Brasileiros vão iniciar ano
endividados e sem perspectiva de reajuste salarial
Raul Mariano
Na avaliação de especialistas, o sufoco não será resolvido no curto
prazo
Se em 2016 a perda de renda e a inadimplência pesaram no bolso do
brasileiro, em 2017 o aperto financeiro tem tudo para continuar. Mais da metade
das famílias vai começar o próximo ano mergulhada em dívidas em um momento em
que a maioria dos reajustes salariais não superou sequer a inflação do período.
Como acréscimo ao bolo de débitos, chegam, junto a janeiro, as despesas
com o IPVA e o IPTU, cujo aumento será divulgado hoje pela Prefeitura de Belo
Horizonte.
E o aperto nas contas não para por aí. As mensalidades dos colégios
particulares devem subir pelo menos 14% em Minas, somadas aos materiais
escolares que já ficaram mais caros depois que o ICMS dos itens de papelaria saltou
de 12% para 18% no Estado.
Recomposição
Com um quadro econômico deteriorado, até mesmo setores tradicionalmente
fortes foram impedidos de oferecer recomposição salarial aos trabalhadores.
Os empregados do agronegócio da cana tiveram ajuste real de -1,1%, o que
significa perda salarial. No nicho de extração e refino do petróleo, a redução
foi de -2%, conforme levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
(Fipe).
O maior ganho real foi de 0,4% para o setor de cemitérios e agências
funerárias. Em seguida, somente os segmentos de confecções e vestuário (0,2%) e
bancário (0,2%) conseguiram recomposição salarial real.
Piora
Piora
Na avaliação de especialistas, o sufoco não será resolvido no curto
prazo. O diretor de economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Storfer, ressalta que o cenário
pode até se tornar mais crítico, com a possibilidade de aumento do desemprego.
“Vamos chegar a índices que ainda não conhecemos. Estatisticamente, vai
haver muita gente desistindo de procurar trabalho, o que vai acabar não
entrando nas estatísticas. Então a realidade vai ser bem pior. Aqueles que
conseguiram reajustes acima da inflação têm que ficar atentos porque essas
empresas podem olhar para o mercado e perceber que há mão de obra barata
disponível, motivando demissões”, explica.
No acumulado dos últimos 12 meses, terminados em outubro, cerca de 1,5
milhão de postos de trabalho foram fechados no país segundo dados do Cadastro
Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
A indústria da transformação lidera o ranking de demissões com 416 mil
vagas a menos. Em seguida, o setor de serviços registra quase 400 mil vagas a
menos no mesmo período.
Pessimismo domina expectativas para 2017
Diante da imprevisibilidade do cenário político ainda em crise, o
pessimismo sobre as melhorias salariais para 2017 é o maior consenso entre
sindicatos. Tanto que algumas categorias já se anteciparam e fecharam acordos
neste ano incluindo a recomposição de 2017, sem nenhum aumento real na renda.
“O desemprego atingirá o ápice em março, com 12,7%, mas essa projeção
pode ser pior, uma vez que os dados fracos de atividade podem atrasar ainda
mais a retomada da economia. Além disso, a crise política alimenta a crise
econômica, fazendo com que a recuperação seja mais lenta do que a esperada, o
que também atrasa a retomada do emprego”
Everton Carneiro - Analista econômico da RC Consultores
Em 2016, ano em que a taxa de desemprego alcançou os dois dígitos pela
primeira vez na série histórica iniciada em 2012 da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (Pnad), a parcela de reajustes abaixo da inflação atingiu
50% das negociações no acumulado do ano até outubro, de acordo com dados da
Fipe.
Achatamento
Achatamento
Em 2016, até mesmo os bancários, que têm um sindicato forte, tiveram os
salários achatados pela primeira vez desde 2004, sem nem mesmo conseguir repor
a inflação.
Após 31 dias de greve, no início de outubro, a categoria aceitou a
proposta de reajuste de 8% nos vencimentos em 2016. Neste período, o Índice
Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que é o indicador de inflação usado
como base para os reajustes salariais, alcançou 9,2%.
“Desde 2004, tínhamos reposição salarial e reajuste real. A campanha de
2016 foi a mais difícil que eu já enfrentei na minha vida de sindicalista. E,
em 2017, esse cenário ruim vai se intensificar, porque a recessão deve
continuar, assim como a crise política e institucional. E, no nosso caso, ainda
tem a questão tecnológica”, observa o presidente da Confederação Nacional de
Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-Cut), Roberto Von der Osten.
PIB Ruim
A expectativa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos (Dieese) também não é boa. “O mais certo é que a economia não
se recupere em 2017. E, mesmo que o PIB cresça 1%, será sobre uma base
deprimida. E ainda tem toda incerteza em relação ao governo, o que pode
deteriorar esse quadro. Assim, é difícil imaginar reajustes acima da inflação
em 2017”, afirmou José Silvestre, diretor de relações sindicais da instituição.
Agência Estado
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