Juízes
federais aderem a paralisação por benefício que soma R$ 28,8 mi ao ano
Evaldo Magalhães
Juiz diz que greve
deve ser simbólica, sem prejuízos para a população
Juízes federais de
todo o país anunciaram, ontem, paralisação nacional da categoria em 15 de
março, em razão da decisão da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo
Tribunal Federal (STF), de levar ao plenário da Casa, no dia 22, a Ação
Ordinária n.º 1.773, que trata do recebimento do auxílio-moradia por esses
magistrados. A decisão de cruzar os braços foi tomada após consulta sobre o
assunto, nos últimos dias de fevereiro, a 1.300 juízes de Tribunais Federais
brasileiros – que, por 81% dos votos, optaram por aderir ao movimento.
Em Minas, mais de
50% dos cerca de 200 magistrados, segundo a Associação dos Juízes Federais do
Estado (Ajufemg), votaram a favor da paralisação.
Para a Associação
dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), que realizou a consulta, é “inaceitável”
que apenas o auxílio-moradia dado a seus associados seja colocado em questão
pela suprema corte do país, já que o mesmo benefício (R$4.377 por mês) é concedido
a categorias do serviço público nos três poderes, incluindo juízes estaduais e
integrantes do Ministério Público, deixados de fora do julgamento do dia 22.
A Ajufe defende que,
na avaliação a ser feita pelo STF, seja incluída a Ação Direta de Inconstitucionalidade
n.º 4.393, que trata da Lei dos “Fatos Funcionais da Magistratura do Estado do
Rio de Janeiro”. Com isso, seria definido o que pode e o que não pode ser pago
ao conjunto dos juízes, sem distinção de lotação, “de forma clara, transparente
e de acordo com os anseios de toda a população brasileira”. O resultado da
consulta, informou a Ajufe, por meio de nota, materializou “a indignação contra
o tratamento dispensado à Justiça Federal”.
Folha
O auxílio-moradia,
um dos benefícios a que diversas categorias de servidores públicos têm direito
– políticos, oficiais das Forças Armadas e das PMs, ministros, desembargadores,
juízes e promotores, entre outros – é amparado por lei e pago, no Brasil, há
pelo menos quatro anos.
No caso dos juízes
estaduais de Minas, o benefício ( R$ 4.377,73) foi pago, na folha de janeiro, a
cerca de mil dos 1.567 juízes e desembargadores. O valor total foi superior a
R$ 4,4 milhões, o que projetaria, para o ano, um gasto de mais de R$ 52,8
milhões. Esse volume de recursos anual seria suficiente para construir mais de
460 casas populares de dois quartos, padrão normal, avaliadas em R$ 115 mil
cada.
Já entre os cerca de
680 juízes federais que atuam em Minas, pouco mais de 550 receberam o
auxílio-moradia em janeiro. O montante destinado ao benefício na folha daquele
mês foi de R$ 2,4 milhões, projetando R$ 28,8 milhões ao longo de 12 meses.
Com esse dinheiro,
poderiam ser construídas 250 casas nas mesmas características do exemplo
anterior. Em janeiro, o rendimento líquido médio dos juízes estaduais, somando
outros auxílios como o refeição (R$ 844), além de pagamentos retroativos e
antecipação de férias, foi de R$ 47,3 mil. No caso dos federais, a média
líquida foi de R$ 37,1 mil.
Retaliação
Em documento
divulgado ontem, a Ajufe também sustenta que o questionamento do
auxílio-moradia exclusivamente de juízes federais tem relação direta com a
operação “Lava Jato”, na qual eles têm atuado nos últimos anos.
“A operação ‘Lava
Jato’ vem mudando a cultura brasileira em relação à corrupção, combatendo-a,
sem limites, o que está comprovado pela condenação de diversas autoridades
nacionais que ocuparam cargos expressivos”, sustenta a nota. “Assim, a forma
encontrada para punir a Justiça Federal foi atacar a remuneração dos seus
juízes”.
A categoria também
questiona a não aprovação de recomposição do subsídio dos juízes federais,
direito previsto na Constituição, cuja perda já atinge 40% do seu valor real, e
a “acelerada tramitação do projeto de alteração da lei de abuso de autoridade,
em total desvirtuamento das dez medidas contra a corrupção, projeto esse de
iniciativa popular”.
Desentendimento entre juízes federais e estaduais
Benefícios pagos a juízes estaduais e federais do país provocam polêmica cada vez maior, mas isso não faz com que as categorias estejam unidas para defender os alegados direitos. Nesta semana, duas entidades classistas de magistrados - a Ajufe e a Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis) - chegaram a se desentender publicamente por causa do julgamento de 22 de março, no STF.
A Ajufe divulgou
comunicado questionando a intenção da ministra Cármen Lúcia de cuidar apenas do
auxílio-moradia dos juízes dos tribunais federais, deixando de fora da pauta os
colegas estaduais. “Não basta apenas julgar as ações que tratam do auxílio-moradia,
que atingirão apenas os juízes federais, deixando sem resolução os diversos
pagamentos realizados no âmbito dos demais segmentos do Judiciário”, informou a
entidade.
Imediatamente, a
reação: a Amagis criticou, também por nota, a postura da Ajufe. “A Amagis
lamenta ver no movimento associativo, líder imprudente, irracional, cujos atos
ultrapassam o limite do suportável. Diferenças salariais sempre existiram,
mesmo entre os juízes estaduais e ainda existem, mas tais diferenças não
justificam que um segmento ataque o outro, num viés autofágico. Ao contrário, o
propósito sempre foi o de buscar as conquistas legais já obtidas pelos demais
segmentos”, opinou a organização.
Diante de
repercussões negativas do comunicado, que parecia indicar uma disputa entre as
duas entidades, a Amagis amenizou o tom. Em nova nota, endereçada ao Hoje em
Dia, afirmou que “não há clima de guerra entre os dois segmentos parceiros da
Justiça brasileira”.
“O presidente da
Amagis, desembargador Maurício Soares, reafirma o grande apreço que tem pelos
colegas federais e que apenas fez uma crítica pontual a uma ação do presidente
da Ajufe”, acrescentou a entidade, destacando, ainda, que seu comandante
representa somente os magistrados de Minas, e não fala, portanto, pelos juízes
estaduais de todo o país.
Processos
De acordo com o
presidente da Ajufemg e juiz da 9ª Vara Federal em Belo Horizonte, Murilo
Fernandes de Almeida, o movimento dele e dos colegas, a ser realizado por um
dia, dentro de duas semanas, será “simbólico” e não deve afetar o andamento de
processos na Justiça Federal, em Minas e no país.
“Nenhum juiz vai
deixar de atender os casos sob sua responsabilidade durante a paralisação, até
porque esse tipo de atitude não faz parte da característica de trabalho do
magistrado. Trabalhamos o tempo todo, mesmo em casa, nos finais de semana”,
afirma.
“O que estamos programando é um ato formal para demonstrar nossa insatisfação à sociedade, como se nos reuníssemos para dizer que não vamos aceitar passivamente um ataque exclusivo, como esse que está previsto para 22 de março”, acrescenta.
“O que estamos programando é um ato formal para demonstrar nossa insatisfação à sociedade, como se nos reuníssemos para dizer que não vamos aceitar passivamente um ataque exclusivo, como esse que está previsto para 22 de março”, acrescenta.
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