quinta-feira, 1 de setembro de 2016

FATIAMENTO DA CONSTITUIÇÃO INDESEJADO



Juristas alertam que 'fatiamento' do impeachment poderá ser usado por Cunha

Estadão Conteúdo 







Eduardo Cunha está afastado da presidência da Câmara dos Deputados desde maio deste ano

Juristas e constitucionalistas avaliam que o fatiamento do impeachment da presidente Dilma Rousseff poderá ser usado pelo deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) e outros políticos. Eduardo Cunha, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro na Operação Lava Jato perante o Supremo Tribunal Federal, será julgado no dia 12 de setembro por seus pares.

O professor do Instituto de Direito Público de São Paulo Luiz Fernando Prudente do Amaral afirma que quanto à questão da inabilitação, houve a manutenção, em tese, de todas as possibilidades relativas a cargo público. "A questão da elegibilidade vai ser discutida no Judiciário, inclusive se eventualmente esse julgamento colegiado do Senado se equipara para efeitos da Lei Ficha Limpa com aquele julgamento colegiado da Lei da Inegibilidade."

Sobre as futuras candidaturas, Prudente do Amaral avalia que depende de como esses tribunais e até a Justiça Eleitoral vão decidir. "No que tange à aplicação da mesma lógica para o Eduardo Cunha, parece que não é um efeito automático do que foi compreendido pelo Senado, mas é algo que certamente será alegado. É lógico que serve como precedente, porém não é certo se será considerado", diz.

O especialista alerta ainda que é importante colocar que a questão de desmembrar os quesitos de afastamento e inabilitação 'é algo bastante questionável, sobretudo para se saber se a lei do impeachment foi recepcionada pela Constituição nessa parte'.

"Isso porque o parágrafo único do artigo 52 dá a entender na leitura, de modo bastante claro, que um seria consequência do outro e houve o desmembramento. Como não houve posicionamento do Supremo Tribunal Federal na matéria em termos de avaliação de constitucionalidade, então fica-se sem essa certeza", observa Prudente do Amaral.

Fábio Martins Di Jorge, especialista em Direito Administrativo da Peixoto & Cury Advogados, diz que a Lei de Inelegibilidade, alterada pela Ficha Limpa, não atinge o presidente da República findo o processo de impeachment.

"Somente se aplicaria a inelegibilidade de oito anos no caso de renúncia do cargo pelo presidente da República após o oferecimento da representação capaz de instaurar o processo de perda do cargo", pondera Di Jorge. "Aplica-se somente a governador e a prefeito além dos respectivos vices. Mas não há lacuna, sendo que a omissão é proposital, uma vez que o parágrafo único do artigo 52 da Constituição regula a matéria e não permite, ao meu sentir, a divisão da votação por quesitos como se deu hoje no Plenário do Senado, sendo conatural à condenação da perda do cargo a inabilitação por oito anos para o exercício de qualquer função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis", afirma.

Di Jorge assinala, ainda. "Outra não é a disposição do artigo 2º da lei de impeachment: crava-se a inabilitação com a perda do cargo. A Constituição elevou a inabilitação de 5 anos para 8 anos. Aliás, realmente, não mais se coaduna com nosso sistema alguém ser arredado do cargo eletivo por crime de responsabilidade sem inabilitação, Constituição artigo 37, §4º da Constituição Federal."
Ele cita o Mandado de Segurança 21.689-DF, impetrado pelo presidente cassado Fernando Collor (PTB/AL). O Supremo decidiu pela inabilitação por 8 anos atrelada à perda do cargo. "O Supremo provavelmente será chamado a tratar do tema novamente e espero que de forma urgente, eis que temo possa a decisão de hoje influenciar nos processos de cassação de mandatos no Poder Legislativo, sendo ainda mais grave para o país o que se tem noticiado sobre um possível 'acórdão' na sessão de hoje", avalia Di Jorge.

A advogada Sylvia Urquiza, sócia da Urquiza, Pimentel e Fonti Advogados, declarou nesta quarta-feira, 31, que 'aquele que renuncia para não enfrentar o processo de impedimento não pode ser reeleito por 8 anos, o que sofre impedimento também tem a mesma pena'.
"Por lógica, aplica-se ao menos, aplica-se ao mais", diz Sylvia.

