terça-feira, 1 de setembro de 2020

MARCO DO GÁS EM APROVAÇÃO NO CONGRESSO NACIONAL PODE BARATEAR O GÁS PARA OS CONSUMIDORES

 

Veja como funciona e o que pode mudar com a aprovação do novo marco do gás

 

Redação Jornal Hoje em Dia

 

 


BRASÍLIA - O novo marco do gás é a aposta do governo para reduzir o preço do insumo, atrair investimentos, aumentar a competição e evitar monopólios. A queda de custo deve atingir principalmente os principais consumidores do gás natural - a indústria e o setor de energia termelétrica. Mas a expectativa do governo é que essa redução seja repassada ao consumidor final.

A aposta do governo, que visa destravar investimentos de até R$ 43 bilhões e reindustrializar o País, deve ir à votação hoje na Câmara. Alinhado ao novo mercado de gás, programa do governo mais conhecido como “choque da energia barata”, a proposta abre um setor que até pouco tempo era dominado pela Petrobrás.

 

© Jorge Henrique/Estadão Além da Petrobrás, o País tem 30 empresas que produzem gás natural - mas domínio ainda é da estatal.

Veja logo abaixo os principais detalhes sobre a medida.

O que é o gás natural?

O gás natural é um combustível fóssil normalmente encontrado em camadas profundas do subsolo, associado (dissolvido) ou não ao petróleo. Ele é extraído por meio de perfurações, tanto em terra quanto no mar. No Brasil, a maior parte da produção é associada ao petróleo.

Onde ele é usado? Por quem?

A grande consumidora de gás natural no país é a indústria, que usa 52% do total produzido. As fábricas utilizam o gás como combustível para fornecimento de calor e geração de eletricidade, mas também como matéria-prima nos setores químico e petroquímico, principalmente para a produção de metanol e de fertilizantes. É usado ainda como redutor siderúrgico na fabricação de aço. Em seguida, com 33%, está o setor de geração elétrica, com as termelétricas. Depois vem o uso como combustível automotivo (GNV), com 9%. Outros 4% são utilizados por cogeração de energia, enquanto o uso residencial (em fogões e para aquecimento de chuveiros, por exemplo) e o feito por estabelecimentos comerciais respondem, cada um, por apenas 1% do consumo total.

Qual a diferença para o gás de cozinha?

O gás natural que chega à residência dos consumidores é o gás encanado. O chamado gás de cozinha, vendido em botijões, é de outro tipo: o gás liquefeito de petróleo (GLP). O primeiro é composto principalmente por metano e etano e é uma substância mais leve que o ar, enquanto o segundo é uma mistura de hidrocarbonetos, entre eles os gases butano e propano, e é mais pesado do que o ar.

Quem produz gás natural no Brasil?

Além da Petrobrás, o País tem cerca de 30 outras empresas que produzem gás natural. Mas a estatal responde pela grande maioria da produção.

Quem distribui?

Em geral, a distribuição de gás natural é feita separadamente por Estado, na maioria por empresas estatais. A Petrobrás é sócia de 19 das 26 distribuidoras.

Qual o tamanho da Petrobrás nesse mercado?

Segundo o governo, a estatal responde por 77% da produção nacional e por 100% do que é importado de outros países. É sócia de 20 das 27 distribuidoras do país, e consome 40% da oferta total. A empresa opera praticamente 100% das infraestruturas essenciais, e detém toda a capacidade da malha de transporte, com participação em todos os dutos.

Quanto custa?

O preço do gás natural do Brasil é alto na comparação com outros países, de US$ 12 a US$ 14 por milhões de BTUs (unidade térmica britânica, na sigla em inglês), de acordo com dados apresentados pelo ministro de Minas e EnergiaBento Albuquerque, à Câmara dos Deputados. Nos Estados Unidos, por exemplo, o preço é de aproximadamente US$ 3 e em países da Europa, US$ 7.

O que diz a lei?

  • Estabelece o regime de autorização para gasodutos. Desde 2009, o regime é de concessão, mas nenhum gasoduto foi construído no período. Com a autorização, o processo é mais simples e cada agente poderá construir, ampliar, operar e manter livremente as estruturas de transporte, por sua conta e risco.
  • Assegura o livre acesso a terceiros de infraestruturas essenciais como gasodutos de escoamento, unidades de processamento de gás natural (UPGN) e terminais de liquefação e regaseificação de GNL. As empresas deverão pagar por esse acesso – hoje, restrito aos donos, no caso à Petrobrás. Isso vai possibilitar entrada de novos produtores e comercializadores que eventualmente não tenham interesse ou recursos para construir um duto próprio.
  • Impede a relação societária direta ou indireta entre transportadores, exercida por monopólio, e produtores e comercializadores, em regime competitivo.
  • Estabelece regime de autorizações para a estocagem subterrânea de gás natural, por conta e risco do interessado. Hoje, o Brasil não conta com essa atividade, que proporciona melhor atendimento e mais segurança a clientes com grande demanda, como termelétricas.
  • Prevê regime de contratação de capacidade de gás por pontos de entrada e saída na malha de gasodutos de transporte. Isso agiliza e desburocratiza a prestação do serviço de transporte.
  • Dá segurança jurídica ao mercado de gás, ao consolidar várias regras de mercado em uma única lei.

O que isso deve significar na prática?

