sábado, 27 de agosto de 2022

ELEJA CANDIDATOS QUE IRÃO COMBATER A CORRUPÇÃO

 

Lava Jato nunca mais?
Renan Ramalho
Brasília

Manifestacao contra o PT e pelo impeachment da presidente Dilma Roussef, em Curitiba. Tag: Fora Dilma, Fora PT, protesto


Manifestação em apoio à Operação Lava Jato, em Curitiba, em 2016| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Se em 2018, a agenda anticorrupção teve grande peso nas eleições, por que, passados quatro anos, a classe política impôs tantos retrocessos no enfrentamento do crime de colarinho branco? No momento em que a sociedade escolherá novos representantes no poder, o que seria necessário fazer para resgatar e retomar avanços nesse campo?

Para entender este fenômeno, listamos dez eventos ocorridos que tornaram mais difícil o combate à corrupção. São julgamentos, viradas na jurisprudência, novas leis e decisões administrativas, envolvendo todos os poderes e o Ministério Público, que impuseram derrotas a conquistas que pareciam certas há pouco tempo atrás.

Especialistas no tema consultados consideram que vários fatores contribuíram para esse quadro. Um deles é que, tendo operações como a Lava Jato descoberto casos de corrupção em grande parte do universo político, houve uma união de grupos diferentes, quase todos com forte influência sobre o Executivo e o Judiciário, para frear as investigações e dar sobrevida a políticos investigados.

“Não foi que chegou em quem não podia, mas que pegou em muita gente, e que tinham entre eles cabeças de grandes grupos políticos. Em algum momento essas forças se reuniram, se reagruparam e a Lava Jato se enfraqueceu”, diz o delegado da Polícia Federal Jorge Pontes, autor do livro “Crime.gov – Quando governo e corrupção se misturam”, escrito junto com o colega de PF Márcio Anselmo, delegado que atuou no início da investigação do petrolão.

Promotor de Justiça e presidente da Associação Paranaense do Ministério Público (APMP), André Glitz agrupa os retrocessos em três grandes categorias. A primeira reúne ações que enfraqueceram órgãos de investigação, como o próprio MP e a PF, com tentativas de controle e interferência.

Depois, aponta decisões judiciais, de tribunais superiores de Brasília, que reinterpretaram a lei e criaram novas nulidades processuais, não previstas anteriormente. Por fim, indica novas leis que dificultaram o trabalho de procuradores e policiais.

“Quando se trabalha com esse tipo de criminalidade, há um grau de incerteza muito grande. As regras do jogo hoje podem não valer amanhã. O sistema de nulidades é reinterpretado constantemente pelos tribunais. A gente viu isso acontecer com a questão da competência, com a colaboração premiada, que anularam investigações muito complexas. Foram anos de trabalho da PF e MP realizados nas regras que eram vigentes à época. Depois, a jurisprudência mudou e anulou tudo”, diz.

Pontes e Glitz acreditam que mudanças só podem ocorrer com a eleição de parlamentares que se comprometam com o tema. Mas isso exige participação ativa dos cidadãos.

“A sociedade brasileira já deu prova de que não é conivente ou tolerante com a corrupção. A mobilização em 2013, por exemplo, foi fundamental para aprovar a lei de organização criminosa. Foi a mobilização que impediu que a PEC que proibia o MP de investigar fosse aprovada”, diz Glitz. “O Congresso pode mudar. Potencialmente, em cada eleição pode mudar 100% da Câmara e um ou dois terços do Senado. Nossa esperança é sempre dentro do processo democrático”, diz Pontes.

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Relembre, abaixo, em ordem cronológica, dez retrocessos no combate à corrupção desde 2018:

1) Restrição ao uso de delações
Em agosto de 2018, quando a Lava Jato ainda andava em ritmo acelerado, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que apenas o conteúdo de delações premiadas era insuficiente para a Justiça receber uma denúncia e tornar um investigado réu num processo penal. Os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski – que se notabilizaram por provocar os maiores reveses na operação – entenderam que era preciso mais elementos para essa decisão.

Mesmo que o delator tenha apresentado provas de suas declarações contra uma pessoa, não bastaria. A colaboração poderia ser um ponto de partida na investigação, mas o Ministério Público e a Polícia Federal deveriam buscar comprovações de forma independente para só então denunciar alguém delatado. Com esse entendimento, os ministros rejeitaram, na época, uma denúncia contra o atual ministro da Casa Civil do governo Bolsonaro, Ciro Nogueira (PP-PI), que fora acusado de receber R$ 2 milhões de propina da UTC Engenharia.

Em junho de 2018, o STF já havia absolvido a deputada e atual presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e seu ex-marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, por considerar que haviam sido processados por corrupção e lavagem de dinheiro apenas com base em delações premiadas.

2) Cerco ao Coaf
Em julho de 2019, de plantão no recesso do Judiciário, o ministro Dias Toffoli, então presidente do STF, suspendeu todas as investigações do país baseadas em dados da Receita Federal e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do governo que comunica ao Ministério Público transações bancárias suspeitas.

O pedido foi feito pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que, desde o ano anterior, tentava anular uma investigação de que era alvo pela suposta prática de “rachadinha”, isto é, de embolsar parte do salário de funcionários da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, quando era deputado estadual. A defesa dizia que ele virou alvo a partir de uma devassa do Coaf sobre suas contas, antes da Justiça autorizar a quebra de seu sigilo bancário.

Toffoli acolheu o pedido e estendeu a decisão para mais de 700 investigações criminais, principalmente ligadas à lavagem de dinheiro, que ficaram paradas por mais de quatro meses. Só em dezembro daquele ano, o plenário do STF permitiu a retomada das investigações, derrubando a decisão de Toffoli. No julgamento, estabeleceu uma série de requisitos para a comunicação entre Coaf e MP: deve sempre ser formalizada e sujeita a controle do Judiciário.

Durante todo o ano de 2019, o Coaf – que foi importante na Operação Lava Jato para rastrear propinas movimentadas entre políticos, doleiros e empresários – foi alvo de pressão no governo de Jair Bolsonaro. Inicialmente, o órgão que originalmente estava vinculado ao Ministério da Fazenda, passou para o Ministério da Justiça, então comandado pelo ex-juiz Sergio Moro. A medida foi elogiada por especialistas no combate à corrupção porque poderia favorecer uma interlocução mais próxima do órgão com autoridades responsáveis por investigações. Contrariado, o mundo político aprovou no Congresso uma lei para transferir o órgão ao Banco Central.

3) Fim da prisão em segunda instância
Em novembro de 2019, o STF reverteu a jurisprudência, restabelecida em 2016 e que vigorara até 2009, que permitia a prisão em segunda instância. Durante quase quatro anos, na fase mais vigorosa da Operação Lava Jato, a possibilidade de execução da pena após uma condenação em segundo grau havia levado à cadeia políticos e empresários graúdos que nunca antes se imaginava que iriam pagar pelos seus crimes no Brasil.

Foram para a prisão, por exemplo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu; o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, o ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral; o ex-senador Gim Argello; os ex-diretores da Petrobras Renato Duque e Jorge Zelada; e empresários como Sérgio Cunha Mendes, José Carlos Bumlai e Salim Taufic Schahin.

Quase todos foram soltos após a decisão de 2019 e alguns só permaneceram na cadeia por causa de prisões preventivas, que podem ser revogadas a qualquer momento pela Justiça – paulatinamente, esses também acabaram soltos.

Para especialistas, além do efeito óbvio de livrar ricos e poderosos da punição – por meio de recursos infindáveis que, não raro, levam os processos ao arquivamento por prescrição –, a decisão reforça na sociedade a percepção de impunidade. Para os cidadãos e vítimas, cai a confiança na Justiça. Para bandidos e criminosos, há um estímulo à reiteração delitiva. “Parece que não é sério o sistema, que é uma palhaçada. Para que Justiça? Tenho certeza que a situação é desestimulante também para delações premiadas”, diz o procurador de Justiça e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Roberto Livianu.


4) Casos de corrupção na Justiça Eleitoral

Ainda em 2019, o STF atendeu a um pedido que interessava a todos os poderosos fisgados na Lava Jato: a transferência de seus processos por corrupção e lavagem de dinheiro, por exemplo, para a Justiça Eleitoral. Bastava a qualquer um deles alegar, mesmo com pouco ou nenhum indício, que o dinheiro que recebiam de empreiteiras e grandes fornecedoras das estatais servia para bancar suas campanhas eleitorais, e não necessariamente propina.

A retirada dos casos da Justiça Federal trouxe grandes vantagens para os acusados. A Justiça Eleitoral não tem expertise, tempo nem estrutura para supervisionar investigações complexas. Casos que envolvem lavagem de dinheiro – um crime instrumental para esconder dinheiro sujo obtido em outros delitos – exigem, por exemplo, um esforço gigantesco de rastreamento de transferências internacionais para empresas de fachada em paraísos fiscais.

Juízes e promotores que atuam na Justiça Eleitoral não têm dedicação exclusiva a esse ramo e trabalham na área de forma temporária, com foco na fiscalização das disputas eleitorais, que ocorrem a cada dois anos. A Justiça Federal, ao contrário, há quase duas décadas se estruturou para criar varas especializadas em crimes de colarinho branco – era o caso da 13ª Vara Federal de Curitiba, dentro da qual o ex-juiz Sergio Moro foi autorizado a se concentrar na Lava Jato.

Segundo o ex-chefe da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, mais de 90% das condenações anuladas ou dos processos que sofreram atrasos na operação tiveram como causa a transferência dos casos de corrupção para a Justiça Eleitoral. O primeiro beneficiado pela decisão do STF, tomada em março de 2019, foi o atual prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes (PSD). Nos anos seguintes, muitos outros políticos, dos mais diversos partidos, se beneficiaram: do ex-ministro petista Antonio Palocci ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, passando pelo senador tucano José Serra e o ex-governador paulista Geraldo Alckmin.