"A discussão envolve as definições de inelegibilidade e inabilitação", ela argumenta. "A conclusão sobre cada vernáculo, dentro do direito, é longa e emana da análise de varias leis. De uma maneira mais simples, é de se dizer que o primeiro apenas alcança a possibilidade de se eleger a cargo público, sendo que a segunda abrange também a função pública. Ou seja, quem é inabilitado não pode exercer nenhuma função pública, ainda que o cargo decorra de concurso público ou indicação."
Sylvia Urquiza é taxativa. "A decisão não poderia ser apartada. Julgada impedida, é efeito da decisão a inabilitação. Dessa forma, não poderá a presidente exercer nenhuma função pública nos próximos 8 anos."

De acordo com o constitucionalista Adib Abdouni, titular do Adib Abdouni Advogados, é equivocada a hipótese de segmentação das votações de perda do mandato e de supressão dos direitos políticos, uma vez que colide com o artigo 52, parágrafo único da Constituição. "O texto constitucional é expresso ao registrar que, havendo a condenação por crime de responsabilidade, irradiam-se duas sanções concomitantes, quais sejam, a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de função pública", anota Abdouni.

"Em que pese o ministro Lewandowski, ao atender o pedido da defesa e dos senadores aliados à presidente afastada, com fundamento no Regimento Interno daquela Casa, (destaque de determinado ponto da acusação) -, não se vê como superar o desacerto, tendo em vista a inequívoca supremacia da Carta Magna em relação à redação regimental. Uma vez reconhecido o crime de responsabilidade com a consequente perda do mandato, a inabilitação para o exercício de função pública revela-se como uma consequência indissociável, não se justificando, o aventado fatiamento, haja vista que a produção de resultados díspares para essas duas sanções, resvala em quebra normativa da Constituição Federal, ante o quadro antagônico formado", conclui Abdouni.

Para o advogado Eduardo Nobre, sócio fundador do Instituto de Direito Político e Eleitoral (IDPE) e sócio responsável pela área eleitoral do Leite, Tosto e Barros Advogados, a Constituição é suficientemente clara ao dispor que a inabilitação é consequência jurídica imediata à perda do cargo, ou seja, em se entendendo pelo cometimento do crime de responsabilidade ela perde o cargo e fica automaticamente inabilitada.

"A decisão é política", crava o criminalista Daniel Bialski, sócio do Bialski Advogados. "E a maioria dos votos proferidos de forma diferente para as questões é consequência de que muitos que estão em situação similar, sendo investigados e respondendo processo, portanto, não queriam abrir um precedente que no futuro seria usado contra eles e os prejudicaria. Obviamente, haverá investigação e um processo judicial sobre os fatos e no Supremo Tribunal Federal, acaso condenada, como consequência, perderia os direitos políticos obrigatoriamente", completa o advogado.


VOCÊ TEM MEDO DA SOLIDÃO?



Medo da solidão

Simone Demolinari 




O medo da solidão é algo presente em muitos de nós. Sofremos pelo fato de nos imaginarmos sozinhos, mas não sabemos ao certo o por quê.
Se analisarmos, encontraremos a solidão sempre associada a contextos negativos. Ficar sozinho é sinônimo de castigo: pais penalizam o filho deixando-o sozinho num quarto porque ele não estudou; nas prisões as punições são feitas nas “solitárias”, etc. Um condicionamento que indica que ser gregário é bom e solitário ruim.
No âmbito social, a solidão é vista como fracasso. Antigamente, uma pessoa que não se casava acabava sendo vista como alguém pouco atraente ou sem competência para manter relacionamentos. Com isso, os solteiros eram associados à imagem de pessoas incapazes. Vem daí o desejo de muitos preferirem carregar o status de divorciados. Isso mudou um pouco, mas não totalmente.
Não podemos negar a concepção pejorativa que os solteiros carregam: solteirões, tios, ou encalhados. A propósito, sempre questionei o uso do termo “encalhar” como sinônimo de não se casar. “Encalhado” é algo “estacionado”, “parado”. Portanto, o mais lógico seria usar o termo “encalhado” para classificar os casados, uma vez que, em tese, eles “estacionam” com um só par. Já os solteiros continuam por aí “desencalhados”.
Mas voltando ao medo da solidão, há quem busque atenuá-la nas relações amorosas: desejam com tanto afinco uma união afetiva que acabam elevando o(a) parceiro(a) à condição de “alma gêmea”, mesmo com sinais evidentes do contrário. Há também aquele que suporta anos a fio relacionamentos desgastados para não ficarem sozinhos.
Outro motivo pelo qual as pessoas sentem pavor da solidão está ligado à velhice. Se imaginar idoso solitário faz com que muitos optem automaticamente por formar uma família. A vocação para paternidade ou maternidade, nesse caso, não é levada em conta. O objetivo maior é garantir uma suposta segurança através de filhos e netos. Repetem um modelo social parcialmente inconscientes das suas vontades particulares.
Seja por condicionamento ou por insegurança, o medo da solidão desnuda uma faceta da fragilidade humana que, sem ter como suprir a própria necessidade, acaba por transferi-la ao outro, na ilusão de que isso irá resolvê-la. Mas não resolve. Ao contrário, piora. A fragilidade transferida passa para o comando do outro.
Nos falta estímulos para perceber que ficar sozinho não é demérito. Ao contrário, é competência emocional que garante liberdade e dignidade. É ficando sozinho que o indivíduo dimensiona sua força, avalia seu potencial e se reinventa. É na solidão que se conclui que a felicidade procurada só pode ser encontrada dentro de si. Ao concluir isso, a autonomia pessoal cresce e a ilusão de que alguém irá salvá-lo some. Percebe-se aí como o próprio salvador. Uma força interior que alguns nem têm oportunidade de encontrar.
Paradoxalmente, quanto maior for a capacidade do indivíduo em ficar sozinho, menos sozinho ele ficará.

