermercados. É como se fosse uma doação legal, à época, empresas podiam doar.
Mas a origem desse dinheiro não é lícita”, disse o delegado. Outra investigação
da PF vai apurar se houve caixa dois no âmbito do esquema de corrupção.
Segundo a Polícia
Federal, o esquema de corrupção no Ministério da Agricultura começou a ser
desmontado após três empresários da JBS, Joesley Batista, Ricardo Saud e
Demilton de Castro, tentarem atrapalhar as investigações e confundir a polícia.
“Houve ocultação de parte do material probatório e destruição de provas do
arquivo da empresa. Percebemos que havia uma tentativa de conduzir a
investigação”, disse Veloso.
A desembargadora
federal Mônica Sifuentes, relatora do inquérito, informou que, ainda em 2015,
“foi possível tomar conhecimento da possível eliminação de documentos ocorrida
na sede da J&F”.
A reportagem não
obteve retorno de Neri Geller e João Magalhães e não conseguiu o contato de
nenhum representante de Eduardo Cunha.
O advogado da JBS, Pierpaolo Bottini, espera que as prisões de Joesley, Ricardo Saud e Demilton de Castro sejam revogadas assim que os fatos forem esclarecidos. “A investigação só existe porque os executivos da J&F colaboraram com a Justiça”.
O advogado da JBS, Pierpaolo Bottini, espera que as prisões de Joesley, Ricardo Saud e Demilton de Castro sejam revogadas assim que os fatos forem esclarecidos. “A investigação só existe porque os executivos da J&F colaboraram com a Justiça”.
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