5) Condenações anuladas pela ordem de alegações
Em setembro de 2019, o STF criou uma regra processual não prevista na lei e a aplicou ao passado para anular várias condenações da Lava Jato. A Corte determinou que, em processos criminais com colaborações premiadas, réus que tenham sido delatados devem apresentar suas alegações finais – a peça de sua defesa final no processo, antes da sentença – sempre após seus delatores. O Código de Processo Penal diz que o prazo é comum, mas a maioria dos ministros considerou que, para garantir a ampla defesa, delatados devem se manifestar depois dos delatores para poderem rebater, da forma mais completa possível, suas acusações.

Como essa ordem não estava na lei, os juízes não a aplicavam. Mas o STF entendeu que deveriam, caso houvesse um pedido nesse sentido. Por isso, aqueles que seguiram a letra da lei tiveram suas sentenças anuladas. O primeiro beneficiado foi o ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine. Depois dele, vários outros se livraram de condenações, como o ex-gerente da estatal Márcio de Almeida Ferreira e o ex-presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro Paulo Melo, investigado pela Lava Jato no estado.

6) Competências revistas

Desde o início da Lava Jato, advogados de réus criticavam o que chamavam de “competência universal” de Sergio Moro para julgar os processos. Na realidade, a cada nova fase, a operação descobria uma extensão ainda maior do esquema de corrupção na Petrobras e colhia mais provas contra empreiteiras que também pagavam propina em outras estatais e governos.

Parte dos processos foi remetida por recomendação da própria força-tarefa para outros estados – Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal, principalmente. Ainda assim políticos e empresários lançavam mão dos mais diversos argumentos para retirar do Paraná seus processos, dado o ritmo acelerado do andamento e das condenações.

Ainda em 2018, a Segunda Turma do STF começou a retirar de Moro trechos de delações firmadas pela força-tarefa. Em agosto daquele ano, por exemplo, o colegiado mandou para Brasília depoimentos de ex-executivos da Odebrecht que narravam como eram feitos pagamentos em favor do PT contidos nas planilhas “Italiano” e “Pós-italiano”, que foram entregues pela empresa para provar as vantagens indevidas pedidas pelos ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e Guido Mantega. A Corte transferiu o caso por entender que já tramitava na capital federal uma investigação contra os dois.

Paulatinamente, e caso a caso, ao longo dos anos, processos importantes passaram a ser retirados de Curitiba. O ápice desse processo ocorreu em março de 2021, quando, por iniciativa própria, o relator da operação no STF, Edson Fachin, acolheu um pedido de Lula para considerar o juízo federal de Curitiba incompetente para julgar o ex-presidente nos casos do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia, pelos quais já havia sido condenado e começado a cumprir pena. Um mês depois, o plenário do STF manteve a decisão do relator por 8 votos 3.

As sentenças foram anuladas, outros processos voltaram à estaca zero, e Lula tornou-se novamente elegível. A justificativa de Fachin foi de que a 13ª Vara de Curitiba deveria julgar exclusivamente casos ligados à Petrobras, mas as ações contra Lula indicavam que ele recebia propina de empreiteiras em razão de contratos com outras estatais. Em Brasília, os processos acabaram arquivados por prescrição e insuficiência de provas – anuladas depois que o STF também considerou Moro suspeito para atuar nos casos envolvendo Lula.

7) Pacote anticrime desfigurado
No início de 2019, o então ministro da Justiça Sergio Moro enviou ao Congresso um conjunto de propostas auspiciosas para enfrentar a corrupção e o crime organizado. Eram mudanças pontuais na legislação penal e processual para agilizar investigações e processos. Durante o ano, o Congresso desfigurou o chamado “pacote anticrime”. Rapidamente, eliminaram as mudanças mais significativas: de estabelecer na lei a prisão em segunda instância e possibilitar que casos de corrupção conexos a caixa 2 fossem divididos, de modo que o primeiro crime ficasse na Justiça comum e o segundo na Justiça Eleitoral.

Ao final, várias propostas para combater o crime organizado, ligados principalmente a facções criminosas e milícias, acabaram sendo aprovadas. Mas a parte contra corrupção, não. A proposta aprovada e sancionada dificultou ainda mais as prisões preventivas – que passaram a depender da “existência concreta de fatos novos ou contemporâneos” que justifiquem a medida – e do fechamento de acordos de delação premiada, que passaram a contar com a participação da defesa das pessoas delatadas.

O maior perigo para os processos foi a criação, dentro do Congresso, do chamado “juiz de garantias”. Em todos os casos criminais, um magistrado passaria a cuidar apenas da fase de investigação, garantindo na maior medida possível os direitos do investigado. Outro magistrado deveria atuar na fase do processo e julgamento. A justificativa é maximizar a imparcialidade da Justiça, mas na prática, a maior parte dos juízes considerou que uma implementação às pressas e mal planejada acabaria tumultuando e atrasando os processos. O presidente do STF, Luiz Fux, suspendeu a aplicação imediata, que até hoje está paralisada.

8) Nova lei de abuso de autoridade
Entre 2019 e 2020, o Congresso aprovou uma nova Lei de Abuso de Autoridade que, segundo críticos, criou novos obstáculos para o trabalho de juízes, procuradores e policiais no combate à corrupção. Parte das novidades chegou a ser vetada por Bolsonaro, mas o Parlamento restabeleceu em boa medida o que havia sido aprovado pelos deputados e senadores.

A nova lei tipificou como crimes atos como “pedir a instauração de investigação contra pessoa mesmo sem indícios de prática de crime”, “estender a investigação de forma injustificada”, “antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa”.

Associações de juízes, de procuradores e de delegados consideraram vários termos vagos, o que poderia inibir a ação deles, pelo receio de represálias. Uma decisão equivocada, diziam, poderia ser revertida na própria Justiça, mas seria excessivo punir as autoridades por decisões que poderiam estar bem fundamentadas.

9) Fim das forças-tarefa
A formação de forças-tarefa para investigar casos grandes e complexos de corrupção provou-se exitosa desde 2014. Constituídas no Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, as equipes avançaram como nunca em investigações e acordos para reparação de danos causados em esquemas de corrupção na Petrobras, Eletrobras, Caixa e governos estaduais.

A partir de 2019, no entanto, quando Augusto Aras assumiu a Procuradoria-Geral da República (PGR), as queixas de advogados começaram a ganhar espaço dentro do órgão. Em 2020, ele determinou uma devassa nos arquivos da Lava Jato, pela suspeita de que os procuradores de primeira instância mantinham investigações clandestinas sobre autoridades com foro privilegiado no STF.

Depois, passou a desconstituir as forças-tarefa com base em queixas internas de que o modelo favorecia certos membros do MPF e prejudicava outros, em razão da forma de escolha dos integrantes, realizada de maneira mais informal, por afinidade, experiência e capacidade. Ele passou a substituir as equipes por Gaecos, formada a partir de concursos internos, mas retirando de seus integrantes a dedicação exclusiva que tinham para tocar casos complexos.

Pouco a pouco, as forças-tarefa foram extintas, ao mesmo tempo em que o mundo político em Brasília pressionava o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e o Tribunal de Contas da União (TCU) a investigar o funcionamento e as práticas de seus antigos integrantes. Deltan Dallagnol foi punido duas vezes no CNMP em processos disciplinares, por causa de críticas a ministros do STF e ao senador Renan Calheiros (MDB-AL).

Em agosto de 2022, Deltan foi condenado pelo TCU a pagar R$ 2,8 milhões, junto com o ex-procurador-geral Rodrigo Janot e o ex-chefe do MPF no Paraná, para ressarcir gastos considerados excessivos com passagens aéreas e diárias concedidas a procuradores de fora do Paraná que atuavam nas investigações.

10) Nova lei de improbidade administrativa

Em 2021, o Congresso aprovou e Bolsonaro sancionou um antigo sonho dos políticos: uma ampla revisão na Lei de Improbidade Administrativa, que pune prejuízo aos cofres públicos com devolução do recurso desviado, multas e inelegibilidade.

Com a nova lei, prazos do processo ficaram mais curtos. O Ministério Público passou a ter 8 anos após o ato que lesou o patrimônio para ajuizar a ação na Justiça. Se o processo demorar mais que quatro anos para tramitar numa determinada instância, deverá ser arquivado por prescrição.

Outra mudança foi limitar a um rol específico de condutas atos de improbidade que impliquem em violação a princípios da administração pública, como impessoalidade, honestidade e legalidade. Por fim, só será possível condenar alguém por dano aos cofres públicos se for provada a intenção do agente.


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GOVERNO FACILITA A PRIVATIZAÇÃO DO SANEAMENTO

 

Água e esgoto

Por
Célio Yano


Estação de Tratamento do Guandu, em Nova Iguaçu (RJ): leilões após o marco do saneamento já geraram compromissos de investimentos de R$ 46,7 bilhões.| Foto: Divulgação/Cedae

Dois anos após a entrada em vigor do novo marco legal do saneamento básico (Lei 14.026/2020), que estimulou a privatização desse serviço, os investimentos privados no setor começam a deslanchar, embora uma série de desafios ainda persista.

Até 2024, estão previstos 28 novos leilões de saneamento em 17 estados, segundo levantamento da Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon), com base em dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No plano, estão projetos em estados com baixos índices de cobertura de serviços, como Ceará, Paraíba e Rondônia.

O investimento total estimado a ser contratado nos próximos dois anos é de R$ 24 bilhões, com 16,3 milhões de pessoas potencialmente beneficiadas.

De 2020 até o último mês de abril, foram realizados 16 leilões que abrangeram 217 municípios e alcançaram 20 milhões de pessoas. Ao todo, os contratos preveem investimentos de R$ 46,7 bilhões, além do pagamento de R$ 29,5 bilhões em outorgas.

Entre as operações realizadas estão a licitação de quatro blocos da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), três blocos de municípios de Alagoas e a concessão plena dos serviços do Amapá.

Uma das metas estabelecidas pelo novo marco é a universalização dos serviços de saneamento até 2033, com atendimento mínimo de 99% da população com fornecimento de água potável e de acesso a coleta e tratamento de esgoto a pelo menos 90% da população.

