segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

PRIVATIZAÇÕES NO GOVERNO LULA VÃO OCORRER OU NÃO?

 

São Sebastião e Itajaí
Aprovação para desestatização de portos reacende discussão sobre privatizações no governo Lula
Por
Luisa Purchio – Gazeta do Povo


A aprovação da desestatização do Porto de São Sebastião pelo TCU coloca nas mãos do Ministério de Portos e Aeroportos a decisão de prosseguir com os trâmites| Foto: Divulgação/Porto de São Sebastião

Cerca de dois meses após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência, o Tribunal de Contas da União fez um movimento importante sobre as privatizações no país: autorizou a desestatização dos portos de São Sebastião, no litoral norte do estado de São Paulo, e de Itajaí, em Santa Catarina. A autoridade fez modificações nas propostas como a exclusão do edital da previsão de cobrança de verba de fiscalização e de uma conta vinculada para recebimento de receitas advindas da venda dos portos, bem como estabeleceu a necessidade de elaboração de estudos concorrenciais atualizados.

Neste início do governo Lula, o encaminhamento pelo TCU é simbólico e passa para as mãos do governo federal a decisão de dar seguimento à agenda de desestatização de portos conduzida pelo governo Bolsonaro. Apesar de o presidente Lula se posicionar de maneira contundente contra privatização e desestatização e revogá-las em grandes ativos estatais como a Petrobras, os Correios e a Empresa Brasil de Comunicações (EBC), o entendimento tanto do próprio governo quanto de especialistas do setor é que o ramo dos portos deve ser encarado de maneira diferente.

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Em entrevistas, o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, tem deixado claro que há espaço para concessões de determinados serviços portuários, posicionamento que foi reforçado em resposta oficial à Gazeta do Povo. “Todos os processos serão analisados pela atual administração, mesmo aqueles que já tiveram o aval do Tribunal de Contas da União (TCU). Nos portos públicos poderão ser concedidos serviços importantes, como dragagem, sinalização e a operação dos próprios terminais, como já vem sendo feito há anos”, disse a assessoria especial de comunicação do Ministério de Portos e Aeroportos. A pasta enfatizou, porém, que “os comandos das autoridades portuárias não serão exercidos por empresas, ou mesmo estatais de outros países”.

Para Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho, diretor da Casa das Garças, que já participou de mais de 40 privatizações, entre elas como coordenador deste processo na Telebrás, o governo Lula será “tão pragmático quanto as necessidades que se mostrarem”. Para a análise, ele considera que foi em 2011, no governo Dilma, por exemplo, que se iniciou a privatização dos aeroportos no país. “Vejo com grande preocupação o discurso político de fortalecimento do estado na gestão das empresas, mas somos ao mesmo tempo surpreendidos por um certo pragmatismo que foi uma característica passada do governo Lula. Foi um governo que criou a legislação das Parcerias Público Privadas e privatizou, mesmo que em um modelo ruim”, diz ele.

Portos no estado de São Paulo
O Porto de São Sebastião é administrado pela Companhia Docas de São Sebastião (CDSS), do governo do estado de São Paulo, por meio de um contrato de delegação com vencimento em 2032 e podendo ser prorrogável por mais 25 anos. De acordo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil), “a intenção do governo local é trabalhar na desestatização do Porto, a partir de diálogos com o Governo Federal.”

Para Sérgio de Aquino, presidente da Federação Nacional das Operações Portuárias (Fenop), “há uma probabilidade muito grande de que esse processo de desestatização de portos continue porque o governo do estado, que detém a delegação, defende essa tese”. Vale destacar que o caso do Porto de São Sebastião é diferente do Porto de Itajaí, uma vez que o município, que possui a delegação do porto, é contra a desestatização.

Informações da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) apontam que o processo licitatório da concessão do Porto de São Sebastião prevê contrato de 25 anos, a um valor de R$ 237,4 milhões e investimentos de R$ 3,26 milhões. A expectativa é de capacidade de 56 milhões toneladas em 2060, um crescimento médio anual de 0,3% ao ano. Já o valor de outorga mínimo proposto é de R$ 33,3 milhões, a ser pago em parcela única.

Após as mudanças estipuladas pelo TCU, no entanto, a Antaq aguarda os ajustes do Ministério de Portos e Aeroportos para definir os editais e abrir a licitação. “O ministro estava ponderando os dois lados e não sabemos ainda se as desestatizações das companhias Docas vão continuar. O fato de ter essa movimentação do TCU acaba trazendo o assunto”, diz Patricia Gravina, chefe da Assessoria Especial de Concessões da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

A avaliação de Gravina é que a decisão do TCU em relação a desestatização dos dois portos pode impactar nas decisões do Tribunal sobre o Porto de Santos, que aguarda o posicionamento do órgão após pedidos de vista de ministros no final do ano passado. “Provavelmente essas decisões que ocorreram nesses dois portos devem repercutir no Porto de Santos, mas não podemos descartar mudanças, já que o Porto de Santos tem características ímpares”, diz Gravina.

A Antaq aprovou o processo de concessão pública do Porto de Santos, considerado o maior da América Latina, em setembro do ano passado, com prazo estipulado de 35 anos e possibilidade de prorrogação por mais cinco anos. A previsão foi de R$ 6,3 bilhões em novos investimentos, sendo R$ 2,1 bilhões para infraestrutura portuária e R$ 4,2 bilhões para a elaboração de um túnel de interligação entre Santos e Guarujá.

Diálogo entre Tarcísio de Freitas e Lula
A recente aproximação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do partido Republicanos, com o presidente Lula, do rival PT, na tragédia causada pelas chuvas em São Sebastião é vista como positiva para o andamento das pautas de interesse do estado. Apesar de os dois já terem dialogado em quatro encontros formais, as manifestações públicas com direito à abraço e palavras cordiais intensifica a expectativa do surgimento de acordos.

“Essa parceria que estamos fazendo aqui é uma fotografia boa para o nosso país”, disse Lula ao lado de Tarcísio em São Sebastião. “Sei com qual partido o Tarcísio disputou as eleições. Veja que coisa bonita e simples, nós estamos juntos. Acabou a eleição, ele tem a obrigação de governar o estado de São Paulo, e eu tenho governar o país”.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas: aproximação pública devido às chuvas em São Sebastião| Rovena Rosa/Agência Brasil

Por trás dessa harmonia está o secretário de Governo de Tarcísio, Gilberto Kassab, do PSD, partido que detém três ministérios de Lula. Braço direito de Tarcísio, Kassab já é visto como quem de fato está governando o estado e sua intensa capacidade de articulação política deve facilitar o andamento de pautas conjuntas com o governo federal, como o Porto de Santos.

Além do porto, o governo de São Paulo está discutindo a criação de um fundo para a construção de um túnel que ligue as cidades de Santos e Guarujá. No começo do ano, o ministro Márcio França indicou a possibilidade de que recursos da Santos Port Authority, administradora do Porto, possam financiar as obras junto com o governo federal, estimadas em R$ 3 bilhões.

“Eu encontrei com o Kassab, combinei para conversar com Tarcísio, e quem sabe fôssemos a Santos mostrar definição, seria muito bom para o Brasil mostrar que podemos caminhar juntos independente de posições ideológicas quando interesse público está se sobrepondo”, disse França na época em entrevista à CBN São Paulo. “É possível ser feito com o recursos da docas e do governo federal”, disse ele, não descartando a ajuda dos governos estaduais e municipais.

Em reunião realizada na semana passada entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com sete governadores, o chefe do executivo de São Paulo apresentou pautas como a concessão do Porto de Santos e a construção do túnel entre Santos e Guarujá, além de mais verbas para saúde, renegociação de passivos de hospitais com bancos federais e investimentos em trens e metrôs.

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Modelo internacional alternativo à desestatização de portos
Na análise de Sérgio de Aquino, presidente da Fenop, o Brasil precisaria realizar uma alteração na legislação, de maneira que possa implementar de maneira mais eficiente o modelo privado de propriedade pública com o formato chamado Landlord. Trata-se de uma modalidade na qual o poder público é dono da área portuária, cuida da administração e dos serviços portuários, enquanto a iniciativa privada arrenda áreas, implanta terminais e opera cargas.

“A nossa legislação não segue este modelo, portanto temos portos de propriedade pública com graves problemas ao longo dos anos. Há necessidade de se recuperar e garantir a competitividade dos portos públicos frente aos privados”, diz Aquino. Entre os principais entraves existentes no setor, citados por ele, estão a falta de autonomia administrativa e financeira dos portos, uma vez que administração é centralizada no governo federal, e não nos estados e municípios.

Além disso, há ausência de governança corporativa nas companhias, uma vez que o Conselho de Autoridade Portuária (CAP), existente na legislação anterior, deixou de ser deliberativo e passou a ser apenas consultivo depois da Medida Provisória 2595, editada em 2013 pelo governo de Dilma Rousseff. E, ainda, o excesso de interferência política partidária nas nomeações dos dirigentes dos portos.

