A Veneza do Norte
Manoel Hygino
Os últimos
acontecimentos na Europa e no Oriente Médio atraem a atenção para a Rússia,
país de maior extensão do mundo. Mais de 10 mil quilômetros separam São
Petersburgo, no Oeste, de Petropavlosk, no extremo Leste. Soma acima de 17
milhões de quilômetros quadrados, em dois continentes – Europa e Ásia.
Mas ali, além de
cenário da maior experiência política do planeta no século passado, o é também
de obras literárias de grandes escritores dos séculos XVIII e XIX. Bastaria
lembrar Dostoievski, Tolstoi e Gogol. Em criações geniais, seus personagens
aparecem em antigas ruas e casas de Moscou e São Petersburgo, cujo metrô foi
palco de atentado terrorista, com mortos e muitos feridos, há poucos dias.
Meu pensamento casa
com o do historiador Morehead. Ele afirma, em um de seus livros, que talvez
tenha sido o brilho dos romancistas russos do século XIX que fixou a Rússia
czarista tão vivamente em nosso espírito. Pode ser também pela maneira
repentina e completa com que aquele mundo desapareceu, fazendo desabar toda a
vasta e complexa superestrutura de vida feudal criada pela monarquia russa
durante mil anos. E desapareceu para sempre, há exatamente um século, num
colapso até agora pouco rememorado e analisado.
Muito mudou. Até
agosto de 1014, quando a Rússia entrou em guerra com a Alemanha, a cidade era
São Petersburgo. Passou a Petrogrado, menos germânico.
Em 1924, os
bolchevistas transformaram–na em Leningrado. Recentemente, voltou ao original.
Mas a cidade se mantém como um dos pontos de maior interesse para turistas e
pesquisadores do planeta. A cidade de Pedro merece por tudo que é e contém: o
Teatro Mariinski, no qual bailarinas famosas dançavam – e dançam, o Lago dos
Cisnes, de Tchaikovsky. Chaliapin se apresentava no Narodny Dom. Em Semenovski,
sucediam as corridas de cavalos no campo de desfiles. Sem falar nas pinturas do
Hermitage, além das lojas e restaurantes chiques. Frequentemente comparava-se
São Petersburgo a Veneza.
Pedro, o Grande,
realizou a metamorfose, antecipando-se a JK, entre nós. Decidiu remover a nação
da herança eslava e lançá-la para a cultura da Europa Ocidental, construindo
uma nova cidade nos pântanos do rio Neva. O soberano queria que São Petersburgo
fosse uma janela para a Europa Ocidental. Milhões de toneladas de granito
vermelho foram transportadas para a região. Duzentos mil trabalhadores
pereceram de febre e desnutrição, mas Pedro já governou a partir daquela cidade
artificial no cimo do Mar Báltico.
Robert K. Massie
recorda-a erguida sobre água. Estendia-se através de nove ilhas, ligadas por
pontes arqueadas, rodeadas por canais sinuosos. O rio Neva enfeitava e enfeita.
Do lado Norte, a Fortaleza de Pedro e Paulo, encimada por um agudo pináculo
dourado, 150 metros acima da catedral fortificada.
Por quatro
quilômetros e meio, na margem Sul, estavam o palácio de Inverno, o Almirantado,
as embaixadas estrangeiras e os palacetes da nobreza. No tempo de Pedro, ali
estava tudo o que era elegante. A sociedade falava francês, não em russo, e os
melhores vestuários e mobílias eram encomendadas de Paris.
Chamada a Veneza do Norte, São Petersburgo revelava-se europeia. E guarda muito da velha tradição.
Chamada a Veneza do Norte, São Petersburgo revelava-se europeia. E guarda muito da velha tradição.

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