NOVO PRESIDENTE - VELHOS PROBLEMAS



No desenho de uma nova página na história do Brasil, Temer tem o desafio de tirar o país da recessão

Amália Goulart 





MICHEL – Ao tomar posse na Câmara dos Deputados, ele foi saudado pelos parlamentares, que fizeram fila para os cumprimentos

Conhecido no meio político como “esfinge” do PMDB, tido por muitos como “apaziguador” e por outros como “usurpador”, Michel Temer, de 75 anos, é o novo presidente do Brasil e terá como desafio tirar o país da segunda mais profunda recessão da história.

Para reverter a queda do Produto Interno Bruto, de 4,6% no primeiro semestre, e um desemprego que atinge 11,8 milhões de pessoas, Temer encaminhará ao Congresso, ainda neste ano, a reforma da Previdência e o que chamou de “adequação das relações entre empregadores e trabalhadores”. Pretende ainda aprovar o teto que limita os gastos públicos ao percentual inflacionário. O objetivo, segundo ele, é deixar o governo “sob aplausos” dentro de dois anos e quatro meses. “Não será fácil”, disse.

Temer assistiu à sessão do julgamento do impeachment pela televisão, no Palácio do Jaburu, ao lado da hoje primeira dama, Marcela Temer, e de ministros. No momento em que foi aberta a votação, ele encaminhou-se a uma sala reservada, com a esposa. Não gostou do resultado final. Queria que Dilma Rousseff (PT) perdesse os direitos políticos, o que não ocorreu.

“É inadmissível. Se é governo, tem que ser governo”, afirmou após a posse, ao realizar a primeira reunião ministerial. O recado foi para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), que avalizou acordo para permitir o salvo conduto político a Dilma. Cassada, ela não perdeu os direitos políticos. A sessão histórica que derrubou a petista foi concretizada em dois atos. No primeiro, 61 dos 81 senadores decidiram pelo impedimento. Não houve abstenção. Já no derradeiro, 46 parlamentares decidiram dar a Dilma o direito de habilitar-se futuramente a um cargo público.

Temer prometeu uma relação diferente com o Congresso. Na primeira reunião com os ministros, determinou que todos negociem com deputados e senadores projetos da gestão peemedebista. Ele não quer ter o mesmo fim que a antecessora.

‘Golpista é quem derruba a Constituição’, diz presidente, que não levará ‘ofensa para casa’

O primeiro discurso foi altivo, duro. Michel Temer bateu o punho na mesa, em reunião com ministros, e disse que não levaria “ofensas para casa”.

Pediu a todos os integrantes do governo que rebatam as acusações dos opositores. “Golpista é quem derruba a Constituição”, disparou. O novo presidente determinou a todos que não deixem sequer um questionamento sem resposta.

Mas também afirmou que não teria caça às bruxas. O peemedebista estava referindo-se aos discursos de petistas, aliados da ex-presidente Dilma Rousseff e da própria petista, que prometeu uma ferrenha oposição.