Para isso, a lei estabelece o aumento da concorrência pelo mercado, com a vedação de novos contratos de programa; maior segurança jurídica para a privatização de estatais do setor; e o estímulo à prestação regionalizada dos serviços, por meio de contratos com blocos de municípios.

Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) apontam que a ausência de água tratada ainda atinge quase 35 milhões de pessoas, e que cerca de 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto. Além disso, somente 50% do volume coletado é tratado. Segundo o Instituto Trata Brasil, o equivalente a 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento é despejado na natureza todos os dias.

No Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) estimou em R$ 507 bilhões o investimento necessário para se atingir a universalização dos serviços até 2033, considerando valores de dezembro de 2020. A consultoria KPMG, por sua vez, calculou, em um estudo de julho de 2020, a necessidade de R$ 993 bilhões.


Universalização traz desafios em municípios menores e mais pobres

Para o economista Eric Brasil, sócio da Tendências Consultoria, um dos maiores desafios nos próximos anos será garantir que municípios pequenos, pobres e com baixo atendimento de água e esgoto sejam capazes de articular uma prestação de serviços de saneamento capaz de atingir as metas de universalização.

Um levantamento da consultoria feito a partir de dados da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que quanto mais pobre e com menor cobertura de água e esgoto, maior é a probabilidade de a cidade estar com o contrato de prestação de serviços de saneamento irregular.

São municípios que, até 31 de dezembro de 2021, não conseguiram comprovar capacidade econômico-financeira para o atingimento das metas. Das 5.570 cidades do país, 1.141 (20,5%) integram o grupo, a maior parte em estados do Norte e Nordeste.

A proporção de contratos irregulares cresce nos municípios que têm menor renda per capita, conforme o estudo. Nas cidades com rendimento médio superior a R$ 500, o porcentual de regularidade chega a 88%. Por outro lado, naquelas em que o ganho é inferior a R$ 200, o índice cai para 30,7%.

Considerando o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), o quadro se repete. Nas localidades com IDHM considerado muito alto, 95,6% dos contratos são total ou parcialmente regulares. Nos que têm IDHM muito baixo, apenas 26,6% dos prestadores de serviço se enquadram nas exigências.

O porte também está relacionado aos indicadores. Nos municípios com população acima de 200 mil habitantes, o porcentual de contratos regulares é de 83,84%, índice que cai para 78,44% naqueles que tem entre 50 mil e 200 mil moradores. Nas cidades com menos de 50 mil residentes, o porcentual é de 70,05%.

O economista da Tendências explica que a situação ocorre porque cidades menores exigem investimento maior exatamente por ter estrutura de saneamento mais precário. “São municípios menos atrativos para o investimento privado, com menor capacidade de prestação do serviço pelo próprio município e, em princípio, parece que as estatais também não têm interesse neles”, diz.

De acordo com estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a GO Associados, há quase 30 milhões de brasileiros nos municípios que estão com contratos irregulares, onde o atendimento de água e esgoto estão bem distantes da média nacional. A população com acesso à água nesses municípios teria que passar de 64,4% para 99% e a cobertura de esgoto teria que subir de 29,1% para 90% até 2033 para se alcançar a universalização prevista na legislação.

“Dois anos após a aprovação do marco, é possível avaliar uma mudança de cenário, principalmente com os investimentos garantidos por meio dos leilões, concessões e parcerias no setor. Entretanto, ainda é necessária a busca de soluções para municípios com contratos irregulares, cujos índices de saneamento são bastante precários”, diz Luana Siewert Pretto, presidente-executiva do Trata Brasil.


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MORAIS TENTOU IMPEDIR A PROPAGANDA DA INDEPENDÊNCIA

 

Presidente do TSE
Renan Ramalho
Brasília


Na decisão anterior, Alexandre de Moraes disse que campanha não tinha urgência; na nova, reconheceu “importância do pertencimento à nação”| Foto: LR Moreira/Secom/TSE

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, voltou atrás na decisão de vetar uma campanha planejada pelo governo para comemorar os 200 anos da Independência do Brasil. Numa nova decisão, divulgada por seu gabinete na tarde desta sexta-feira (26), ele permitiu a veiculação das peças publicitárias, que promovem uma identificação entre brasileiros comuns e “heróis nacionais” que participaram do ato que encerrou o período colonial do Brasil. No novo documento, ele admitiu a “ocorrência de erro material” na decisão anterior, que chegou a ser publicada no Diário Oficial de Justiça.

Nos três meses anteriores às eleições, toda publicidade federal deve ser submetida ao TSE. A lei diz que, nesse período, só são permitidas campanhas “em caso de grave e urgente necessidade pública”. Na decisão anterior, Moraes escreveu que não havia ficado comprovada a urgência durante o “período crítico” da campanha eleitoral, que as propagandas apresentadas pelo governo tinham “viés político”, que os slogans tinham “plena alusão a pretendentes de determinados cargos públicos” e que a ênfase nas cores verde e amarelo “trazem consigo símbolo deum ideologia política”, o que prejudicaria a igualdade na disputa.

Na nova decisão, o ministro reconheceu a urgência. “Inegável a presença dos requisitos pela importância histórica da data, em especial para comemorações dada a dimensão do país e seus incontáveis feitos durante esse período de independência. No tocante à urgência, verifica-se a importância do pertencimento à nação, que agora de forma democrática, vem se perpetuando o [sic] país”, escreveu.

A proposta da propaganda, obtida pela Gazeta do Povo, prevê outdoors, filmes na TV, locuções no rádio e peças na internet que apresentam brasileiros comuns ao lado de figuras históricas como Dom Pedro I, Maria Quitéria, José Bonifácio, Joana Angélica, Alexandre Gusmão, Maria Felipa e Almirante de Tamandaré. Nas imagens, sobre um fundo verde e amarelo, aparecem frases como “somos uma nação de heróis” e “heróis nacionais que construíram o Brasil no passado têm os mesmos valores dos heróis do presente, quais sejam os cidadãos de bem, que trabalham no dia a dia para o crescimento de toda nação”.

Na nova decisão, Moraes, contudo, mandou retirar a seguinte frase: “E essa luta também levamos para o nosso cotidiano, para a proteção das nossas famílias e sobretudo, para a construção de um Brasil melhor a cada dia”. Para ele, ela teria conotação eleitoral. As propagandas não apresentam nomes ou imagens do presidente Jair Bolsonaro nem de seus ministros. Serão expostos apenas selos das pastas do Turismo, Defesa e Relações Exteriores. Moraes, de qualquer modo, também proibiu menção ao governo nas peças que irão ao ar na internet, inclusive no endereço, de forma abreviada.


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BATALHA DE STALINGRADO DEFINIU O FINAL DA GUERRA

Como a ‘batalha de egos’ entre Hitler e Stalin mudou os rumos da 2ª Guerra

Foto: Itar-Tass Photo Agency/ Handout via REUTERS

Por Renato Vasconcelos e Luiz Raatz – Jornal Estadão

Batalha mais sangrenta da História é considerada o ponto de virada para os Aliados na guerra contra os nazistas

Quando os primeiros disparos da artilharia alemã e bombas incendiárias despejadas pela Luftwaffe atingiram Stalingrado, uma vitória dos Aliados na 2ª Guerra ainda era um sonho distante. A máquina de guerra nazista, que em três anos tomou grande parte Europa continental, agora expandia os domínio do 3º Reich rumo a leste, em busca do chamado “espaço vital” alemão. A batalha, que durou cinco meses, mudou o curso da guerra, exauriu as forças alemãs e abriu caminho para o contra-ataque aliado em duas frentes, pactado entre o ditador soviético Josef Stalin, o primeiro-ministro britânico Winston Churchill e o presidente americano Franklin D. Roosevelt.

A maior batalha da 2ª Guerra foi também a mais sangrenta. Os números são imprecisos, mas fontes históricas estimam que 2 milhões de pessoas, entre soldados soviéticos, do Eixo e civis, tenham morrido, desaparecido ou capturados em Stalingrado – no maior derramamento de sangue em um embate único na História.

“Stalingrado marca literalmente o ponto de virada da 2ª Guerra. Foi a partir dela que os soviéticos começaram lentamente a empurrar os regimentos alemães para trás, e os fizeram passar da ofensiva para a defensiva”, afirma o professor de história contemporânea da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em Rússia Angelo Segrillo.

Soldado soviético ergue bandeira no centro de Stalingrado após rendição nazista.
Soldado soviético ergue bandeira no centro de Stalingrado após rendição nazista. Foto: Itar-Tass Photo Agency via REUTERS – 02/02/2013

As tropas do 6º Exército alemão, apoiadas por regimentos formados por finlandeses, húngaros, romenos e italianos, chegaram às margens dos rios Volga e Don após Adolf Hitler dividir as forças que avançavam para o sul da União Soviética, com objetivo de chegar às reservas de petróleo do Cáucaso – o que garantiria recursos vitais para a manutenção da guerra total nazista. Stalingrado não era uma parada obrigatória na rota, mas o Führer acreditava que era possível vencer nas duas frentes simultaneamente.

Enquanto o Eixo movimentava as tropas em direção a Stalingrado, do lado soviético, Josef Stalin organizou uma linha de defesa na cidade que levava seu nome – hoje rebatizada de Volvogrado. Por volta de 17 de julho, quase um mês antes da chegada dos alemães, o líder soviético passou a concentrar unidades do Exército Vermelho no local, preparando a resistência.

O resultado do choque das duas potências foi um cenário caótico. Relatos do conflito apontam que os explosivos e bombas incendiárias alemãs destruíram quase todas as edificações da cidade, a maioria feita de madeira. Mesmo com numerosas baixas, Stalin se negou a retirar a população civil da cidade ou a recuar seus soldados. E quando os soldados alemães invadem e tomam quase toda Stalingrado, a batalha se transforma em uma espécie de guerrilha urbana, em que o controle de cada prédio e setor da cidade era disputado incessantemente.

