quinta-feira, 8 de maio de 2014

FÁBULA



FÁBULA

As fábulas (do latim fabula, significando “história, jogo, narrativa”, literalmente “o que é dito”) são uma aglomeração de composições literárias em que os personagens são animais que apresentam características humanas, tais como a fala, os costumes, etc. Estas histórias terminam com um ensinamento moral de caráter instrutivo. É um gênero muito versátil, pois permite diversas maneiras de se abordar determinado assunto. As Fábulas naturalmente têm como descrição animais como personagens e no seu final apresenta um ensinamento,  ou seja a MORAL.
O Leão e o Rato

Depois que o Leão desistiu de comer o rato porque o rato estava com espinho no pé (ou por desprezo, dá no mesmo), e, posteriormente, o rato, tendo encontrado o Leão envolvido numa rede de caça, roeu a rede e salvou o Leão (por gratidão ou mineirice,  já que tinha que continuar a viver na mesma floresta), os dois, rato e Leão, passaram a andar sempre juntos, para estranheza dos outros habitantes da floresta (e das fábulas). E como os tempos são tão duros nas florestas quanto nas cidades, e como a poluição já devastou até mesmo as mais virgens das matas, eis que os dois encontraram, em certo momento, sem ter comido durante vários dias. Disse o Leão:
- Nem um boi. Nem ao menos uma paca. Nem sequer uma lebre. Nem mesmo uma borboleta, como hors-d’oeuvres de uma futura refeição…
Caiu estatelado no chão, irado ao mais fundo de sua alma leonina. E, do chão onde estava, lançou um olhar ao rato que o fez estremecer até a medula. “A amizade resistiria à fome? – pensou ele. E, sem ousar responder à própria pergunta, esgueirou-se pé ante pé e sumiu da frente do amigo (?) faminto. Sumiu durante muito tempo. Quando voltou, o Leão passeava em círculos, deitando fogo pelas narinas, com ódio da humanidade. Mas o rato vinha com algo capaz de aplacar a fome do ditador das selvas: um enorme pedaço de queijo Gorgonzola que ninguém jamais poderá explicar onde conseguiu (fábulas!). O Leão, ao ver o queijo, embora não fosse um animal queijífero, lambeu os beiços e exclamou:
- Maravilhoso, amigo, maravilhoso! Você é uma das sete maravilhas! Comamos, comamos! Mas, antes, vamos repartir o queijo com equanimidade. E como tenho receio de não resistir à minha natural prepotência, e sendo ao mesmo tempo um democrata nato e confirmado, deixo a você a tarefa ingrata de controlar o queijo com seus próprios e famélicos instintos. Vamos, divida você, meu irmão! A parte do rato para o rato; para o Leão, a parte do Leão.
A expressão ainda não existia naquela época, mas o rato percebeu que ela passaria a ter uma validade que os tempos não mais apagariam. E dividiu o queijo como o Leão queria: uma parte do rato, outra parte do Leão. Isto é: deu o queijo todo ao Leão e ficou apenas com os buracos. O Leão segurou com as patas o queijo todo e abocanhou um pedaço enorme, não sem antes elogiar o rato pelo seu alto critério.
- Muito bem, meu amigo. Isso é que se chama partilha. Isso é que se chama justiça. Quando eu voltar ao poder, entregarei sempre a você a partilha dos bens que me couberem no litígio com os súditos. Você é um verdadeiro e egrégio meritíssimo! Não vai se arrepender!
E o ratinho morto de fome, riu o riso menos amarelo que podia, e ainda lambeu o ar para o Leão pensar que lambia os buracos do queijo. E enquanto lambia o ar, gritava, no mais forte que podiam seus fracos pulmões: 

- Longa vida ao Rei! Longa vida ao Rei! Leão!

MORAL: Os ratos são iguaizinhos aos homens. O Leão é o Político e o Rato o Povo.

Qualquer semelhança com a situação atual é mera coincidência.

 Do Livro: 100 Fábulas de Millôr Fernandes

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