Desestatização de portos na gestão anterior
O governo de Jair Bolsonaro foi um defensor ferrenho das privatizações e, em 2021, realizou os maiores leilões da história no setor de rodovias. O período foi representado pelo então ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, atual governador de São Paulo, dando marteladas enérgicas no balcão de madeira da B3, que marcaram o entusiasmo do governo com a pauta. Dados da bolsa brasileira apontam que foram 32 leilões realizados em 2021, com 102 ativos públicos alienados ou concedidos à iniciativa privada em um total de R$ 90 bilhões em investimentos. Já no ano passado foram R$ 85 bilhões em investimentos.

A expectativa dentro da própria B3 é que neste e nos próximos anos haverá mudança nas composições de leilões, uma vez que a União possui menos ativos que antes e a priorização do Estado como condutor da economia é uma política declarada do governo Lula.

Porém, há expectativa por casos específicos, como participação leiloada pelo BNDES ou vendas conduzidas por estados e prefeituras. Apesar dos números vultosos, alguns modelos de concessão para a iniciativa privada realizados durante o governo Bolsonaro são questionados, como é o caso do Porto de Vitória, leiloado no ano passado e que antes era administrado pela empresa pública Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa).

Em um modelo inédito no país estruturado pelo BNDES, houve um processo de desestatização de portos, no qual o fundo de investimentos Shelf 119 Multiestratégia, da gestora Quadra Capital, representado pela Necton Investimentos, comprou o direito de explorar o porto por 50 anos e, simultaneamente, o direito de privatização, com a compra da Codesa pelo fundo.

“O governo anterior optou por esse caminho de desestatização e privatização de portos. No sistema brasileiro, o porto público tem problemas que precisam ser resolvidos, mas alguns portos que conseguiram parcialmente o modelo Landlord conseguiram resultados melhores, como o Porto de Paranaguá, no Paraná; de Suape, em Pernambuco; e do Itaqui, no Maranhão. Eles foram entregues pelo governo federal ao governo do estado e só por estarem sendo administrados localmente já apresentam resultados melhores”, diz Aquino, da Fenop. “Dentro dessa lógica, o fato de o processo em relação ao porto de Santos ter sido interrompido inclusive pelo TCU permite uma oportunidade de se rediscutir essa questão”, diz ele.

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Ativos portuários no pipeline
Na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), três projetos de arrendamento estão sendo analisados para lançamento de edital, entre eles o MAC11, no valor estimado de R$ 28,8 milhões; o MAC11A, de R$ 46,4 milhões; e o MAC12, de R$ 37,5 milhões, em Alagoas, que são terminais de combustível muito estratégicos do ponto de vista regional, com prazo de concessão de 25 anos. Há também o POA01, no Rio Grande do Sul, estimado em R$ 17 milhões e prazo de 10 anos, e o TMP, no Ceará, um terminal de passageiros no valor de R$ 3,1 milhões, por 25 anos.

Além deles, há os projetos de concessão aeroportuária que estavam aguardando o TCU e agora dependem do Ministério de Portos e Aeroportos, como o Porto de Santos, de São Sebastião e Itajaí. E há ainda ativos com possibilidade de atração de investimento privado aguardando serem encaminhados à Antaq, como um canal de acesso de Paranaguá e o canal da Galheta, na fronteira do Uruguai com o Rio Grande do Sul, projeto importante para os planos geopolíticos de integração com a América Latina do governo Lula.

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USO DE BALÕES PARA ESPIONAGEM

China x EUA
Resquício do passado? Não: são muitos os motivos para o uso de balões espiões no século XXI

Por
Filipe Figueiredo – Gazeta do Povo


Imagem divulgada pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos mostra piloto da força aérea americana seguindo balão chinês antes do objeto ser derrubado na costa atlântica| Foto: EFE/EPA/US DEPARTMENT OF DEFENSE

As primeiras semanas de fevereiro foram marcadas por diversos incidentes envolvendo objetos voadores em altas altitudes. Alguns deles ainda não foram totalmente identificados, ao menos publicamente, gerando uma enxurrada de memes e brincadeiras sobre alienígenas. No início do mês, entretanto, os incidentes foram identificados, envolvendo balões chineses supostamente espiões sobre o continente americano. Ainda assim, o tema gerou especulações e algumas teorias da conspiração.

Foram ao menos dois balões chineses confirmados. Um deles entrou no espaço aéreo dos EUA no dia 28 de janeiro, via Alasca. O balão transitou pelo espaço aéreo do Canadá e dos EUA antes de ser abatido na costa atlântica dos EUA pela força aérea do país no dia 4 de fevereiro, com os destroços recolhidos pela marinha. Chamar de “balão” pode induzir ao erro, já que a aeronave carregava um grande aparato eletrônico de monitoramento, do “tamanho de dois ou três ônibus”, na definição das autoridades dos EUA.

O segundo balão sobrevoou, no dia 2 de fevereiro, a Costa Rica e a Colômbia, sem ser abatido. Segundo as autoridades chinesas, ambos os balões eram de monitoramento meteorológico e foram desviados de suas rotas originais pelo Oceano Pacífico. Já o governo dos EUA afirmou que os balões fazem parte de um projeto global de vigilância das forças armadas chineses e que balões espiões chineses sobrevoaram mais de 40 Estados nos cinco continentes.

Politicamente, o incidente e o abate fizeram com que uma planejada visita à China do secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, fosse adiada, evitando o uso do termo “cancelada”. O governo chinês afirmou que o abate do balão e demais ações dos EUA “impactam e prejudicam seriamente os esforços de ambas as partes e o progresso para estabilizar as relações sino-americanas”, já que, na versão oficial chinesa, a aeronave era civil e o ocorrido foi um acidente.

Fronteira da Guerra Fria
Tudo o que foi descrito na coluna até o momento foi bastante debatido e repercutido na imprensa. Algumas questões, entretanto, merecem um olhar mais atento para o nosso leitor. Uma delas é o que teria a ser espionado na rota feita pelo balão, especialmente pelo norte dos EUA, passando longe de grandes centros, como a Califórnia. Estados do norte dos EUA, como o Alasca ou Montana, eram a “fronteira” mais estratégica da Guerra Fria, por sua proximidade com o território soviético.

Ao pensar na Guerra Fria, muitas vezes o foco é na Europa, com a Alemanha dividida e um potencial grande campo de batalha. Na perspectiva dos EUA, entretanto, a guerra seria principalmente travada pelo Ártico, já que as rotas ao norte eram as mais curtas no globo terrestre para o disparo de mísseis balísticos intercontinentais. No caso do Alasca, trata-se de uma distância de apenas alguns quilômetros da Rússia. Como consequência dessa herança da Guerra Fria e da proximidade, esses locais são estratégicos.

Montana, por exemplo, foi tema de memes, na linha de que não existiria nada ali, quanto mais algo para ser espionado. Brincadeiras longe da realidade, já que o estado é um dos três a basear mísseis balísticos intercontinentais no território dos EUA, em prontidão em silos subterrâneos. Outra questão foi a de uma suposta demora do governo dos EUA em autorizar o abate do balão, algo que foi inclusive tema de comentários partidários por políticos republicanos.

A suposta demora foi oficialmente justificada pela necessidade de impedir que destroços afetassem áreas civis, causando danos ou até mesmo vítimas. Isso certamente foi um cálculo, mas, principalmente, o curso de ação tomado foi para possibilitar a captura de mais evidências possíveis pelos EUA. O abate em águas territoriais dos EUA conseguiu três coisas: evitar danos em solo, preservar o máximo possível do objeto e garantir que os destroços ficassem na área de jurisdição dos EUA.

O recolhimento dos destroços não se dá necessariamente para que os EUA possam “roubar” tecnologia chinesa, mas definir com precisão quais os sensores e dispositivos carregados pelo balão, permitindo aos EUA saberem exatamente que informações os chineses podem ter coletado. Segundo informações divulgadas pelos EUA a partir de seus próprios aparelhos de espionagem, o balão tinha equipamentos para geolocalizar dispositivos de comunicação.

Vantagens dos balões
Finalmente, muitas pessoas se perguntaram o motivo de utilizar um balão para espionagem. Balões de reconhecimento eram comuns na Grande Guerra, mais de cem anos atrás, por exemplo. Hoje, com aviões e satélites, qual seria a utilidade de um balão? Seria até supostamente inconsistente com uma potência como a China, dotada de outros meios de espionagem, uma inconsistência que alguns mais apressados apontaram até como elemento de uma suposta “armação” contra os chineses.

Nos últimos anos, entretanto, alguns desdobramentos fizeram com que o uso de balões para reconhecimento e espionagem voltasse a ser interessante. Primeiro, seu baixo custo frente aos satélites. Segundo, maior conhecimento sobre a estratosfera e a mesosfera e seus regimes de ventos, permitindo rotas mais previsíveis. Junto com novos materiais e tecnologias, balões de alta altitude hoje não são simplesmente lançados “a esmo”, mas podem seguir rotas definidas, incluindo correção de curso.

Terceiro e principalmente, balões como o abatido são muito difíceis de serem detectados. É possível que tenha sido um golpe de sorte dos EUA, ou consequência de uma perda de altitude pelo balão, vide o número de fotos e contatos visuais que foram feitos. E todos esses aspectos sobre balões espiões não são exclusividade dos chineses ou alguma grande novidade. Não existe conspiração para acusar a China de usar “balões velhos”. Na verdade, tudo o que foi citado aqui vem de um requerimento das forças armadas dos EUA.

