Por quem os sinos dobram
Manoel Hygino
A frase se
celebrizou e Hemingway a transformou em título para um dos seus mais belos – e
densos – romances. “Por quem os sinos dobram”, levado ao cinema com sucesso.
Mas, o escritor Emanuel Medeiros Vieira, nascido em Santa Catarina e residente
em Salvador, explica: a frase teve berço em versos de John Donne.
Ouvindo sempre
“Hallelujah”, de Leonardo Cohen, ele dedica os três versos às crianças da
Síria: “nenhum homem é uma ilha isolada(...)/ por isso não perguntes por quem
os /sinos dobram: eles dobram por ti”.
A afirmação não se
perdeu no tempo, como uma infinidade de outras. Antigório, John Donne nasceu
em1572 e faleceu em 1631, séculos decorreram, mas os homens continuam matando
homens, não bastam aves e pássaros.
Para o autor
catarinense, “é a lógica da guerra, é a essência do poder: é justo matar os
inimigos. É injusto matar os nossos. É claro: não há mais tempo pra
ingenuidades. A estrutura que domina o mundo é poder, dinheiro, tráfico de
armas etc. E com a ascensão de grupos fundamentalistas, da extrema-direita, do
terrorismo em todo o mundo, essa perversa lógica mercadológica vai prevalecer”.
Emanuel pergunta e
nós fazemos coro: “Como continuar? Apenas palavras. Eu sei somente palavras. Ma
é o que me resta”. E elas não são senão o que o dicionário registra. “O velho
Shakespeare, que faleceu há quatrocentos anos e quase mais um, reclamava da sua
desimportância no meio de uma sociedade que quer apenas e quase sempre o poder:
palavras, palavras, palavras, repetia Hamlet”.
No raciocínio de
Medeiros Viana, a barbárie e a crueldade extrema, que são o uso de armas
químicas, não são fatos novos na história do mundo. Eu sei, é a
institucionalização da barbárie.
Sem concordar
inteiramente com o escritor, que julga “a ONU um fantoche dos interesses
imperialistas – de que lado for”, inclino-me à evidência: a organização não
consegue vencer a crueldade que existe. Esta parece intrínseca ao homem, que
não aprendeu a sentir os males horríveis que dissemina em torno de si e para
sempre.
É profundamente
triste tecer estas considerações em maio, mês das noivas, do Dia das Mães, das
celebrações cristãs nas igrejas e capelinhas do interior brasileiro, em que as
meninas, vestidas de belos trajes brancos, cantam à Virgem que gerou Jesus.
Enquanto acontecem
aqui cerimônias tão simples e belas, o mundo se engalfinha em graves embates
que deixam milhões de mortos, estigmatizados, órfãos, deserdados, multidões que
buscavam salvar-se em outros pedaços do planeta, perdendo a vida nas fronteiras
oceânicas, ou cercadas de arame farpado ou muros.
Não se permite que o
homem procure o caminho do bem-viver, da felicidade. As nações que detêm poder
não medem a sua própria indiferença em causas de males irremediáveis. Os
americanos foram perversos em muitas partes do mundo, inclusive com uso do
napalm no Vietnã para destruir aldeias, eliminado civis inocentes, embora
outros povos o fizeram antes e ainda fazem.
Repito Emanuel: “Por
quem os sinos dobram?” Dobram pelos refugiados – que a extrema-direita mundial
coloca como o primeiro inimigo. Só falta os fascistas proclamarem: “mate os
seus vizinhos”.
Por quem os sinos
dobram? Dobram por todas as crianças do mundo, abandonadas, órfãs, perdidas nos
oceanos, ignoradas pelo mundo. Dobram pelos humanistas “o uso de armas químicas
é proibido pela Convenção de Genebra desde 1925. Mas qual nação liga para dar
convenções?”.

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