Por Alexandre Garcia – Gazeta do Povo Porto Alegre
A senadora Simone Tebet e o ex-governador Eduardo Leite| Foto: Divulgação Ouça este conteúdo
O presidente Jair Bolsonaro está indo nesta segunda-feira a Recife.
Vai ver in loco os males causados pela chuva. São mais de 60 mortos e
mais de mil desabrigados já. Tragédias brasileiras em todas as épocas do
ano. No Rio de Janeiro, é no verão. Agora é Recife com chuvas
torrenciais.
Maratona de viagens Não sei como o presidente aguenta, é a maior
correria, não tem parada. Estava em Goiânia na Marcha para Jesus. Depois
foi para Manaus, com aquela multidão gigantesca também na marcha.
Antes disso teve Minas Gerais, também acompanhado de multidões,
inclusive em Belo Horizonte.
Em Minas, no auditório da federação das indústrias, Bolsonaro
levantou o braço de Romeu Zema (Novo), governador de Minas Gerais,
mostrando uma aliança. Depois levantou o braço de Arthur Lira
(Progressistas), que ficou satisfeitíssimo, mostrando que está tudo bem
entre o presidente da Câmara e o presidente da República. Eu faço uma
ressalva, porque eu perguntei ao Palácio sobre o Rodrigo Pacheco, que
muitos reclamam e chamam de roda presa. O Palácio disse que não tem
queixas dele, que está encaminhando bem as questões de interesse da
presidência da República.
PSDB provavelmente vai de Eduardo Leite Aqui em Porto Alegre está
todo mundo esperando para ver o que decide agora na quinta-feira o PSDB.
Porque está entre Simone Tebet, que é MDB, e Eduardo Leite, que perdeu
as prévias para João Doria. Dentro do partido não queriam Doria, ele não
decolou. Eduardo Leite está se oferecendo para ser candidato, aliás já
renunciou ao governo do Rio Grande do Sul exatamente para isso, não
renunciou por nada, nem para ser vice de ninguém. Simone Tebet também
não quer ser vice de Eduardo Leite, então já dá para prever que o PSDB
siga com Eduardo Leite como cabeça de chapa.
Leite não vai ganhar mais votos que os outros dois, Bolsonaro e Lula,
nem no estado onde foi governador. Estou sentindo aqui o ambiente, e é o
seguinte: todo mundo sabe que ele saldou as dívidas do estado com o
dinheiro recebido do governo federal para tratar de pandemia. E da
pandemia todo mundo se queixa que ele, assim como outros governadores e
prefeitos, o que fez foi tirar emprego e renda, porque não teve nenhum
outro efeito o tal de lockdown.
Tríplex sorteado e o ridículo passado pelo STF Foi sorteado no
sábado o tríplex do Guarujá, que a OAS deu para Lula, conforme o
processo que já foi revisado duas vezes e comprovou as condenações. Foi
revisado no tribunal regional e superior, que comprovou as condenações,
só que o Supremo que resolveu decidir que houve um erro de CEP, que não
era em Curitiba que deveriam tratar disso.
Fernando Gontijo comprou e fez um sorteio numa plataforma chamada
“Pancadão”. Quem pagasse R$ 19,90 poderia participar do sorteio.
Duzentos e cinquenta mil pessoas pagaram e quem ganhou foi Antônio
Tarcísio. Ele ganhou o tríplex que era de Lula, e que Lula disse que não
era dele e sim de um amigo, assim como o sítio de Atibaia.
O Supremo passa por um ridículo com essas coisas, mas é um assunto
seríssimo, um assunto de confiança na Justiça. Agora mesmo, vão para
Algarve, em Portugal, segundo o Estadão, juízes, desembargadores,
ministros de tribunais superiores para um evento sobre maus pagadores,
débitos não pagos. Tudo de graça, pago exatamente pela entidade
Instituto Brasileiro da Insolvência (Ibajud). Os juízes que estão indo
lá são responsáveis por processos de mais de R$ 8 bilhões de devedores
insolventes. Vai ser aberto pelo ministro Ricardo Lewandowski, do
Supremo Tribunal Federal (STF).
Morte em abordagem da PRF A Polícia Rodoviária Federal abriu
inquérito, vai tomar medidas, afastou os cinco policiais que causaram a
morte de Genivaldo de Jesus Santos. Ele, esquizofrênico, foi abordado e
reagiu com susto. Puseram gás onde ele foi preso e acabou morto.
Eu vi uma postagem do ministro Gilmar Mendes dizendo “o assassinato
do homem negro Genivaldo de Jesus Santos”. Gente, se houvesse uma
petição do advogado dele, o texto seria “Genivaldo de Jesus Santos,
brasileiro, casado, aposentado”. Ninguém falaria em cor de pele, Gilmar
Mendes viu cor de pele. É o contrário do que diz a Constituição, em que
todos são iguais sem distinção de qualquer natureza.
Gustavo Petro vai disputar o segundo turno com Rodolfo Hernández em
um resultado que demonstra o descontentamento dos colombianos com a
política tradicional
MEDELLÍN – Em um surpreendente avanço na reta final da campanha, o candidato populista Rodolfo Hernández desbancou o candidato da direita tradicional, Federico “Fico” Gutiérrez, e vai ao segundo turno contra o esquerdista Gustavo Petro, um ex-guerrilheiro que concorre à sua terceira eleição presidencial.
Segundo analistas, o resultado deixa clara a insatisfação dos
colombianos com os políticos tradicionais e o uribismo, a ala
conservadora ligada o ex-presidente Álvaro Uribe.
Com 99,99% das urnas apuradas, Gustavo Petro avançou com 40,33% dos votos. Hernández,
um magnata do setor da construção civil com um patrimônio avaliado em
US$ 100 milhões e investimentos em todo o país, ficou com 28,15% (5,9
milhões) dos votos.
Com uma campanha forte nas redes sociais e encampando um discurso
antissistema e de ataque à corrupção dos partidos tradicionais,
Hernández cativou um eleitorado insatisfeito com a direita tradicional,
que apoiava Gutiérrez, ligado ao atual presidente, Iván Duque. Essa será
a primeira vez que o uribismo não terá um candidato próprio ou apoiado
no segundo turno desde 2002.
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Pessoas
caminham em Bogotá e passam por cartazes de Gustavo Petro, que tenta
pela terceira vez ser presidente da Colômbia Foto: Mauricio Dueñas
Castañeda/EFE
Já muito polarizada no primeiro turno, a nova rodada deve esquentar
ainda mais o debate ideológico até 19 de junho, quando ocorre a disputa
final entre os candidatos. Um deles à esquerda, que pela primeira vez
pode governar o país, e o outro da direita radical.
Para Edgar Andrés Londoño, cientista político da Universidad Nacional
de Colombia e doutor pela UERJ, a principal razão da ascensão de
Hernández é e ele representar uma mudança nessa política tradicional,
assim como o Petro. “Os resultados desse primeiro turno demonstram
precisamente o fracasso das políticas da direita e do uribismo” diz
Londoño. “Ele (Hernández) é um empresário e sua plataforma está
organizada a partir dessa questão mais de negócios. Ele também tem a
proposta de diminuir os impostos”. Duque – que não poderia concorrer à
reeleição – tem o desempenho muito criticado nas áreas de economia,
saúde, e na segurança pública, tema caro aos colombianos.
Insatisfação com o tradicional
Fico Gutiérrez – como é conhecido – do Equipo por Colombia é um
representante do uribismo que há décadas governa a Colômbia. Em um país
marcado pela violência, Fico apoiou toda a sua campanha na bandeira da
segurança pública, prometendo combater o narcotráfico e demais grupos
criminosos.
Embora tenha se distanciado do impopular partido governista de Iván Duque, Gutiérrez tem um discurso semelhante ao que levou Álvaro Uribe ao
poder em 2002, promotor do atual presidente e influente político que
conquistou grande parte de sua aceitação com uma estratégia de luta sem
trégua contra os guerrilheiros de esquerda.