Em 2019, foi divulgado o programa Cold Star, literalmente “Estrela Fria”, mas um acrônimo em inglês para “Arquitetura estratosférica oculta de longa duração”. Ou seja, um balão espião difícil de ser detectado e que permanece no ar por um grande período de tempo. O propósito inicial era o monitoramento do tráfico de drogas e de pessoas na fronteira sul dos EUA, mas, após sua divulgação e debate no Congresso dos EUA, seu escopo foi ampliado para o monitoramento de outros Estados.

Mesmo antes disso, em 2014, o governo dos EUA desenvolveu o projeto Jlens em parceria com a empresa Raytheon, também um acrônimo. Basicamente, o projeto tratava de colocar sensores em alta altitude para a detecção de lançamentos de mísseis. Depois de alguns bilhões de dólares torrados, o projeto foi suspenso, já que previa balões fixos. Foi o início da mudança para os estudos do uso de balões que possam voar livremente, exatamente como as aeronaves chinesas detectadas em 2023.

O uso de balões espiões parece um resquício do início do século XX, com militares com um binóculo olhando as posições inimigas. Nada mais longe da verdade. Novas tecnologias e possibilidades fazem de balões espiões um complemento valioso na guerra internacional por inteligência e informação. Isso também significa que podemos esperar incidentes similares no futuro, especialmente entre EUA e China, mas, ao que tudo indica, ainda não se trata de contato extraterrestre.


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BRIGA NO GOVERNO PELO AUMENTO OU NÃO DOS COMBUSTÍVEIS

 

Desoneração de impostos

Por
Alexandre Garcia – Gazeta do Povo

Posto de combustível


Fim da desoneração de impostos pode elevar o preço dos combustíveis a partir de 1º de março| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A ex-deputada do Paraná Aline Stuart, que foi presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, denunciou nas redes sociais o que ela chamou de “Carnaval vermelho”. É como estão chamando as invasões de terra por parte de um movimento sem terra, algo assim, não é exatamente o MST.

Ela disse inclusive que estão matando gado, quebrando e queimando. Um horror. Engraçado que eu não vejo essas coisas na mídia convencional.

Governo Lula debate reajuste sobre os combustíveis
A partir desta quarta-feira (1º) a gasolina e o álcool podem ficar mais caros. A gasolina mais 69 centavos por litro e álcool mais 24 centavos por litro. Isso porque termina a isenção do PIS/Pasep e Cofins, os impostos federais que foram retirados por parte do ex-presidente Bolsonaro para evitar que o combustível ficasse muito caro.

Está havendo é uma briga entre o PT e as autoridades econômicas do governo. Vale dizer entre [Fernando] Haddad e Gleisi [Hoffmann]. Ela disse, inclusive, que voltar a esse imposto seria descumprir compromissos de campanha. Já o Haddad diz que o governo não pode prescindir esse imposto.

Em outras palavras, o imposto voltando, nós vamos pagar a mais no abastecimento de nossos veículos R$ 29 bilhões neste ano. Não é pouco!

Mais de 1 milhão de pessoas vão deixar de receber o Bolsa Família
Também a partir do dia 1º de março, 1,5 milhão de pessoas vão deixar de receber o Bolsa Família. Foi o que anunciou o ministro Wellington Dias [Desenvolvimento Social], que tá administrando o Bolsa Família.

Por outro lado, o presidente Lula foi internado no sábado (25) para fazer uma ressonância magnética do quadril. Ele está sentindo muitas dores no quadril.

Eu fico pensando que com o Pelé foi assim. O Pelé começou com dores no quadril fez ressonância magnética, mas ele era um atleta. Diz a notícia que é porque Lula retomou a atividade física, e a partir daí começou a sentir dor. Agora querem achar um diagnóstico.

Já com o ex-ministro José Dirceu deve ter acontecido algum trauma, pois um hematoma subdural só acontece com trauma. A notícia diz simplesmente que ele sentiu dores de cabeça, mas ele deve ter batido a cabeça no chão ou a batido a cabeça em algum lugar.

Eu digo isso porque já aconteceu comigo! Meu cachorro me derrubou, um cachorro que é mais pesado do que eu, um dog alemão, e bati a cabeça no chão. Perdi o movimento das mãos, do braço e de um hemisfério por causa desse hematoma subdural, que fica entre o cérebro e a caixa craniana, mas pressiona o cérebro.

O caso dele foi mais grave que o meu, pois precisou furar fazer um dreno para aliviar a pressão. Já retirou o dreno, teve na UTI, então um aconteceu alguma coisa mais grave com ele. O filho dele [Zeca Dirceu] disse que ele felizmente já estava voltando para casa. Otimo, né? Tomara que se recupere.

Ministro diz que presos por vandalismo em Brasília são criminosos
É preciso dar uma má notícia para os parentes daquelas quase 900 pessoas que estão presas em Brasília. O ministro da Justiça numa entrevista ao Correio Braziliense de domingo (26) disse que eles são criminosos e que estando num acampamento, onde tinha faixa pedindo a intervenção do Exército, isso é um crime e que eles são criminosos.

Então pelo jeito vai ter muito trabalho os advogados todos que estão tentando liberar essas pessoas.


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CACHÊ ALTO DA GISELE BUNDCHEN NO CARNAVAL CARIOCA

 

Brahma? Não tem outra?
Cachê milionário de Gisele Bündchen revolta invejosos “com consciência social”

Por
Paulo Polzonoff Jr. – Gazeta do Povo


Invejosos cheios de consciência social estão revoltados com o cachê milionário que a modelo Gisele Bündchen recebeu no carnaval.| Foto: Reprodução/ Twitter

A modelo Gisele Bündchen recebeu R$10 milhões para estar presente durante três horas num camarote durante o carnaval. Achei pouco. Para passar calor e ficar no meio de gente suada, bêbados, jornalistas (arght!) e subcelebridades, este cronista de província com barriga de chope cobraria bem mais. Mas tem gente que está revoltada. Minto, tem gente que finge estar revoltada. Tem gente que expressa essa falsa revolta usando e abusando da liberdade, do conforto e do luxo que o capitalismo lhes proporciona.

Não que o cachê de R$57 mil/minuto seja certo. Mas sobre isso falarei mais adiante. Por enquanto deixe eu me divertir um pouco mais falando dos argumentos da esquerda para atacar Gisele Bündchen e a empresa que lhe pagou os dez mirréis – como se dizia antigamente e acho que ainda dizem nas mesas de dominó do Passeio Público. Todos os argumentos, na verdade um amontoado de lugares-comuns enferrujados, giram em torno de uma só coisa: inveja.

Este é o problema da esquerda contemporânea: ela se recusa a abdicar de sua vida de confortos e privilégios pequeno-burgueses (para usar um termo fora de moda), ao mesmo tempo em que gosta de apontar para a grama mais verde do vizinho e dizer ao mundo: não é justo. E qual o senso de justiça desse povo? Explico: para eles a injustiça não está mais na fome, na miséria ou nas muitas privações do operariado. A injustiça, para a esquerda-cabelo-azul, está no fato de faltar luxo para todos.

É uma esquerda que nem Marx reconheceria. Afinal, os marxistas de antigamente eram péssimos, mas pelo menos tentavam esconder a inveja. Pelo menos disfarçavam. Pelo menos camuflavam a canalhice com as plumas e paetês do intelectualismo, racionalismo, iluminismo. Ou qualquer outro ismo que estivesse na moda (como o freudianismo). Pelo menos diziam que matavam em defesa “dos interesses dos oprimidos”. A esquerda de hoje não. A esquerda de hoje cancelaria Marx por receber uma gorda mesada do Engels – e ela não.

Ah, mas as garçonetes do camarote ganharam apenas R$200 reais para trabalhar a noite toda – dizem. Acho que não capto bem o argumento. Por acaso todas as garçonetes eram clones da quarentona mais bonita do mundo? Ah, porque um brasileiro médio teria que trabalhar séculos para acumular essa quantia. Bom, alguns de nós somos tão feios que nem em milênios acumularíamos essa fortuna catwalking nas passarelas da vida.

Abundância estéril
O que não quer dizer que o cachê de R$3.333.333,33 por hora seja certo. Digo, os libertários anarcocapitalistas acham que tudo isso é belo & moral. Que é apenas uma troca de capital baseada no autointeresse, porque Mises isso, Ayn Rand aquilo, blá, blá, blá. Discordo. Isso é simplificar demais a dinâmica das interações humanas. É ignorar o fato de que não nascemos para o conforto, e sim para a grandeza, como dizia o Papa Bento XVI.

Há mais entre o céu e a terra do que possa imaginar sua vã filosofia econômica e política. Há, por exemplo, a questão do mérito e do bem comum: o que Gisele Bündchen fez para ser tão valorizada? Além de ter nascido linda, claro. Há a “abundância estéril” que troca de mãos. Há uma empresa que, por uma cálculo econômico que me escapa, considera vantajosa essa troca. Será mesmo que alguém vai beber mais cerveja ruim só porque Gisele Bündchen passou três horas exibindo uma barriga que não combina nada com quem consome o produto?

E veja que nessa história considero a modelo mais “vítima” do que algoz. O que ela fará com o dinheiro, se trocará o papel-de-parede da sala, se comprará um carro, se criará uma ONG que milita contra a gordofobia ou se doará para os pobres, é uma questão que diz respeito somente a ela e sua consciência. E não deve ser nada fácil manter a consciência limpa no meio em que Gisele Bündchen vive. Mas quem sou eu para julgar?

