A surpreendente fuga do empresário brasileiro Carlos Ghosn de prisão
domiciliar no Japão para o Líbano
© Reuters Ainda não está claro como Carlos Ghosn
conseguiu deixar o Japão
O ex-presidente da Nissan, o brasileiro Carlos Ghosn, viajou ao
Líbano após fugir do Japão, onde é acusado de crimes financeiros.
Num comunicado, Ghosn disse que não fugiu da
Justiça, mas sim "da injustiça e da perseguição política". O advogado
Junichiro Hironaka, que representa o brasileiro, afirmou que está
"estupefato" com a notícia e que não falou recentemente com seu
cliente.
Não está claro como Ghosn conseguiu deixar o país,
já que ele estava impedido de viajar para o exterior e sob supervisão da
Justiça.
O brasileiro, que tem um patrimônio estimado em US$
120 milhões, era uma das figuras mais poderosas da indústria automotiva até ser
preso em novembro de 2018. Ele nega ter cometido qualquer irregularidade.
O caso dele atraiu atenção internacional e os
vários meses em que ficou na prisão levou a um questionamento sobre o sistema
judicial japonês. O executivo de 65 anos nasceu no Brasil, é descendente de
libaneses e passou parte da infância e juventude em Beirute, capital do Líbano,
antes de completar os estudos em Paris.
©
AFP Esta casa em Beirute pertence a Ghosn. A esposa dele, Carole, nasceu na
capital libanesa
Ele possui passaportes francês, brasileiro e
libanês. Mas seu advogado disse a repórteres em Tóquio, nesta terça (31), que a
equipe de defesa de Ghosn ainda está com os documentos dele.
"Eu nem sei se conseguiremos contato com ele.
Não sei como vamos prosseguir a partir de agora", disse Hironaka.
O Líbano não tem acordo de extradição com o Japão.
Ghosn foi liberado da prisão em abril após pagar US$ 9 milhões em fiança e sob
várias restrições que tinham como objetivo impedir que ele saísse do país.
O que diz o
comunicado de Carlos Ghosn
O executivo brasileiro divulgou um breve comunicado
depois que várias agências de notícias publicaram a informação de que ele teria
viajado ao Líbano.
Ele confirmou que embarcou para o país do Oriente
Médio e disse que "não vai mais ser mantido refém pelo viciado sistema de
justiça japonês, em que a culpa é presumida, a discriminação é desenfreada e
direitos humanos básicos são negados".
"Agora eu posso finalmente me comunicar
livremente com a imprensa e espero começar a fazer isso na próxima
semana."
Ghosn tem repetidamente negado qualquer
irregularidade desde que foi preso pela primeira vez. Os advogados dele
acusaram o governo japonês de conspirar contra seu cliente, dizendo que o
processo teve "motivações políticas".
A esposa de Ghosn, Carole Ghosn, disse à BBC News em junho que
autoridades tentaram "intimidar e humilhar" o casal.
©
Getty Images Carole Ghosn (à direita, ao lado de Carlos Ghosn) chegou a dizer
que pediria ajuda aos presidentes dos EUA e do Brasil e acusou o sistema
judicial japonês de não respeitar os direitos do marido
Como o executivo conseguiu fugir do Japão é uma
incógnita. Ghosn tinha que observar diversas restrições por determinação da
Justiça desde que foi solto sob fiança.
Ele era monitorado por um sistema de vídeo em sua
casa e tinha limitações para uso de celular e computador. Teve também que
entregar os passaportes a seu advogado e necessitava pedir permissão a um juiz
para passar mais de duas noites fora de casa.
De acordo com a agência de notícias japonesa Kyodo
News, os termos da fiança não haviam sido modificados.
Vergonha e
questionamentos no Japão
O correspondente da BBC News em Tóquio, Rupert
Wingfield, diz que a fuga de Ghosn deixou na capital japonesa um sentimento de
embaraço e muitas perguntas sem resposta.
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STEPHANE DE SAKUTIN/AFP/GETTY IMAGES As condições da soltura de Ghosn sob
fiança incluíam monitoramento de sua casa com câmeras de segurança e a entrega
dos do executivo passaportes aos advogados de defesa
Como uma figura tão conhecida, que teve de entregar
seus passaportes, conseguiu deixar um país que não tem fronteira terrestre com
nenhum outro?
A imprensa japonesa especula que Ghosn pode ter
usado um outro passaporte, com nome diferente.
Promotores haviam alertado que, se o executivo
fosse solto, havia um risco de fuga, devido ao seu amplo patrimônio e múltiplas
cidadanias.
Que acusações Ghosn
enfrenta?
Ghosn já foi considerado o "herói" do
sucesso da Nissan e se tornou até personagem de revista em quadrinhos no Japão.
Mas sua queda foi tão notável quanto sua ascensão.
Ele passou 108 dias sob custódia, após ser preso em
Tóquio em novembro de 2018. A Nissan demitiu Ghosn três dias depois disso.
Promotores alegam que o executivo fez um pagamento
multimilionário a um distribuidor da Nissan em Omã. A empresa japonesa, por sua
vez, acusa Ghosn de desviar dinheiro da companhia para enriquecimento próprio.
Ele também é acusado pelos investigadores de ter
reportado ao fisco remuneração menor do que a que recebia. Ghosn nega todas as
acusações.