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“Os alemães chegaram a dominar de 80% a 90% do território e poderiam ter conseguido a vitória, não fosse cada detalhe de um conjunto de fatores que permitiu a resistência soviética”, explicou Segrillo.

A blitze nazista

A ofensiva alemã começou avassaladora. Em meados de setembro, os soldados do Eixo já tinham conquistado a maior parte da cidade, chegando a encurralar o Exército Vermelho em uma faixa de apenas 15 km de extensão por 5 km de largura ao longo do rio Volga.

Com a derrota batendo à porta, o líder comunismo determinou, por meio da ordem 227, o novo padrão de disciplina das tropas soviéticas, que seria implantado a ferro e fogo. A determinação de Stálin é para que cada soldado russo lute por cada centímetro de terra, e que qualquer recuo ou retirada só pode ser autorizado pelo Alto Comando do Exército Vermelho -sob pena de execução sumária.

“Não vamos mais tolerar que comandantes, comissários e oficiais políticos permitam que alarmistas decidam a situação no campo de batalha e convençam outros soldados a se retirarem, abrindo assim a frente para nossos inimigos”, determinou Stalin. “Alarmistas e covardes devem ser executados de imediato.”

O contra-ataque soviético

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Manter a posição perante o avanço alemão só foi possível com um abastecimento contínuo das tropas e um esforço de guerra descomunal por parte dos soviéticos. De acordo com o historiador britânico Max Hastings, em seu livro Inferno: o mundo em guerra, Moscou produziu 24 mil veículos blindados apenas em 1942, contra 4.800 dos alemães. O número de aeronaves e de soldados empregados em combate também foi infinitamente superior.

Mas era preciso mais do que defender a posição para virar o jogo. Por volta da metade de novembro daquele ano, com a aproximação do inverno, o Exército Vermelho lança uma contraofensiva batizada como Operação Urano. Evitando o combate frontal com o 6º Exército Alemão, os soviéticos começam a atacar o flanco inimigo, onde estavam tropas mais despreparadas do que a linha-de-frente alemã. Antes do fim do mês, as forças do Eixo estavam completamente cercadas.

“A Operação Urano foi o ponto de virada dentro do ponto de virada. Foi a partir daí que os soviéticos começaram a caminhar lentamente e encaminhar uma contraofensiva. Depois de estarem na defensiva o tempo todo, eles começaram a cercar as tropas do Eixo”, conta Segrillo.

Guerra de egos e o fator inverno

Sem admitir a derrota mesmo com o cerco das tropas, Hitler proíbe a retirada ou rendição de seus soldados. Operações de reabastecimento das tropas por via aérea e de enviar reforços são frustrados, tornando a situação insustentável com a chegada do inverno. Os soldados alemães e aliados foram alvo das tropas soviéticas por mais de dois meses após serem totalmente isolados, antes da rendição final, em fevereiro de 1943.

Soldados nazistas capturados em Stalingrado.
Soldados nazistas capturados em Stalingrado. Foto: Itar-Tass Photo Agency via REUTERS – 20/12/1943

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Um componente que acompanhou toda a campanha em Stalingrado ajuda a entender a resistência de ambos os lados à rendição – os egos de Stálin e Hitler.

Uma das razões para a divisão das tropas que iam para o Cáucaso na tentativa de garantir recursos necessários para a Alemanha foi a ideia de Hitler de conquistar “a cidade de Stálin”, uma conquista que certamente seria utilizada pela propaganda nazista. Do outro lado do tabuleiro, Stálin se negava a entregar sua própria cidade aos alemães, e tentava recuperar a confiança no Exército Vermelho, após as derrotas no início da fulminante de invasão alemã.

“A dimensão simbólica teve sua importância. Outro general poderia ter deixado aquela frente de batalha de lado para seguir o plano original (do lado alemão) ou reforçar a defesa em outro lugar, em outra circunstância. Mas esse talvez tenha sido um dos menores fatores (em comparação as dimensões materiais)”, pondera Segrillo, que reputa à entrega dos soldados soviéticos e o esforço de guerra montado por Moscou, com uma imensa quantidade de recursos utilizados para manter sua linha de defesa, como fatores decisivos.

Ao final de Stalingrado, 91 mil soldados do Eixo se renderam, além de um número estimado de 800 mil mortos. Com as forças nazistas extenuadas, começaria a lenta e custosa marcha do Exército Vermelho em direção a Berlim.

Em paralelo, Churchill e Roosevelt selariam com Stalin na Conferência de Teerã no final de 1943 o plano para atacar Hitler em duas frentes, que culminaria com a invasão da Normandia, em 6 de junho de 1944. No dia 16 de abril, os soviéticos iniciaram o ataque contra as posições defensivas da Alemanha em Seelow, nas proximidades de Berlim. Quando a cidade foi oficialmente invadida, no dia 25, a luta por Berlim foi travada rua por rua.

Com os soviéticos conquistando a capital alemã, Adolf Hitler passou os seus dias finais em seu abrigo subterrâneo, e cometeu suícidio em 30 de abril de 1945. Com a morte de Hitler, o poder da Alemanha foi assumido por Karl Dönitz, que tratou de aceitar os termos da rendição incondicional no dia 2 de maio de 1945. A capitulação definitiva foi assinada, porém, em 8 de maio de 1945 em Berlim, data em que até hoje a europa comemora o Dia da Vitória.

 

O MEIO AMBIENTE PRECISA DAS ABELHAS

 

Mudanças climáticas, uso excessivo de pesticidas e ação humana ameaçam a existência das abelhas, animais que desempenham papéis cruciais no equilíbrio do meio ambiente

As abelhas são conhecidas pela produção de mel, produto utilizado na cozinha, em remédios e em uma vasta parcela de cosméticos. Mas o que muitos não sabem é a importância que esses animais têm para o equilíbrio do meio ambiente.

Entenda um pouco mais do comportamento das abelhas, por que elas são vitais para o equilíbrio do meio ambiente e por que a existência da espécie está ameaçada.

Como as abelhas se comportam?

As abelhas vivem em grupos e desempenham atividades que impactam a natureza de diferentes formas. Um grupo de cientistas da Universidade Nacional de Singapura (NUS) e da Academia Chinesa de Ciências investigou o padrão de comportamento e distribuição de 20 mil espécies do inseto pelo mundo.

Como resultado, o estudo revelou que as abelhas preferem viver em lugares distantes da Linha do Equador, em zonas secas e com clima ameno. O grupo também testemunhou a importância dos diferentes papéis dos animais na manutenção do meio ambiente e os benefícios que geram para os seres humanos.

Abelha prestes a polinizar uma centáurea. (Fonte: Shutterstock/Reprodução)

A importância das abelhas para o meio ambiente

A transferência de grãos de pólen das anteras de uma planta para o estigma de outra (polinização) é realizada por moscas, borboletas, pássaros e vento. Contudo, as abelhas são os principais agentes desse processo, já que o realizam quando se alimentam de recursos florais e espalham o pólen por grandes áreas.

Essa ação garante a produção de frutos e sementes, além da reprodução de diversas plantas fundamentais para a preservação do meio ambiente. Confira, a seguir, alguns efeitos dessa atividade.

Polinização de plantas alimentícias

Dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) revelam que 70% de todas as culturas agrícolas são polinizados por abelhas, estima-se que grande parte dos alimentos consumidos pelos seres humanos são produtos do processo de polinização desses insetos.

Como resultado, as mercadorias geradas pela polinização das abelhas correspondem a cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) agrícola e representam uma cifra superior a US$ 200 bilhões por ano, mundialmente.

Polinização de matas nativas

A ação das abelhas no meio ambiente também colabora para a preservação das matas nativas, já que 85% das plantas de matas e florestas são polinizadas por esses insetos. Na Mata Atlântica, por exemplo, 90% das espécies vegetais são polinizados por abelhas.

Colmeia de abelhas na mata. (Fonte: Shutterstock/Reprodução)

Qualidade genética e produção de oxigênio

Frutos que nascem de plantas polinizadas por uma abelha têm qualidade genética superior às que não foram polinizadas e apresentam um valor nutricional maior com sabores muito mais marcantes.

Outro ponto essencial para a preservação do meio ambiente é o efeito cascata causado pelas abelhas que chegam até a produção de oxigênio, vital para qualquer forma viva na Terra.

As abelhas estão desaparecendo? Por quê?

Ações humanas como desmatamento, uso de pesticidas e mudanças climáticas ameaçam a alimentação, a habitação e a sobrevivência direta desses insetos. Recentemente, uma denúncia feita pelo pesquisador e biólogo Antônio F. Carvalho, em um estudo no Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), em Santa Teresa, revelou outro risco aos animais: o tráfico online de abelhas.

Segundo a publicação, a transferência dos insetos de seu hábitat para regiões não nativas facilita a disseminação de parasitas e predadores, o que contribui ainda mais para o desaparecimento da espécie.

Fonte: Current Biology, Embrapa, Revista Eletrônica Científica da UERGS, Sem abelha, sem alimento, Agencia Estadual de Notícias do PR

CRESCIMENTO PESSOAL DEVE SER PRIORIDADE

 

Dr. Roopleen – Escreve sobre desenvolvimento pessoal, sucesso e motivação

Invista em você para construir uma vida melhor. Faça do crescimento pessoal sua prioridade.

Todos nós aspiramos a ser o melhor de nós mesmos. E porque não? Temos a capacidade, o talento e o potencial para nos destacarmos e realizarmos tudo o que queremos. Existem amplas oportunidades para você melhorar a si mesmo e experimentar o sucesso que você merece.

O caminho mais curto para chegar onde você quer é através do crescimento e desenvolvimento pessoal. Se você investir em si mesmo, não apenas realizará seu maior potencial, mas também terá sucesso em projetar a vida dos seus sonhos.

Aqui estão cinco razões pelas quais você deve investir no crescimento pessoal e torná-lo sua principal prioridade.

1. Autoconsciência

O crescimento pessoal é um processo que começa com o direcionamento de sua atenção para dentro. Entender quem você pode, quais são seus traços positivos e negativos e onde você precisa melhorar a si mesmo, mostra o quadro geral de como você deve melhorar a si mesmo.