Para mim, o semipior nessa história toda é saber que vivemos num mundo que exalta a fama pela fama, a beleza física pela beleza física, a alegria vazia pela alegria vazia, e até o pileque pelo pileque. A tal ponto que um publicitário qualquer consegue convencer os executivos de uma empresa biliardária de que é uma boa ideia esfregar na cara da população mais pobre – justamente aquela que é obrigada a beber cerveja de qualidade questionável – a opulência imoral do artigo de marketing de luxo: uma bela mulher.

Agora, o pior-pior mesmo é ser obrigado a encerrar este texto reconhecendo que tudo poderia ser ainda mais imoral – como, aliás, clamam os invejosos e hipócritas cheios de “consciência social” e purpurina na cara. A cervejaria poderia, por exemplo, doar os R$10 milhões para alguma causa progressista. Ou para financiar um curso de lavagem cerebral identitária para os funcionários. Ou para patrocinar a cinebiografia de algum canalha histórico admirado pela esquerda.


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A AGRICULTURA BRASILEIRA PRODUZ TRÊS SAFRAS ANUAIS

 

A revolução da 3ª safra: como a agricultura brasileira atingiu níveis recordes de produção

Foto: Thiago Silva/Estadão

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Por José Maria Tomazela – Jornal Estadão

Novas pesquisas e tecnologias de manejo do solo ampliam o potencial de produção agrícola em todas as regiões do País, com ganho de produtividade sem aumento da área plantada

Colher três safras agrícolas na mesma área em um ano e alguns dias não é novidade para o agricultor Emílio Kenji Okamura. Cultivando cerca de 1,8 mil hectares em Capão Bonito, no sudoeste paulista, ele plantou feijão entre agosto e setembro para colher em dezembro passado; na colheita desse grão, iniciou o plantio da soja, para colher agora em abril; o que vai abrir espaço na sequência para o trigo, que ficará no ponto em setembro.

“As condições de solo e clima em nossa região, que tem um regime de chuvas bem regulado, permitem fazer uma safra atrás da outra”, diz o agricultor, que está longe de ser um exemplo isolado no País.

A tecnologia do plantio direto, a irrigação e o melhoramento genético dos cultivares já permitem que os agricultores brasileiros de forma geral consigam colher até três safras agrícolas por ano numa mesma área.

Em algumas regiões, é possível obter três safras cheias de grãos, como sojamilho trigo, sem necessidade de arar, gradear ou adubar previamente a terra. O adubo é aplicado junto com a semente que vai para o solo quase no mesmo instante em que a cultura anterior é colhida. É cada vez mais comum nos campos brasileiros ver tratores com plantadeira “empurrando” a máquina colhedora.

Principal grão cultivado no País, a soja entra em praticamente todos os esquemas de uso intensivo do solo
Principal grão cultivado no País, a soja entra em praticamente todos os esquemas de uso intensivo do solo Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Segundo o chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Nepomuceno, um conjunto de técnicas e manejos, aliado à pesquisa, está permitindo que a chamada terceira safra avance em todas as regiões do País. Ele afirma que 70% dos quase 77 milhões de hectares cultivados já utilizam o plantio direto, o que tem permitido a colheita de safras sucessivas sobre o mesmo terreno. “Temos de levar em conta que a expansão da soja no País contribuiu para essa evolução, pois, além de ser um grão altamente produtivo, a planta tem características que preservam e enriquecem o solo, evitando sua exaustão”, disse.

A capacidade de produzir safras sucessivas na mesma área é um dos fatores que contribuem para aumentar a produção agrícola do Brasil sem abrir novas áreas de cultivo. Esse recurso se aproveita do plantio direto, uma prática conservacionista iniciada na década de 1970 pelos agricultores brasileiros. A técnica consiste em manter o solo sempre coberto por plantas ou resíduos vegetais – geralmente a palhada da cultura anterior – para fazer a semeadura e adubação sem necessidade de revolver o solo.

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A expansão da soja, que tem variedades precoces, com ciclo de 100 a 120 dias, ajudou a estreitar o calendário dos cultivos, possibilitando mais safras em menor tempo. Principal grão cultivado no País, a soja entra em praticamente todos os esquemas de uso intensivo do solo, fazendo a rotação com milho safrinha, feijão, sorgo e cobertura verde. “Outros países produtores de grãos, como Argentina, Estados Unidos e toda a Europa, não conseguem isso porque têm invernos rigorosos”, disse o pesquisador da Embrapa.

Em Capão Bonito (SP), produtores conseguem obter produção acima dos níveis nacionais, fazendo cinco safras em dois anos
Em Capão Bonito (SP), produtores conseguem obter produção acima dos níveis nacionais, fazendo cinco safras em dois anos Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Rodízio de grãos

Nas áreas cultivadas pela Cooperativa Agrícola de Capão Bonito, no sudoeste paulista, os 102 agricultores associados seguem um esquema de cinco safras em dois anos – um ano de três safras, outro de duas – e obtêm alta produtividade. A soja, plantada em 24 mil hectares, entra em todos os ciclos, em rotação com milho, milho safrinha, sorgo, trigo, feijão e cobertura verde. O solo fica o ano inteiro com alguma lavoura ou com plantas que aumentam a umidade, fazem a reciclagem de nutrientes e combatem doenças da terra.

Um dos cooperados, o produtor Walter Kashima, cultiva cerca de 2,5 mil hectares. Ele colhia em meados de fevereiro uma média 80 sacas (4.800 quilos) de soja por hectare. Na mesma área, ele estava semeando o milho que será colhido entre junho e julho deste ano. As três plantadeiras seguiam o rastro de palha triturada deixado pelas colheitadeiras e abriam sulcos para depositar a semente com adubo.

Para fazer o plantio direto, os produtores deixam a palha e resíduos da cultura colhida sobre o solo, que, dessa forma, fica protegido do sol e da erosão. Essa cobertura mantém a umidade do solo, favorece o desenvolvimento de microrganismos e protege a reserva dos adubos usados na lavoura. Também evita a compactação do solo. Plantadeiras próprias para esse cultivo abrem sulcos no solo e depositam as sementes, junto com o adubo. O próprio equipamento cobre os sulcos com terra, favorecendo a germinação.

O produtor Walter Kashima, de Capão Bonito (SP): soja e milho na mesma área, e ganho na produção
O produtor Walter Kashima, de Capão Bonito (SP): soja e milho na mesma área, e ganho na produção  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Segundo Nepomuceno, da Embrapa, o País consegue alta produtividade mesmo com baixo uso de irrigação. “A maioria da área de grãos brasileira depende de chuva. Na soja, por exemplo, só 4% da área é irrigada. Irrigar 46 milhões de hectares é quase impossível. Além do custo, vamos ter o problema da água, bem escasso. Então, investimos no bom manejo, na rotação de culturas, e aí entra de novo a pesquisa, que nos permitiu desenvolver variedades de soja, por exemplo, com um sistema radicular mais profundo e que resiste mais à seca.”

No Oeste do Paraná, agricultores também já fazem três safras seguidas em um ano, sempre incluindo a soja. O Estado é o segundo maior produtor do País, e colhe 20,7 milhões de toneladas nesta safra. O produtor Amauri Grisotti, de 52 anos, que cultiva 640 hectares no município de Toledo, escolheu um cultivar de soja precoce com ciclo de 120 dias para fazer a rotação com híbrido de milho superprecoce, de 140 dias. “Estou fazendo soja na safra, milho na safrinha e trigo no inverno. Nesse sistema, a produtividade total melhorou 20% porque a reserva de fertilizantes no solo é transferida de uma lavoura para outra”.

Produção dobrada

Como o País tem biomas com muita diversidade, as regiões agrícolas adaptam o manejo das lavouras usando as tecnologias disponíveis em cada área. A terceira safra no Mato Grosso costuma envolver soja, milho safrinha e cobertura verde; já no Paraná e interior de São Paulo, entram soja, milho e trigo ou sorgo; no Mato Grosso do Sul, soja, milho e pasto (braquiária); e no Rio Grande do Sul, Estado com temperaturas mais baixas, trigo, soja e olerícolas.

“Temos agora o sistema de plantar soja no meio do milho, que ainda está no início, mas tem tudo para se expandir”, disse Nepomuceno.

O uso de sistemas de produção intercalados pode levar o Brasil a dobrar a atual produção de grãos na próxima década, segundo o pesquisador. “Temos uma área de 120 milhões de hectares de pastagens, e metade disso é de pastagem degradada. Dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) mostram que vamos aumentar, só de soja, de 10 milhões a 15 milhões de hectares, e a soja é uma grande recuperadora de solos, por isso recupera também as pastagens.”

É IMPORTANTE ENCONTRAR UM EQUILÍBRIO PARA MANTER A SAÚDE MENTAL E EMOCIONAL

 

Autor: Virgilio Marques dos Santos, CEO da FM2S Educação e Consultoria

Você já se deparou com mais coisas do que é capaz de gerenciar? Já experimentou aquela sensação de angústia e ansiedade em saber que algo pode estar acontecendo com aquilo que não está olhando? Ou sofreu com a falta de concentração ou calma para executar uma tarefa importante, porque você não está seguro de que as outras coisas estão bem cuidadas?

