Luciano Luppi
Não sei ao certo o que muitos artistas
fazem em tempos de crise. Quando falo em crise, não estou generalizando, apenas
me referindo aos períodos em que a atividade econômica se reduz e os ganhos
financeiros diminuem. Penso que todos esses momentos difíceis não passam de
oportunidades, dependendo de como deitamos nosso olhar sobre o fato.
Oportunidades para muitas coisas interessantes e necessárias ao ato de criar.
Nunca pesquisei, mas converso com um
colega aqui, outro colega ali e chego à conclusão de que muitos artistas, assim
como eu, aproveitam essas ocasiões para colocar a casa em ordem. É o momento de
criar, de refletir, de organizar o seu espaço de trabalho, de jogar fora aquilo
que só estava atrapalhando a criação, de conversar mais com pessoas ricas em
ideias e valores, momento para ponderar, refazer algo que sempre deixamos de
lado por preguiça ou falta de tempo. Aliás, é o tempo de ter tempo, de viver
sem aquele corre-corre desenfreado, de evitar o estresse, de recusar algumas
tarefas desagradáveis que sempre fazíamos para não aborrecer alguém, é o tempo
de semear.
A vida de artista é tão cheia de altos
e baixos, de projetos, de experiências (as que deram certo e as que deram
errado), de ensaios, de tentativas, de glória e de fracasso, que não faz muita
diferença passar uma temporada em estado de hibernação, em repouso, permitindo
que o ócio produza mais criatividade. Depois, quando a situação melhorar e nos
chamar para uma fase de mais ação, quando convocados para uma temporada de
execução, teremos algumas obras ou ideias mais elaboradas nos servindo de base
para uma nova produção artística.
A vantagem dessa situação de
ociosidade é que a nossa mente pode se esvaziar por alguns instantes, livre de
preocupações e paradigmas a serem seguidos, e permitir que as ideias apareçam,
limpas, sem estarem contaminadas pela razão e pelo ego. Nem sempre precisamos
do ócio para criar, pois existem inúmeras outras maneiras para isso, mas a
inércia também faz parte do processo e é natural como os ciclos da vida.
Fiquei sabendo que a palavra “crise”,
em japonês, tem dois significados básicos, são eles: perigo e oportunidade. É
muito interessante, pois o que acontece nesses momentos pode nos levar para um
lado ou para outro. Se ficarmos arrancando os cabelos, debatendo-nos como
loucos, amaldiçoando tudo e todos, corremos o perigo de perdermos o nosso foco,
o nosso objetivo e dificultar a nossa vida mais ainda. Mas se aquietarmos,
esvaziarmos nossa mente, aceitarmos os desafios como dádivas e como aprendizes
de um novo caminhar, perceberemos que a motivação sempre esteve presente,
guardada e protegida num canto de nossa alma, junto à nossa natureza e
essência.
O jeito japonês de resolver as crises
A palavra crise 危機 (lê-se Kiki) em japonês, possui dois
significados básicos, são eles: situação difícil e oportunidade. Levando
em conta que a linguagem tem uma forte influência na cultura de um povo, tal
antagonismo gramatical exerce grande poder na forma como um indivíduo - bem
como uma organização - enfrenta as dificuldades. Prova disso é a forma como o
Japão encarou (e vem encarando) suas crises ao longo dos séculos, sobretudo
aquelas vividas no período pós-guerra.
Para os japoneses, não importa quão difíceis sejam seus problemas. O
segredo para sobrepujá-los não reside, necessariamente, na tentativa de mudar
determinada situação, mas sim, em mudar a si mesmo. Quando você muda a si
mesmo, tudo em sua volta muda também. E, foi exatamente o que eles fizeram
depois da amarga e frustrante derrota para os americanos na segunda guerra
mundial. Passaram a investir rigorosamente na educação, sem perder suas origens
culturais. Essa inovação alavancou o país do caos pós-guerra, elevando-o a
patamares inimagináveis não só na economia, mas também no índice de
desenvolvimento humano.
Os que optam pelo significado negativo da palavra crise, costumam,
quando enfrentam as dificuldades, culpar os outros; repetir os mesmos erros;
achar que fracassará sempre. Ficam limitados pelos erros passados e acabam
achando que eles (e não a situação) são os verdadeiros fracassos.
Já os que encaram a crise como oportunidades procuram assumir suas
responsabilidades e aprendem com cada erro cometido. Sabem que a crise faz
parte do progresso e procuram sempre manter uma atitude positiva. Gostam de
desafiar as suposições antigas e conservadoras e, assumem novos riscos,
quebrando todos os paradigmas tradicionais e ultrapassados. Aqueles que vencem
as crises veem a dificuldade como algo temporário, mantêm expectativas
realistas e acima de tudo, se concentram nos pontos fortes.
Outra grande lição ensinada pelo povo japonês quando deparado por uma
crise, é mudar os meios, para modificar os fins. Ou seja, parar de insistir na
tática errada, mesmo tendo a estratégia certa. Sobre isso, Albert Einstein
dizia: “se você sempre faz o que sempre fez, então vai sempre alcançar o que
sempre alcançou”. Para que isso não aconteça, é necessário quebrar antigos
paradigmas, abandonar o que não serve e, claro, inovar, inovar e inovar.
Ter uma mentalidade positiva diante de uma crise, também é outro fator
importante, porque ele põe o medo para correr. O medo, além de ser o mau uso da
imaginação, é também uma energia altamente prejudicial ante uma crise, pois ela
paralisa e congela quem fica à deriva no centro nervoso de uma situação
crítica.
Outra praga, também combatida por aqueles que vencem as crises é a
procrastinação. O hábito de adiar as coisas e deixar sempre para amanhã o que
se pode fazer hoje, é sem dúvida, o fator que mais contribui para morrer no
campo de batalha. Os juros cobrados pela danada da crise são elevadíssimos e
suas conseqüências são mortais. Não há misericórdia nem compaixão para aqueles
que procrastinam em meio a uma crise.
Recentemente o Brasil passou por uma reforma gramatical consistente.
Foram modificadas diversas regras e palavras do nosso vocabulário, entretanto,
a palavra crise continuou tendo o mesmo significado. Porém, nada impede que
você e eu alteremos seu significado, procurando dar uma nova concepção para a
crise, buscando sempre uma solução para superar os momentos difíceis.

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