Na fila de espera
Manoel Hygino
Ao estrangeiro causará estranheza o noticiário da imprensa sobre
acontecimentos registrados no Brasil. Os espaços destinados aos registros
políticos se confundem com os dos fatos policiais. Impressiona realmente, mesmo
aos patrícios já acostumados com as mazelas da administração pública.
Diante dos inúmeros crimes (disse, inúmeros, sem quantidade exata,
imensurável?, e não numerosos, isto é, de grande número) descritos em minúcias
pelos veículos de comunicação, envolvendo integrantes dos altos escalões do
poder, em seus três níveis. Fica-se quase perplexo: como conseguiram seus
autores chegar a tal ponto de degradação, devassidão e delinquência sem que se
tomassem em tempo hábil providências impeditivas?
Têm os chefes de Executivo de tomar extremo cuidado quando acolhem
auxiliares. Esses podem já estar nas malhas de Justiça ou terem passado por
elas, não ter ficha limpa, responder a processos ou estar à sua beira, porque
investigados pela Polícia Federal, pela Civil, pela Promotoria Pública, enfim
por quantos organismos agem em nome da lei.
Eduardo Cunha prometera que, se fosse preso, não cairia sozinho.
Brasília incrementou em suas farmácias a venda de calmantes. Se ninguém está
efetivamente acima e além da lei, e forem efetivamente denunciados ou
delatados, tremerão as paredes dos edifícios projetados por Niemeyer. A bela
igreja, ali erguida, inspirada nas antevisões de Dom João Bosco, estão
certamente a receber fiéis e infiéis em busca da remissão dos pecados.
Verdade verdadeira e irrefutável é que as listas dos futuros ocupantes
das celas da PF são enormes, firmadas por gente do mais alto gabarito na vida
política, econômica e social do país inventado por Cabral. Pode até chegar o
instante em que as autoridades judiciárias e policiais darão o aviso: não há
vagas.
Conta-se, em todas as grandes capitais brasileiras, que se está criando um sorteio com atos prêmios: quem será o próximo a ser julgado pelo destemido juiz Sérgio Moro?
Conta-se, em todas as grandes capitais brasileiras, que se está criando um sorteio com atos prêmios: quem será o próximo a ser julgado pelo destemido juiz Sérgio Moro?
Da relação fatídica consta um preferencial, que nos remete a velho e
aplaudido cantor de músicas com letras doridas de amor na primeira metade do
século passado. Refiro-me a Augusto Calheiros, que encantava e suscitava
lágrimas dos ouvintes de discos de 78 rotações ou rádios na época.
O Calheiros de agora é mais pomposo: José Renan Vasconcelos Calheiros,
que consagrado magistrado mineiro identificou como “reformista constitucional,
especialista em fatiamentos”. Segundo o Estadão, trata-se de um político
profissional, em toda a extensão pejorativa do termo.
As manchetes de grandes jornais no dia seguinte à prisão de Cunha eram
enfáticas: “Governo e Congresso temem delação”; “Lava Jato prende Cunha e
amedronta mundo político”; “Prisão acende o alerta do Planalto”; “Cunha preso,
aliados tensos”; “Prisão deixa a República de cabelos em pé”.
O “Estado de S. Paulo” via Renan: são 12 inquéritos junto ao STF, nove
dos quais relativos à Lava Jato; em 7 de junho último, o procurador-geral da
República chegou a pedir-lhe a prisão, assim como de Sarney, Cunha e Jucá, sob
acusação de tentar obstruir os trabalhos da operação. Conclui o editorial: “O
alagoano é um devoto das sombras e evita desafiar abertamente o governo –
qualquer governo”.
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