Direto da
Rússia, Temer de volta ao campo minado da política nacional
AFP
O presidente Michel
Temer retornou de uma viagem à Rússia e à Noruega, marcada por desencontros,
para pisar em um campo político minado, que poderia transformá-lo, esta semana,
no primeiro presidente do país denunciado formalmente por corrupção.
Seu contraparte
russo, Vladimir Putin, o deixou plantado no aeroporto de Moscou, e seus
contatos com empresários russos não se materializaram em nenhum contrato. Já em
Oslo, o governo norueguês anunciou um corte substancial em sua contribuição
para o Fundo da Amazônia, devido ao aumento do desmatamento na floresta ante o
avanço do agronegócio, e expressou sua preocupação com a corrupção no Brasil.
Uma realidade da
qual talvez Temer esperasse se distanciar em sua viagem, mas que o aguardava em
seu retorno ao Brasil.
Entre segunda e
terça-feira, o Procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deveria apresentar
uma ou mais denúncias contra Temer, no âmbito de sua investigação por
corrupção, obstrução da Justiça e organização criminosa.
Embora ainda se
desconheça a gravidade de seu conteúdo, Temer, com apenas 7% de popularidade,
terá que lidar com seu impacto judicial e com a ameaça de uma erosão ainda
maior de sua base governista.
Desde que, em meados
de maio, veio à tona a gravação feita por um dos donos da JBS, Joesley Batista,
em que parece dar seu aval ao pagamento de propina para silenciar o deputado
cassado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), o presidente foi saltando obstáculos: superou
um julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que poderia ter cancelado a
chapa que compôs com a presidente Dilma nas eleições de 2014 e conseguiu conter
a deserção de seu principal parceiro no governo, o PSDB. Mas durante sua
acidentada viagem, o principal argumento de sua defesa se esvaiu.
A Polícia Federal
concluiu na sexta-feira a perícia da gravação de Batista e concluiu que o áudio
não foi editado ou manipulado, como tinha denunciado o presidente.
Questão de números?
A Constituição prevê
que, quando um presidente é denunciado, dois terços dos deputados devem validar
a denúncia para que o Supremo Tribunal Federal (STF) possa processá-lo. Se isto
ocorrer, Temer se tornará formalmente réu e terá que se afastar do cargo por no
máximo 180 dias, enquanto a mais alta corte trata do caso.
Seria a segunda
crise de poder em pouco mais de um ano no Brasil, pois Temer, que foi vice de
Dilma, assumiu o cargo em maio de 2016, após o impeachment da presidente,
acusada de manipulação de contas públicas por causa das chamadas pedaladas
fiscais.
Este cenário parece
improvável atualmente, visto que Temer tem a maioria na Câmara.
Além disso, "há
muitos legisladores envolvidos em casos de corrupção e isto cria uma rede de
solidariedade", disse à AFP Sylvio Costa, diretor do portal político
Congresso em Foco.
"Estamos
vivendo uma situação parecida à de Dilma no início do processo de impeachment.
Temer não tem mais uma maioria sólida no Congresso, mas a oposição ainda não
tem a força suficiente para afastá-lo", acrescentou.
Mas "já não
basta saber se o presidente continua tendo força na Câmara (...), senão se seu
esforço cada vez maior para se manter no poder não prejudicará ainda mais o
país, inviabilizando as reformas que são a única razão de ser de seu
governo", escreveu no fim de semana Merval Pereira, colunista de O Globo.
Temer prometeu tirar
o país da pior recessão de sua história, através de uma série de reformas
impopulares de austeridade, mas a trabalhista e a previdenciária - desejadas
pelo mercado - estão travadas no Congresso desde que a crise eclodiu.
O papel do PSDB
O presidente se
apresenta como o único capaz de levar adiante a aprovação destas polêmicas
reformas e, apoiando-se na tímida recuperação econômica, promete terminar o
mandato no fim de 2018.
As eleições gerais,
previstas para outubro do ano que vem são, de fato, o fator que muitos parlamentares
e partidos têm em mente.
Se estar junto de
Temer é visto como um salva-vidas para boa parte da classe política suspeita de
corrupção, também pode ser tóxico para quem tem aspirações eleitorais. O
PSDB está neste dilema há semanas.
"Sem o apoio do
PSDB, a governabilidade deixa de existir. Isto é um fato, a solidez (do
governo) está comprometida", advertia no sábado o prefeito de São Paulo,
João Doria, um dos favoritos do partido para as presidenciais do ano que vem.
Mas as coisas
tampouco são evidentes para a oposição de esquerda, visto que o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) também está na mira da Justiça por
corrupção e poderia ser condenado à prisão em breve pelo juiz de primeira
instância Sérgio Moro.
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