Ainda ontem, Michel Temer viajou para a China para a reunião do G-20. Oportunidade em que, segundo ele, tentará desfazer o discurso petista de que houve um golpe. “A partir de hoje divulguem que nós estamos viajando exata e precisamente para revelar aos olhos do mundo que temos estabilidade política e segurança jurídica”.

Diplomacia
Segundo Temer, o principal objetivo da viagem é atrair recursos para o Brasil. “Vamos fazer várias viagens ao exterior com esse objetivo”, disse. Ele destacou as agendas bilaterais previstas e disse ainda que, durante o encontro do G-20, fará quatro discursos, inclusive no almoço com os líderes.

Para o dia 3 de setembro, por exemplo, já estão previstos encontros bilaterais com os primeiros ministros da Espanha e Itália, com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita. Há também a previsão de uma conversa com o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevedo.


MENOS BUROCRACIA E MAIS PROGRESSO



Para especialistas, governo terá que agilizar reformas para evitar desgaste

Raul Mariano 



INDÚSTRIA – Olavo Machado, da Fiemg, quer menos onerosidade para as empresas

Mudar os rumos da economia dentro de um curto período de tempo será o maior desafio para o presidente Michel Temer, com a consolidação do processo de impeachment de Dilma Rousseff. Para especialistas, o humor do mercado vai ser diretamente influenciado pela velocidade com que vão avançar as principais reformas dentro do Congresso.

 tarefa é considerada difícil porque envolve mudança em estruturas extremamente rígidas. Primeiro, o presidente precisará determinar um limite para os gastos do governo em 2017, tendo como baliza a inflação deste ano. A mudança possivelmente encontrará barreiras porque vai propor a desvinculação de receitas específicas a gastos com saúde e educação.

Outra medida de caráter impopular, mas esperada pelo mercado, é a aprovação da reforma da Previdência. Como os gastos com aposentadorias estão entre as maiores despesas do governo, a ideia é mexer nessa conta para conseguir uma adequação das finanças públicas.

No entanto, a tentativa de fixar uma idade mínima comum para homens e mulheres se aposentarem, assim como desvincular o salário mínimo do piso pago aos aposentados são medidas que vão enfrentar enorme resistência popular.

“Mesmo com a mudança de presidente, a base política continua sendo a mesma. Portanto, essas reformas ou serão recusadas ou vão amargar no congresso por um longo prazo, o suficiente para deteriorar ainda mais as expectativas (do mercado)”, avalia o presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen.

Moeda

Com a efetivação de Temer como presidente da República, a tendência é de valorização do real frente ao dólar. Segundo Pettersen, isso deve ser motivado pela maior entrada de capitais no país.

“De um lado, (o real valorizado) ajuda no combate à inflação, mas é péssimo para a economia porque torna as importações mais baratas e enfraquece ainda mais a indústria nacional”, explica o economista.

Representantes de setores da indústria defendem que a redução da taxa de juros e a simplificação da carga tributária estejam entre as prioridades do governo que se inicia com o desfecho do impeachment. A gerente executiva da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq/MG), Regiane Nascimento, avalia que é necessário reanimar o empresariado para que a o país volte a crescer.

“Estamos com um índice de mais de 30% de capacidade ociosa. Ou seja, mesmo que haja uma grande reviravolta, não haverá uma retomada significativa na indústria de máquinas. Não adianta a aplicação de medidas pontuais”, avalia.

Empresários mineiros cobram ações para retomar crescimento

O presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais, Olavo Machado, espera que o governo Temer tome agora iniciativas para desburocratizar todo o processo produtivo para que a indústria retome o crescimento.

“Temos muitas normas, portarias, leis. É necessário criar um ambiente de negócios que gere vendas e mercado para atacar o desemprego que está alarmante”, disse Machado, acrescentando que o governo deve desenvolver ações para tornar menos burocrática as estruturas trabalhista, tributária e previdenciária.

O presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, comemorou o impeachment e cobrou medidas de Temer no comando do país, como o ajuste fiscal e reforma da previdência. A entidade voltou a rechaçar qualquer aumento de impostos e cobrou do Banco Central a redução da taxa de juros e um controle do câmbio para não prejudicar as exportações.

“O equilíbrio fiscal deve ser feito sem aumento de impostos. Os brasileiros não admitem aumento de impostos”, disse.
Já o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte, Bruno Falci, afirmou que é necessário restaurar urgentemente o equilíbrio econômico e político do país. “É preciso que o novo governo recupere a confiança dos investidores, dos empresários e da população”, disse.