Equilibrar todos os pratos da vida pode ser um desafio. Entre o trabalho, a família, os relacionamentos, as obrigações pessoais e a vida social, parece que nunca há tempo suficiente para tudo.

Às vezes sonhamos em voltar no tempo, se deslocando para a infância. Queria voltar para a rua 3, lá em Rio Claro. Não me refiro a retornar geograficamente, como faço todo mês, mas voltar da escola. Lembro-me que, aos 15 anos, voltava à pé da escola. Saía do Koelle às 12h20 e me dirigia para a casa dos meus pais, para o almoço. Era uma delícia caminhar nessa hora, porque em cada esquina eu sentia o cheiro do menu das casas. A cada aroma diferente, eu ficava imaginando o que minha mãe estava cozinhando. E, ao cruzar a avenida 20, sentia o frescor do almoço e começava minha tarefa mental de adivinhar o que seria servido.

Lembro-me bem do cheiro da farta lasanha à bolonhesa. Nesses dias, era garantia de que meus avós maternos estariam à mesa. Depois da esquina, 60 metros e pronto. Estava em frente ao interfone, avisando que estava lá. Abria-se o portão e eu tinha a plena sensação de segurança. Nada iria me deixar nervoso, ansioso ou tenso. A estrutura que minha família me proporcionava permita que eu fosse feliz de maneira plena. É claro, havia perrengues e problemas da idade, mas quando eu os esquecia, era feliz. Não havia muitos pratos para equilibrar.

Nos idos de 1999, não havia a profusão dos smartphones, ainda. Os celulares eram apenas para ligações aos pais e amigos. Já as mensagens, eram apenas torpedos (sms) para nossos crushes. A conexão online era baseada em pessoas, não em algoritmos. O tempo, apesar de acelerado, era variável aos finais de semana. A angústia e as aflições eram coisas para o longo prazo e a sensação de estabilidade, ainda que curta, existia.

Como viver sem a máquina do tempo?

É importante encontrar um equilíbrio para manter a saúde mental e emocional. Aqui estão algumas dicas para ajudá-lo a equilibrar todos os pratos da vida:

●    Priorize: determine o que é realmente importante para você e concentre seus esforços nessas áreas;

●    Delegue tarefas: se você está sobrecarregado, considere delegar tarefas a outras pessoas, seja em casa ou no trabalho;

●    Desenvolva uma rotina: ter uma rotina ajuda a manter a organização e a produtividade, permitindo que você atenda às suas responsabilidades de maneira eficiente;

●    Encontre tempo para si mesmo: é importante dedicar tempo para sua saúde mental e física, seja por meio de atividades de lazer ou de práticas de meditação, por exemplo;

●    Mantenha um diário: escrever suas preocupações e tarefas pendentes pode ajudá-lo a mantê-las organizadas e diminuir a sensação de sobrecarga.

Lembre-se de que equilibrar todos os pratos da vida é uma jornada constante e não há soluções definitivas. Encontre o que funciona para você e continue trabalhando nisso, e tenha em mente que é normal ter altos e baixos. O importante é encontrar um equilíbrio saudável, que lhe permita ser feliz e realizado. E, para isso, tenha o direito e a coragem de dizer não… Como a sinceridade é um dos valores mais importantes para mim, não consigo mentir. E, se alguém pede para que eu faça algo, dificilmente declino. Acabo aceitando todas as demandas que vão surgindo e isso me deixa angustiado. O prazer instantâneo por agradar e não discutir acaba gerando pendências que muito me custam, como a quebra da minha rotina para que as coisas que ascendi sejam feitas.

Como não podemos voltar ao ambiente seguro e sem cobranças excessivas, precisamos lutar pelo direito de falar a verdade e defender nosso planejamento. Para aceitar alguma solicitação ou mudança, pense bem. Só o faça se isso não ferir o seu planejamento de forma dolorosa e não for contra seus valores. Nesses casos, pode parecer perigoso, mas use o direito de dizer não quero ou não consigo. É libertador!

A Startup Valeon reinventa o seu negócio

Enquanto a luta por preservar vidas continua à toda, empreendedores e gestores de diferentes áreas buscam formas de reinventar seus negócios para mitigar o impacto econômico da pandemia.

São momentos como este, que nos forçam a parar e repensar os negócios, são oportunidades para revermos o foco das nossas atividades.

Os negócios certamente devem estar atentos ao comportamento das pessoas. São esses comportamentos que ditam novas tendências de consumo e, por consequência, apontam caminhos para que as empresas possam se adaptar. Algumas tendências que já vinham impactando os negócios foram aceleradas, como a presença da tecnologia como forma de vender e se relacionar com clientes, a busca do cliente por comodidade, personalização e canais diferenciados para acessar os produtos e serviços.

Com a queda na movimentação de consumidores e a ascensão do comércio pela internet, a solução para retomar as vendas nos comércios passa pelo digital.

Para ajudar as vendas nos comércios a migrar a operação mais rapidamente para o digital, lançamos a Plataforma Comercial Valeon. Ela é uma plataforma de vendas para centros comerciais que permite conectar diretamente lojistas a consumidores por meio de um marketplace exclusivo para o seu comércio.

Por um valor bastante acessível, é possível ter esse canal de vendas on-line com até mais de 300 lojas virtuais, em que cada uma poderá adicionar quantas ofertas e produtos quiser.

Nossa Plataforma Comercial é dividida basicamente em página principal, páginas cidade e página empresas além de outras informações importantes como: notícias, ofertas, propagandas de supermercados e veículos e conexão com os sites das empresas, um mix de informações bem completo para a nossa região do Vale do Aço.

Destacamos também, que o nosso site: https://valedoacoonline.com.br/ já foi visto até o momento por mais de 190.000 pessoas e o outro site Valeon notícias: https://valeonnoticias.com.br/ também tem sido visto por mais de 4.000.000 de pessoas, valores significativos de audiência para uma iniciativa de apenas dois anos. Todos esses sites contêm propagandas e divulgações preferenciais para a sua empresa.

Temos a plena certeza que o site da Startup Valeon, por ser inédito, traz vantagens econômicas para a sua empresa e pode contar com a Startup Valeon que tem uma grande penetração no mercado consumidor da região capaz de alavancar as suas vendas.

E-Mail: valeonbrasil@gmail.com

Site: https://valedoacoonline.com.br/

Fones: (31) 98428-0590 / (31) 3827-2297

domingo, 26 de fevereiro de 2023

PT NÃO QUER PRIVATIZAR E O FUTURO DO MONOPÓLIO DOS CORREIOS FICA NA MÃO DO STF

 

Estatais
Sem privatização no governo Lula

Por
Vandré Kramer – Gazeta do Povo


Dois questionamentos sobre o monopólio dos Correios serão avaliados pelo STF.| Foto: Aniele Nascimento/Arquivo/Gazeta do Povo

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar nos próximos meses uma ação que questiona o monopólio dos Correios nos serviços postais. Como o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) “enterrou” o projeto de privatização da estatal, o julgamento na Corte tornou-se a principal alternativa para os que defendem o fim do monopólio estatal e a livre concorrência no setor.

A quebra desse monopólio seria uma consequência da proposta de privatização dos Correios, apresentado no governo de Jair Bolsonaro (PL). No entanto, o projeto “empacou” no Senado após ser aprovado pela Câmara, e não é do interesse do novo governo, que defende participação ativa do Estado na economia e retirou a empresa do Programa Nacional de Desestatização (PND).

A questão aguarda definição há pelo menos duas décadas. Uma das ações que serão julgadas foi protocolada há quase duas décadas. Originalmente, o julgamento estava marcado para dia 1.º de março, mas a presidente do STF, ministra Rosa Weber, retirou o assunto de pauta.

Economistas liberais defendem a quebra do monopólio, afirmando que o sistema postal ganharia mais eficiência com o fim do domínio absoluto dos Correios. Também seriam beneficiados os consumidores, que poderiam contar com preços menores e o desenvolvimento de inovações na área logística.

“No Brasil, os Correios têm um monopólio sobre muitos serviços postais, o que limita a entrada de outras empresas no mercado e impede a concorrência. Isto pode dificultar a inovação e a criação de novos modelos de negócios”, diz Diogo Costa, CEO do Instituto Millenium, organização que defende valores liberais como a economia de mercado.

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Correios estariam descumprindo princípios constitucionais como a livre concorrência
Uma das ações que será apreciada pelo plenário do Supremo é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 70, protocolada em 2003 pelo Sindicato Nacional de Encomendas Expressas.

A entidade alega que os Correios descumprem preceitos e princípios constitucionais fundamentais, como a livre concorrência, praticando “atos de extermínio da concorrência em completa dissonância com o preceito constitucional e as leis vigentes, sob a alegação de pretenso monopólio”.

As empresas de encomendas dizem que decisões judiciais têm levado ao encerramento de micro e pequenas empresas no país.

“Manter o monopólio da ECT sobre certos serviços postais, além de juridicamente frágil, seria prejudicial ao país e cada vez mais anacrônico em face aos desenvolvimentos institucionais e tecnológicos por que passam nossa sociedade”, aponta nota técnica publicada pelo Instituto Millenium.

Constituição de 1988 estabeleceu monopólio dos Correios sobre serviços postais
O monopólio sobre os serviços postais foi estabelecido pela Constituição Federal de 1988, porém ela não explicita que serviços são esses e como a União irá mantê-los.

O detalhamento é feito por lei anterior, a 6.538, de 22 de junho de 1978, que dispõe sobre os serviços postais, regulando direitos e obrigações relacionadas ao serviço postal no território nacional. A legislação também trata das competências e monopólios dos Correios.

Segundo a legislação, são exploradas pela União, em regime de monopólio:

recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a expedição para o exterior de carta e cartão-postal;
recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a expedição para o exterior de correspondência agrupada; e
fabricação, emissão de selos e de outras formas de franqueamento postal.
A legislação também prevê que dependem de prévia e expressa autorização dos Correios:

venda de selos e outras fórmulas de franqueamento postal; e
fabricação, importação e utilização de máquinas de franquear correspondência, bem como de matrizes para estampagem de selo ou carimbo postal.

A lei também prevê que não se incluem no regime de monopólio:

transporte de carta ou cartão-postal efetuado entre dependências da mesma pessoa jurídica, em seus negócios, por meios próprios e sem intermediação comercial; e
transporte e entrega de carta e cartão-postal, executados eventualmente e sem fins lucrativos, na forma definida em regulamento.
A norma legal já foi alvo de questionamento no STF, sendo objeto da ADPF 46. A Associação Brasileira das Empresas de Distribuição questionava, em 2003, o direito de as transportadoras privadas realizarem entregas de encomendas, o que já ocorria.

O plenário do STF decidiu, em 2009, que a Lei 6.538/78 está de acordo com a Constituição Federal. “Assim, cartas pessoais e comerciais, malotes e cartões-postais só podem ser transportados e entregues pela ECT. Ficou definido, porém, que o transporte e entrega de demais objetos e encomendas não são de exclusividade dos Correios”, aponta a nota técnica do Millenium.

As empresas requerem que a Corte Suprema estabeleça que a Lei 6.538/78 não está de acordo com a Constituição Federal e determine que a Justiça suspenda o andamento de ações judiciais relacionadas à ADPF.

Questionamento sobre o envio de boletos
Outra medida que será apreciada pelo STF é o recurso extraordinário (RE) 667.958, de 2011, que trata da possibilidade de entes federados, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem guias de arrecadação tributária ou boletos de cobrança aos contribuintes ou consumidores sem o intermédio dos Correios.

O tema ganhou repercussão geral por decisão de seu relator, ministro Gilmar Mendes. Ele entende que o tema diz respeito à organização político-administrativa do Estado e alcança relevância econômica, política e jurídica que ultrapassa os interesses subjetivos da causa.

O Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1) já decidiu favoravelmente ao município de Três Marias (MG) para a entrega de guias e boletos feita pela própria prefeitura.

A nota técnica do Millenium observa lembra que os Correios têm monopólio em serviços que em breve se tornarão obsoletos, como entrega de documentos autenticados e cartões-postais. Por isso, de acordo com o documento, a empresa de serviços postais quer manter a entrega de guias de IPTU. “É, talvez, o único produto sobre o qual o eventual monopólio dos Correios, se mantido pelo STF, deve ainda fazer diferença por algum tempo”, pontuou a publicação.

Quais os principais problemas do monopólio dos Correios
O Instituto Millenium considera que, no caso dos Correios, os efeitos sobre o preço e o volume de serviços prestados não são o principal problema. O problema está no desestímulo à inovação, que tem reflexos no serviço prestado ao consumidor.

“Como ocorre em diversos monopólios, este é regulado pelo Estado e operado por uma estatal que, por não ser orientada pelo lucro, não recorre à prática de preços abusivos. Os efeitos sobre a inovação, entretanto, são graves”, diz a nota.

Na avaliação do Millenium, o monopólio dos Correios sobre o envio de determinados produtos inibe inovações na prestação de serviços de transporte e entrega de cartas e outros documentos em todo o país.

“As restrições à entrada de novos agentes econômicos no mercado leva a acomodação da empresa monopolista. Sem concorrência, deixa de haver motivação ou feedback do processo de mercado para se investir em mudanças inovativas que facilitem a vida do consumidor, que, por sua vez, não tem a quem recorrer”, enfatiza a nota.

O instituto aponta que o monopólio “compromete mesmo o desenvolvimento de novos modelos de negócios, como o envio de documentos conciliados ao transporte de passageiros por meio de aplicativos de fretados, dentre outros modelos de negócios que não somos sequer capazes de imaginar, mas que poderiam estar, hoje, em pleno funcionamento, tornando mais simples, ágil e barato para todos a entrega de determinados produtos”.

Para o CEO da entidade, Diogo Costa, quanto mais empresas estiverem operando nesse mercado, melhor. “O problema não é exatamente a existência dos Correios, é o monopólio que se atribui a ele e prejudica sua constante evolução.”

A abertura de concorrência nos serviços postais ocorreu em, pelo menos, três países: Alemanha, Reino Unido e Suécia. O resultado, de acordo com Costa, levou a maior eficiência e inovação no setor, com as empresas buscando formas de diferenciar seus serviços e oferecer preços mais competitivos. Ele afirma que as empresas, antes monopolísticas, se tornaram mais dinâmicas e inovadoras.

Quais os impactos da decisão do STF sobre o monopólio dos Correios
Para o Instituto Millenium, a interpretação da Constituição é bastante clara. A Constituição estabelece que a livre iniciativa é um fundamento da República. A ordem econômica também tem a livre concorrência como princípio.

“Então, aqueles monopólios que não estejam claramente expressos e delimitados como exceção pela Constituição não podem existir, pois colidem com fundamentos e princípios fundamentais da nossa República e ordem econômica”, aponta a nota técnica.

Costa aponta que uma decisão que favoreça a livre concorrência possibilitará, no caso do recurso extraordinário, que as prefeituras possam escolher outras empresas para enviar as guias de IPTU.

“Outras empresas de encomenda, logística e serviços postais não serão perseguidas pelos Correios. Isso permitirá que o mercado se desenvolva de maneira mais livre e aberta, o que pode levar a mais inovação e a modelos de negócios mais eficientes”, afirma o CEO.

Por outro lado, caso o Supremo entenda que o monopólio dos Correios se estenda a serviços como entregas de guias de IPTU e, eventualmente, demais contas, boletos e documentos, será mantido o bloqueio ao desenvolvimento de inovações e de novos negócios.

Uma decisão contrária e favorável ao monopólio, avalia o think tank, continuará causando limitações no desenvolvimento do mercado. Costa destaca que isto pode ser prejudicial para a economia, mas o mercado ainda pode driblar o monopólio, como já aconteceu com outros serviços, como a digitalização das contas de água e luz.

“Muitas pessoas estão optando por autenticar documentos e reconhecer assinaturas digitalmente para evitar a necessidade de enviar documentos físicos pelos Correios. O Brasil não aguenta mais ser anacrônico”, diz.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/economia/sem-privatizacao-no-governo-lula-futuro-do-monopolio-dos-correios-esta-nas-maos-do-stf/
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A ESQUERDA QUER ACABAR COM A LEI DAS ESTATAIS

Editorial
Gazeta do Povo


O advogado-geral da União, Jorge Messias.| Foto: Renato Menezes/Ascom AGU

Quando a esquerda é incapaz de fazer prevalecer suas plataformas no Congresso Nacional, o que ela faz? Corre para o Supremo Tribunal Federal, obviamente, para conseguir no tapetão o que não consegue por lhe faltarem bancada própria ou aliados. O exemplo mais recente é o da Lei das Estatais, que o petismo quer desfigurar para, agora que está no poder, voltar a fazer as indicações políticas de sempre. O plano ia muito bem, com a aprovação-relâmpago da alteração na Câmara dos Deputados, digna de um “tratoraço”. Mas a repercussão negativa foi tamanha que o Senado, de forma bastante razoável, resolveu colocar um freio na tramitação ainda não fim do ano passado.

Foi quando entrou em cena o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que em 29 de dezembro do ano passado ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.331, contra os exatos trechos da Lei das Estatais que o governo quer derrubar. Em outras palavras, o PCdoB, agindo como “laranja” de Lula, está pedindo que o Supremo termine o trabalho que o Congresso achou por bem conduzir com mais calma. O partido alega que as vedações legais contrariam os direitos constitucionais à isonomia, à liberdade de expressão e à autonomia partidária.

Lula criticou a judicialização da política em janeiro, mas, comprovando que sua palavra não vale nada, a AGU endossou ação do PCdoB no Supremo para derrubar partes da Lei das Estatais

A pretensão é descabida em todos os sentidos, dos argumentos apresentados ao instrumento escolhido para conseguir a mudança. A regra do artigo 17, parágrafo 2.º, II da lei proíbe a indicação, para a diretoria ou Conselho de Administração de estatais, “de pessoa que atuou, nos últimos 36 (trinta e seis) meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”. O inciso III ainda menciona “pessoa que exerça cargo em organização sindical”. O objetivo é muito claro e bastante razoável: preservar as estatais da ingerência política em sua administração. Elas pertencem ao Estado, não ao partido governante; têm de ser conduzidas com critérios técnicos. Não existe, aqui, nenhuma “criminalização da política” – por mais que os políticos tenham usado e abusado das estatais para cometer crimes, como bem demonstrou a Lava Jato, apenas acrescentando mais razões para que houvesse uma lei moralizando as nomeações –, e sim uma preocupação com a governança dessas empresas.

Se o argumento para contestar as vedações legais é fraco, o mesmo se pode dizer do recurso ao Judiciário para derrubá-las. É atribuição do Poder Legislativo definir quem pode ser nomeado para cargos em estatais, como também em muitos outros casos. A Constituição estabelece critérios (por exemplo, de idade) para ocupar cargos eletivos; a Lei da Ficha Limpa determina quem pode se candidatar a esses cargos. Os representantes do povo no Congresso Nacional debateram cada uma dessas situações e estabeleceram essas regras por um processo político totalmente legítimo. A Lei da Ficha Limpa, é verdade, tem muitos inimigos no próprio parlamento, e o Supremo já atuou para desfigurá-la, em mais um de tantos episódios de ativismo judicial e judicialização da política que não deveria se repetir no caso da Lei das Estatais – mas vai, se depender do petismo.

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Mas Lula não tinha criticado a judicialização da política um mês atrás? “Eu tenho pedido aos meus colegas líderes do partido que é preciso parar de judicializar a política. Nós temos culpa de tanta judicialização. A gente perde uma coisa no Congresso Nacional e, ao invés de a gente aceitar a regra do jogo democrático de que a maioria vence e a minoria cumpre aquilo que foi aprovado, a gente recorre a uma outra instância para ver se a gente consegue ganhar”, afirmou o presidente a líderes partidários em 27 de janeiro. No entanto, em (mais) uma confirmação de que acreditar na conversa do petista é passar atestado de ingenuidade, no último dia 15 a Advocacia-Geral da União (AGU) mostrou que, na prática, ao PT só interessa a vitória a qualquer custo. Chamada a se pronunciar, a AGU não apenas endossou o procedimento do PCdoB como ainda se manifestou pela derrubada dos trechos questionados na Lei das Estatais.

O desfecho natural da ADI 7.331 seria o indeferimento por inépcia; trata-se de matéria reservada ao Legislativo, e com o Legislativo deve permanecer. Mas infelizmente vivemos tempos de relação disfuncional entre poderes, em que o ativismo judicial é recorrente e já foi praticado em ocasiões anteriores pelo ministro a quem coube a relatoria da ação, Ricardo Lewandowski. Dois anos e meio atrás, quando tomava posse como presidente do Supremo, Luiz Fux disse que o Judiciário deveria dar “um basta na judicialização vulgar e epidêmica de temas e conflitos em que a decisão política deva reinar”, recusar a “transferência voluntária e prematura de conflitos de natureza política para o Poder Judiciário” e adotar a “virtude passiva, devolvendo à arena política e administrativa os temas que não lhe competem à luz da Constituição”. Desde então, o conselho nem sempre foi seguido, mas a correção de rumos continua sendo necessária.


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NEM O JUDICIÁRIO E NEM NINGUÉM SABE ONDE FICA O QUINTO DOS INFERNOS

“Discurso de ódio”?

Por
Thiago Rafael Vieira
e

Por
Jean Marques Regina – Gazeta do Povo


“O Mapa do Inferno”, de Sandro Botticelli.| Foto: Reprodução/ Wikipedia

Em tempos de “perseguição educada” – ou, como também dizemos, a “nova guilhotina” – cada vez crescente, lançamos luz (enquanto dá) sobre a representação do deputado distrital Fábio Félix (PSol-DF) contra a fala do pastor norte-americano pentecostal David Eldridge. O pastor, em sua pregação proferida em um culto, durante o carnaval, teria dito que “gays têm reserva no inferno”. Para o deputado, tal fala configura discurso de ódio, e o pastor deveria ser punido.

Em primeiro lugar: a afirmação é pesada, e quanto a isso não temos dúvidas. A nosso ver, foi infeliz. Pode, também, ser teologicamente questionável. Mas compete ao Poder Judiciário dizer onde fica o “quinto dos infernos” e quem vai ou não para lá?

Depois, é importante entendermos o conceito jurídico de discurso de ódio. Esta figura foi introduzida no Brasil como importante vetor exegético a partir do chamado “caso Ellwanger”, via STF, no RHC 134682 (HC 82424). Para o Supremo, temos discurso de ódio quando a fala é discriminatória. E, para que seja considerada discriminatória, o julgador deve percorrer três etapas: 1. A constatação fática de que os seres humanos são desiguais; 2. A afirmação de superioridade sobre os diferentes; e 3. A defesa da eliminação, escravização ou supressão dos direitos fundamentais do considerado desigual.

A Justiça pode dizer se o inferno é bom ou ruim, se é frio ou se é quente, se é lugar de pastores ou de gays? Óbvio que não!

Pode ser que a primeira etapa esteja contemplada no discurso, caso façamos o seguinte raciocínio lógico: “para o pastor Eldridge, o gay tem reserva no inferno; logo, quem não é gay não tem reserva no inferno”. Não assistimos a toda a pregação, mas, ao ler os comentários e a publicação do deputado, pareceu-nos que mais gente, além dos gays, tem a tal “reserva no inferno”.

Por outro lado, essa “desigualdade”, se é que podemos chamá-la assim, se daria no plano espiritual e depois da morte; afinal de contas, só pode ir para o inferno quem já morreu. Então, a pergunta óbvia é a seguinte: existe “desigualdade espiritual”? Se existe, como se faz para processar uma alma superior que foi para o céu e fica se vangloriando para cima da alma que está no inferno? Então, parece-nos que a desigualdade entre seres humanos – necessária para a primeira etapa no Caso Ellwanger – ocorre no plano material e enquanto estamos vivos (até porque, caso contrário, o Poder Judiciário teria de aceitar a existência do inferno e do plano espiritual).

Passamos à segunda etapa. O pastor norte-americano não se disse superior, mas afirmou quem vai ou não para o inferno. A afirmação aqui só pode ter uma conotação de superioridade se reconhecermos o inferno como fato, e um fato ruim (ainda no plano espiritual). Somos pessoas de fé, religiosos, e podemos ter tais convicções; mas o Estado pode? A Justiça pode? Será que a Justiça pode dizer se o inferno é bom ou ruim, se é frio ou se é quente, se é lugar de pastores ou de gays? Óbvio que não, pelo amor de Deus!

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O caso da modelo transexual brasileira vestida de Nossa Senhora Aparecida
A liberade religiosa vitoriosa na Finlândia: o caso Räsänen e suas implicações para o Brasil

Uma coisa é ter uma ação positiva com a religião no sentido de criar condições para que as pessoas religiosas exerçam sua fé: é a laicidade colaborativa, o caso brasileiro. Outra coisa é o Poder Judiciário reconhecer a existência do inferno e que ele é muito ruim. Apenas com tal reconhecimento é que a Justiça poderia afirmar que a sentença “os gays têm reserva no inferno” é uma constatação de desigualdade entre seres humanos. Pois o ser humano que tem certeza de ir para o céu estaria cometendo um ato de superioridade ao sentenciar que os outros, incluindo gays, vão para o inferno. Reitero: a Justiça e o Estado precisariam necessariamente reconhecer a existência de céu e inferno e suas qualidades!

Por fim, a terceira etapa. O tal pastor falastrão defendeu a eliminação, escravização ou supressão dos direitos dos homossexuais? Não. Há quem diga que, no inferno, as almas condenadas não possuem direitos e são escravas do capeta. Pode ser que sim, pode ser que não. Depende do que você acredita. Todavia, no mundo do aqui e agora o pastor não falou nada sobre eliminação, escravização ou supressão dos direitos dos homossexuais; apenas – reiteramos – de céu e inferno.

Para aplicar as etapas do Caso Ellwanger e haver a caracterização como discurso de ódio, o deputado (bem como o Ministério Público e o Poder Judiciário) precisaria aceitar a versão de inferno do pastor David Eldridge. Do dia para a noite teríamos um Estado confessional pentecostal. O Tribunal de Justiça poderia se chamar Tribunal de Justiça Mundana e Espiritual ou Santo Tribunal Pentecostal, sei lá. Também precisaríamos de um Código Civil Espiritual Pentecostal com as definições de pecado, céu, inferno etc. Critérios de ingresso no céu, no inferno e por aí vai…

Voltemos ao STF: a ADO 26 (que ainda está em andamento) tem sido um marco importante para questões envolvendo homofobia. Se você quiser mais explicações sobre a decisão do julgado, sugerimos olhar este vídeo nosso aqui. A decisão segue a mesma linha do Caso Ellwanger e ainda excepciona claramente as pregações que estiverem de acordo com os livros sagrados. Esta fala do pastor norte-americano encontra ressonância com a doutrina pentecostal e as principais correntes teológicas em todo o mundo. Na exceção, deixa bem claro: “desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio” – e o que é o tal discurso de ódio? O STF responde: palavras que “incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência”.