O crescimento pessoal, portanto, ajuda você a desenvolver um senso mais profundo de si mesmo e o conecta com seu verdadeiro eu. Você aceita o que não pode mudar em si mesmo e muda o foco para as áreas onde há espaço para melhorias.

“A autoconsciência é a capacidade de dar uma olhada honesta em sua vida sem qualquer apego a ela estar certa ou errada, boa ou ruim.”

— Debbie Ford

Com a autoconsciência vem a clareza e, com clareza, você pode viver com intenção e propósito.

2. Aumenta sua confiança

Quando você investe em crescimento pessoal e autodesenvolvimento, você toma posse de sua vida em suas mãos e inicia o caminho do auto-aperfeiçoamento. A cada dia você aprende algo novo, adquire um bom hábito, elimina um mau hábito, luta contra seus medos e estende seus limites.

Ver-se evoluindo para sua melhor versão aumenta sua confiança e melhora seu senso de identidade.

Você começa a confiar em si mesmo e a ter uma fé mais profunda em sua capacidade de abraçar a mudança e deixar de lado o que não lhe serve.

Saber que você pode sair da sua zona de conforto lhe dá coragem para elevar o nível mais alto para si mesmo e definir metas maiores. Isso cria mais impulso para o crescimento e, assim, coloca você no caminho certo para o sucesso.

3. Ajuda você a sair da sua zona de conforto

A vida oferece várias possibilidades de crescimento e progresso. Mas se você se limitar à zona de conforto e continuar fazendo as coisas que sempre fez, perderá o próximo nível.

Dizer não às oportunidades de crescimento – tanto como pessoa quanto como profissional – e seguir em frente na vida te condena a viver na mediocridade.

O crescimento pessoal ajuda a identificar seus pontos fortes e fracos. Você pode tomar medidas para superar suas deficiências e alavancar seus pontos fortes ao mesmo tempo, ganhando assim uma vantagem dupla e aumentando suas chances de ficar à frente dos outros.

“Mesmo as menores mudanças em nossa rotina diária podem criar incríveis efeitos cascata que expandem nossa visão do que é possível.”

— Charles F. Glassman

Além disso, quando você investe em desenvolvimento pessoal, aprende coisas novas e adquire habilidades, maior conhecimento e experiência, você se abre para melhores perspectivas de crescimento e pode acelerar seu sucesso.

4. Faz de você uma pessoa completa

Sua jornada de crescimento pessoal irá expô-lo a diferentes ideias, visões e perspectivas. Isso ajudará bastante a ampliar seus horizontes mentais e aumentar sua largura de banda para assumir um novo papel, relacionar-se confortavelmente e trabalhar com pessoas que podem ser diferentes de você em pensamento e atitude.

Crescer e aprender coisas novas aumentará seu conjunto de habilidades e o capacitará a assumir desafios maiores e mais responsabilidades. Isso abrirá novas possibilidades para trazer à tona sua força interior e seu potencial oculto.

Investir no crescimento pessoal o ajudará a se tornar uma pessoa mais versátil e a se adaptar e prosperar em diferentes circunstâncias e enfrentar os desafios que surgirem no seu caminho.

5. Realização pessoal

Não existe vida perfeita, mas se você assumir o controle e viver de acordo com o design, poderá se aproximar da vida dos seus sonhos.

Quando você se compromete com o autoaperfeiçoamento e assume a responsabilidade de aprender, melhorar e enriquecer a si mesmo, você se prepara para o sucesso e a felicidade.

Trabalhar para o que você quer ser e fazer coisas que importam para você permitirá que você viva com propósito e busque objetivos alinhados com seus valores e paixões fundamentais. Você também estará motivado a se esforçar ao máximo, enfrentar as dificuldades e lidar com ousadia com os problemas que encontrar.

 “Não é na busca da felicidade que encontramos realização, é na felicidade da busca.”

— Denis Waitley

Ver-se progredindo na frente pessoal também lhe dá um impulso para chegar ao próximo nível na vida profissional. Isso garante uma melhoria de 360 ​​graus em sua vida e ajuda você a criar um espaço interior feliz.

Para concluir

Quando se trata de crescimento pessoal, não existe um plano único para todos . Cada pessoa é única, assim como sua jornada de vida.

Portanto, para se tornar sua melhor versão e explorar todo o seu potencial, você deve definir claramente suas prioridades e trabalhar nelas para trazer o melhor de você.

Criar seu plano personalizado garantirá que você faça coisas que funcionem para você e o ajudem a crescer, evoluir e viver uma vida com propósito, criando valor para você e para os outros ao seu redor.

Todas as pessoas altamente bem-sucedidas alcançaram grandes alturas porque entenderam o significado do crescimento pessoal e investiram pesadamente em si mesmas.

“Pode-se optar por voltar para a segurança ou avançar para o crescimento. O crescimento deve ser escolhido repetidamente; o medo deve ser superado de novo e de novo.”

– Abraham Maslow

O crescimento pessoal será benéfico para você em todas as áreas da vida. Você trabalhará melhor, interagirá efetivamente com os outros e viverá uma vida mais gratificante.

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sexta-feira, 26 de agosto de 2022

ATIVISMO JUDICIAL E POLÍTICO DO STF

 


Cinco decisões recentes do STF que invadiram a competência dos demais poderes

Por
Renan Ramalho – Gazeta do Povo
Brasília


Para analistas, inquérito das fake news, caso Daniel Silveira, CPI da Covid, veto na PF e proibição de operação em favelas revelam ativismo político do STF.| Foto: Nelson Jr./STF

Há mais de uma década, o Supremo Tribunal Federal (STF) convive com acusações de ativismo judicial. O conceito envolve críticas a decisões em que a Corte atua além de suas competências convencionais e passa a fixar normas não previstas em leis aprovadas pelo Legislativo ou redirecionar políticas públicas tocadas pelo Executivo.

Há exemplos históricos nesse sentido e que há algum tempo são discutidos em âmbito acadêmico. Em 2008, por exemplo, o STF proibiu o nepotismo em todos os poderes, sem uma lei formal, com base nos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade. Em 2011, o plenário permitiu a união estável entre pessoas do mesmo sexo e, dois anos depois, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) assegurou o direito ao casamento, ainda que a Constituição fale expressamente que as duas relações são reconhecidas para “homem e mulher”.

Em 2016, presidindo o julgamento de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o ministro Ricardo Lewandowski permitiu uma manobra contrária ao texto da Constituição. A condenação pelo Senado deveria levar à perda do mandato e à suspensão dos direitos políticos, mas só a primeira punição prevaleceu. No mesmo ano, outra surpresa: seguindo o voto do ministro Luís Roberto Barroso, a Primeira Turma do STF decidiu, num caso individual, que o aborto voluntário até o terceiro mês da gestação não deveria ser crime.

Apesar de todas as críticas a essas decisões, por parte não apenas de estudiosos, mas da própria classe política, os ministros sempre as defenderam, alguns admitindo expressamente que o ativismo judicial, nesses casos, era legítimo. Em artigos, entrevistas e nos próprios votos, diziam que esse avanço era necessário por uma série de razões.

A justificativa mais usual é a suposta inércia ou omissão do Legislativo em garantir os numerosos direitos fundamentais previstos na Constituição. Essa alegação também se apoiava na teoria da “força normativa” da Carta, basicamente a ideia de que esses direitos devem ser garantidos diretamente pelo STF quando não há regulamentação aprovada em lei para detalhar como eles devem ser exercidos. Isso também abarcava aplicação de princípios genéricos e abstratos inscritos no texto, tais como a igualdade, a liberdade, a dignidade da pessoa humana, o pluralismo político, a moralidade administrativa, entre vários outros.

“O próprio papel do Judiciário tem sido redimensionado. No Brasil dos últimos anos, deixou de ser departamento técnico especializado e passou a desempenhar um papel político, dividindo espaço com o Legislativo e o Executivo. Tal circunstância acarretou uma modificação substantiva na relação da sociedade com as instituições judiciais. É certo que os métodos de atuação e argumentação empregados por juízes e tribunais são jurídicos, mas a natureza de sua função é inegavelmente política. Embora os órgãos judiciais não sejam integrados por agentes públicos eleitos, o poder de que são titulares, como todo poder em um Estado Democrático, é representativo. Vale dizer: é exercido em nome do povo e deve contas à sociedade. Essa constatação ganha maior realce quando se trata do Tribunal Constitucional ou do órgão que lhe faça as vezes, pela repercussão e abrangência de suas decisões e pela peculiar proximidade entre a Constituição e o fenômeno político”, escreveu o ministro Luís Roberto Barroso no livro “O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro”, publicado pela primeira vez em 2004 e reeditado várias vezes desde então.

No período mais recente, porém, inaugurado com a presidência de Jair Bolsonaro (PL) e marcado por seus duros embates com o STF, alguns analistas externos, que não se envolvem diretamente nos julgamentos, passaram a notar de forma crítica um avanço no ativismo, que, para eles, assumiu uma natureza política. Em meio a crescentes críticas por parte da população que apoia o presidente, e sob o novo pretexto de assegurar o regime democrático e a defesa da própria instituição, a Corte teria passado, na visão desses observadores, a afrontar de forma desproporcional outros direitos e garantias relevantes também garantidas pela Constituição, principalmente a liberdade de expressão e a imunidade parlamentar.

Para o advogado e constitucionalista Ives Gandra Martins, que participou dos debates da Assembleia Constituinte, trata-se de um entendimento que não foi aceito pelos parlamentares que redigiram a Constituição. “Temos tido intervenção política por parte da Suprema Corte em defesa do que eles chamam de democracia, mas com um poder, que, a meu ver, não está na Constituição e que não foi a linha que os constituintes adotaram. Entendo que há no Supremo uma corrente doutrinária –que chamam de consequencialismo jurídico, jurisprudência constitucional, neoconstitucionalismo – que respeito, mas que não foram hospedadas pelo constituinte. A Constituição admite harmonia e independência entre os poderes, mas sem invasão de competência no poder de cada um”, diz ele.

O desembargador aposentado Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, também vê excesso na atuação do STF. “O ativismo judicial moderado, que fique dentro dos lindes, dos limites do razoável, você pode aceitar, porque a Justiça tem que ter certa flexibilidade na interpretação da lei, mas desde que a interpretação esteja de acordo com a lei. Mas de uns quatro anos para cá, estamos verificando que não se trata mais de ativismo judicial, mas sim de ativismo político”, afirma.

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Com base nesse diagnóstico e em consulta a alguns desses críticos, vários deles renomados professores de direito, a reportagem elencou cinco decisões recentes nas quais o STF invadiu, além do razoável, as competências de outros poderes ou instituições.

1) Inquérito das fake news

A investigação, destinada a apurar ofensas e ameaças aos ministros, foi aberta em março de 2019, de ofício, pelo então presidente do STF, Dias Toffoli. Desde então, o inquérito das “fake news” nunca contou com aprovação do Ministério Público, deixado quase sempre à margem de prisões, buscas, quebras de sigilo e censuras ordenadas pelo ministro Alexandre de Moraes, escolhido a dedo para conduzir o caso. A maioria dos investigados nem sequer tem foro privilegiado no STF: já foram alvos procuradores da República, auditores da Receita, jornalistas e veículos independentes de mídia, e principalmente, Bolsonaro e seus apoiadores nas redes sociais.

“O STF não é órgão de investigação e usurpou competência do Ministério Público. O regimento interno autoriza a abertura de inquérito para investigar fato determinado ocorrido nas dependências do STF. É puro inquérito administrativo (não judicial) interno. No caso, não havia fato determinado, nem, muito menos, crime ocorrido nas dependências do STF”, resume Adilson Abreu Dallari, doutor e professor em direito administrativo da PUC-SP.

Em 2020, por 10 votos a 1, o plenário do STF rejeitou as contestações ao inquérito e, desde então, Moraes passou a abrir, quase sempre por iniciativa própria ou a pedido de delegados da Polícia Federal que oficiam diretamente a ele, outras investigações ou apurações correlatas. A mais recente é o inquérito das milícias digitais, que tem objeto mais amplo: uma suposta organização criminosa que atua nas redes com o intento de “atacar” a democracia e as instituições no país.

Relatórios dos delegados que alimentam a investigação falam em núcleos de produção, disseminação e financiamento de notícias “fraudulentas” contra autoridades, mas não fica claro exatamente quem as compõe e como concretamente elas ameaçam o Estado brasileiro. Já se mencionou o chamado “gabinete do ódio”, que seria composto por assessores de Bolsonaro e de parlamentares aliados. O foco atual são questionamentos às urnas eletrônicas.

2) Caso Daniel Silveira
Derivado do inquérito das fake news e de um de seus subprodutos, o inquérito dos atos antidemocráticos, o processo contra o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) desde o início provocou preocupação entre juristas, por atropelar uma série de outros direitos e garantias.

É consensual entre eles que as falas do parlamentar contra ministros do STF, veiculadas em vídeo nas redes sociais em fevereiro de 2021, configuraram abusos na liberdade de expressão, por conterem xingamentos e incitações à violência. O questionamento, porém, se dá em relação à forma com que o caso foi conduzido por Moraes, e com aval dos demais ministros.

O primeiro problema surgiu na prisão, ordenada por iniciativa do ministro sem pedido prévio da Polícia Federal ou da Procuradoria-Geral da República, como de praxe. A Constituição diz que deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Mais: que qualquer parlamentar só pode ser preso em flagrante de crime inafiançável. Silveira não foi preso no momento de suas falas, mas depois, e os delitos pelos quais foi acusado – coação no curso do processo e crimes contra a segurança nacional – não estão no rol de inafiançáveis.

“Alexandre de Moraes criou uma espécie jurídica que não existe em lugar nenhum: mandado de prisão em flagrante. Se é flagrante, você não pode ter um mandado, é na hora que o crime está acontecendo”, diz a advogada e professora de direito constitucional Samantha Ribeiro Meyer-Pflug Marques. Moraes justificou a medida argumentando que, porque os vídeos estavam disponíveis por tempo indefinido na internet, havia um estado permanente de flagrante; e inafiançável porque estariam presentes requisitos para uma prisão preventiva.

Ao longo do processo, que tramitou de forma acelerada, surgiram mais medidas heterodoxas: nova prisão e uma série de restrições que também não foram autorizadas pela Câmara, como recolhimento domiciliar, locomoção limitada ao Rio de Janeiro e Brasília, proibição de contato com outros investigados, veto a entrevistas e participação em eventos públicos. Restrições que, segundo a defesa, afetavam diretamente o exercício da atividade parlamentar e, por isso, deveriam ter sido aprovadas pela maioria dos deputados para serem validadas.

Samantha entende que atos assim comprometem a independência e harmonia entre os poderes, um mandamento constitucional, e lembra que, em 2017, num caso semelhante, uma reação do Senado fez o STF recuar. Na época, discutia-se se a Corte poderia afastar parlamentares do mandado sem aval do Parlamento – isso havia ocorrido com o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PTB-RJ), e com o senador Aécio Neves (PSDB-MG), no âmbito de investigações da Operação Lava Jato. No caso do tucano, o Senado resolveu colocar a medida em votação, para derrubá-la. O STF levou a questão ao plenário e depois aceitou a decisão.

“Nitidamente o Supremo entrou numa seara que não é dele, indo contra o que estava disposto na Constituição. O Supremo é o guardião da Constituição, não pode reescrever o texto constitucional. Esse foi um dos únicos casos em que o Legislativo se manteve firme e aí o Supremo teve que voltar atrás. Foi um caso expresso de ativismo judicial”, diz a advogada.

Atualmente, mesmo após um indulto concedido por Bolsonaro a Silveira, Moraes não decretou o perdão da pena imposta a ele, de quase 9 anos de prisão. Além disso, impôs novamente o uso de tornozeleira e, diante da recusa, multas que chegam a R$ 2 milhões, com bloqueio de suas contas bancárias e redes sociais. O deputado quer concorrer ao Senado, mas poderá ter a candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cujo atual presidente é exatamente Alexandre de Moraes.


3) CPI da Covid
Em abril de 2021, a relação entre STF e Congresso voltou a ficar estremecida quando o ministro Luís Roberto Barroso, contrariando o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), determinou que ele instalasse a CPI da Covid. O senador dizia que o momento era “inapropriado” e que cabia somente a ele avaliar a instalação da comissão parlamentar de inquérito, segundo um juízo de “conveniência e oportunidade”.

Esses critérios, em geral, são respeitados pelo STF, por se tratarem de questões “interna corporis”. Trata-se de um argumento comum, usado por ministros quando rejeitam interferências na tramitação de propostas, em regras e procedimentos do processo legislativo e também na rejeição de pedidos para forçar a abertura de processos de impeachment.

“Quem tem que decidir sobre comissão parlamentar de inquérito, que tem a ver com oportunidade e conveniência, é o Poder Legislativo. Aí vai lá um representante da minoria, provoca o Judiciário, e consegue. O STF devia falar ‘não é comigo, é questão do Legislativo’”, diz o professor Dircêo Torrecillas, livre docente pela USP e especialista em direito constitucional.

A decisão do ministro foi bastante criticada por vários senadores, porque foi monocrática e porque outros pedidos de CPI que estavam antes na fila não receberam o mesmo tratamento, por exemplo, uma para investigar a conduta dos próprios ministros do STF.

“Vejo uma afronta do STF a esta Casa. Isso tem acontecido repetidamente. Essa decisão monocrática interfere diretamente na nossa soberania e mostra desrespeito com o Senado. Estamos com um poder acima do outro. Precisa de um freio. O freio é a CPI da Lava Toga e impeachment de alguns ministros”, disse, na época, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE).

“Tivemos um ataque às liberdades e agora ao livre exercício de nossas funções. Neste caso, também temos as assinaturas necessárias para a Lava Toga”, protestou o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS). Plínio Valério (PSDB-AM) pediu a Pacheco para descumprir a decisão, mas em vão. A liminar foi confirmada poucos dias depois no plenário do STF, o presidente do Senado acatou a ordem e instalou a comissão.

Em seis meses, os senadores que dominavam a comissão foram acusados de diversos abusos: ameaças ou ordens de prisão mal fundamentadas contra testemunhas; humilhações aos depoentes; devassa sobre empresas e pessoas com motivos genéricos. As medidas foram criticadas por advogados e investigados, pois dificilmente seriam aceitas na Justiça. O STF, nesses casos, pouco interferiu, apesar de várias ações enviadas aos ministros.

A PGR já pediu o arquivamento da maioria das apurações abertas contra Bolsonaro com base no relatório final da CPI, mas os ministros ainda não decidiram sobre esses pedidos.

4) Nomeação para a PF suspensa

Em abril de 2020, com base numa suspeita levantada pelo ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro, Alexandre de Moraes suspendeu a nomeação do delegado Alexandre Ramagem para a direção-geral da Polícia Federal, escolhido para o cargo por Jair Bolsonaro.

Ele atendeu a um pedido do PDT, partido de oposição, sob o argumento de que o ato estaria viciado por “desvio de finalidade”. A alegação era baseada em declarações de Moro de que Bolsonaro queria interferir na PF, trocando o diretor-geral a fim de obter informações privilegiadas em investigações contra familiares e aliados. A suspeita nunca foi comprovada – ao contrário, PF e PGR pediram o arquivamento do inquérito sobre o caso, após vários delegados afirmarem, em depoimentos, que o presidente não teve acesso a casos sensíveis.

Na época, Bolsonaro afirmou que a decisão de Moraes foi política. “Se não pode estar na PF, não pode estar na Abin também. No meu entender, uma decisão política, política […] Não justifica a questão da impessoalidade. Como é que o senhor Alexandre de Moraes foi para o Supremo? Amizade com o senhor Michel Temer. Ou não foi?”, disse.

“Ontem quase tivemos uma crise institucional. Quase. Faltou pouco. Eu apelo a todos que respeitem a Constituição […] Eu não engoli ainda essa decisão do senhor Alexandre de Moraes. Não engoli. Não é essa a forma de tratar um chefe do Executivo”, protestou. Depois, acabou desistindo de nomear Ramagem, que era diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), e a ação contra sua nomeação perdeu objeto.

Vários juristas, mesmo críticos de Bolsonaro, manifestaram objeções. A Constituição diz que compete privativamente ao presidente da República exercer a direção superior da administração federal. A lei que define a estrutura da PF diz que o diretor-geral da corporação é nomeado por livre escolha do presidente.

A decisão de Moraes – baseada nos princípios da moralidade e da impessoalidade – tinha um precedente. Em 2016, o ministro Gilmar Mendes vetou, a pedido do PSDB, a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil. Também apontou desvio de finalidade, pela suspeita de que o objetivo da então presidente Dilma Rousseff era dar ao petista foro privilegiado para escapar das investigações da Lava Jato na primeira instância.

Em 2019, quando passou a criticar a operação, Gilmar Mendes disse que “teria muitas dúvidas sobre que decisão tomar” se a ação tivesse chegado a ele após as revelações de conversas hackeadas dos procuradores de Curitiba.

5) Proibição de operações policiais em favelas

Em junho de 2020, acolhendo um pedido do PSB, o ministro Edson Fachin proibiu, monocraticamente, operações policiais em favelas em todo o estado do Rio de Janeiro. A decisão seria válida enquanto perdurasse a pandemia de Covid, mas até hoje está em vigor.

A liminar afirmou que o descumprimento da medida sujeitaria policiais a responsabilização civil e criminal; as incursões só seriam admitidas em “hipóteses absolutamente excepcionais”. A decisão foi motivada, na época, pela morte de dois jovens em morros da capital fluminense.

Só em outubro de 2020, a decisão foi levada ao plenário do STF, que, numa sessão virtual, confirmou a proibição, por 9 votos a 2. Alexandre de Moraes divergiu com o argumento de que não caberia ao Judiciário a “vedação genérica” a operações por tempo indeterminado. A falta de atuação policial, acrescentou, “gerará riscos à segurança pública de toda a sociedade do Rio de Janeiro, com consequências imprevisíveis”. O presidente do STF, Luiz Fux, o acompanhou, mas ambos ficaram vencidos.

A decisão foi criticada pelas autoridades locais. O prefeito do Rio, Eduardo Paes afirmou, na época, que a decisão “impede as forças policiais de exercer o monopólio da força do Estado”, apontando armazenamento de drogas nas favelas por traficantes internacionais.

Em fevereiro deste ano, diante de incertezas sobre quais, afinal, seriam as “situações excepcionais” para a realização das operações, o plenário do STF acabou tendo de voltar ao tema para definir uma série de regras. Determinou que o estado fizesse um plano de redução da letalidade policial, colocasse câmeras nos uniformes dos agentes e ambulâncias nas proximidades das favelas.

A maioria acabou afrouxando medidas mais rígidas propostas por Fachin, que queria restringir ao máximo o uso de armas de fogo, divulgar os protocolos seguidos pelas polícias nas operações, permitir o controle do MP Federal sobre as atividades e impedir que as incursões fossem baseadas em denúncias anônimas.

Para o desembargador aposentado Ivan Sartori, a tentativa de controlar em minúcias as operações, de forma distante da realidade local, é uma usurpação dos poderes do Executivo estadual. “A decisão impedindo a polícia de subir o morro, o que fez com a criminalidade prevalecesse, se agigantando cada vez mais. A polícia está completamente desautorizada, desprestigiada e com isso quem perde é o cidadão. O policial deveria estar resguardado pelo Estado e isso não está acontecendo. É lamentável.”


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AUTORITARISMO DO STF

Editorial
Por
Gazeta do Povo


Detalhe da estátua da deusa Têmis, diante do prédio do STF, em Brasília.| Foto: Gervásio Baptista/SCO/STF

“Violência estatal”, afirmaram mais de 90 associações empresariais, câmaras de dirigentes lojistas e sindicatos do comércio de Santa Catarina. “Em Direito Penal não se pune a cogitação (…) eu achei muito perigoso e não atende aos interesses nacionais”, disse o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello. “Se eles não cometeram nada, estamos diante de uma arbitrariedade”, afirmou Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência da República. “Absolutamente irrazoável”, na descrição da Associação Comercial do Rio de Janeiro. O que essas pessoas ou entidades da sociedade civil organizada têm em comum? Não estão alinhadas ideologicamente a Jair Bolsonaro – no caso de Ciro, mais ainda: estamos diante de um forte crítico do presidente –, mas perceberam (ainda que de forma hipotética, para o pedetista) o enorme perigo causado pela operação policial ordenada por Alexandre de Moraes contra oito empresários que tiveram conversas em um grupo privado de WhatsApp publicadas na imprensa.

O Brasil precisa aprender a discernir as ameaças à democracia no país, de onde quer que venham. Mello sempre foi um crítico dos inquéritos abusivos abertos no Supremo e conduzidos por Moraes – é do ex-ministro a expressão “inquérito do fim do mundo”, referindo-se à investigação das fake news, o primeiro dos inquéritos, aberto por ordem de Dias Toffoli quando este presidia o Supremo. Mas sua voz, além de isolada, costumava cair no vazio. Boa parte da sociedade aplaudiu e ainda aplaude as prisões, as operações de busca e apreensão, a derrubada de perfis em mídias sociais, a desmonetização de YouTubers e sites noticiosos – o único momento em que uma parcela um pouco maior da opinião pública se levantou contra Moraes foi no hoje distante episódio da censura à revista Crusoé. De resto, o que tem havido é o endosso ou o silêncio cúmplice; afinal, as vítimas eram e são sempre aqueles que boa parte do mundo jurídico e midiático trata como inimigos viscerais: direitistas, conservadores ou bolsonaristas, contra os quais se decidiu que vale praticamente tudo.

O Brasil tem de escolher entre as conveniências políticas e a defesa incondicional e intransigente das liberdades democráticas para todos

Foi preciso que Moraes avançasse ainda mais sobre as liberdades individuais, trazendo para o Brasil de 2022 os ecos da União Soviética stalinista ou da defunta Alemanha Oriental – que com sua eficientíssima Stasi era capaz de identificar “inimigos do Estado” por meio de suas conversas privadas –, para que mais brasileiros percebessem que estamos às portas de um autoritarismo velado. Uma ditadura da Toga imposta não por tanques, mas por canetas, e que passa por legítima apenas porque as ordens, mesmo que arbitrárias, seguem trâmites regulamentares. Decisão do Supremo se cumpre, por certo, mas o Supremo não pode se esconder atrás deste princípio para abolir o devido processo legal, o direito à ampla defesa, o princípio do juiz natural, a imunidade parlamentar, a liberdade de expressão. No entanto, é o que a corte tem feito nos inquéritos das fake news, dos “atos antidemocráticos” e das “milícias digitais”.


Nunca é demais repetir: oito cidadãos brasileiros receberam a visita da Polícia Federal, tiveram celulares apreendidos e sigilos violados porque manifestaram opiniões de forma privada. Destes oito, cinco não disseram uma única palavra sobre golpe de Estado, e mesmo os outros três apenas manifestaram preferências hipotéticas, sem tramar nem estimular nenhum processo violento de ruptura institucional (o “ilícito” de um deles foi publicar uma imagem de uma pessoa fazendo sinal de positivo). Não há nem mesmo indício de crime que justificasse a abertura de uma investigação. Como afirmamos dois dias atrás, qualquer juiz com critérios minimamente bem definidos teria indeferido toda essa insanidade, que ainda por cima prospera em um sigilo que a Procuradoria-Geral da República está sabiamente tentando derrubar para que fique exposta, de uma vez por todas, a sanha persecutória de Alexandre de Moraes.

O Brasil tem de escolher entre as conveniências políticas e a defesa incondicional e intransigente das liberdades democráticas para todos. É vergonhoso que, até agora, entidades de dimensão nacional, que já foram luzeiros a apontar a direção correta para o país em tempos de escuridão, estejam caladas apenas porque o arbítrio está lançado contra o “inimigo comum”. Assinar manifestos é fácil; muito mais difícil é perceber o risco real à democracia e levantar a voz quando ela é aviltada. Mas é assim que se revelam os autênticos democratas.


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ENTREVISTA DE LULA AO JORNAL NACIONAL

 

Ex-presidiário

Por
Paulo Polzonoff Jr.


Na entrevista de Lula ao Jornal Nacional, chamou muito mais a atenção a postura de William Bonner e Renata Vasconcellos.| Foto: Reprodução/ Globoplay

Ainda na terça-feira (23), enquanto a entrevista do presidente Jair Bolsonaro ao Jornal Nacional estava fresquinha na memória, me peguei imaginando como seria a entrevista de Lula ao telejornal – e com os mesmos entrevistadores. E imediatamente pensei que, naquele momento, alguém estava tomando decisões muito importantes sobre o tom da entrevista com o ex-presidiário. A começar pelo uso ou não desse termo (spoiler: não vão usar).

O dia transcorreu normalmente. Muito trabalho, graças a Deus. A Catota aprontando das suas. Mulher me dando bronca por alguma coisa errada que eu fiz (desculpe!). Ideias se acumulando no meu bloquinho de anotações. Boas risadas com os amigos. E, no meio de tudo isso, ela, a pervasiva e um tantinho quanto incômoda imaginação. Será que William Bonner e Renata Vasconcellos seriam corteses e generosos com Lula? Ou será que seriam arrogantes e agressivos? Haveria sorrisinhos sarcásticos ou rolariam lágrimas? Lula levaria a água ou aceitaria a que lhe servissem?

Aí me dei conta de algo que talvez seja óbvio para o leitor. Mas é que sou distraído mesmo. Daí a surpresa ao constatar que, no caso da entrevista de Lula ao Jornal Nacional, os entrevistadores tinham se tornado mais importantes do que o entrevistado. E olha que estamos falando de um ex-presidente que ocupou o cargo durante oito anos, sobreviveu intacto ao julgamento do Mensalão, elegeu a sucessora e passou 600 dias preso. Numa cadeia de luxo, vá lá. Mas ainda assim preso. Por corrupção e lavagem de dinheiro. O que estava em jogo não era a postura do candidato, e sim a dos entrevistadores diante dele.

Sejamos sinceros: ninguém está interessado no que Lula tem a dizer. Se é que ele tem algo a dizer. Quem é petista é petista até debaixo d’água. Quem não é, dificilmente se tornará por encanto da retórica lulista. As pessoas só estão interessadas em analisar a postura de William Bonner e Renata Vasconcellos. Que insisto em escrever com a consoante dobrada, mas que talvez seja com um “l” só. Deixa eu ver aqui. Ufa.

Poc, poc, poc, poc, poc. A pipoca ficou pronta. Se serei capaz de assistir à entrevista, escrever e comer ao mesmo tempo, não sei. De qualquer forma, peço antecipadamente desculpas por eventuais erros. Qualquer coisa, você já sabe: a culpa foi da pipoca.

Como foi a entrevista
Lula parece nervoso. Esfrega as mãos enquanto Bonner explica a entrevista. Renata está sorridente. Não diria simpática. A entrevista começa falando sobre corrupção. “Portanto, o senhor não deve nada à justiça”, diz Bonner. A pergunta se alonga, cheia de ressalvas. Lula olha de baixo para cima. “Como esses escândalos não vão se repetir?”, pergunta. Lula agradece a oportunidade de falar sobre o assunto.

“Foi no meu governo que a gente criou…”, começa Lula, dando origem a uma curiosa narrativa: a de que ele foi o responsável pela própria prisão. Nenhuma interrupção. Nenhum confronto. A voz rouca de Lula espanta a Catota. Minto, foi um mosquito que atraiu a atenção dela. Lula aponta o caráter político da Lava Jato e ataca Sergio Moro. Nenhuma interrupção. Nenhuma interrupção ainda. Nenhuma interrupção.

Oiando nos óio do povo brasileiro, Lula promete combater a corrupção. Lula, que ficou preso quase 600 dias. Lula. Educadamente, Bonner insiste no tema da corrupção. “Como o senhor pode assegurar que a corrupção não ocorrerá?”, insiste Bonner. Insistência estranha. Lula, por sua vez, insiste na ideia de que ele foi o responsável pela própria prisão. Sem ele, a corrupção correria solta. Imagina!

“Eu poderia fazer decreto de cem anos. De sigilo. Sabe, o que está na moda agora”, diz um Lula que parece perdido no argumento. Será que a retórica e o “carisma” serão capazes de seduzir o telespectador? William Bonner toma a dianteira novamente. Calmamente, com aquele tom condescendente, mas não sarcástico, ele insiste na corrupção e pede de Lula uma confissão de que o PT se envolveu com a corrupção. Lula critica as delações premiadas. Tergiversa. Não reconhece nada.

Bonner insinua uma interrupção e até um sorrisinho de sarcasmo. Aí Lula critica a Lava Jato e culpa a operação por desemprego, desinvestimento e até queda na arrecadação. Não acredito que estou ouvindo isso. Lula está culpando a Lava Jato por falência de empreiteira. Não acredito nisso. Bonner finalmente passa a palavra para Renata Vasconcellos e “defende” a Lava Jato.

Uma Renata Vasconcellos sem nenhum vestígio de sangue nos olhos pergunta a Lula sobre… lista tríplice da PGR. Fico imaginando o povão assistindo a isso. Enquanto Lula responde qualquer coisa, tenho tempo para refletir sobre a estratégia de comunicação desse jornalismo aí. Xi, agora Renata Vasconcellos levantou a bola para Lula falar sobre a relação entre o procurador-geral e Bolsonaro. Lula não aproveita a deixa.

“O senhor vai manter mistério sobre assunto tão fundamental?”, insiste Renata Vasconcellos. Tão fundamental? Lista tríplice é tão fundamental? A pergunta se estende. Outra bola levantada por Renata Vasconcellos: intervenção na Polícia Federal. Não acredito no que estou vendo – de novo. Lula não aproveita novamente e evoca a prisão do irmão. Ele se diz injustiçado. Fala em garantia da democracia. Não é interrompido.

“Quero ser melhor do que fui”, diz Lula. Bom slogan. Elogia Alckmin. Não acredito no que estou vendo – pela terceira vez. Bonner decide, então, falar sobre algo que fala ao povo: o bolso. Pessimista, Bonner pergunta como Lula pretende recuperar a economia. Os números mostram o contrário, penso. Lula compara o Brasil de 2002 ao Brasil de vinte anos mais tarde. Cita vários números que farão a alegria das agências de checagem. Lula se diz o responsável por diminuir a inflação no Brasil. Os entrevistadores deixam Lula falar à vontade. “Credibilidade, previsibilidade, estabilidade”, diz Lula. Outro slogan. Que ele tem tempo de sobra para explicar. Sem interrupção alguma dos entrevistadores.

Bonner continua falando da economia. O desastre Dilma é mencionado. A pauta é: intervencionismo na economia. Mas Bonner não explica isso para o Homer Simpson. “Sábado eu estive com a Dilma…”, diz Lula, contando uma anedota para não criticar Dilma Rousseff. Ele quase chora ao elogiar a ex-presidente. Ele está elogiando o governo Dilma. Não acredito nisso IV. Lula culpa Eduardo Cunha e Aécio Neves pelo desastre econômico de Dilma.

“Seu governo vai ser diferente do de Dilma?”, pergunta Bonner. Boa pergunta. Lula tergiversa. Diz que vai governar do jeito que bem entender. Cita outro slogan. Diz que a obsessão dele “é porque é possível recuperar esse país”. Papinho mais velho do que andar para frente. Política velha. Bonner cita números para atestar a falência do Brasil sob o governo Dilma.

“Se tem uma coisa que eu sei fazer é cuidar do povo”, diz Lula. Novamente, sem ser perguntado, ele evoca o nome de Alckmin, exaltando sua capacidade de diálogo. Renata Vasconcellos insiste em assuntos absolutamente desinteressantes para o espectador: Centrão. Para compensar, ela menciona o Mensalão. “O Mensalão é mais grave do que o ‘orçamento secreto’?”, pergunta Lula. Renata não responde a resposta óbvia: claro que é! Lula, então, defende o Centrão. Boa oportunidade para Renata perguntar se Lula, então, concorda com Bolsonaro. Mas não há interrupção.

Lula defende a imprensa livre. Não acredito no que estou ouvindo – não me canso de dizer. Lula volta a atacar a corrupção. Só falta se dizer Caçador de Marajás. Ah, agora Renata diz que não há como comparar o Mensalão ao “orçamento secreto”. Ufa. Lula diz que Bolsonaro é refém do Congresso Nacional. “O Bolsonaro parece um bobo da corte”, diz. Aí Lula começa a dar aula de como Bolsonaro deveria se relacionar com o Congresso. Lula fala em LDO. O espectador lembra o que é LDO? Eu lembro?

Lula ri. Tenta usar todo o seu poder de sedução. Ninguém o interrompe. Lula olha diretamente para a câmera. “Não coloque rancor na urna”, diz. Não, ele não está pedindo perdão. Bonner faz uma pergunta longa sobre a hostilização de Alckmin por parte dos petistas. “Nós não estamos vivendo no mesmo mundo. Estou até com ciúmes do Alckmin”, diz Lula. Nunca vi um candidato elogiar tanto o vice. Mas minha memória não é das melhores, reconheço.

“O povo tem que voltar a comer um churrasquinho e beber uma cervejinha”, diz Lula. Outro slogan. Bonner e Renata vão deixando. Como será que os espectadores estão vendo isso?, penso. Bonner fala da agressividade da militância petista. “Feliz era o Brasil quando a polarização era entre PT e PSDB”, diz Lula. É teatro das tesouras que fala? “Militância é militância”, diz Lula. Lula começa a comentar futebol, como se estivesse na mesa do bar. E cinicamente defende a paz na política.

Bonner se sai muito bem ao falar do “nós contra eles”. Lula volta a comparar a política ao futebol. E aí defende a polarização. Desde que seja entre iguais, né, Lula?, penso. Lula, então, critica o regime chinês e cubano. Eu não acredito no que estou ouvindo – perdi as contas. “Eu me dou muito bem com o PSDB”, diz, novamente escancarando o teatro das tesouras. Lula menciona Paulo Freire. Não tomei o Engov. Lula fala em fascismo e ultradireita. Não é confrontado por causa disso.

Renata Vasconcellos faz uma boa pergunta, mas num tom que você provavelmente achou calmo demais. E menciona o conflito entre o MST e o agronegócio. Lula começa a se autoelogiar. E diz que o problema dele com o agronegócio é a pauta ambiental do PT. Não acredito, etc. Lula defende o MST. Lula perde uma grande oportunidade de ficar calado e começa a atacar o agronegócio. “Qual será o papel do MST no seu governo?”, pergunta Renata. Lula não responde e elogia o MST. Maior produtor de arroz orgânico do Brasil. Faltou falar que a produção é irrisória. Lula critica o armamento no campo.

Politica internacional, anuncia Bonner. Boa pergunta sobre as ditaduras de esquerda e o apoio de Lula. “A gente precisa respeitar a autodeterminação dos povos”, diz. Lula não responde a pergunta de Bonner. Bonner, Lula não respondeu! Bonner, Lula não respondeu. Não respondeu. O tempo acaba. “Não gosto da palavra ‘governar’; gosto da palavra ‘cuidar'”, diz Lula, repetindo mais um slogan. Agora vou publicar o texto e dormir. Boa noite.

ELEIÇÕES 2022
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GOVERNO LULA ESCOLHEU SEU INIMIGO NÚMERO UM AS BIG TECHS

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