A pobreza andarilha
Paulo Haddad
Está se tornando urgente que o governo federal tome uma série de medidas
de grande intensidade para reativar a economia brasileira. Quando uma economia
em recessão demora a ser reanimada, aumenta-se o risco de que se instale um
processo de depressão econômica. Enquanto a recessão se caracteriza por dois ou
mais períodos de crescimento econômico negativo, uma fase de declínio típica
dos ciclos das economias capitalistas, a depressão apresenta impactos
econômicos, sociais e psicológicos mais dramáticos.
A depressão econômica se caracteriza por um longo período em que se
observa um número inusitado de falências de empresas, crescimento alarmante do
desemprego, generalização da falta de confiança sobre o futuro da economia e do
próprio país, desestruturação das economias e das condições psicossociais das
unidades familiares. Foi o que se viu na crise de 1929 em escala mundial ou na
Grande Crise Financeira de 2008 em escala de algumas nações, até mesmo
desenvolvidas. Para alguns analistas, como os da Goldman Sachs, se os grandes
desequilíbrios macroeconômicos continuarem se acumulando no Brasil, o que se
iniciou como uma recessão em 2014 pode se transformar numa depressão econômica
já em 2017.
É importante observar como acontece a distribuição de renda numa
economia em processo de transição de uma recessão para uma depressão econômica.
No caso brasileiro, entre 2015 e 2016, as famílias de renda mais alta (acima de
20 mil reais por mês) obtiveram uma melhoria de 6 por cento, as de renda mais
baixa (800 reais por mês), uma pequena alta de 1,5 por cento, e as classes
médias, perdas significativas de até 4,5 por cento (renda familiar mensal de
4.800 reais). O que explica, na faixa de cima, a multiplicação da riqueza
financeira acumulada num ambiente econômico altamente especulativo. E, na faixa
de baixo, a persistência das políticas sociais compensatórias.
Igualmente importante é analisar o que vem ocorrendo com aqueles que nem
mesmo aparecem nas pesquisas de distribuição da renda familiar, aqueles que,
segundo um cientista político, não são encontrados pelos agentes do Censo,
pelos funcionários da receita tributária e da Previdência Social ou pelos
partidos de esquerda. São os sem teto, sem renda, sem riqueza e sem
oportunidades num regime de pobreza absoluta que alguns denominam pobreza
asiática ou africana e que prefiro denominar pobreza andarilha, pois lembram a
imagem de indivíduos perambulando nos grandes centros urbanos do país.
Solitários ou em grupos, vivem desalentados padecendo o mal-estar da miséria
social.
Ora, quando a crise econômica se aprofunda e avança sobre as condições
sociais das famílias com consequentes perdas de renda, de patrimônio e de
esperança, não há como negar que o número de pobres andarilhos possa crescer
geometricamente nas metrópoles e em suas áreas periféricas.
No Brasil, a dimensão cruel desse drama social tem, felizmente, dois fatores de amortecimento. De um lado, estão as políticas sociais compensatórias previstas na Constituição de 1988, do outro lado, os movimentos sociais de solidariedade humana.
No Brasil, a dimensão cruel desse drama social tem, felizmente, dois fatores de amortecimento. De um lado, estão as políticas sociais compensatórias previstas na Constituição de 1988, do outro lado, os movimentos sociais de solidariedade humana.
Em médio e longo prazos, o Brasil precisa encontrar sua trajetória de
crescimento sustentado e inclusivo, pois, a persistir na estagnação econômica,
entre suas sequelas estará a de se minar a capacidade de financiamento público
das políticas sociais compensatórias. Nesse caso, cresce a necessidade
redistributiva da solidariedade humana, pois o pouco dos que têm muito acaba
por representar muito para os que têm pouco.

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