Alemanha
devolve à Namíbia restos mortais de tribos exterminadas
Agence France Presse
Em uma cerimônia
religiosa em Berlim, uma delegação namibiana liderada pela ministra da Cultura,
Katrina Hanse-Himarwa (à dir.), recebeu 19 crânios, ossos diversos e couro
cabeludo tomados pelas forças coloniais alemãs há mais de um século
A Alemanha entregou
nesta quarta-feira (29) à Namíbia os restos mortais de integrantes das tribos
Herero e Nama, exterminadas durante a época colonial, em um gesto de
reconciliação considerado insuficiente pelos descendentes, que esperam um
pedido de desculpas.
Em uma cerimônia
religiosa em Berlim, uma delegação namibiana liderada pela ministra da Cultura,
Katrina Hanse-Himarwa, recebeu 19 crânios, ossos diversos e couro cabeludo
tomados pelas forças coloniais alemãs há mais de um século.
A maior parte dos
restos mortais procede da coleção antropológica da clínica universitária
Charité, de Berlim.
Uma decisão que
irritou profundamente os representantes das duas etnias, vítimas do que os
historiadores consideram o primeiro genocídio do século XX.
Durante a cerimônia
de entrega, uma secretária de Estado para Relações Exteriores alemã, Michelle
Muentefering, pediu "perdão do fundo do coração".
O comportamento da
Alemanha é "surpreendente", denunciou Esther Utjiua Muinjangue,
presidente da fundação Ova Herero Genocide, para quem Berlim deveria aproveitar
a oportunidade para pedir desculpas oficialmente e assim "curar feridas
emocionais".
Muito por fazer
A Alemanha
"ainda tem muito por fazer" a respeito de seu passado colonial no
território africano (1884-1915), admitiu esta semana a secretária de Estado
para Política Cultural Internacional no ministério das Relações Exteriores,
Michelle Müntefering.
A cerimônia desta
quarta-feira (29) foi a terceira entrega de ossos, após eventos similares em
2011 e 2014, mas nenhum pedido de desculpas será apresentado, argumentou
Müntefering, por não tratar-se do âmbito adequado para isto.
O governo alemão
reconheceu a responsabilidade nos massacres e indicou em 2016 a previsão de um
pedido oficial de desculpas no âmbito de negociações com a Namíbia, que seguem
em curso.
"Reparações,
reconhecimento e desculpas são condições para a normalização das relações
diplomáticas entre Alemanha e Namíbia", recordou a ministra Katrina
Hanse-Mimrawa na segunda-feira (27).
Até hoje Berlim não
pagou indenizações, optando por compensações em forma de ajuda ao
desenvolvimento. A Alemanha afirma que investiu centenas de milhões de euros na
Namíbia desde sua independência da África do Sul em 1990.
A ajuda beneficia
todo o país, mas as únicas vítimas foram as tribos Herero, que representa 7% da
população namibiana (no início do século XX eram 4%) e os Nama. Seus
representantes iniciaram um processo judicial em Nova York para exigir
indenizações diretas aos descendentes das tribos.
Privados de suas
terras e do gado, os Herero se rebelaram em 1904 contra os colonos alemães, o
que deixou mais de 100 mortos entre estes últimos.
Enviado para sufocar
a rebelião, o general alemão Lothar von Trotha ordenou o extermínio. Os Nama
protagonizaram um levante um ano depois e tiveram o mesmo destino.
Ao menos 60.000
Herero e quase 10.000 Nama morreram entre 1904 e 1908. As forças coloniais da
Alemanha utilizaram técnicas genocidas: massacres em massa, deslocamentos
obrigatórios pelo deserto, onde milhares de homens, mulheres e criançass
morreram de sede, e campos de concentração como o de Shark Island.
Os ossos, em
particular os crânios das vítimas, foram enviados à Alemanha para experimentos
científicos de caráter racial. O médico Eugen Fischer, que trabalhou em Shark
Island e cujos textos influenciaram Adolf Hitler, queria provar a
"superioridade da raça branca".
O historiador
Christian Kopp, da ONG Sem Anistia para os Genocídios, exigiu a divulgação de
quantos ossos procedentes da Namíbia e de outras ex-colônias alemãs permanecem
no país.
"Não há nenhuma
transparência sobre o tema", disse à reportagem.
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