sexta-feira, 1 de abril de 2016

PEDALADAS FISCAIS SÃO EMPRÉSTIMOS PROIBIDOS



Manobra ou crime?

Marcelo Coelho  





Prefeitos já perderam o mandato por atos muito menos graves que os de Dilma Rousseff. "Há casos de chorar", disse a advogada Janaina Paschoal, expondo na comissão do impeachment o seu pedido de afastamento da atual presidente.
Mesmo que um prefeito tire dinheiro da merenda escolar para pagar a gasolina da ambulância, considera-se que cometeu crime de responsabilidade fiscal, pois falhou no planejamento das finanças do seu município.
"Não é questão de elite ou não elite", prosseguia a advogada. Imagine-se a família pobre que conta colocar um filho na faculdade, confiando nas promessas do governo de que há fundos para a educação, e se percebe lograda porque o suposto superavit das contas públicas não existia.
Jovem, com os cabelos pretos que pareciam recém-saídos do chuveiro, Janaina Paschoal procurou responder a questões que não se resumem ao puro juridiquês. "Fez-se agitação política", reclamou um deputado governista.
O empenho de Paschoal, bem-sucedido, foi enfatizar que as famosas "pedaladas fiscais", ou os decretos determinando gastos sem autorização do Legislativo, não consistiram em tecnicalidades, capazes de escandalizar apenas os especialistas em finanças.
Quando Dilma recorreu a tais expedientes, disse a advogada, estava procurando transmitir (em ano eleitoral) uma ideia falsa à população: a de que o governo dispunha de recursos para cumprir as promessas de campanha.
Manobra ou crime? Crime, insistiu Miguel Reale Jr., que, como Janaina Paschoal, é autor do pedido de impeachment. Não se pense, disseram os dois advogados, que infrações à Lei de Responsabilidade Fiscal são coisas de natureza meramente político-administrativa.
Certo, essa lei de 2000 proíbe o Executivo de tomar empréstimos junto a entidades como o BNDES. Proíbe que se deixe para bancos públicos, como a Caixa Econômica, o peso de pagar do próprio bolso as despesas do governo, deixando para acertar as contas depois (são as pedaladas). Proíbe que se façam gastos suplementares sem aprovação do Congresso.
Muito vermelho, Miguel Reale Jr. não se contentou em invocar a Lei de Responsabilidade. Acontece que a Câmara, depois de aprová-la, mudou o próprio Código Penal. Passou a considerar crime comum fazer aquilo que a Lei de Responsabilidade proíbe. Fez mais, adaptando à nova norma a própria lei de 1950 que prevê os casos de impeachment.
Ou seja, os comportamentos citados no pedido estão claramente definidos, pelo próprio Legislativo, como criminosos e passíveis de impeachment. Negando importância a essas leis, a Câmara "viola a si mesma", exclamou Reale Jr.
Dois pontos que vêm sendo levantados contra o impeachment também foram discutidos. O primeiro é que a Lei de Responsabilidade Fiscal só valeria para governadores e prefeitos, não para o presidente. O segundo é que, como as contas de Dilma Rousseff em 2014 e 2015 ainda não foram julgadas pelo plenário, não haveria como abrir um processo de impeachment.
Paschoal e Reale Jr. contestaram esses argumentos. O artigo 38 da Lei de Responsabilidade, por exemplo, fala explicitamente em "prefeito, governador e presidente". Quanto ao relatório do Tribunal de Contas da União, ainda não votado na Câmara, o que importa é que descreve uma série de fatos. E esses fatos, diz Janaina, se enquadram "direitinho" nos crimes previstos pela lei.
Para que nada fique tão claro assim, vieram em seguida as perguntas do relator da Comissão, Jovair Arantes (PTB-GO). Foram muito técnicas e imparciais.
Quando foi que o Executivo contrariou a lei, perguntou Arantes: quando emitiu decretos determinando gastos sem ciência do Congresso, ou quando estes gastos foram efetivamente feitos? Um projeto do Executivo propondo alteração nas metas orçamentárias pode ser considerado indício de má gestão antes de ser convertido em lei?
Jovair Arantes ouviu as respostas sem fazer comentário. A coisa estava ficando técnica de novo; outros deputados da Comissão se encarregaram de voltar ao bate-boca e –no fim– ao empurra-empurra que se conhecem.

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