A única forma de impedir os religiosos de pregar e ensinar sobre suas crenças é interferindo em seus dogmas via decisão judicial ou lei, dizendo quais doutrinas podem e quais não podem vigorar nos dias de hoje. Para isso, teremos de dar adeus à laicidade e às liberdades

Geralmente o discurso dogmático sobre o pecado tem o condão de salvar os pecadores, para que alcancem a vida eterna no paraíso. É necessário sempre ler o discurso religioso com a chave espiritual e acreditando nas premissas espirituais e sobrenaturais. Se você desliga a chave espiritual, o discurso religioso se torna irrelevante. Pensem conosco: Para quem não acredita em céu e inferno, a fala “gays têm uma reserva no inferno” é irrelevante, uma besteira completa como o Coelho da Páscoa ou os zumbis de The Walking Dead. Mas, se alguém acredita, ela passa a ser relevante. A relevância, no entanto, é espiritual e depende da crença de cada um; como o Poder Judiciário poderia entrar na esfera do que as pessoas acreditam ou não? Somente sendo crédulo como o fiel é! E aí teríamos um Tribunal da Santa Inquisição e não um Tribunal de Justiça!

Não temos dúvidas de que o pastor americano poderia escolher melhor as palavras para ensinar e pregar sobre os seus dogmas; afinal de contas, prudência nunca é demais e, ao nosso ver, afirmações assim apenas afastam as pessoas do Evangelho. Mas dizer que se trata de discurso de ódio, passível de crime, é demais. É o que chamamos de “perseguição educada”: chegará o tempo que ninguém mais poderá falar de inferno, afinal de contas ele é quente, ruim e sabe-se mais o quê.

A única forma de impedir os religiosos de pregar e ensinar sobre suas crenças é interferindo em seus dogmas via decisão judicial ou lei, dizendo quais doutrinas podem e quais não podem vigorar nos dias de hoje. Para isso, teremos de dar adeus à laicidade estatal e às liberdades de pensamento, consciência, crença, de expressão e religiosa.  Será o fim das liberdades, tudo porque algumas pessoas não acreditam no inferno e por isso não querem que ninguém fale sobre ele; ou, o que é pior, porque acreditam em sua visão “particular” de inferno, jogando fora a tradição milenar das igrejas cristãs, e querem impor a todos os seus fiéis tal visão particular, nascida de suas cabeças ou de movimentos identitários que não entendem nada de teologia, de céu, inferno e de coisas espirituais.


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O BRASIL VAI LANÇAR A SUA MOEDA DIGITAL O ANO QUE VEM

 

Política
Lula está contando com uma futura moeda digital estatal para aumentar seu poder?

Por
Diogo Schelp


As CBDCs, moedas digitais estatais, podem enfraquecer os bancos privados e dar mais poder aos governos| Foto: Traxer / Unsplash

Será que há algo a mais nessa guerra do governo Lula aos juros e na indiferença que o presidente vem demonstrando em relação ao mercado financeiro desde sua eleição? Talvez algo relacionado aos planos de criar uma moeda digital estatal no país, a exemplo do que vem ocorrendo globalmente? Ou será que vão querer interditar também este debate?

Antes de voltar à questão da moeda digital, falemos da interdição do debate. A estratégia para pressionar o Banco Central (BC) a reduzir a taxa básica de juros, nas últimas semanas, se deu em duas frentes. Na primeira, o presidente Lula, ministros e parlamentares de esquerda pautaram a discussão, criticando o presidente do BC Roberto Campos Neto e classificando a Selic nos patamares atuais como “vergonhosa” e até como uma traição ao povo brasileiro, como se os integrantes do Copom tivessem prazer ou interesse político em frear a economia com juros altos.

Que tal levantar outra lebre, a da moeda digital, estudada desde 2021 pelo Banco Central, e que tem potencial para enfraquecer os bancos privados e aumentar o poder do Estado?

Na segunda frente, comentaristas políticos e colunistas alinhados ao governo passaram a desqualificar os jornalistas que criticaram a pressão de Lula e que lembraram que foi com a adoção do remédio amargo da elevação da Selic que o BC conseguiu evitar que o Brasil tivesse uma inflação ainda mais alta nos últimos meses, algo que outros países não conseguiram. Teria sido um milagre? Tais jornalistas, dizem os blogueiros de esquerda, estariam sendo pautados por analistas do mercado financeiro e não estariam nem aí para o risco de desaceleração da economia. Curioso que até alguns meses atrás, quando o presidente ainda era Jair Bolsonaro, nenhum desses comentaristas que dizem amém a Lula estava se insurgindo contra a Selic elevada.

Já que o debate que o próprio governo iniciou está interditado, que tal levantar outra lebre, a da moeda digital que está sendo estudada desde 2021 pelo Banco Central e que deve ser lançada no ano que vem, com potencial para enfraquecer os bancos privados e aumentar o poder do Estado sobre os cidadãos?

Diversos países do mundo estão lançado, ainda em caráter experimental, sua própria CBDC (Central Bank Digital Currency, ou “moeda digital do banco Central”). Na China, o processo está mais avançado. Mais de 100 milhões de cidadãos têm sua carteira digital vinculada diretamente ao banco central chinês, sem passar pela intermediação de instituições bancárias de varejo, e já realizaram transações que somam bilhões de yuans.

Um sistema financeiro controlado de ponta a ponta por Estados é o futuro distópico que se vislumbra quando se pensa nas possibilidades extremas das CBDCs.

Mas o que é uma CBDC? De maneira bem resumida, é uma moeda digital que, ao contrário das de criptomoedas como Bitcoin ou Ethereum, não é privada e tampouco descentralizada. Trata-se, como o próprio nome diz, uma moeda digital criada e lastreada pelo Estado, por meio de seu banco central. Cidadãos e empresas fazem transações digitais uns com os outros de maneira virtual usando suas carteiras vinculadas ao BC, sem precisar dos bancos.

Os bancos privados, com razão, estão apavorados, por mais que muitos especialistas digam que seus serviços continuarão sendo necessários para muitas outras coisas. Tudo depende de quais regras cada banco central vai adotar para essas moedas. Por exemplo, se não houver limite do total de moeda digital que cada pessoa ou empresa pode movimentar sem custos, se o dinheiro depositado na carteira digital estatal for remunerado com juros e se, além de tudo, o Estado ainda resolver fornecer crédito diretamente aos cidadãos por meio de seu banco central, o que mais os bancos convencionais poderão oferecer?

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Surge, aí, o componente político da questão. Enquanto a posse de criptomoedas ou de dinheiro em espécie permite o anonimato (e mesmo os depósitos bancários atuais garantem algum grau de sigilo), o mesmo não tem como ocorrer com as moedas digitais estatais. O Estado consegue saber quem pagou o quê para quem, até porque precisará rastrear movimentações para finalidades criminosas (como terrorismo e narcotráfico), e, em uma situação de totalitarismo, pode até impedir que determinadas transações sejam feitas. Imagine um regime como a China com o controle total sobre o principal — e, quem sabe, em algum momento, o único — meio de pagamento disponível.

Um sistema financeiro controlado de ponta a ponta por Estados, sem intermediários privados, esse é o futuro distópico que se vislumbra quando se pensa nas possibilidades extremas das CBDCs.

O real digital é uma política de Estado, não de governo. Não começou com Lula e, se for de fato implantado, não terminará com sua gestão.

Mais de 100 países já estão estudando — ou já concluíram, em fase experimental — a implantação de suas próprias moedas digitais. Ninguém quer ficar atrás. Claro que existe uma preocupação de afastar os temores dos bancos. Muitas autoridades monetárias desmentem que o sistema vá substituir o sistema financeiro atual.

Há dois meses, ao falar sobre os planos para uma moeda digital estatal no Brasil, Roberto Campos Neto disse que o modelo será basicamente uma junção do sistema de depósitos bancários já existente e da nova carteira digital. “Você vai ter duas carteiras: o Pix, que vai ser o integrador da carteira do dinheiro físico. E vai ter a carteira digital”, disse Campos Neto.

Mas é óbvio que, com o passar do tempo e com a evolução das tendências do setor em nível global, o sistema pode se tornar cada vez mais centralizado.

Duvido que, pelo menos no caso do Brasil, o atual governo seja capaz de antever as oportunidades totalitárias das moedas digitais estatais.

O real digital, portanto, é uma política de Estado, não de governo. Não começou com Lula e, se for de fato implantado, não terminará com sua gestão.

Mas é interessante se perguntar até que ponto essa nova realidade tão próxima está motivando a atitude atual do governo Lula nas discussões em torno da autonomia do Banco Central, do desprezo pelos humores do “mercado” e da pressão sobre os juros sem preocupação com a inflação.

Vale lembrar que existem estudos, confirmados tanto pelo governo brasileiro quanto pelo argentino, de criação de uma moeda comum para transações comerciais no Mercosul — que seria nada mais, nada menos, do que uma moeda digital.

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E também não se pode esquecer que Lula quer colocar a ex-presidente Dilma Rousseff na presidência do banco dos Brics, grupo que reúne Brasil, China, Rússia, Índia e África do Sul. E que uma das ideias é justamente a de usar uma ou mais CBDCs nas relações comerciais entre esses países.

Alguém com tendências conspiracionistas poderia imaginar que os governantes de alguns países, e talvez o próprio Lula, estão contando com o futuro das moedas digitais estatais para aumentar seu poder. Sou mais cético, e duvido que, pelo menos no caso do Brasil, o atual governo seja capaz de antever as oportunidades totalitárias das moedas digitais estatais.


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