A tragédia da Guiana
Manoel Hygino
Há alguns anos, saiu publicado o meu livro “Sangue em Jonestown: uma
tragédia na Guiana”, em que se descreviam os últimos acontecimentos sobre Jim
Jones, que se intitulava pastor e líder de uma seita que levou ao suicídio
centenas de pessoas nas selvas da Guiana. Jones residiu em Belo Horizonte,
retornou à pátria – os Estados Unidos – e, dali, cuidou de erguer na América do
Sul o Templo do Povo, congregando em torno de si centenas de prosélitos.
Em Jonestown, as pessoas supunham terem tudo e viverem felizes. Jim
Jones, dominado por drogas e ideias alucinadas, dizia-se enviado de um outro
planeta. Planejou e conduziu a um suicídio coletivo, no qual se sacrificaram
921 fiéis, número não exato como se desejaria. Não foi, como se constatou, um
autoextermínio propositalmente dito. Houve uma indução ao gesto trágico. Jones,
em sermão, chegou a afirmar: “Eu sou um eleito e vim à Terra, irmãos, para
trazer a esperança. Quando morrermos todos, eu os levarei de volta...”. O corpo
de Jones, depois de tudo, foi encontrado com um tiro na cabeça.
Passados tantos anos (meu trabalho é de 1979), a Guiana me desperta
atenção com o relato dramático das agências internacionais. Localizada no
litoral Norte da América do Sul, é um país pequeno com uma população
diversificada de pouco mais de 750 mil habitantes, com a maior taxa
proporcional de suicídio no mundo. A Organização Mundial de Saúde avalia que
44,2 em cada 100 mil pessoas se matam na ex-colônia britânica anualmente,
enquanto no Brasil o índice é de 5,8 pessoas por 100 mil.
Bibi Ahamada, vice-presidente da filial guianense da ONU “La Voz Del
Caribe”, sediada em Nova York, é claro: “O suicídio é um grande tabu aqui”.
William Adu-Krow, representante da Organização Pan-Americana de Saúde e da OMS,
acrescenta: ninguém sabe o número exato de suicídios. Além disso, acredito que
esse número seja subestimado. Por causa do estigma que envolve o suicídio, o
paciente que tenta tirar a própria vida não diz que tomou veneno, por exemplo,
mas – quando chega ao hospital – fala que se sentiu mal e não mais consegue
respirar”.
Vê-se que a Guiana vive uma tragédia coletiva, maior do que a de Jim
Jones, nos anos 1970. Neste triste episódio, as vítimas eram de
norte-americanos, influenciados pela pregação do líder da seita. Agora, elas são
guianenses, principalmente jovens, com idade entre 15 e 24 anos, segundo o
Ministério da Saúde Pública. Uma das causas: não têm com quem falar sobre seus
problemas e muita dificuldade em confiar em alguém.
A atual miss Guiana, Lisa Punch, que em 2012 fundou a ONG Prevention
(POTS, na sigla em Inglês), voltada para adolescentes suicidas, fez campanha
para aumentar o número de conselheiros nas escolas.
“O governo está enviando conselheiros para várias escolas, mas não o
suficiente. (...) Seria melhor que cada escola tivesse um”, defende ela. “Os
jovens precisam de alguém em quem possam confiar, com quem possam conversar,
alguém em que diga que tudo está bem, que algumas crises podem ser parte do
processo de envelhecimento, porque às vezes você acha que é a única pessoa que
passa por algo do tipo”.
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