segunda-feira, 23 de maio de 2016

A HISTÓRIA DE ESPERAR O BOLO CRESCER PARA DISTRIBUIR - NÃO DEU CERTO E NEM VAI DAR



Os paradoxos das desigualdades sociais

Paulo Haddad  



As relações entre o processo de crescimento econômico e o processo de distribuição da renda e da riqueza ao longo do tempo são de natureza paradoxal. No Brasil, houve diversos períodos históricos em que essas relações se manifestaram através de configurações bastante diferenciadas das quais puderam ser extraídas muitas lições e paradigmas.

No início dos anos 1970, como resultado das reformas de base, concebidas e implementadas na gestão econômica Campos-Bulhões (reformas econômicas e institucionais), o país vivenciou praticamente uma década de crescimento econômico acelerado (com taxas superiores à da China no século XXI), mas igualmente de profunda concentração da renda que era gerada. Os frutos do crescimento se concentraram de forma generalizada entre indivíduos, famílias e grupos sociais heterogêneos, assim como entre Estados e Regiões.

A grande lição desse período histórico é a de que a compatibilidade entre o crescimento econômico e o desenvolvimento social não se processa espontaneamente pelas forças dos mercados. O desenvolvimento social não se apresentou como um subproduto cronológico do crescimento econômico, pois os efeitos genuínos do crescimento econômico estão estruturalmente vinculados aos imperativos da acumulação e à lógica da diferenciação social.

Para atenuar essas mazelas, na elaboração da Constituição de 1988 deu-se particular ênfase política à formulação dos direitos sociais do cidadão brasileiro, muitos dos quais se desdobraram nas conhecidas políticas sociais compensatórias que foram implementadas a partir dos anos 1990 e consolidadas nos primeiros anos do atual século. Os resultados foram surpreendentemente positivos: reduziram-se de forma expressiva os números de brasileiros pobres e miseráveis. Uma redução que se deve também à introdução da dimensão distributiva em outras políticas públicas (política salarial, subsídios e incentivos fiscais, promoção da agricultura familiar, etc.).

Assim, aprendemos que a desigualdade não tende a tornar-se necessariamente mais aguda quanto mais rápida seja a expansão econômica. A partir de uma ideologia política igualitária é mais flexível para o poder público manipular parcela expressiva do excedente econômico para favorecer soluções para os problemas econômicos e sociais dos segmentos mais pobres da população.

Para compreender a questão crucial das desigualdades, é preciso examinar todos os aspectos da sociedade, em sua realidade atual e como evoluíram ao longo do tempo. Não se pode segmentar e isolar um objetivo de desenvolvimento da sociedade e buscar instrumentos econômicos e mecanismos institucionais para atingi-lo, sem considerar a sua interdependência com os demais objetivos. Veja, por exemplo, a experiência de ajuste fiscal dos últimos anos.

Apesar da redução da pobreza e da miséria no Brasil a partir de 1990, o nosso país ainda se destaca pela intensa concentração de renda. O grupo formado pelos 10 por cento mais ricos recebe 68 vezes o que recebe os 10 por cento mais pobres. Essa relação é extremamente superior à do Japão (4,23) à da França (9,1), à dos EE.UU. (15,57), etc. Ora, o ajuste fiscal que vem sendo adotado, ao elevar a taxa de juros, ao aumentar o desemprego e ao reduzir a capacidade de financiamento das políticas sociais compensatórias torna-se implicitamente uma política pública que aumenta as desigualdades.


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