História de Giordanna Neves, Iander Porcella, Gabriel Hirabahasi e Victor Ohana – Jornal Estadão
BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados, o Senado Federal e
nove partidos (PT, PL, União Brasil, PP, PSD, PSB, Republicanos, PSDB,
PDT, MDB e Solidariedade) entraram nesta quinta-feira, 15, com um
recurso pedindo para suspender a liminar
apresentada ontem pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal
Federal (STF), que interrompe a execução de todas as emendas impositivas.
O PSB, uma das legendas que pede a derrubada da decisão, era o partido
de Flávio Dino antes de deixar a política partidária para ingressar na
Corte.
“As decisões monocráticas, proferidas fora de qualquer contexto de
urgência que justificasse uma análise isolada, e não colegiada,
transcenderam em muito o debate em torno de alegada falta de
transparência das denominadas “emendas PiX”, e alcançaram de forma
exorbitante também as chamadas “Emendas de Comissão – RP8?, que já
tinham sido questionadas em ação anterior, de Relatoria do Ministro
Alexandre de Moraes, que estaria, portanto, prevento para tanto (ADPF
1094), e as Emendas Individuais Impositivas, que já tinham sido
escrutinizadas pela ministra Rosa Weber, sem nenhum apontamento de
qualquer tipo de falta de transparência e rastreabilidade”, diz a nota
assinada pelas Casas Legislativas e por oito partidos.
O PT se dividiu sobre a adesão ao recurso do Congresso. A sigla
decidiu aderir ao documento, mas depois que já havia sido protocolado.
Pessoas familiarizadas com o assunto afirmam que a presidente nacional
do PT, Gleisi Hoffmann, não quis assinar a peça por “posições diferentes
dentro do partido”. Quem representa o partido no documento são o líder
do governo na Câmara, José Guimarães (CE), e o líder do PT na Câmara,
Odair Cunha (MG). A decisão ocorreu após o recurso ter sido divulgado
com a assinatura de várias siglas. Depois, MDB e Solidariedade também
aderiram.
Segundo nota distribuída pela Presidência da Câmara, “em uma única
decisão monocrática”, o STF desconstituiu quatro emendas constitucionais
em vigor há quase 10 anos, aprovadas em três legislaturas.
De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, o Congresso estuda
ainda uma medida para melhor disciplinar o uso das emendas,
privilegiando especialmente as de pagamento obrigatório e que asseguram o
cumprimento dos pisos mínimos constitucionais da Saúde e Educação. A
proposta das lideranças é de construir uma saída que contemple
Parlamento e governo e que atenda às exigências do Judiciário.
Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino suspendeu emendas impositivas Foto: Wilton Junior/Estadão
Como antecipou ontem o Estadão/Broadcast, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que conversaria com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG),
para tratar da decisão de Dino. Em reunião na noite desta quarta-feira,
14, Lira e líderes partidários falaram em recorrer à Corte para tentar
derrubar a determinação do magistrado, mas buscavam o apoio de Pacheco.
Dino suspendeu todas as emendas impositivas
Dino suspendeu nesta quarta todas as emendas impositivas de
parlamentares ao Orçamento da União até que o Legislativo crie regras
para a execução desses recursos que observem requisitos de
transparência, rastreabilidade e eficiência.
Deputados e senadores chegaram a prever para esta quarta a votação de mudanças nas chamadas emendas Pix para
dar mais transparência nos repasses. A análise ocorreria na Comissão
Mista de Orçamento (CMO), mas o item foi retirado de pauta para a
inclusão da medida provisória do Judiciário que acabou sendo rejeitada.
O Congresso foi pego de surpresa, e agora os parlamentares querem se
debruçar sobre a nova decisão de Dino para avaliar os desdobramentos.
Até então, o ministro havia suspendido apenas a operação das emendas
Pix, que são uma parte das emendas individuais. A nova decisão, contudo,
afeta todas as individuais e também as emendas de bancada estadual.
Dino já havia pedido mais transparência nas emendas de comissão, que não
são impositivas.
A ideia é delimitar o objeto das emendas Pix, ou seja, explicitar
para qual fim o dinheiro está sendo usado (para qual obra ou política
pública específica). Hoje, não fica claro como as prefeituras estão
usando as verbas, embora o nome do deputado que enviou a emenda possa
ser identificado.
Emendas parlamentares são recursos no Orçamento da União que podem
ser direcionados pelos deputados e senadores a seus redutos eleitorais.
Hoje, existem três modalidades: as emendas individuais, a que cada
deputado e senador tem direito, as de bancada estadual e as de comissão.
As duas primeiras são impositivas, ou seja, o pagamento é obrigatório,
embora o governo controle o ritmo da liberação.