“A principal razão da ascensão de Hernández é porque ele representa
uma mudança nessa política tradicional, assim como o Petro”, explica
Londoño. “Ele é um empresário e sua plataforma está organizada a partir
dessa questão mais de negócios. Ele também tem a proposta de diminuir os
impostos e coisas que com Fico Gutiérrez pareciam que iam ser uma
continuidade do governo de Duque que tem uma impopularidade muito
grande.”
O candidato pela Liga de Gobernantes Anticorrupción, Rodolfo Hernández Foto: REUTERS / REUTERS
Duque – que não pode concorrer à reeleição – tem uma impopularidade
em torno de 67%. Sem conseguir cumprir suas promessas na área da
segurança e com um desempenho muito criticado na economia e na saúde em
meio à pandemia, Duque foi rejeitado por todos os candidatos ao cargo
presidencial.
“O Duque tem a maior desaprovação dos presidentes recentes da
história da Colômbia. Isso faz com que muitas pessoas tenham considerado
que Fico Gutiérrez seria a continuidade e não queriam votar por Petro
que representa uma esquerda que aqui no país é rejeitada por muitos
setores políticos poderosos e por parte da população”, afirma Londoño.
Cenário na América Latina
A votação expressiva de Petro repete um roteiro de eleições em outros
países da América Latina. Liderados por liberais, países como a
Argentina, de Mauricio Macri, elegeu Alberto Fernández, e o Chile, então
governado por Sebastián Piñera, escolheu Gabriel Boric – nos dois
casos, políticos identificados com a esquerda.
Na Colômbia, porém, o candidato do Pacto Histórico, terá de superar
uma intensa polarização e um aumento da violência eleitoral. Segundo
dados da organização civil Misión de Observación Electoral, em 2018, na
vitória de Duque, o país registrou 322 casos de violência com motivação
eleitoral, sendo que 131 foram direcionados a líderes políticos.
Em 2022, o número total saltou para 683, alta de 112.1%.Analistas
projetam um segundo turno ainda mais tenso, com uma clara tendência de
setores da direita se unindo para evitar uma vitória do ex-guerrilheiro.
Ainda no domingo, Gutiérrez, que obteve 23,9% (5 milhões) dos votos,
anunciou apoio a Hernández. “Não queremos perder o país e não vamos
colocar em risco o futuro da Colômbia”, disse.
Após o resultado, Petro disse que uma vitória do seu adversário “é um
risco para a democracia e para as liberdades da Colômbia”Para Londoño, o
resultado das urnas no domingo, 29, torna as previsões sobre um segundo
turno mais difíceis, pois Hernández se mostra muito competitivo. “Acho
que muitos votos de ‘Fico’ Gutiérrez devem ir para Hernández e não pra
Petro.”
A polarização, no entanto, tende a ser bastante diferente da que
seria em um cenário Petro e Fico. “A polarização estará mais distante do
uribismo. Vão entrar outros temas, outras questões que Uribe e esquerda
como era antes”, finaliza.
Guerra de desinformação travada pelo Kremlin faz parte da tentativa de minar a solidariedade internacional e o apoio à Ucrânia
Nossos países estão de luto, juntamente ao Brasil e à comunidade
internacional, pela perda de vidas inocentes e o deslocamento forçado de
milhões de pessoas causado pela invasão não provocada, injusta e ilegal
da Ucrânia pela Rússia. A invasão viola o direito internacional e ameaça a ordem global baseada em regras, que ajudou a preservar a paz na Europa e além desde a Segunda Guerra Mundial.
Assim como nossos países, o Brasil condenou a invasão da Rússia na Assembleia Geral das Nações Unidas. E, como muitos de nós, o Brasil está dando apoio humanitário à Ucrânia e proporcionando um porto seguro para os ucranianos que tiveram que fugir de suas casas.
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Enquanto a Ucrânia luta para se defender da guerra de agressão da
Rússia, a comunidade internacional se vê lutando uma guerra de
desinformação travada pela Rússia. Isso faz parte da tentativa do
Kremlin de minar a solidariedade internacional e o apoio à Ucrânia.
A guerra da Rússia prejudica a todos nós
A invasão da Ucrânia pela Rússia está afetando a todos. O mundo
inteiro se vê defrontado com interrupções na cadeia de suprimentos e
dolorosos aumentos no preço dos alimentos e da gasolina. O Brasil é
particularmente afetado pelo risco de escassez de fertilizantes. E, no
entanto, o governo russo está tentando convencer o mundo de que não é
responsável por nada disso.
Residente anda em meio a destroços de um prédio bombardeado por forças russas em Severodonetsk
Mas é a Rússia que está bombardeando campos e estoques de grãos,
impedindo as colheitas de trigo e milho. É a Rússia que está bloqueando
os portos e paralisando a capacidade da Ucrânia de exportar alimentos,
provocando uma potencial escassez de alimentos. É a Rússia que está
expulsando milhões de pessoas de suas casas ao bombardear cidades e
vilarejos. Se a Rússia se retirar da Ucrânia, muitas das interrupções no
fornecimento de alimentos e bens essenciais se dissiparão.
As sanções impostas pela comunidade internacional foram apropriadas e
necessárias – elas não incluem alimentos ou fertilizantes. As sanções
visam líderes políticos e militares russos, oligarcas e propagandistas,
não o povo russo. Se o direito internacional significa algo, as elites
russas não podem violá-lo impunemente; elas devem pagar um preço.
A propaganda grosseira deve ser vista pelo que é
A Rússia está usando mentiras para justificar a invasão, alegando que
a Ucrânia é governada por nazistas que cometeram atrocidades contra
russos étnicos. Mas foi incapaz de fornecer qualquer evidência dessas
supostas atrocidades. A verdade é que a última vez que a Ucrânia
experimentou o uso de foguetes e artilharia pesada para atingir e
aterrorizar civis foi quando ela foi invadida por nazistas de verdade
durante a Segunda Guerra Mundial.
A Rússia está tentando desviar a culpa pelas violações de direitos
humanos alegadas contra ela, que o Conselho de Direitos Humanos da ONU
está agora investigando. Ela nega qualquer responsabilidade pelos
massacres e estupros em Bucha e em outros lugares, o ataque aéreo na
estação de trem de Kramatorsk que abrigava mulheres e crianças, e os
mais de 10.000 civis mortos em Mariupol. Mas todos nós sabemos onde está
a verdade.
Precisamos reconhecer onde está a responsabilidade
Assim como nós, o Brasil acredita nos princípios das Nações Unidas –
que os direitos humanos e a independência dos Estados soberanos devem
ser respeitados, as disputas devem ser resolvidas pacificamente, e o
poder militar não deve espancar o direito moral. Todos temos um
interesse comum em defender o Estado de direito na Ucrânia e rejeitar as
tentativas da Rússia de culpar os outros pelas consequências de sua
agressão.
Fertilizante, defensivo e óleo diesel são os vilões dos custos de
produção da próxima safra e devem encarecer em 45% o plantio da soja e
em quase 50% o do milho no País
Márcia De Chiara, O Estado de S.Paulo
Produtor rural há dez anos, Fabrício Maestrello pela
primeira vez vai reduzir a área plantada com soja na safra a ser
semeada em setembro. Dos 1,2 mil alqueires (cerca de 2,9 mil hectares ou
a área equivalente a quase 3 mil campos de futebol), próprios e
arrendados que normalmente cultiva na região de Paranacity, noroeste do Paraná,
ele vai plantar a metade. O motivo do corte foi a alta de preços dos
insumos. “O aumento foi muito superior à valorização do grão, é um
negócio que você entra devendo”, afirma.
O
produtor Fabrício Maestrello, do Paraná, vai cortar pela
metade áreas de produção de soja, entre próprias e arrendadas Foto:
ROGÉRIO RECCO/COCAMAR
Os três vilões da alta de custos, segundo o produtor, são o fertilizante, o defensivo e o combustível.
Neste ano, Maestrello desembolsou R$ 6,2 mil pela tonelada de adubo,
120% a mais do que na última safra. Pelo litro do herbicida, pagou R$
90, quatro vezes o que gastou em 2021. Isso sem falar no diesel usado
nos tratores. “Custava R$ 4 e pouco o litro e agora está quase R$ 7.” No
período, a soja no mercado futuro subiu cerca de 40%.
Recorde indesejado
A forte pressão de custos dos insumos enfrentada por Maestrello é a
realidade dos agricultores brasileiros que vão plantar a safra mais cara
da história, apontam levantamentos de várias instituições. A guerra entre a Ucrânia e a Rússia, esta última um dos principais exportadores de adubos para o Brasil e a crise energética e logística da China, onde estão as fábricas de defensivos, além da alta do diesel, levaram os preços de insumos às alturas.
Pressões de custos dos grãos soam como um sinal de alerta para uma inflação de alimentos “encomendada”, que pode se concretizar em 2023 ou não, a depender da situação do mercado na hora da comercialização da safra.
Nas contas da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o gasto médio no País para produzir um hectare este ano deve crescer 45% para a soja e aumentar quase 50% para o milho em relação ao anterior. “Pode ser que o custo seja ainda maior”, frisa Maciel Silva, coordenador de Produção Agrícola da CNA. É que, neste momento, nem todos os insumos foram comprados e, portanto, estão sujeitos a altas de preços, diz.
No entanto, o aumento de custos em regiões específicas e consolidadas
na produção de grãos supera a média nacional calculada pela CNA. A alta
dos gastos com insumos para a próxima safra de soja varia entre 60% e 70% no norte do Paraná e no Mato Grosso em relação à anterior, apontam a cooperativa Cocamar, de Maringá (PR), e o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária.
Fertlizante
O fertilizante é o item que mais deve contribuir para que a próxima
safra de grãos seja a mais cara da história recente, segundo analistas
especializados em agronegócio. Nas contas do superintendente da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, Anderson Bertoletti,
o aumento do preço do produto no último ano foi de 140%, seguido pelo
dos defensivos (de 60% a 70%) e pelo das sementes (15% a 20%).
Diante do cenário de incerteza sobre a disponibilidade de produto e
do risco de preços ainda mais elevados, a cooperativa, que reúne 16 mil produtores no norte do Paraná,
tem antecipado as compras. Hoje, 80% dos insumos já foram
comercializados, ante 60% nesta mesma época de anos anteriores. Além da
alta de preços, pode faltar algum produto, alerta o superintendente.
Neste momento, a indústria de adubos está fazendo uma ginástica enorme
para disponibilizar os fertilizantes em razão de problemas logísticos
decorrentes da guerra na Ucrânia, aumento de custos de frete marítimo e a
maior demanda mundial por adubos, segundo o diretor executivo da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda), Ricardo Tortorella.
No primeiro bimestre, o dado mais recente disponível, houve retração
de 11% nos volumes de fertilizantes entregues aos agricultores
brasileiros para todas as lavouras em relação a igual período de 2021,
segundo dados da Anda.
“O mundo mudou, não é como antes, tem um sinal amarelo ligado”,
afirma Tortorella, fazendo referência às incertezas geopolíticas no
mercado provocadas pela guerra entre Rússia e Ucrânia. Apesar disso, ele
diz que o setor está conseguindo atender a demanda, mas não no ritmo
desejado.
Hoje o Brasil produz só 15% dos fertilizantes que consome. O Plano Nacional de Fertilizantes,
recentemente lançado, só vai começar a ter efeitos na oferta no longo
prazo. Esses fatores contribuem para um cenário incerto de preço dos
adubos no curto prazo.
Em resposta ao aumento de custos de insumos e ao juro mais elevado para o custeio da próxima safra, o gerente da Consultoria Agro do Itaú BBA, Guilherme Belotti,
acredita que os agricultores vão reduzir o ritmo de expansão da área
plantada de grãos. “O produtor deve ficar mais cauteloso”, diz,
lembrando que nas duas últimas safras houve avanços significativos. Para
ele, por mais que os preços das commodities estejam elevados, as
margens de ganho dos produtores devem ser achatadas em razão dos
aumentos de custos.
Como lidar com o ‘comer emocional’ quando as temperaturas estão mais baixas?
Quando a temperatura cai, nossa tendência é sentir mais fome e
buscamos alimentos mais quentes e calóricos. Foto: Pixabay/congerdesign
Você já reparou que sentimos mais fome no frio?
Não, isso não é coisa da sua cabeça. Existe uma explicação: os seres
humanos se sentem ameaçados pelas baixas temperaturas e essa percepção
faz com que haja uma busca por calor, que pode ser suprida também
através dos alimentos.
“Com certeza as pessoas sentem mais fome no frio por uma questão de
sobrevivência. Ele baixa a nossa capacidade de esquentar o corpo,
portanto, precisamos de mais calorias. Na parte psicológica, tem a ver
com essa informação que o corpo recebe que vem em dissonância com o que
sabemos. Por exemplo, sabemos que não estamos no inverno e,
teoricamente, não deveríamos estar sentindo frio, mas estamos. Então,
gera um conflito. É uma quebra da lógica orgânica”, explica a
neuropsicóloga Gisele Calia.
A endocrinologista Lívia Marcela acrescenta que, nessa época, é comum optarmos por alimentos mais
quentes e, com isso, mais calóricos, mais gordurosos. “Isso porque eles
demoram mais para serem digeridos, produzindo, assim, maiores
quantidades de calor. Um estudo da Universidade da Geórgia, nos Estados
Unidos, rastreou o quanto as pessoas comiam em cada estação do ano e com
que rapidez. Os entrevistados consumiram cerca de 200 calorias a mais
por dia a partir do outono, principalmente quando os dias ficaram mais
escuros”, afirma.
Outro dado importante é que, nesse período do ano, ocorre uma diminuição na produção de serotonina,
um neurotransmissor que promove a sensação de bem-estar. Para suprir
esta sensação de tristeza e desânimo, a maioria das pessoas acaba
compensando com os alimentos.
A neuropsicóloga Gisele Calia ressalta que a comida gordurosa fornece mais caloria com
menos quantidade: “E aí é uma escolha lógica e saborosa, porque o nosso
paladar também foi moldado há anos para que gostássemos de coisas
gordurosas, de energia rápida como o açúcar. E isso de fato aquece o
corpo”.
Hambúrguer, batata frita e alimentos gordurosos demoram mais para
serem digeridos, produzindo, assim, maiores quantidades de calor. Foto:
Pixabay/PortalJardin
Outro fato importante é que, no frio,
nós gastamos mais energia para exercer as mesmas funções. “Isso porque
nosso corpo tem que manter a temperatura estável e isso requer um gasto
calórico maior. Esse gasto calórico gira em média em 200 calorias por
dia. Porém, às vezes, nós exageramos na reposição de calorias nessa
época do ano, o que pode render alguns quilinhos extras no final da
estação”, destaca a doutora em Endocrinologia pela Unifesp Lívia
Marcela.
A especialista também lembra que essa sensação de frio pode variar
entre os gêneros. “Algumas pesquisas revelam que as mulheres sentem mais
frio do que os homens. Uma das explicações fisiológicas para essa
diferença na sensação térmica é a quantidade e distribuição de pelos
pelo corpo, também pela constituição física e pelos hormônios. Os pelos
estão ligados a nervos que os contraem no frio e ajudam a elevar a
temperatura corporal. Como as mulheres estão sempre depiladas e
constitucionalmente têm menos pelos que os homens, tendem a ter menos
contrações acontecendo abaixo da pele e tremem com qualquer brisa”, diz.
Doces e outras guloseimas são irresistíveis para algumas pessoas e
essa vontade pode ficar acentuada no inverno. Foto: Pixabay/silviarita
Ansiedade pode ser agravada diante do frio e a necessidade de comer mais
Você já ouviu falar sobre o ‘comer emocional’? Este é um termo usado
para pessoas que, mesmo sem estar com fome, têm uma vontade irresistível
de ingerir comida e, normalmente, de forma voraz. Essa situação fica
mais evidente na compulsão alimentar. Porém, outras questões de saúde mental, como ansiedade e até mesmo quadros de depressão, podem ter os sintomas exacerbados.
“Qualquer reação física de falta, por exemplo, falta de cobertor, de
alimento, ou outras necessidades como matar a sede e até vontade de ir
ao banheiro, isso tudo gera ansiedade. O corpo interpreta que está
faltando isso e, se não suprir essas necessidades, vai ter alguma
consequência. E a ansiedade está muito relacionada à perigo, seja real,
físico ou psicológico. Então, comer mais por ansiedade acontece quando
está mais frio também”, avalia Gisele Calia.
Portanto, segundo a neuropsicóloga, a ansiedade é ‘disparada’ por questões fisiológicas como a queda de temperatura climática e
a fome: “Quando a pessoa tem algum tipo de desequilíbrio emocional,
quer seja por depressão, ansiedade e transtorno alimentar, sentir mais
fome agrava os sintomas. Isso desequilibra o já frágil controle de
ingestão de alimentos”.
O nosso organismo tenta se adaptar às mudanças do ambiente mas, para
pacientes com qualquer tipo de transtorno mental, de leve a grave, a
situação é mais desafiadora. “Uma revisão publicada em 2013 na revista Frontiers in Neuroscience,
que analisou dados tanto em pessoas quanto em animais, descobriu que
mudanças sazonais afetam muitos hormônios relacionados à fome e apetite,
incluindo glicocorticóides, grelina e leptina”, aponta Lívia Marcela.
Além das alterações nos hormônios, os dias de inverno são, em geral,
mais escuros, e somos menos expostos à luz solar. Esse fato também
aumenta a ansiedade e pode despertar sentimentos de tristeza.
“Esses são sentimentos que estão diretamente relacionados com a
procura de alimentos mais palatáveis e geralmente também existe um
aumento da quantidade de alimentos. Além disso, nesta época ocorre uma
diminuição na produção de serotonina, um neurotransmissor que promove a
sensação de bem-estar. Para suprir esta sensação de tristeza e desânimo,
a maioria acaba compensando com os alimentos”, analisa a
endocrinologista, que cita um estudo realizado em Campinas e que
acompanhou 227 mil indivíduos, entre 2008 e 2010.
Os pesquisadores verificaram que os níveis de colesterol “ruim” (LDL)
aumentaram significativamente no inverno e diminuíram no verão.
Dicas para evitar comer exageradamente no inverno
Se você percebe que sente mais fome quando fica ansioso, triste, com
raiva ou com qualquer outro sentimento, é preciso redobrar a atenção no inverno.
“Uma dica importante para driblar o ‘comer emocional’, quando realmente
não é uma necessidade orgânica, é fazer uma leitura antes de colocar o
alimento na boca. Uma vez que o alimento está na boca, deflagra todo o
processo de dificuldade de interromper ou compulsão”, enfatiza Gisele
Calia.
A neuropsicóloga propõe uma espécie de ‘conversa’ com o alimento e
simula um diálogo: “Então, você olha para a comida e reflete: ‘Sim,
estou com vontade de comer esse doce porque sei que é gostoso, mas como
está meu estado emocional agora?’. ‘Que hora almocei e jantei? Bom, não
importa, sigo com vontade de comer o doce’. Na sequência, você pode
raciocinar assim: ‘O que que estou sentindo, intendente da vontade de
comer doce?’. É como se a vontade de comer doce se sobrepusesse a todas
as outras sensações e desejos. ‘Se não existisse o doce aqui, o que
estaria sentindo além desta vontade?’. É difícil traduzir isso de um
jeito prático, mas é tentar tirar o doce da frente ou o alimento que
está te ‘tentando’ e ver o que realmente está te fazendo falta”.
A vontade de comer doce, a batatinha frita ou a macarronada podem
estar escondendo outros sentimentos como aceitar um conflito, um
sentimento negativo ou a ansiedade por ter de tomar alguma decisão, por
exemplo. A dica é tentar, racionalmente, refletir sobre o comer, do
contrário, você pode ceder à tentação e deixar o instinto ‘impulso’
imperar.
Aqui no Brasil, a época mais fria do ano coincide com as tradicionais festas juninas,
com diversas guloseimas como canjica, paçoca, pé-de-moleque, bolo de
milho e quentão. E isso aumenta a dificuldade de controle do peso.
A endocrinologista Lívia Marcela fez uma lista de dicas para a reportagem do Estadão para você evitar comer exageradamente no frio:
– Comidas mais quentes e cremosas: “Temos a sensação
do aumento de fome e também ficamos imaginando delícias como um
brigadeiro de panela naquelas noites frias e chuvosas. Isso acontece
porque o nosso organismo precisa de mais energia para manter a
temperatura corporal. Então, a orientação para esses momentos de gula é
procurar comer mais vezes durante o dia, evitando o consumo de alimentos
mais gordurosos à noite”, afirma.
– Carnes, risotos e queijos são bem-vindos: “Mas uma
ótima ideia é incluir no cardápio temperos termogênicos, que aquecem o
corpo e aumentam o gasto calórico. Tente não confundir tédio com fome,
por exemplo, ‘estou sem nada para fazer então vou comer’. Isso realmente
acontece normalmente no inverno”, diz
– Sopas e cremes: é preciso ter cuidado, pois alguns são preparados com ingredientes altamente calóricos. Avalie sempre antes de tomar.
– E se não conseguir beber água no frio: uma opção para manter a hidratação em dia é investir em uma variedade de bebidas quentes, como os chás.
“A diminuição da prática de atividade física também ocorre, já que no
frio as pessoas tendem a se exercitar menos. Esses comportamentos
acabam se enquadrando como fatores de risco para o desenvolvimento de
doenças cardiovasculares e diabetes”, conclui a endocrinologista Lívia
Marcela.
Carro abandonado por bandidos que praticaram ações do “novo
cangaço” em Guarapuava (PR): esse tipo de ação está no radar do pacotaço
da segurança.| Foto: Divulgação/Sesp
A Câmara dos Deputados deve
promover, no início de junho, uma semana de votação de propostas
ligadas à segurança pública. A ideia é costurada pelo presidente da
Casa, Arthur Lira (PP-AL), e tem o apoio de parlamentares alinhados com o
governo de Jair Bolsonaro (PL).
Os defensores da iniciativa esperam a votação de propostas que
combatam o chamado “novo cangaço”, que ampliem punições a quem comete
feminicídio e também que atendam a demandas corporativas dos
profissionais da segurança pública. As categorias do setor apoiaram
Bolsonaro em 2018 e tendem a defender a reeleição do presidente em
outubro, mas contestam decisões administrativas do governo e muitos
falam em “abandono” da categoria por parte do governo. Uma das medidas
tomadas pelo Planalto que desagradou o setor foi a reforma da
Previdência, que reduziu o valor de aposentadorias de profissionais da
segurança.
A fonte das propostas que serão submetidas a votação é a Comissão
de Segurança Pública, que atualmente é presidida por Aluísio Mendes
(PSC-MA) e que tem apoiadores do governo em sua cúpula – o
vice-presidente é Daniel Silveira (PTB-RJ).
Na próxima quarta-feira (25), a comissão deve se reunir para fechar
uma lista de proposições que poderão fazer parte do mutirão de votações.
Segundo Mendes, a ideia é apresentar a Lira proposições que tenham “o
mínimo consenso” e, portanto, tenham mais chances de aprovação. No
sistema de votação idealizado por Lira, as propostas estarão em regime
de urgência, e portanto não precisarão ser apreciadas por comissões,
podendo ser levadas diretamente ao plenário.
“Foi um acordo, fiz isso com ele [Lira] no início do ano. Eu, junto
com ele, queríamos uma semana de votações. Há débito grande [com a
agenda da segurança pública]”, diz Mendes. “Daremos prioridade a
projetos que aumentam pena contra crimes de feminicídio, crianças e
adolescentes, novo cangaço, projeto que visam a aumentar as penas com
relação à violência e crimes contra idosos. Temos projetos também que
restringem as ‘saidinhas’, um projeto que restringe a concessão de
liberdade condicional para presos”, acrescentou o parlamentar.
O deputado Capitão Augusto (PL-SP), presidente da Frente Parlamentar
de Segurança, elenca ainda o projeto que cria um novo Código de Processo
Penal, em tramitação há anos na casa. Augusto, que lidera a “bancada da
bala”, citou também a criação das leis orgânicas da Polícia Militar e
da Polícia Civil como projetos que podem ser votados em junho.
O projeto da lei para a Polícia Militar tramita há mais de 20 anos na
Câmara e busca substituir a norma que regula a categoria, um
decreto-lei elaborado em 1969. Já Mendes disse esperar apoio do
Ministério da Justiça para o avanço da iniciativa.
Como a oposição vê o pacote de segurança pública Membro da
Comissão de Segurança Pública da Câmara, o deputado Paulo Teixeira
(PT-SP) disse que a prioridade da oposição no período será a de “evitar
retrocessos” no combate à violência. “Eles [base aliada de Bolsonaro]
estão querendo discutir pautas corporativas, propostas que dão autonomia
às polícias, que nós somos contra. Nada disso é para ampliar a
segurança, é sim para fazer corporativismo, atender às corporações”,
diz.
Teixeira afirma que não foi chamado para conversar sobre a semana de
votações. Além dele, o único outro integrante do PT que é titular na
comissão é Reginaldo Lopes (MG). Outros partidos de oposição, como Psol e
PCdoB, não têm atualmente titulares no colegiado.
Qual pode ser a influência do tema nas eleições Teixeira acusa os
aliados de Bolsonaro de “fazer populismo com a legislação” de segurança
pública. O parlamentar avalia que o tema “terá um peso grande” no debate
eleitoral de 2022.
O combate à violência foi um dos temas que norteou a eleição
presidencial de 2018. Então candidato, Bolsonaro reforçou suas bandeiras
de endurecimento da legislação penal, que defendera ao longo de sua
carreira como deputado. Ele também explorou o crescimento dos índices de
violência durante os 13 anos de gestão do PT no país. O plano de
governo de Bolsonaro relacionava o aumento da criminalidade com o
tráfico de drogas e vinculava o comércio de entorpecentes com as Forças
Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), grupo que participou do Foro
de São Paulo, entidade que reúne partidos de esquerda e que é liderada
pelo PT.
Para o deputado Capitão Augusto, a votação de temas ligados à
segurança “acaba agradando bastante as instituições policiais” e evita
que a categoria, historicamente alinhada com Bolsonaro, rejeite o
presidente. “Com certeza o pessoal fica mais entusiasmado para trabalhar
para a reeleição do presidente Bolsonaro”, diz.
São Paulo SP 27 11 2019–Petrobras aumenta em 4% o preço da gasolina por causa do dolar Foto: Rafael Neddermeyer/ Fotos Públicas
ICMS, cobrado pelos estados, é componente importante do preço final dos combustíveis.| Foto: Rafael Neddermeyer/Fotos Públicas
A recente aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto de lei que
limita a alíquota de ICMS a ser cobrada de combustíveis, gás natural,
energia elétrica, transporte coletivo e serviços de telecomunicação é o
mais recente desdobramento de todo o cenário de insatisfação coletiva
com os altos preços dos combustíveis, que por sua vez alimentam a
persistente alta da inflação. O Projeto de Lei Complementar 18/2022
elenca esses produtos e serviços como essenciais, proibindo que suas
alíquotas de ICMS sejam maiores que as “das operações em geral”. Na
prática, isso significa que o imposto estadual cobrado sobre esses itens
não poderá superar 17% – ainda que este número não esteja presente nem
no PLP 18, nem nas leis que ele altera, como a Lei Kandir e o Código
Tributário Nacional, ele é a média das alíquotas-base cobradas nos
estados.
Para que se chegasse a essa situação, foi necessária uma enorme série
de erros que se acumularam ao longo das décadas. A causa remota está no
próprio desenho da tributação nacional: ainda que os estados tenham
muitas atribuições em termos de serviços públicos, como saúde, educação e
segurança pública, eles recebem uma fatia minoritária de tudo o que é
retirado da sociedade na forma de impostos. Ainda por cima, essa fatia é
dominada pelo ICMS, que é o carro-chefe da arrecadação de qualquer
estado. Dessa forma, governadores e secretários de Fazenda acabam
tentados a maximizar as receitas decorrentes desse imposto para que
consigam dar conta de todas as suas despesas. E isso leva ao segundo
erro.
Por mais importante que seja agir para conter a inflação, por mais
imoral que seja uma tributação tão excessiva sobre itens tão essenciais,
por mais que o Congresso tenha a competência legal para estabelecer o
que está no PLP 18, este processo não está sendo conduzido de forma a
respeitar o modelo federativo
Combustíveis, energia elétrica, transporte público e telecomunicações
são bens e serviços que praticamente toda a população consome, e em
grandes quantidades; tributá-los mais pesadamente é certeza de receita
substancial. Mas, ao mesmo tempo, é inegável o caráter essencial desses
itens; não faz o menor sentido impor-lhes alíquotas de ICMS superiores
nem às alíquotas-base, muito menos à alíquota de itens verdadeiramente
supérfluos ou cujo consumo se deseja desestimular, por quaisquer razões.
Ainda que a lei permitisse aos gestores tributar combustíveis e energia
dessa forma, não é razoável que o façam – e, em um cenário ideal,
governadores que optassem por esse caminho acabariam punidos nas urnas
pelos eleitores, que também são consumidores e contribuintes, embora
esse tema dificilmente ganhe relevância nas campanhas eleitorais.
No fim do ano passado, entretanto, o STF entrou na discussão. Em ação
impetrada pelas Lojas Americanas, o plenário da corte decidiu que as
alíquotas de ICMS de energia elétrica e serviços de telecomunicações não
poderiam superar a média, que consistia nos referidos 17%. Apesar de a
ação questionar apenas uma lei do estado de Santa Catarina, o Supremo
também afirmou que a decisão tinha repercussão geral, valendo para todo o
país, com um período de transição que se encerraria em 2024. E, ao
contrário de outros casos em que o Supremo resolveu fazer política
tributária sem poder para tal, neste caso havia uma interpretação
possível (ainda que não a única), com base constitucional, para uma
limitação. O artigo 155 da Carta Magna, que trata dos impostos estaduais
e municipais, afirma, a respeito do tributo sobre “circulação de
mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação” (inciso II), que ele “III – poderá ser
seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços”.
Ora, admitindo-se que possa haver alíquotas diferentes, pressupõe-se do
texto constitucional que, quanto mais essencial o produto ou serviço,
menor seja a tributação sobre ele, e não maior, como vinha sendo feito
no caso dos combustíveis, da energia e dos serviços de telecomunicações.
A intervenção do Supremo foi usada como justificativa durante a
tramitação do PLP 18, que, segundo seus defensores, estaria apenas
adiantando os efeitos da decisão e adicionando itens que, sendo
essenciais, não estavam em jogo do julgamento de 2021. E é assim que
retornamos aos equívocos e precipitações. Não apenas o período de
transição foi simplesmente abolido, tirando dos estados o tempo
necessário para recalcular as alíquotas de outros itens como forma de
compensação, mas ainda há sérias divergências a respeito da perda de
arrecadação dos estados com o PLP 18. Enquanto o Ministério da Economia
alega que a queda não superará os 5%, entidades representativas de
estados e municípios calculam as perdas entre R$ 66 bilhões e R$ 83
bilhões. E, mesmo com a trava que prevê o abatimento, nas dívidas dos
estados, de toda queda de arrecadação que superar os 5%, o efeito
inevitável é tornar os governadores ainda mais dependentes da
“generosidade” do Planalto, na forma de repasses dos fundos de
participação.
Em suma: por mais importante que seja agir para conter a inflação,
por mais imoral que seja uma tributação tão excessiva sobre itens tão
essenciais, por mais que o Congresso tenha a competência legal para
estabelecer o que está no PLP 18, este processo não está sendo conduzido
de forma a respeitar o modelo federativo – pelo contrário, tende a
enfraquecê-lo ainda mais. A mudança apressada, sem que se saiba ao certo
o seu efeito sobre as contas dos estados, equivale a colocar uma faca
no pescoço dos governadores, como se eles fossem os únicos responsáveis
pelos combustíveis caros, quando na verdade há inúmeros outros fatores
envolvidos na composição dos preços cobrados nos postos.
Deputados e senadores aproveitaram a Medida Provisória 1090/21,
conhecida como MP do Fies, que permite o abatimento de até 99% das
dívidas de estudantes com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies),
para incluir um tema não previsto pela proposta do governo federal: a
possibilidade de o Ministério da Educação (MEC) avaliar cursos de
graduação de forma online ou até por meio de “autoavaliação”. A
alteração surpreende por facilitar que uma faculdade nova receba, sem os
cuidados de uma visita presencial, uma boa nota no MEC e assim consiga
ser uma das possíveis eleitas por alunos beneficiados pelo Fies.
O Projeto de Lei 12/2022, na qual a MP foi transformada, foi aprovado
na última terça-feira (24) no Senado e agora para sanção do presidente
Jair Bolsonaro (PL). Educadores temem que as mudanças indicadas na Lei
10.861/2014, responsável pela instituição do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Superior (Sinaes), incluída na MP pelos
parlamentares, facilitem ainda mais a mercantilização do ensino, a
criação fácil de faculdades de baixa qualidade, as quais apenas tentam
conseguir recursos federais.
Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o educador Juliano Campana,
conselheiro municipal de Educação da Prefeitura de Vitória (ES) com 23
anos de experiência no ensino superior, esclarece que as alterações
trazidas na MP do Fies à Lei do Sinaes não são, propriamente, um
“jabuti”, como apontaram alguns deputados. Há uma conexão entre os
temas: a possibilidade de financiamento está atrelada à avaliação que
uma instituição e seus cursos vão receber. Confira a entrevista:
Qual é o objetivo do movimento criado pela MP do Fies ao trazer esse “jabuti” em seu texto?
Juliano Campana: O que está acontecendo com o movimento criado pela
MP é a união do acadêmico com o financeiro. O dinheiro acabou e, com
poucos recursos, houve a limitação de vagas para o financiamento em cada
instituição. O critério que passa a ser utilizado para definir qual
instituição vai receber mais ou menos financiamento é o acadêmico, ou
seja, as avaliações do Sinaes. Unir esses dois requisitos, facilitando
para as instituições, é garantir o recebimento de recursos. Esse é o
objetivo. Portanto, o Sinaes dentro da MP do Fies está longe de ser um
“jabuti”, é antes uma conexão importante e proposital.
A composição dessas notas, concedidas à instituição e aos seus
cursos, define quantas possibilidades de financiamento ela vai ter.
Antes, a instituição tinha que ter nota para estar habilitada, para ser
procurada e demandada no mercado. Agora, precisa ter nota para ter
dinheiro. Logo, esses assuntos se fundem, porque ao trabalhar qualquer
questão sobre financiamento estudantil, eu vou ter que passar pela
avaliação do Sinaes. Estão matando o Sinaes, porque a nota virou
dinheiro. Se é preciso seguir os critérios da nota (avaliação) para
liberar certa quantidade de dinheiro, ficou mais fácil obter os
recursos, pois ficou mais simples receber uma nota com a visita virtual,
que não é visita.
Os grandes grupos educacionais que surgem no país não vendem para o
mercado, vendem para o governo. Compram vagas de financiamento,
torneirinhas de dinheiro. Não é um “jabuti”, porque se não tiver uma
facilitação de liberação de recursos, de financiamento estudantil, de
avaliação das instituições, elas vão morrer. Uma visita online agora
habilita uma instituição para funcionar e receber recursos, sem a menor
condição para isso. O Sinaes está monetizado.
Uma avaliação 100% online de uma instituição é mais precária e afeta a qualidade do ensino?
Juliano Campana: Participo desses processos de avaliação desde 1999 e
muitas alterações foram criadas, tanto na parte acadêmica quanto na
questão do financiamento. Esses temas se fundiram. O movimento foi
facilitado, principalmente na pandemia, porque houve uma fuga do ensino
presencial. Essa avaliação online é facilmente burlada sem um avaliador
presencial. Um exemplo disso é a avaliação da biblioteca.
Numa avaliação presencial, o avaliador vai até a biblioteca, conta os
livros, os volumes, os títulos que foram informados no processo. Mas,
hoje, no processo online, apresenta-se numa nota fiscal ou, no máximo,
passa com uma câmera e fala que tem os livros na prateleira. Tornando-se
fácil de ser maquiado. Sem a presença do MEC, é inevitável que haja
queda na qualidade dos cursos e das IES. Estamos habilitando
instituições sem a menor condição. Dinheiro e qualidade entraram no
mesmo processo. O Sinaes está na MP do Fies porque, facilitando as
avaliações, dando nota para uma IES que não tem condições de funcionar,
abre-se a porta para financiamentos, ou seja, para o Fies.
Enfraquecer a Lei do Sinaes é sinônimo de garantia de recursos?
Juliano Campana: O Fies já apresenta falhas há muito tempo. Foi
criada uma bolha de tomada de crédito que estourou, porque foi tão
facilmente adquirido que a educação superior não teve um crescimento
orgânico: a pessoa fazia engenharia e ia trabalhar no shopping. O
financiamento seria coerente se a pessoa se tornasse engenheira.
Criou-se uma explosão de não pagamento e o dinheiro acabou. O dinheiro
não é do aluno, o dinheiro está sempre entre o governo e as
instituições, por isso é preciso criar facilidades para elas. E boa
parte dos recursos do Fies não vai ser recebida, porque o financiamento é
uma transferência de dinheiro. Ele não retorna, não se transforma num
fundo que sai, financia e volta para a próxima geração de estudantes que
dependerão dele. A conta vai chegar no futuro.
Quando esse crédito foi aberto, grandes instituições nacionais foram
formadas e grandes instituições internacionais viraram investidoras.
Assim nascem os grandes grupos educacionais. Dessa forma que são criados
esses mega grupos, onde um vai comprando o outro com o dinheiro que vem
do financiamento. Isso levou a uma prática que era comum no Brasil: a
sobretaxa irregular do Fies, de onde saíam novos recursos. O curso de
Administração que custava R$ 500 passava a custar R$ 1000. O dinheiro do
Fies começou a ser extraído de forma irregular, antiética e imoral. No
edital do vestibular, não constava o valor de R$ 500, mas de R$ 1000
pelo Fies.
Facilitar avaliações para instituições, com nota concedida
precariamente, será garantir vagas de financiamento, mais alunos
financiados, mais cursos sobretaxados e recursos entrando de forma
irregular. É uma forma de abrir a torneira. Os temas se fundem. Ter nota
é garantir o financiamento. Além disso, em ano eleitoral, estamos
falando de uma medida populista, considerando que os inadimplentes do
Fies são um número enorme de eleitores.
Existe a possibilidade desse financiamento chegar aos cursos EAD, com toda essa facilidade na avaliação dos cursos e das IES?
Juliano Campana: A pandemia acelerou esse processo. Sem dinheiro para
financiamento, os alunos desistiam e as instituições encolhiam sem
ingressantes. A pandemia veio como força motriz para naturalizar o
ensino EAD e banalizar o ensino presencial. Com isso, os cursos
presenciais foram achatados e as instituições também, uma vez que o EAD
traz um valor mais atrativo, diminuindo o número de pessoas interessadas
em comprar um curso presencial no valor real dele. Há uma pressão muito
grande para que se naturalize todo processo online de ensino, de
avaliação e de controle.
Toda mudança política que está acontecendo é para que o financiamento
estudantil chegue no ensino EAD e isso vai decretar a morte das
instituições presenciais. Abrir cursos à distância, a partir de
avaliações frágeis e falhas, cuja sobretaxa é menos perceptível, é mais
um elemento que enfraquecerá a educação superior no Brasil. A toda hora
surgem instituições e com a avaliação virtual enfraquece-se ainda mais o
processo. Instituições ruins desmontam a formação profissional de nível
superior no Brasil.
Há alguma maneira de garantir a qualidade dos cursos e das IES com a avaliação online?
Juliano Campana: Como estamos falando de avaliação e dinheiro no
mesmo processo, fica difícil garantir a qualidade. Por exemplo, resolver
um processo de saneamento de uma instituição, que é uma visita de
avaliação para ver se está tudo bem, através do virtual, é tornar todo o
processo ruim. É falho e totalmente frágil.
Facilitar as avaliações trazendo para a modalidade virtual, 100%
online, é implodir o Sinaes. Estamos desmontando as avaliações, ou seja,
o Sinaes, com o dinheiro do financiamento. O Sinaes virou um processo
de captação de recursos e não processo de avaliação de qualidade. E o
resultado desse ciclo, atrelando financeiro com acadêmico, é a não
garantia da qualidade.
As avaliações serão ruins, as instituições serão ruins. Todas as IES
passarão por avaliações na modalidade online e farão autoavaliações de
maneira bem maquiada, sendo habilitadas a fazer o financiamento. Vamos
mudar toda formação de uma geração. Instituições ruins e cursos fracos
são sinônimos de uma educação superior pobre, de formação profissional
deficiente. Estamos vivendo um processo complicado.
Karl Marx, o ídolo da esquerda que perdeu espaço para os pós-modernos| Foto: Pixabay
Não
passou batido entre os que acompanhavam o evento de lançamento da
pré-campanha do ex-presidente Lula (PT), no último dia 8 de maio, a
troca do termo “esclarecimento” por “escurecimento”, feita pela
apresentadora do evento. Incompreensível a qualquer trabalhador comum
que viva fora da bolha do Twitter, o uso do novo dialeto “antirracista” é
um dos sinais da transformação da esquerda que, conforme narrado nesta
reportagem da Gazeta do Povo, se afastou dos sindicatos para abraçar as
causas identitárias. Segundo bastidores publicados pela imprensa, o
próprio Lula é criticado por exaltar a picanha em vez de dialogar com
vegetarianos e veganos, e usar termos como “índio” e “galega”.
Em pleno ano eleitoral, não é de se esperar que o petista seja alvo
de uma tentativa de “cancelamento”. Contudo, a colisão entre os ideais, a
linguagem e as prioridades da esquerda sindical e a que cresceu entre
tablets e smartphones gera alguns estrondos, no Brasil e no mundo. Nos
Estados Unidos, por exemplo, o professor de Harvard Cornel West, um dos
intelectuais marxistas mais relevantes do país, discutiu publicamente
com o escritor Ta-Nehisi Coates, um dos “sacerdotes” do novo
“antirracismo”, autor de um livro que exalta a gestão de Barack Obama,
que rendeu alguns bilhões a mais para grandes empresas de tecnologia e
começou a mergulhar o país numa crise de desemprego. “Coates é a face
neoliberal da luta negra pela liberdade”, escreveu West. Em mais uma
manifestação de desprezo pelos trabalhadores, Coates já afirmou não
sentir nenhuma pena dos policiais e bombeiros mortos no World Trade
Center, uma vez que a polícia seria uma “ameaça da natureza”.
Para além dos planos específicos de governo, eleições e
particularidades locais, a migração da esquerda do marxismo “raiz”,
aferrado à luta de classes, para as guerras culturais do pós-modernismo é
um fenômeno global, cujas raízes remontam à filosofia emergida dos
séculos XIX e XX. Diretor do Center for Ethics and Entrepreneurship da
Rockford University, no Canadá, o filósofo Stephen Hicks é um dos
pensadores contemporâneos a se debruçar sobre essa questão.
Em seu livro “Explicando o Pós-modernismo: Ceticismo e Socialismo de
Rousseau a Foucault”, Hicks explica que, como herdeiros do pensamento
moderno, caracterizado pelo protagonismo das ideologias (ou os
diferentes “ismos” – individualismo, capitalismo, comunismo, socialismo –
que emergiram da Revolução Industrial e o nascimento do mercado), os
marxistas acreditavam que seu sistema político-econômico era sustentado
pelo pensamento racional e pelas evidências.
A exploração sistemática dos trabalhadores, bem como a autodestruição
do mercado, que inevitavelmente levaria a uma revolução proletária e ao
renascimento de uma economia mais próspera e igualitária, portanto,
eram tomadas como proposições que podiam ser submetidas ao crivo da
realidade. “A prática é o critério da verdade”, defendia o próprio Marx.
Em outras palavras, a verdade é a expressão da realidade concreta.
E então, veio o século XX. E, a despeito dos relevantes avanços na
medicina, no trabalho, nas relações humanas e no desenvolvimento social,
a ciência e a razão, rebentas do iluminismo triunfante, seriam
instrumentalizadas para justificar teorias de superioridade racial,
novos modelos de Estados totalitários e câmaras de gás.
De um lado, o fascismo e o nazismo tomariam a Europa, dizimando
milhões de vidas. Enquanto isso, o “nobre experimento” da União
Soviética colhia os frutos da revolução. Duas guerras mundiais – a
última delas, encerrada com o primeiro ataque à bomba atômica da
história, outra mancha no currículo do avanço científico subjugado às
ideologias – e uma Guerra Fria, cada qual com seus milhões de mortos,
foram o saldo da era que se pretendia racional. Além de tudo isso, havia
os gulags. Os paredões. A fome e a perseguição sistemática a quem
ousasse denuncia-la – vide o caso do jornalista Gareth Jones, pioneiro a
escrever sobre o Holodomor.
Sem contar que, desde o início do século passado, as três previsões
do socialismo originário haviam falhado: o proletariado não se tornara
ainda mais pobre, nem havia cada vez menos pessoas usufruindo de boas
condições materiais. Diante do cenário, a esquerda precisou mudar de
estratégia. Um dos artifícios empregados foi uma transformação
discursiva: se, antes, a riqueza era vista como positiva, contando que
fosse distribuída de forma igualitária, com a falência do modelo
socialista e a comprovação de que o capitalismo era quem melhor atendia a
esta necessidade, a aquisição de bens se tornou o próprio problema.
Entra em cena Marcuse
Formado em filosofia na Alemanha, Herbert Marcuse foi um dos maiores
divulgadores dos escritos da Escola de Frankfurt, grupo de intelectuais
que se debruçou sobre o fracasso do racionalismo que marcara a época –
sem, contudo, associa-lo ao próprio comunismo. “Politicamente, Marcuse
identificava-se profundamente com o marxismo e se ocupou em adaptá-lo à
imprevista flexibilidade do capitalismo de resistir à revolução”,
escreve Hicks. Em suma, Marcuse tratou de justificar o sucesso do
capitalismo à sedução do proletariado por suas benesses, integradas não
apenas ao sistema econômico, mas à alma humana – o novo objeto da
revolução. Para Marcuse, “o capitalismo não só oprime as massas
existencialmente como também as reprime psicologicamente”, como explica
Hicks.
Em 1974, diante do fracasso não apenas da União Soviética, mas dos
movimentos revolucionários de extrema-esquerda emergidos ao longo da
década de 1960, seria o próprio Marcuse quem, profeticamente, afirmaria
sobre a “nova esquerda”: “Não creio que ela tenha morrido; será
ressuscitada nas universidades”. E, em poucos anos, o caminho estaria
aberto para que Michel Foucault, Jean-François Lyotard e Jacques Derrida
e suas teorias sobre microagressões e micropoderes expressos em cada
partícula da vida humana – a começar pela linguagem.
Tome-se, por exemplo, as teorias do francês Michel Foucault.
“Foucault estava especialmente interessado na relação entre a linguagem,
ou, mais especificamente, discurso (modos de falar das coisas),
produção de conhecimento e poder. Foucault não negou que existe uma
realidade, mas duvidou da capacidade dos humanos de transcender nossos
preconceitos culturais o suficiente para chegar a ela”, explicam os
autores James Lindsay e Helen Pluckrose, no best-seller “Teorias
Cínicas: Como a academia e o ativismo tornam raça, gênero e identidade o
centro de tudo e por que isso prejudica todos” (Ed. Avis Rara), que
também se debruça sobre este fenômeno. Seguindo esse raciocínio,
“conhecimento, verdade, significado e moralidade são, portanto, produtos
culturalmente construídos e relativos de culturas individuais”. “A
razão e o poder são uma coisa só”, dizia Lyotard.
“O pós-modernismo é a estratégia epistemológica da extrema-esquerda
acadêmica para responder à crise causada pelas deficiências do
socialismo na teoria e na prática”, descreve Hicks. Da derrocada do
marxismo ancorado na luta de classes, nasce a retórica das lutas entre
os sexos, raças e outros aspectos da identidade humana, cujo resultado é
o conhecido discurso anticapitalista que se contenta com ações de
marketing de empresas bilionárias envolvendo a bandeira LGBT e o Black
Lives Matter.
Não à toa, com o pós-modernismo em alta, vê-se marxistas da “velha
guarda” a destoar da nova esquerda ao criticar o que, no fundo,
configuram as verdadeiras “estruturas” de opressão identificadas por
Marx: as grandes corporações. O filósofo e crítico cultural esloveno
Slavoj Zizek, um comunista inveterado, é uma destas vozes.
Discorrendo sobre o livro “Em defesa das causas perdidas”, o jurista
brasileiro Alysson Mascaro explica que o alvo das críticas de Zizek “é o
multiculturalismo norte-americano e o pós-marxismo inglês, ambas
estratégias que se apoiam nas políticas da identidade, ou seja, da
particularidade (étnica, sexual, nacional etc). Para Zizek, tal
estratégia desconhece a universalidade pressuposta pela noção de classe,
redundando em uma política da distribuição da vitimação e na
despolitização do político”.
“Trata-se do pensamento de um mundo sem decisão”, define Mascaro,
resumindo os escritos de Zizek sobre a subjugação da razão às vontades e
sentimentos, à mera “experiência pessoal”. “Fica-se tão distante de uma
apreensão da verdade das coisas que até os direitos humanos são
afirmados por meio de uma fragilidade essencial: não é da natureza
humana que tiramos sua determinação, mas sim de uma postulação advinda
de uma mera vontade. Para Zizek, as experiências de resistência atuais,
como a que se extrai do lema do Fórum Social Mundial – ‘Um outro mundo é
possível’ -, relacionam-se ambiguamente com a estrutura já posta do
capitalismo”.
Paradoxalmente, o abraço da nova esquerda ao pós-modernismo que se
pretende anticapitalista e acaba por ceder cada vez mais poder às
grandes empresas em nome deste “outro mundo” politicamente correto, leva
alguns marxistas a se aproximarem dos conservadores que, por sua vez,
se afastam do liberalismo. Um exemplo recente é o lançamento da Compact,
revista capitaneada por autodenominados “radicais”, à esquerda e à
direita, que prometem “desafiar a superclasse que controla o governo, a
cultura e o capital”. Enquanto os resultados da revolução interna da
esquerda já se fazem sentir na sociedade, há que se perguntar se, em
nome da sobrevivência, seus opositores também devem encarar uma
metamorfose.
Magistrados estão na programação de palestras de encontro do Ibajud,
em um resort; especialistas apontam possíveis conflito de interesses
Ministros de Cortes superiores, desembargadores e juízes vão
participar de palestras em um resort no Algarve, em Portugal, com
hospedagens e passagens pagas por um banco, empresas de investimentos,
administradores judiciais e escritórios de advocacia. Patrocinadores do
fórum do Instituto Brasileiro da Insolvência (Ibajud) possuem litígios
bilionários na área de falência pendentes de julgamento por magistrados
convidados para o evento.
A programação prevê que os debates ocorram nas próximas segunda e
terça-feira. Os magistrados ficarão em um hotel quatro-estrelas, com
diárias em torno de € 200 (cerca de R$ 1 mil). Os quartos têm vista para
a Praia de Vilamoura. O ingresso para assistir às palestras custa R$
900, e, segundo a organização, a arrecadação será revertida para
projetos sociais.
Praia no Algarve, em Portugal Foto: Rafael Marchante/Reuters
Especialistas em Direito e Ética afirmaram que a presença no evento
de responsáveis por julgamentos de litígios pode configurar conflito de
interesses. Procurado, o Ibajud não quis se manifestar. Membros da
entidade afirmaram ao Estadão, na condição de anonimato, que passagens, diárias e alimentação serão custeadas pelos patrocinadores, mas não haverá cachê.
O Ibajud foi fundado em 2013 pela advogada Rosely Cruz, que foi
consultora da Jive Investments, detentora de fundos de investimentos em
massas falidas e créditos de recuperações judiciais. Segundo atas
registradas em cartório obtidas pela reportagem, a Jive foi a primeira
patrocinadora do instituto, com um aporte de R$ 100 mil. Sócios da Jive
integraram o conselho da entidade. Atas de assembleia do Ibajud mostram
que patrocinadores do instituto pagam de R$ 1 mil a R$ 12 mil mensais,
além de anuidade de R$ 30 mil.
O fórum prevê em sua abertura uma palestra do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a programação, participam dos painéis os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
João Otávio de Noronha, Marco Buzzi, Paulo de Tarso Sanseverino, Moura
Ribeiro, Raul Araújo, Ricardo Cueva, Ribeiro Dantas e Gurgel de Faria.
Outros 14 magistrados, entre juízes de varas empresariais e de falências
e desembargadores, estão relacionados como participantes.
Consulta feita a processos mostra que as demandas judiciais de
patrocinadores do evento sob relatoria de ministros e juízes que irão ao
Algarve somam ao menos R$ 8,17 bilhões. Trata-se de disputas
empresariais e processos de recuperação judicial que passam pelas mãos
de juízes paulistas e de ministros do STJ na lista de participantes do
evento.
Na Corte superior, os ministros Raul Araújo, Paulo de Tarso
Sanseverino, Moura Ribeiro, Ricardo Cueva, Gurgel de Faria e Marco Buzzi
vão julgar casos de parte dos patrocinadores, como os escritórios TWK;
Galdino & Coelho; Leite, Tosto e Barros; e o banco BTG.
Pelo menos quatro juízes de São Paulo estão na programação do evento.
Dois deles, João de Oliveira e Leonardo Fernandes, da 1.ª Vara de
Recuperações e Falências, já nomearam a EXM Partners, outro patrocinador
do fórum, em recuperações judiciais, como a do Grupo Itapemirim, que
tem R$ 2 bilhões em dívidas, e a do Hotel Branston, em São Paulo, que
deve R$ 500 milhões a credores.
O ministro do STF Ricardo Lewandowski participará do evento Foto: André Dusek/Estadão
Por meio de nota de sua assessoria de imprensa, o STJ afirmou que “a
participação dos magistrados no seminário não trará nenhum ônus”. Nenhum
ministro quis se manifestar sobre se vai, ou não, se declarar impedido
de julgar demandas de patrocinadores do evento. Procurado, Lewandowski
não se manifestou.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) disse que “não custeará
nenhuma despesa”. “Os magistrados não estão em ato de representação do
TJ-SP”, afirmou a Corte, em nota. Os juízes também não disseram se vão
se declarar impedidos em casos relativos a patrocinadores do evento.
Para o ex-desembargador Walter Maierovitch, as palestras são “terreno
movediço”. “Quando ocorre conflito de interesse, e parece ser o caso, a
ética sucumbe”, disse. Professor de Direito da USP, Rafael Mafei
afirmou que juízes precisam evitar eventos que possam trazer
desconfiança sobre a imparcialidade nos processos.
Dos 14 patrocinadores, apenas o BTG Pactual abriu valores do apoio
financeiro. O banco afirmou que repassou R$ 100 mil para o evento e
contribui anualmente com R$ 54 mil à entidade. Disse, ainda, que é
“mantenedor do Ibajud desde 2021, bem como de outras associações sem
fins econômicos”.
A Sumaré Leilões afirmou que sua “cota de patrocínio é parametrizada
de acordo com o mercado publicitário, sendo que a informação sobre os
valores destinados ao evento poderá ser obtida diretamente no Ibajud”. O
instituto, no entanto, não informou o montante.
Procurados, os outros patrocinadores – Invista, Force, EXM Partners,
Positivo Leilões, Câmara de Arbitragem Med Arb RB, a administradora
judicial BL e os escritórios TWK; Leite, Tosto e Barros; Galdino &
Coelho; Bissolatti; Moraes Jr. Advogados; e Márcio Guimarães – não se
manifestaram.