Paulo Haddad
Quando se intervém na economia de
forma intensa visando a atingir um objetivo meritório, é preciso estar
prevenido sobre a possibilidade de se provocar grandes perdas e danos sociais.
Muitas vezes, os custos sociais da intervenção podem ser inesperados ou
imprevistos. Mas, na maioria das vezes, esses podem ser previsíveis e estimados
quantitativamente através de modelos de projeção. Como é o caso do ajuste
fiscal que está sendo implementado no Brasil dentro de uma arquitetura
analítica amplamente conhecida por experiências históricas realizadas em
diversos países, inclusive no Brasil num passado recente.
É evidente que se o ajuste é
bem-sucedido, os benefícios sociais são imensos. A economia ganha maior
estabilidade. Elimina-se o imposto inflacionário que deteriora o poder de
compra dos assalariados. Cria-se um ambiente de confiança entre consumidores e
empresários que pode estimular a expansão da demanda agregada e reativar a
economia. O campo de oportunidades para a população pode se ampliar. Mas nem
sempre isto acontece. Nesse ca</CW>so, prevalecem os custos sociais do
ajuste malsucedido.
Destaca-se, em primeiro lugar, a
elevação da taxa de desemprego que, no caso brasileiro, já se aproxima de dez
milhões de trabalhadores que estavam inseridos nos mercados formais urbanos.
Esse número tende a crescer à medida que a recessão deve se aprofundar pelo
menos até o primeiro semestre do ano que vem. Quem já viveu a experiência de
ruptura de suas condições gerais de vida ao ser desempregado conhece a eventual
realidade de ocorrer uma desestruturação da sua família, a perda da sua
autoestima, o estresse psíquico e emocional e, principalmente, o desalento em
relação à construção de projetos futuros.
Em segundo lugar, destaca-se a questão
das desigualdades sociais. Estudos do IPEA com base em dados das declarações do
imposto de renda das pessoas físicas entre 2008 e 2014 mostram que somos uma
das sociedades mais desiguais do mundo. Os números são evidentes: 0,3% dos
declarantes concentra 14% da renda total do Brasil e 22,7% de toda a riqueza
declarada em bens e ativos financeiros. Trata-se do topo da pirâmide social com
apenas 71.440 pessoas ou 0,05% da população economicamente ativa.
Grande parte dessa concentração de
renda e de riqueza é resultante da intervenção de políticas públicas concebidas
e implementadas num contexto histórico em que prevalece uma concentração de
poder político. Nesse contexto, segmentos não organizados e mais empobrecidos
da sociedade civil muitas vezes não encontram espaço de expressão, de
interlocução e de participação para viabilizar programas e projetos de
interesse coletivo. E a desigualdade enfraquece a demanda agregada e a retomada
do crescimento da economia ao reduzir relativamente a renda daqueles que têm
maior propensão a consumir.
O principal custo social, entretanto,
é o desbalanceamento entre benefícios incertos e improváveis a serem realizados
num futuro indefinido pela austeridade fiscal e a dura realidade, concreta e
efetiva, dos custos sociais do desemprego e das desigualdades em expansão.
Nessa trajetória, um ajuste que produz somente custos para a sociedade leva o
governo federal a se tornar um semeador de incertezas econômicas, de tensões
políticas e de dramas sociais.

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