As emendas Pix (batizadas com esse nome em referência ao sistema de
pagamento instantâneo criado pelo Banco Central) são uma forma de
manejar as emendas individuais e permitem a destinação direta de
recursos federais a Estados e municípios sem controle e fiscalização.
Apesar de estarem empenhados em resolver os problemas de
transparência das emendas Pix para atender aos questionamentos do
Judiciário, os líderes da Câmara estão mais preocupados com o impacto
nas emendas de comissão, que também foram incluídas na ação relatada por
Dino no STF.
As emendas de comissão têm sido usadas como moeda de troca política
no Congresso desde o fim do orçamento secreto, esquema revelado pelo
Estadão que consistia no repasse de emendas de relator sem transparência
e de forma que dificultava a fiscalização.
A ofensiva sobre esses recursos, portanto, impacta diretamente no
poder da cúpula do Legislativo, às vésperas das eleições para as
presidências da Câmara e do Senado.
O pano de fundo do imbróglio é uma disputa de poder entre o Executivo
e Legislativo, arbitrada pelo Judiciário. O orçamento secreto foi
declarado inconstitucional pelo STF após a eleição do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, mas parte dos recursos continuou nas mãos do
Congresso, após um acordo feito com o Planalto.
Agora, os parlamentares veem nova ofensiva do governo federal, em
aliança com o Judiciário, para retomar mais poder sobre o Orçamento.
Principalmente porque Dino foi indicado por Lula para a Corte.
Veja a íntegra da nota da Presidência da Câmara dos Deputados, assinada também por Senado e partidos:
“A Câmara dos Deputados, o Senado Federal e partidos políticos de
diferentes campos entraram, hoje, junto a Presidência do Supremo
Tribunal Federal, com pedido de suspensão de liminar das decisões
monocráticas proferidas nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº
7688, 7695 e 7697, e na ADPF 854, todas de autoria do ministro Flávio
Dino.
A peça jurídica questiona a legalidade e a constitucionalidade
dos atos monocráticos do ministro Flávio Dino, que interrompem a
execução orçamentária de emendas parlamentares à lei orçamentária anual.
As decisões monocráticas, proferidas fora de qualquer contexto de
urgência que justificasse uma análise isolada, e não colegiada,
transcenderam em muito o debate em torno de alegada falta de
transparência das denominadas “emendas PIX”, e alcançaram de forma
exorbitante também as chamadas “Emendas de Comissão – RP8?, que já
tinham sido questionadas em ação anterior, de Relatoria do Ministro
Alexandre de Moraes, que estaria, portanto, prevento para tanto (ADPF
1094), e as Emendas Individuais Impositivas, que já tinham sido
escrutinizadas pela Ministra Rosa Weber, sem nenhum apontamento de
qualquer tipo de falta de transparência e rastreabilidade.
Numa única decisão monocrática, o Supremo Tribunal Federal
desconstituiu 4 Emendas Constitucionais, em vigor há quase 10 anos, e
aprovadas por 3 legislaturas distintas (Presidências de Henrique Eduardo
Alves, Rodrigo Maia e Arthur Lira, na Câmara dos Deputados, e de Renan
Calheiros, Davi Alcolumbre e Rodrigo Pacheco, no Senado Federal).
No entendimento das Advocacias da Câmara dos Deputados e do
Senado e dos Partidos Políticos, as decisões causam danos irreparáveis à
economia pública, à saúde, à segurança e à própria ordem jurídica, além
de violar patentemente a separação de poderes.
Elencando um arrazoado de argumentos jurídicos, legais e
constitucionais, todos os requerentes postulam a suspensão imediata das
decisões liminares proferidas nessas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade.
Argumentam ainda que o presidente do Supremo Tribunal Federal tem
autoridade e legitimidade Constitucional para, em decisão fundamentada,
suspender a execução de liminar em ações movidas contra o Poder
Público, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante
ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e
à economia públicas.
Defendem ainda que as decisões monocráticas do ministro Flávio
Dino representam uma tentativa de controle de atos concretos da
Administração Pública e do Poder Legislativo e que causam danos
imediatos, diretos e concretos ao interesse público, pois paralisam
políticas e obras públicas de suma importância para a população e as
gestões estaduais e municipais.
A defesa de ambas as Mesas e das agremiações partidárias também
argumenta que no caso da ADI 7688, a decisão liminar foi proferida
ignorando a patente e flagrante ilegitimidade da ABRAJI para propor
medidas de controle abstrato que fogem aos seus objetivos
institucionais, já que não possui um interesse direto entre o objeto da
norma impugnada e os objetivos institucionais das associações e
entidades de classe legitimadas.
Assinam o documento as Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado e
os seguintes partidos políticos: PL, União Brasil, PP, PSD, PSB,
Republicanos, PSDB e PDT.”