O objetivo é aumentar o número de empresas atuantes no mercado de gás, rompendo assim o monopólio da Petrobrás. A ideia é que, com mais empresas competindo no mercado, o preço seja reduzido. O governo também vai incentivar os Estados a privatizarem suas empresas e atualizarem os marcos regulatórios próprios, já que a competência para legislar sobre distribuição de gás é dos governadores.

Qual a redução de preço esperada?

O ministro Paulo Guedes disse “pode ser que caia 40% em menos de dois anos até”. Já o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirma que o mercado vai regular o preço. “Não somos nós que vamos dizer quanto que o valor do gás vai cair ou não. A expectativa é que em torno de dois ou três anos o preço do gás tenha uma forte redução.”

Quanto o novo mercado deve movimentar?

O Ministério de Minas e Energia, calcula que o programa pode destravar R$ 32,8 bilhões em investimentos em infraestrutura para gás no país até 2032.

A energia pode ficar mais barata?

O governo diz que, com a abertura do mercado, o preço do gás natural poderá cair e, consequentemente, o preço da energia elétrica, já que parte das usinas térmicas usam o combustível para gerar eletricidade. O preço baixo deve impulsionar a construção de novas usinas a gás, em substituição às termelétricas a diesel e óleo combustíveis, que são mais poluentes e produzem energia cara.

 

ANÁLISE SOBRE A REFORMA TRIBUTÁRIA EM ANDAMENTO NO CONGRESSO

 

A reforma tributária e a crise

 

Bernard Appy*

 


 

 

Uma preocupação que surgiu no debate sobre a reforma tributária diz respeito a seus efeitos sobre as empresas, num momento em que vários setores da economia vêm sendo afetados pela crise do coronavírus. Como a reforma tende a provocar uma redistribuição da carga de tributos, alguns setores prejudicados pela crise atual temem ter sua recuperação dificultada por um aumento da tributação.

Trata-se de uma preocupação pertinente, especialmente no caso de uma mudança que afetasse a distribuição setorial da carga tributária num período curto, na saída da crise. Este não é o caso, no entanto, da proposta de reforma tributária consolidada na PEC 45/2019, atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados, que prevê a substituição de cinco tributos atuais – PISCofinsIPIICMS e ISS – por um único Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

 

Caso a PEC 45 seja aprovada neste ano ou no início de 2021, o IBS só começará a ser cobrado em 2023, em razão da necessidade de aprovação da legislação complementar e montagem da estrutura de administração do novo imposto (que será gerido conjuntamente pela União, pelos Estados e pelos municípios), inclusive dos sistemas informatizados necessários para a sua operação. Adicionalmente, nos dois primeiros anos de operação o IBS será cobrado à alíquota de apenas 1%, sendo seu custo dedutível do valor devido de Cofins, não afetando, portanto, nenhum setor da economia. Ou seja, até 2024 a aprovação da PEC 45 não resultará em aumento da tributação de nenhuma empresa, e mesmo após esse período haverá uma transição em mais oito anos.

© Clayton de Souza/Estadão Até mesmo os serviços prestados a pessoas físicas podem ser beneficiados pela reforma tributária.

 


Isso não significa, no entanto, que a aprovação da PEC 45 não tenha impactos no curto prazo. Há, sim, um efeito positivo sobre as expectativas dos agentes econômicos, que tende a se refletir numa queda dos juros de longo prazo, a qual pode ser muito importante para reativar a demanda na saída da crise. Esse efeito é consequência da perspectiva de melhoria da solvência do setor público decorrente do impacto da reforma tributária sobre o potencial de crescimento da economia no longo prazo.

Segundo estudo do economista Bráulio Borges, mantendo o teto dos gastos federais até 2036 (com uma pequena flexibilização em 2027), no cenário sem reforma a dívida pública chegaria a cerca de 100% do PIB no final do período. Já no cenário que considera a aprovação da PEC 45, supondo a mesma regra para os gastos, o maior crescimento da economia levaria a dívida pública a menos de 30% do PIB em 2036. Tais cálculos demonstram que o aumento do potencial de crescimento resultante da reforma tributária pode ser determinante para a solvência do setor público, o que tende a ser antecipado pelos agentes econômicos, contribuindo para a saída da crise.

O aumento do potencial de crescimento também é essencial para entender o impacto da reforma tributária sobre os diversos setores da economia. Mesmo setores cuja tributação tende a crescer em termos relativos serão beneficiados pelo maior crescimento da renda. No caso dos serviços prestados a pessoas físicas, por exemplo, um cálculo simplificado sugere que, para cada 1% de aumento de renda das famílias, a demanda por esses serviços cresce cerca de 1,5%. Isso significa que, se a reforma tributária elevar a renda das famílias em 20 pontos porcentuais em 15 anos – como indica o estudo citado acima –, a demanda por serviços pode crescer cerca de 30 pontos porcentuais acima do que cresceria sem a reforma.

 

Em suma, no curto prazo nenhum setor da economia será prejudicado pela aprovação da PEC 45. Ao contrário, o efeito positivo da reforma sobre as expectativas e os juros de longo prazo tende a beneficiar todos os setores na saída da crise.

No longo prazo há, é verdade, mudanças na distribuição da carga tributária entre setores. Mas mesmo os setores cuja participação no total da tributação tende a crescer serão beneficiados pelo maior crescimento resultante da reforma tributária.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL