sexta-feira, 25 de março de 2022

PUTIN MUDA A MOEDA DE PAGAMENTO DO GÁS FORNECIDO À EUROPA

 Mischa Ehrhardt – DW

Moscou quer que países ocidentais paguem por gás russo em rublos, numa tentativa de valorizar moeda do país. Medida viola contratos com pagamentos em dólares e deve pressionar europeus dependentes da energia russa.Putin lançou uma sangrenta ofensiva contra a Ucrânia em fevereiro© Reuters/Russian Presidential Press Office Putin lançou uma sangrenta ofensiva contra a Ucrânia em fevereiro

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse nesta quarta-feira (23/03) que a compra de gás russo por “países hostis” – ou seja, as nações do Ocidente que apoiam sanções contra Moscou – deverá ser paga em rublos.

A medida ocorre após um congelamento de centenas de bilhões de dólares de ativos russos no exterior por causa das sanções impostas ao país pela invasão da Ucrânia. O anúncio também é encarado como uma tentativa de Moscou de tentar valorizar o rublo, que sofreu uma queda vertiginosa nas últimas semanas diante das sanções.

Mesmo em meio à tensão entre o Ocidente e a Rússia, Moscou afirma que continuará a cumprir suas obrigações de entrega. A Gazprom, principal estatal russa de gás, por exemplo, está enviando 104 milhões de metros cúbicos de gás através de gasodutos na Ucrânia para a Europa nesta quinta-feira.

Mas o anúncio de Putin provocou preocupação em grandes compradores de gás, como a Alemanha. “Pagar em rublos é, antes de tudo, uma violação dos contratos”, reagiu o ministro alemão da Economia, Robert Habeck (Partido Verde), na noite de quarta-feira.

Putin instruiu seu governo e o Banco Central russo a elaborarem os detalhes exatos da mudança na forma de pagamento dentro de uma semana.

“Indiretamente, isso talvez seja uma resposta à declaração do governo [do chanceler federal alemão] Olaf Scholz, que disse que não queremos tocar no fornecimento de gás, caso contrário isso sairia muito caro para a Alemanha”, afirmou à DW Jens Südekum, professor do Instituto de Economia da Concorrência da Universidade de Düsseldorf. “Putin está respondendo a isso dizendo: ‘Ok, você pode ter gás – mas apenas nos meus termos’.”

Putin e o ex-chanceler federal alemão Gerhard Schröder. Alemanha é dependente do gás russo© Peer Grimm/dpa/picture alliance Putin e o ex-chanceler federal alemão Gerhard Schröder. Alemanha é dependente do gás russo

Clara violação de contratos celebrados

É claro que muitos juristas têm uma visão crítica do assunto. “Os contratos são entre duas partes e geralmente são especificados em dólares americanos ou euros, portanto, se uma das partes disser unilateralmente ‘Não, você pagará em outra moeda’, não há contrato”, diz Tim Harcourt, economista da Universidade de Tecnologia em Sydney.

Mikhail Krutikhin, fundador e analista sênior da consultoria RusEnergy Moscow, descreveu o anúncio de Putin como “um tipo de propaganda voltada para o público local”. A Alemanha e outros países ocidentais rejeitaram a proposta do Kremlin alegando que ela representa uma quebra de contrato – opinião compartilhada por Krutikhin.

“Talvez ele [Putin] ache que os clientes da Gazprom precisam fazer negócios com os bancos [russos] que estão atualmente sob sanções e trazer moeda forte para [esses] bancos. Uma operação de chantagem nesse sentido pode vir a ajudar esses bancos e frear o declínio do rublo russo.” No entanto, Krutikhin adverte que o plano pode sair pela culatra, provocando caos no mercado de gás. “Pode ser muito difícil entender qual será o preço real do gás russo.”

Entre os “países hostis” que impuseram sanções a empresas ou indivíduos na Rússia estão Alemanha, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Japão, Noruega, Cingapura, Coreia do Sul e Suíça.

Provided by Deutsche Welle© Provided by Deutsche Welle Provided by Deutsche Welle

O rublo financia a guerra

A medida também pode ser uma resposta à forma como as sanções prejudicaram a habilidade da Rússia em fazer transações com moedas como o dólar ou o euro. “É claro que a Rússia ainda pode tentar trocar moedas com outros países como Índia e China. Mas é claro que não pode fazer nada no Ocidente no momento”, afirma o economista-chefe do banco ING, Carsten Brzeski. “Mas ele [Putin] precisa de rublos: ele tem que financiar a guerra com rublos, então, do ponto de vista dele, é uma jogada muito esperta.”

Além disso, mudar os pagamentos para rublos teria consequências e benefícios ainda mais abrangentes para a Rússia. Isso fortaleceria o rublo e apoiaria novamente o Banco Central russo após a instituição ser cortada dos mercados de capitais internacionais pelas sanções ocidentais. “Agora Putin os promoveria de volta a uma posição central porque então precisaríamos do banco para pagar pelo gás”, explica o professor Jens Südekum.

Isso porque pagamentos por entregas de gás envolvem grandes somas, que não podem ser obtidas tão facilmente nos mercados de câmbio, especialmente no quadro atual. Os compradores de gás não teriam escolha a não ser trocar moeda estrangeira por rublos junto ao Banco Central russo, indiretamente enfraquecendo as sanções impostas ao regime de Putin e à economia russa.

Fornecedores de energia como a OMV, da Áustria, já anunciaram que pretendem continuar a pagar em euros, sem recorrer aos rublos. “Eu nem poderia fazer algo assim”, disse o chefe da OMV, Alfred Stern, na quarta-feira à emissora de TV Puls 24. Segundo ele, o contrato original com os russos prevê que as contas devem ser pagas em euros.

Na Alemanha, manifestante contra a guerra pede suspensão da compra do gás russo© Florian Gaul/greatif/picture alliance Na Alemanha, manifestante contra a guerra pede suspensão da compra do gás russo

O declínio do rublo foi estancado

No entanto, o posicionamento de Putin foi suficiente para frear uma queda maior do rublo. O anúncio foi feito na tarde de quarta-feira e reforçado nesta quinta. Como resultado da guerra e das sanções, o rublo havia despencado, e o Banco Central russo chegou a elevar a taxa básica de juros de 9,5% para 20% com o objetivo de frear uma desvalorização ainda maior da moeda.

Ao mesmo tempo, com o anúncio, o governo russo está sinalizando que pode prescindir da receita em dólares e euros das vendas de gás. Assim, o país avalia que está em condições de poder pagar juros e dívidas vencidas nessas moedas estrangeiras. Apenas alguns dias atrás, havia especulações sobre um possível default da Rússia.

E, finalmente, o anúncio coloca Berlim e Bruxelas em uma posição difícil. Porque um boicote ao fornecimento de energia russo teria o efeito de inflacionar ainda mais os preços de energia na União Europeia, que já estão altos. Os governos alemão e francês, por exemplo, já estão tomando medidas para aliviar financeiramente o peso das faturas sobre cidadãos e empresas.

Além disso, a dependência do gás russo é extremamente alta. A associação alemã de energia BDEW alerta para o risco de deterioração da situação do fornecimento de gás na Alemanha. “O BDEW pede ao governo federal que declare o nível de alerta antecipado no plano nacional de emergência de gás”, disse a presidente do conselho executivo da associação, Kerstin Andreae, na quinta-feira. Esse plano de emergência estabelece uma ordem de prioridades que devem ser mantidas no caso de cortes ou gargalos na entrega de gás.

Autor: Mischa Ehrhardt

 

INDENIZAÇÕES NO MPF SÃO ASSUSTADORES OS SEUS PAGAMENTOS

Por
Lúcio Vaz – Gazeta do Povo

Sede do Ministério Público Federal, em Brasília.| Foto: Wikimedia Commons

A fartura nas indenizações pagas a procuradores do Ministério Público Federal (MPF) em dezembro do ano passado se estendeu a inativos e também a membros de outros órgãos do Ministério Público da União – Procuradorias do Trabalho, Militar e do Distrito Federal. A procuradora aposentada do MPF Elizabeth Toledo, por exemplo, recebeu R$ 606 mil de conversão de licença prêmio em dinheiro.

O procurador aposentado Ronaldo Fleury, servidor da Procuradoria Geral do Trabalho, levou R$ 482 mil de licença prêmio não gozada. Com remuneração do cargo efetivo de R$ 46 mil, ele também recebeu o 13º salário em dezembro. A sua renda bruta chegou a R$ 92 mil. Naquele mês, ele recebeu um total de R$ 574 mil.

A procuradora aposentada Beatriz Hollebem, da Procuradoria do Trabalho da 4ª Região, com renda básica de R$ 38,9 mil, também recebeu o 13º e teve renda bruta de R$ 77,8 mil em dezembro. Com mais R$ 385 mil de licença prêmio não usufruída, chegou a uma renda total de R$ 463 mil. Mais oito procuradores do Trabalho receberam R$ 297 mil de licença prêmio. Sessenta procuradores foram contemplados licença prêmio acima de R$ 200 mil. Membros ativos e inativos e servidores do MPT receberam um total de R$ 37,6 milhões de licença prêmio.

O que é a licença prêmio
A licença prêmio é devida a servidores que completam cinco anos de exercício do cargo. Eles têm direito a ficar três meses afastados do trabalho, mas podem optar por receber o valor em pecúnia (dinheiro) no momento da aposentadoria ou desligamento do cargo. Em 2017, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) definiu que, “de acordo com a disponibilidade orçamentária e conveniência da administração, estes valores podem ser antecipados e pagos na ativa.

Reportagem publicada pelo blog mostrou que as indenizações pagas a procuradores do Ministério Público Federal em dezembro custaram R$ 75 milhões aos cofres públicos. Eram conversão de licença-prêmio em dinheiro, abonos e indenização de férias não usufruídas. O maior pagamento foi feito ao procurador Mário Lúcio Avelar, da Procuradoria da República em Goiás, no valor de R$ 362 mil.

Mas os benefícios foram estendidos aos procuradores aposentados, que receberam um total de R$ 2,15 milhões. Domingos Sávio da Silveira, procurador aposentado da Procuradoria Geral da República (PGR), recebeu R$ 433 mil de licença prêmio em pecúnia. Aroldo Ferras da Nóbrega, outro procurador aposentado da PGR, recebeu R$ 342 mil de licença prêmio. Luís Cláudio Leivas, da Procuradoria da 2ª Região, levou mais R$ 310 mil.


Os extras dos procuradores militares
Os procuradores do Ministério Público Militar receberam um total de R$ 9,8 milhões de licença prêmio não usufruída. O promotor Antônio Carlos Facuri, da 3ª Procuradoria Militar do Rio de Janeiro, teve direito a R$ 459 mil. O procurador aposentado Antônio Antero dos Santos recebeu R$ 448 mil. O subprocurador geral aposentado da Justiça Militar, Cezar Rangel Coutinho, levou R$ 347 mil. A bolada superou os R$ 200 mil para 25 procuradores. Apenas quatro aposentados foram contemplados com licença prêmio, incluindo um servidor.

No Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), os maiores valores individuais foram menores do que no MPM, mas a despesa total foi bem mais pesada. Foram pagos 41,5 milhões de licença prêmio e R$ 2,8 milhões de abono pecúnia a membros e servidores ativos e inativos. Noventa procuradores receberam boladas acima de 200 mil. A maior renda foi do procurador Cláudio Portela do Rego – R$ 320 mil, sendo R$ 286 mil de licença prêmio e R$ 33,6 mil de abono. O procurador Moises Antônio de Freitas levou R$ 297 mil de licença prêmio e R$ 18 mil de abono – R$ 315 mil no total. O procurador Mauro Faria de Lima recebeu R$ 314 mil.

Entre os promotores aposentados, Daniel Rodrigues de Faria recebeu o maior valor: R$ 211 mil – tudo de licença prêmio. Apenas seis promotores inativos receberam licença prêmio em dinheiro, no valor médio de R$ 149 mil.

Questionado pelo blog sobre o motivo dos pagamentos extras, o MPDFT afirmou que é um dos ramos do MPU, não possui autonomia financeira e deve seguir as determinações daquele órgão, bem como do CNMP. “Esse pagamento é uma quitação de dívidas da União para com membros e servidores, tais como licença-prêmio, abonos e indenizações de férias não usufruídas”.

“Parte dessas dívidas é antiga e foi reconhecida por decisões judiciais, que determinaram a respectiva quitação. Referem-se, portanto, a direitos previstos em lei, reconhecidos e disciplinados pelos órgãos superiores e de controle, caso do CNMP”, diz nota enviada ao blog.

Em nota divulgada pela PGR, o procurador-geral da República e presidente do CNMP, Augusto Aras, afirmou que “todos os valores pagos pelo MPF a seus membros atendem os princípios da legalidade e da transparência, tanto que estão disponíveis para escrutínio de qualquer cidadão no portal da instituição”.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/lucio-vaz/indenizacoes-no-mpf-se-estendem-a-outros-orgaos-do-ministerio-publico-da-uniao/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

 

PROCURADOR DA REPÚBLICA É OBRIGADO A IDENIZAR O CONDENADO LULA

Assuntos do dia

Por
Alexandre Garcia – Gazeta do Povo

Lula processou o ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol na Justiça| Foto: Joédson Alves/EFE

Depois de o ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol ser condenado a indenizar o ex-presidente Lula, agora tem gente se movimentando para pegar de volta o dinheiro roubado da Petrobras. O Ministério Público Federal retomou mais de R$ 6 bilhões desviados da companhia e agora alguns corruptos querem estornar essa devolução. E é capaz de terem sucesso, porque não se duvida de mais nada. Existe, hoje, uma inversão de valores.

Por sinal, Lula disse, em entrevista, que a ex-presidente Dilma Rousseff ajudaria a campanha dele se não fizesse nada. E que José Dirceu e José Genoino, ex-deputados enrolados até o pescoço no escândalo do mensalão, não vão participar do governo dele. Será que isso é o reconhecimento de alguma coisa?

Lula disse que vai botar gente nova no governo, só que até agora não tem ninguém. O companheiro de chapa dele, por exemplo, deve ser o ex-governador Geraldo Alckmin, que era adversário até o ano passado. E agora todo mundo mudou de ideia: Lula ama o Alckmin e o ex-tucano ama Lula.

Direito de propriedade é sagrado
Em um encontro com sem-terra no Paraná, Lula disse que o MST voltará a ter força em seu governo, assim como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, que faz ocupações urbanas. No mesmo evento ouvi um discurso do ex-senador e ex-governador Roberto Requião contra o direito de propriedade.

Só para lembrar: no dia 13 de março de 1964, os discursos contra o direito de propriedade no comício da Central do Brasil, em que estava presente o presidente João Goulart, ajudaram a derrubá-lo depois pelos militares.

O direito de propriedade não é apenas um princípio. Está na Constituição brasileira, junto com o direito à vida. É bom que a gente considere essas coisas antes de sair por aí falando esse tipo de coisa.

Troca-troca partidário
A janela aberta para trocar de partido sem perder mandato está entrando na reta final. O ministro Fábio Faria, das Comunicações, saiu do PSD e assinou ficha de filiação ao PP. É o mesmo partido da ministra Tereza Cristina, que está saindo da Agricultura para ser candidata ao Senado por Mato Grosso do Sul.

O presidente Jair Bolsonaro quer uma bancada forte no Senado. Tanto que convenceu a ministra Damares Alves a voltar atrás na decisão de não sair candidata. Em agenda no Pará, ela anunciou que será sim candidata, provavelmente ao Senado, para pegar o lugar do atual senador Davi Alcolumbre (União Brasil), no Amapá.

Já o ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura, que é candidato ao governo de São Paulo, vai se filiar ao Republicanos. O PL, do presidente da República, e o PP são os partidos que mais estão crescendo na janela partidária. O PL já é a primeira bancada da Câmara.

Novo ministro da Agricultura
Já é possível saber quem será o ministro da Agricultura no lugar de Tereza Cristina, para que não haja alteração na continuidade da administração. É o secretário-executivo Marcos Montes Cordeiro, que é ruralista no triângulo mineiro.

Ele tem experiência administrativa como ex-prefeito de Uberaba (MG), experiência política de três mandatos como deputado e foi presidente da Comissão de Agropecuária da Câmara e da Frente Parlamentar Agropecuária.

Censura prévia

Para encerrar quero falar sobre algo muito estranho. Não é nem sobre política, é uma área religiosa, que envolve o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Ele mandou o Telegram monitorar os cem maiores canais do aplicativo com objetivo de fazer censura prévia. E aí ele vai monitorar o canal do padre Paulo Ricardo, que está nas redes sociais desde 2006, falando exclusivamente sobre a religião católica, apostolado, liturgia, novo testamento, direito canônico, etc. Eu sei disso porque acompanho. Nada a ver com política.

Ele está sendo alvo de censura prévia, que é proibida na Constituição, artigo 220º. Além disso, sofre outro tipo de restrição, sobre os direito invioláveis previstos na linha 6 do artigo 5º da Constituição. É uma coisa que me deixa boquiaberto e eu fico me perguntando: será que não tem ninguém no Senado brasileiro para coibir isso?


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/alexandre-garcia/lula-indenizado-ataque-direito-de-propriedade-troca-troca-partidario/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

 

DÓLLAR EM QUEDA É UMA PROVA QUE A ECONOMIA VAI BEM

Câmbio
Dólar em queda prova que não há crise na nossa economia

Por
J.R. Guzzo – Gazeta do Povo

Dinheiro / Dólar – 25-05-2017 – O código para o dólar dos Estados Unidos é USD (que significa United States Dollar), e o Fundo Monetário Internacional refere-se ao mesmo como US$. Na foto, detalhe de uma nota de 100 dólares. A moeda americana apresenta na face a imagem de Benjamin Franklin. Ele não foi presidente dos Estados Unidos, tendo diversas ocupações como jornalista, filantropo e diplomata.

Desvalorização do dólar é reflexo de um aumento nos investimentos estrangeiros no Brasil, atraídos pela taxa de juros mais alta| Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo

É uma decepção: o dólar caiu para abaixo dos R$ 5, sua menor cotação em dois anos. Como assim? Mas ele não deveria estar subindo, como garantiam todos os economistas de esquerda, o comando da campanha de Lula e os banqueiros com sensibilidade social?

Deveria, porque, segundo eles, o dólar em alta é prova provada e comprovada de crise econômica em fase terminal, e em sua visão o Brasil está vivendo uma crise econômica em fase terminal; era mais um prego no caixão desse governo que está aí. E agora? Como explicar que a moeda de uma economia moribunda está ficando mais forte em relação ao dólar – mais de 10% de valorização, desde o começo do ano?

Os economistas da PUC, ou de qualquer outro canto onde se faz militância política na economia, não vão explicar nada. Vão apenas repetir que o Brasil está em crise e etc. etc. etc., e que a cotação do dólar, que até agora dizia muito, não quer dizer mais nada.

Naturalmente, a realidade é outra, e muito mais simples. O dólar vale o que vale, e não depende do que Lula e seu conselho econômico querem que valha, nem da importância que lhe atribuem hoje, ontem ou amanhã. No caso, está valendo menos porque no momento há sobra de dólares no Brasil; entra mais do que sai, a oferta é maior que a procura e o preço cai.

A oferta abundante de dólares é o resultado de um forte aumento nos investimentos estrangeiros no Brasil, a começar pela Bolsa de Valores – e aí sim, há um significado importante a se considerar. Investimento estrangeiro em alta não combina, de jeito nenhum, com crise econômica; jamais, em tempo algum, o capital corre para países em agonia. O fato, muito simplesmente, é que a economia brasileira não está em agonia. Tem problemas pesados, como o resto do mundo, em consequência da pandemia que colocou uma camisa-de-força na atividade produtiva durante os dois últimos anos. Mas é isso, e só isso.

O desemprego no Brasil é uma questão de primeira grandeza, mas não é maior nem pior do que o desemprego que há nas principais economias do mundo. A inflação está alta demais, na casa dos 10% ao ano, mas a inflação na maior economia de todas, a dos Estados Unidos, está beirando os 8% anuais – a pior dos últimos 40 anos. O crescimento projetado para este ano é muito baixo, pelas previsões feitas até agora, mas não há nenhum país fazendo muito melhor. É claro que teria de ser assim, no mundo inteiro – como poderia ser diferente, após dois anos de economia paralisada por conta da Covid?

A queda do dólar não é uma realização do governo, da mesma maneira que a alta não é sua culpa. É apenas um reflexo das realidades. Mas o noticiário econômico, hoje, passou a fazer parte do noticiário eleitoral – reflete apenas a torcida, e não os fatos. Preste atenção, assim, para não perder seu tempo acreditando em tudo aquilo que lhe dizem.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/jr-guzzo/dolar-em-queda-prova-que-nao-ha-crise-na-nossa-economia/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

 

PRIVILÉGIOS E ALTOS SALÁRIOS PAGOS PELA PETROBRAS

 

  1. Economia 

Com poder de pressão favorecido por ‘monopólio’, petroleiros mantêm regalias que só existem na estatal e vivem situação privilegiada no País

José Fucs, O Estado de S.Paulo

Nos idos de 2015, ao se licenciar da presidência do conselho de administração da Petrobras, posto que acabaria deixando em definitivo dois meses depois, o executivo Murilo Ferreira fez um diagnóstico sinistro da estatal a um amigo.

“A Petrobras não é do acionista majoritário nem do acionista minoritário – ela é da corporação”, disse Ferreira, que também era presidente da Vale, de acordo com o site Brazil Journal. “Se eu fosse morador de Nilópolis, São Gonçalo ou da Baixada (regiões pobres do Rio, onde se situa a sede da empresa), ficaria revoltado com os privilégios que os funcionários da Petrobras conseguiram garantir para si mesmos.”

Em seguida, Ferreira tirou da carteira um cartãozinho verde e acrescentou: “Sabe o que é isso? É um cartão com o qual posso comprar o medicamento que quiser, em qualquer farmácia, pagando apenas R$ 15. Nenhuma empresa privada no Brasil tem um convênio desses. Eu nunca usei, tenho vergonha de usar.” Desolado com a sua impotência para mudar a situação, ele fechou o desabafo traçando um paralelo entre a a Vale, privatizada em 1997, e a Petrobras, símbolo maior do gigantismo do Estado no País e das benesses concedidas aos funcionários das estatais: “Na Vale, consegui tirar os carros dos diretores. Na Petrobras, não é possível diminuir qualquer coisa que a corporação não queira.”

Passados quase sete anos do diagnóstico hiper-realista feito por Ferreira, o quadro continua praticamente o mesmo. Desde que ele deixou a companhia, o País já teve mais dois presidentes da República – Temer e Bolsonaro – e a Petrobras já teve quatro comandantes diferentes, mas ninguém conseguiu até agora mexer para valer nas regalias de seu pessoal.  Quem tentou, segundo ex-executivos da empresa, tornou-se alvo de ameaças e de campanhas difamatórias promovidas pela tropa de choque da turma.

Salários generosos

Os privilégios, é certo, vêm se acumulando desde a criação da Petrobras, em 1953, no governo Vargas. Mas, conforme relatos feitos ao Estadão, foi durante os governos Lula e Dilma, quando sindicalistas assumiram o comando da área de recursos humanos, que a situação degringolou de vez. “Sempre houve privilégios na Petrobras, mas as concessões feitas naquele período agravaram muito o problema”, afirma um ex-gestor da estatal.

petrobras
Sede da Petrobras; ex-presidente do conselho da estatal afirmou que, se fosse morador de regiões pobres do Rio, ficaria revoltado com os privilégios dos funcionários.  Foto: Pilar Olivares/Reuters – 11/03/2022

Os salários, que já eram bem mais generosos do que os pagos por empresas privadas do setor petrolífero e mesmo do que os de outras estatais, também engordaram ainda mais. Entre 2003 e 2015, de acordo com dados dos sindicatos dos petroleiros, os funcionários da Petrobras tiveram um ganho real (já descontada a inflação) de 34%, sem contar os adicionais por tempo de serviço, que podem alcançar até 45% sobre o salário-base, no caso dos mais antigos. Mesmo com a perda de 5,6% registrada nos governos Temer e Bolsonaro, ainda acumulam um aumento real de 26,4%.

“Não há vantagem que não tenha um peso econômico”, diz Almir Pazzianotto, ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ex-ministro do Trabalho e advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, no ABC paulista, nos tempos em que Lula era o presidente da entidade, nos anos 1970 e 1980. “Acho razoável que haja uma certa liberalidade numa grande empresa. Agora, na Petrobras, eles foram longe demais.”

Nem o economista Roberto Castello Branco, um liberal forjado na Escola de Chicago que comandou a Petrobras de janeiro de 2019 a abril de 2021, conseguiu promover um corte significativo nos privilégios. Como apurou o Estadão, Castello Branco preferiu concentrar esforços na redução de alguns benefícios, de maior impacto nos custos, em vez de atacar tudo de uma vez, para não colocar “a massa toda”, como costumava dizer, contra ele e sua equipe.

Inadimplência

Em troca da manutenção de quase todos os “penduricalhos” no Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) 2020-2022, ainda em vigor, a estatal conseguiu negociar com os sindicatos o “congelamento” dos salários por um ano, no auge da pandemia. Considerando que o reajuste salarial seria de cerca de 3%, conforme a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) entre setembro de 2019 e agosto de 2020, a medida permitiu uma redução de custos da ordem de R$ 650 milhões.

Favorecida pela Resolução 23/2018, do antigo Ministério do Planejamento, que limitava a participação das estatais no custeio de planos de saúde, a Petrobras também conseguiu incluir no ACT a elevação das contribuições dos funcionários de 30% para 40% do total em 2021 e de 40% para 50% em 2022, com um impacto no caixa de cerca de R$ 750 milhões em dois anos. Mas, no ano passado, com a aprovação de um projeto de decreto legislativo apresentado pela deputada Erika Kokay (PT-DF), o dispositivo criado no governo Temer perdeu validade e a fatia dos funcionários acabou congelada nos 40% já praticados na ocasião.

À margem do ACT, por meio de ações administrativas, a Petrobras ainda cortou 1.500 cargos comissionados – muitos dos quais haviam sido criados para abrigar apadrinhados de antigos gestores –, que ofereciam um ganho extra a seus ocupantes de até R$ 60 mil por mês. Houve também um controle maior da “indústria” de horas extras que prosperava na empresa. Um ex-executivo da Petrobras conta que havia funcionários que chegavam a receber R$ 80 mil por mês graças às horas extras contabilizadas em suas jornadas. “Eles teriam de trabalhar quase 24 horas por dia para ganhar tanta hora extra”, afirma. A companhia também endureceu o jogo com os inadimplentes do plano de saúde, que acumulavam uma pendência de R$ 280 milhões, sem perder o benefício por falta de pagamento.

Regalias

Por fim, a Petrobras conseguir cortar em cerca de 20% o número de funcionários, de 57,1 mil em 2019 para 44,9 mil em 2021, incluindo suas controladas, graças principalmente a um plano de demissão voluntária que atraiu mais de 10 mil trabalhadores que atendiam às condições estabelecidas pela empresa. Com os desligamentos, a estatal calcula que terá uma redução de custos com pessoal de R$ 18 bilhões até 2025, já deduzido o total de R$ 4 bilhões gasto com o pagamento das indenizações, que variam de R$ 400 mil a R$ 1 milhão per capita.https://arte.estadao.com.br/uva/?id=20ZNYy

Todas essas medidas, porém, apesar de relevantes, não atingiram a maior parte das regalias reservadas aos funcionários da Petrobras, previstas no ACT 2020-2022. Quase todas as “jaboticabas”, como alguns ex-executivos costumam chamar os privilégios que só os funcionários da estatal têm, continuam por aí. Pelos cálculos de um ex-gestor de RH da empresa, o custo das “jaboticabas” alcança cerca de R$ 7 bilhões por ano, o equivalente a um terço do gasto total de pessoal, de R$ 21,7 bilhões em 2020.

Além do auxílio-farmácia largo, mencionado por Ferreira no início desta reportagem, os funcionários da Petrobras recebem 100% a mais por hora extra, em vez do adicional de 50% previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Enquanto os demais trabalhadores ganham um adicional de 33,33% nas férias, eles embolsam 100% a mais. Recebem também, o reembolso de até 90% dos gastos com matrículas e mensalidades escolares de filhos de até 18 anos e uma “ajuda de custo” para assistência alimentar de R$ 1.254 por mês, mais R$ 192 de vale-refeição.

‘Coisa de louco’

Nas plataformas, a jornada funciona no esquema de 14 dias de trabalho por 21 dias de folga, em vez dos 14 dias de trabalho por 14 de folga praticados pela indústria de petróleo mundo afora, de acordo com um ex-dirigente da companhia. O sistema é tão light, em sua avaliação, que há funcionários de plataformas que moram nos Estados Unidos, em Portugal e em outros países. Chegam no aeroporto do Galeão, no Rio, vão direto para o heliporto usado pela empresa em Jacarepaguá, na zona oeste da cidade, passam duas semanas em alto mar e depois fazem o caminho inverso. Só voltam a trabalhar três semanas depois. Como moram fora do Rio, ainda têm um benefício adicional: o tempo gasto na viagem de ida e volta de helicóptero conta como se já estivessem trabalhando.

“É uma chuva de privilégios sem precedentes no setor privado”, diz Paulo Uebel, ex-secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia e ex-secretário municipal de Gestão de São Paulo. “O acordo coletivo da Petrobras é uma coisa de louco, diferente de tudo o que eu conheço”, afirma Pazzianotto. “Tem muita concessão para os trabalhadores, para a família dos trabalhadores, para os agregados. Tudo o que foi possível fazer foi feito para conceder uma situação privilegiada para o pessoal da Petrobras.”

Mesmo se a empresa cortasse as “jabuticabas”, os petroleiros não poderiam reclamar da vida. Pesquisas encomendadas pela Petrobras apontam que seus funcionários ganham de duas a três vezes mais do que a média paga no mercado para funções semelhantes. Um “inspetor de segurança”, responsável pela proteção das portarias, por exemplo, recebe de R$ 7 mil a R$ 8 mil por mês, enquanto no mercado a média gira em torno de R$ 2,5 mil. Como trabalha em sistema de turno, seus ganhos podem chegar, com todos os “penduricalhos”, a cerca de R$ 15 mil por mês.

Já um técnico de operação, que atua nas refinarias, recebe, em média, R$ 20 mil mensais, enquanto o valor pago no setor privado não passa de R$ 7 mil. Nos cargos de nível superior, como engenheiro, geólogo e psicólogo, a remuneração média é de R$ 25 mil por mês, podendo chegar a R$ 40 mil, dependendo do tempo de serviço, enquanto no setor privado a média fica ao redor de R$ 12 mil.

Quebra do ‘monopólio’

Segundo um levantamento divulgado recentemente pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest), vinculada ao Ministério da Economia, a remuneração média dos funcionários da Petrobras atingiu R$ 25.164 por mês em 2020, o equivalente a dez vezes o ganho médio dos brasileiros, de cerca de R$ 2,5 mil, conforme dados do IBGE. A maior remuneração mensal na companhia foi de R$ 145,2 mil e a menor, de R$ 1,5 mil. Pelo estudo, que incluiu as 46 estatais de controle direto da União, o ganho médio na Petrobras, só foi menor do que no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde chegou a R$ 31 mil.

Embora os dados divulgados pela Sest tenham sido fornecidos pela própria Petrobras, a empresa agora contesta as informações e apresenta números diferentes. Em resposta a um questionamento do Estadão, a Petrobras informou que, na verdade, a remuneração média em 2020 ficou em R$ 18,6 mil por mês, enquanto a maior foi de R$ 97,7 mil e a menor, de R$ 3,3 mil. Mesmo que a retificação seja procedente, não altera muito o quadro. A remuneração média na Petrobras ainda seria equivalente a 7,5 vezes a média do País. Em vez de ocupar o segundo lugar na lista das maiores remunerações médias das estatais, a companhia ficaria na terceira posição, atrás também da Embrapa, onde o ganho médio alcançou R$ 20,2 mil em 2020.

Quando se considera o custo total de pessoal, que inclui todos os “penduricalhos” e os encargos socias e tributários, o gasto médio anual da Petrobras por funcionário atingiu R$ 449,3 mil, quase o dobro da média das estatais. Apesar de representar 10,6% de todo o efetivo das estatais, o gasto com pessoal da Petrobras foi equivalente a 20,6% do total.

petrobras
Plataforma da Petrobras em Angra dos Reis; ninguém conseguiu até agora mexer para valer nas benesses concedidas aos funcionários da estatal.  Foto: Thelma Vidales/Agência Petrobras – 29/12/2013

Na visão de Paulo Uebel, a situação só chegou a esse ponto porque a Petrobras detém o monopólio no setor de fato, embora não de direito, já que a “reserva de mercado” que a favorecia caiu oficialmente em 1997. Isso, segundo ele, dá um poder enorme para os sindicatos e possibilita a realização de greves que têm enorme impacto na vida dos cidadãos e das empresas. Uebel é favorável à privatização da Petrobras, combatida de forma feroz pelos sindicatos, mas pondera que, enquanto ela não vier, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) deveria limitar a participação da empresa no mercado, nas diferentes áreas em que atua, a no máximo 60%.

Ele lembra que, nos Estados Unidos, no início do século passado, a Standard Oil, do magnata John D. Rockfeller, que detinha praticamente o monopólio no setor, foi fatiada de forma compulsória, com bons resultados. “É preciso quebrar o monopólio não só de direito, mas de fato, para que haja várias empresas competindo com a Petrobras”, diz. “Só assim será possível reduzir a força da corporação.”

Conflito de interesses

Uebel também atribui o quadro atual às decisões da Justiça do Trabalho, que garantem estabilidade no emprego para os funcionários de estatais, apesar de eles serem contratados pela CLT e poderem negociar aumentos salariais e benefícios por meio de acordo coletivo. “No poder público isso não existe: ou você tem estabilidade e só pode criar benefícios e definir reajustes salariais por meio de lei ou você não tem estabilidade e aí pode negociar tudo por meio de acordo coletivo”, afirma. “Agora, nas estatais, você tem o pior dos mundos, porque você tem estabilidade, que a Justiça do Trabalho garante, e ao mesmo tempo tem a prerrogativa de gerar benefícios por meio de acordo coletivo.”

Uma saída, para ele, seria realizar uma reforma administrativa que incluísse o corte dos privilégios existentes nas estatais, sujeitando seus funcionários aos mesmos princípios e regras da administração pública direta, inclusive em relação ao teto constitucional, hoje de R$ 39,3 mil. Uebel conta que quis incluir esse ponto no projeto de reforma administrativa que elaborou, mas não conseguiu. “O pessoal era contra. Eles falavam que as estatais precisam competir com as empresas privadas, mas isso não é verdade”, diz. “As estatais não deveriam competir com as empresas privadas. Elas teriam de existir só quando não houvesse empresa privada em atividade na mesma área.”

petrobras
Refinaria da Petrobras em Paulínia; uma saída seria o corte dos privilégios das estatais, sujeitando funcionários às mesmas regras da administração pública direta.  Foto: Paulo Whitaker/Reuters – 01/07/2017

Pazzianotto vai mais ou menos na mesma linha. Ele afirma que, se houvesse cinco refinarias privadas competindo com a Petrobras, o poder de pressão dos trabalhadores seria bem menor. “Tudo isso é resultado do nosso corporativismo, do sindicato único, da intervenção da Justiça do Trabalho”, afirma. “Agora, nada disso é definitivo. Só é definitivo o que está na Constituição e na lei.” 

Pazzianotto sugere que a Petrobras contrate “gente de fora” para conduzir as negociações trabalhistas com os sindicatos. “É uma forma de evitar possível conflito de interesses por parte advogados da empresa, que também se beneficiam do acordo coletivo ou de uma decisão favorável aos trabalhadores na Justiça.” Para justificar sua posição, ele relata o caso de um processo trabalhista envolvendo o Banco do Brasil, no qual os trabalhadores reivindicavam o pagamento de um adicional de caráter especial “que não existia”. “Como também eram parte interessada, os advogados do Banco do Brasil perdiam os prazos judiciais e não compareciam às audiências.”

Preços dos combustíveis

Os sindicatos dos petroleiros, obviamente, rejeitam a percepção de que os benefícios recebidos pelos funcionários da Petrobras sejam “privilégios” e de que o salário médio na Petrobras seja maior do que os pagos por outras empresas do setor. “A CLT é um piso”, diz o presidente do Sindipetro de São José dos Campos (SP), Rafael Prado, secretário de comunicação da FNP (Federação Nacional dos Petroleiros), uma dissidência à esquerda da FUP (Federação Única dos Petroleiros). “Isso não quer dizer que não seja possível negociar um acordo coletivo com melhores condições.”

Prado cita um estudo elaborado pelo economista Eric Gil Dantas, assessor da FNP, segundo o qual a Petrobras paga salários menores do que quatro das grandes petrolíferas do mundo – Shell e BP (Reino Unido), Equinor (Noruega) e Total (França). Mesmo que o estudo esteja baseado em dados comparáveis do ponto de vista financeiro, ao dividir os gastos com salários de cada companhia pelo seu número de funcionários, ele não faz a ponderação pela paridade do poder de compra de cada país, o que acaba distorcendo o resultado. No ranking dos 170 países com os maiores preços de gasolina, por exemplo, o Brasil ocupa o 89º lugar. Mas, na lista dos países com o maior custo para encher um tanque de 60 litros em relação ao salário médio mensal, aparece na quarta posição.

De acordo com Prado, os altos lucros da Petrobras justificariam os benefícios e salários recebidos pelos seus funcionários. “Isso precisa ser encarado dentro da realidade do setor de petróleo e gás. Como ele tem uma rentabilidade muito superior à média da economia, paga salários melhores aos seus funcionários”, afirma. “Isso significa que uma parte da riqueza gerada no setor fica com os trabalhadores.”

Mais uma vez, é preciso fazer uma ressalva aqui. Além dos fartos benefícios e salários pagos a seus funcionários, a Petrobras já lhes concede uma participação nos lucros a cada ano, conforme seus resultados. Oferece também um programa de bônus baseado no desempenho individual e coletivo, como muitas empresas, que é outra forma de reconhecer o papel dos trabalhadores no negócio. “Você está questionando a pequena fatia que fica com a maioria que produz a riqueza”, diz Prado. “A fatia que fica com os trabalhadores é ínfima perto do lucro que eles produzem.”

Com os preços dos combustíveis na estratosfera, a tentação de atribuir a alta aos privilégios e à remuneração generosa dos petroleiros é grande. Mas não dá para dizer, segundo ex-gestores da Petrobras, que o impacto nos preços seja significativo. O que se pode afirmar é que isso afeta a eficiência e a produtividade da companhia, assim como a capacidade de investimento e de pagamento de dividendos aos acionistas, inclusive a própria União, o que não é pouca coisa.

“Com o pré-sal e os técnicos, os ativos e a tecnologia que a Petrobras tem, ela poderia estar entre as maiores e melhores empresas de petróleo do mundo, mas não está, porque tudo isso retira a capacidade da empresa de ser produtiva”, afirma um deles. “Embora o custo de extração seja muito baixo, há uma estrutura muito pesada em cima, que é muito cara. O custo de refino também é muito caro por causa disso.” 

Como parece improvável que o presidente Jair Bolsonaro tome qualquer atitude para viabilizar a privatização da Petrobras, abrindo espaço para a redução de seus custos e a melhoria de sua competitividade, talvez ele pudesse contribuir para reduzir, desde já, as benesses conferidas aos funcionários da empresa, em vez de tentar interferir em sua política de preços. A julgar, porém, pelas suas posições em defesa de interesses corporativistas de outras categorias, tudo indica que os privilégios existentes na Petrobras vão continuar por aí até que apareça alguém disposto a enfrentar a questão de frente.

CUT RESSUSCITA AS BRIGADAS DIGITAIS

 

Redes Sociais
Militância virtual do PTTreinamento em massa feito pelo partido em 2011 será feito agora pela Central Sindical, que pretende chegar a 60 mil militantes virtuais.

Por
Madeleine Lacsko – Gazeta do Povo

| Foto: divulgação CUT

Você já deve ter ouvido nas redes sociais alguém falar nos MAVs. Talvez não tenha ideia do que sejam porque, quando surgiram, eram coisa de gente muito nerd. Eu, por exemplo. Em 2011, o PT decidiu montar os núcleos de Militância em Ambiente Virtual, MAVs. Tivesse lido a cartilha do Ibama sobre espécies exóticas invasoras, jamais teria feito isso.

Os MAVs marcam o início não da militância virtual, mas da gourmetização do militante de esquerda. Em 10 anos, ela funcionou como um caracol gigante africano. Gerou alguns bebês de Rosemary: o núcleo de identitarismo estético, o parque de areia antialérgica e os Che Guevara de apartamento. Se você tem dúvida de quem são eles, confira a cartela do bingo:

O caracol gigante africano é uma das piores espécies exóticas invasoras do Brasil. Chegou por volta da década de 1980, quando alguém do parque de areia antialérgica da sociedade teve a maravilhosa ideia de turbinar a indústria de criação de escargots no Brasil. Claro que sempre haverá mercado para escargot, como também haverá mercado para identitarismo. É praticamente o mesmo recorte socioeconômico de público alvo. Mas não é esta a questão.

O Ibama preconiza que, ao introduzir uma espécie exótica no meio ambiente, é preciso avaliar os riscos com cuidado. Até aquela época, o parque de areia antialérgica frequentava a esquerda mais para contrariar os pais, contar vantagem para a moçada e arrumar emprego em jornalismo ou publicidade.

Dentro do partido lideravam, quando muito, o movimento dos alvos de chacota. De repente, eles passaram a liderar a militância. Como só gente com mais dinheiro tinha condições de ter banda larga e tanta internet disponível à época, os militantes tradicionais ficaram de fora. Além disso, a militância gourmet tem mais dinheiro e relacionamentos, o que a colocou como prioridade na imprensa.

Recomendação do Ibama para a introdução de espécies exóticas
Se você não é da velha guarda, pergunte a alguém o que pensa da militância raiz do PT. Se for petista, vai dizer que era maravilhosa, sindical, vinda da classe trabalhadora. Se não for, provavelmente vai dizer que eram arruaceiros, exageravam, eram broncos. Mas ninguém vai te dizer que eram almofadinhas, malas e não faziam nada além de sinalizar virtude. É isso o que os MAVs fizeram pela militância de esquerda.

O caracol gigante africano teve um efeito semelhante no nosso país. O Brasil virou grande produtor e grande consumidor de escargot? Não. Mas, em compensação, temos agora, segundo o Ibama:

  1. Ameaça de extinção para as espécies nativas de caramujos
  2. Criadouros para mosquitos do gênero Aedes sp
  3. Hospedeiros intermediários de parasitas humanos e de animais domésticos para doenças como esquistossomose, fasciolose, meningite eosinofílica e angiostrongilíase abdominal.
    Deu super certo, né?

A gourmetização da CUT e o revival dos MAVs
Quando soube que a CUT é quem faria os novos MAVs, já pensei que poderia ser menos pior. Pelo menos é alguém que já pegou ônibus na vida e sabe a alegria de quitar um carnê. Inocência da minha parte. A CUT está definitivamente gourmetizada.

Dei graças a Deus porque meu pai morreu antes disso. Bancário, era defensor ferrenho do Sindicato dos Bancários do ABC, filiado à CUT. Avalia esse pessoal das Comunidades Eclesiais de Base vendo a CUT virar uma espécie de coxia de desfile do Denner (era mais fino ainda que o Clodovil e Ronaldo Ésper). O anúncio da iniciativa digital da CUT foi feito em francês.

É um jornal de militância política da França. Defende Lula no caso da última rodada de fake news, aquela da foto na lancha que seria do amigo. Era um velho da lancha aleatório, não o Lula.

Eu não tenho maturidade para ver a CUT debater este tema, ainda mais em francês. Tudo dito em francês parece sofisticado e delicado demais, eu não tenho maturidade para isso. Em francês, lixeira se diz “poubelle”. Eu não tenho nem lixo qualificado para jogar numa “poubelle”, avalia os camaradas da CUT.

E eles toparam dar entrevista para um jornal que descreve “velho da lancha” com a frase: “Sur le bateau, un homme barbu, visiblement âgé, en caleçon de bain”. É um disparate. Chega a ser desrespeito com o Lula, com a CUT, com o velho da lancha e até com o cantor Thierry.

O segundo ponto importante que me ocorreu é: sindicato não pode contribuir para campanha eleitoral nenhuma, nem com dinheiro nem com serviços ou mão-de-obra. Tem aí uma saída boa, negar que seja para campanha e dizer que é um investimento em formação digital. Nada a ver com política, mas com defesa dos ideais do sindicato.

Cantaram essa bola para mim e fui atrás. Efetivamente é o que disse o presidente da CUT, Sergio Nobre, ao jornal francês. “Os brigadistas terão a tarefa de resgatar as informações factuais nas redes sociais.  Essas brigadas também são um espaço de formação, portanto estratégicas para que a CUT dê um salto organizativo e representativo”. São as Brigadas Digitais da CUT.

“A população precisa saber de toda a destruição causada por Bolsonaro, mas também precisa de solidariedade, ajuda para resolver seus problemas urgentes e imediatos causados ​​pelo governo.  Quem está com fome, sem trabalho, sem casa para morar, sem dinheiro para o transporte público não pode discutir o amanhã, precisa de uma solução para hoje”, prosseguiu. Se você não é petista, obviamente viu aí uma possível participação do sindicato na campanha. Convenhamos, é uma linha tênue.

Resolvi então ler a cartilha que a CUT fez para as Brigadas Digitais. Será que diriam ali ter a intenção de militar por uma candidatura específica? Bem, eles disseram. Deixo a foto abaixo, mas você pode conferir a cartilha inteira neste link.

A defesa de ideias no campo digital é legítima, guiada pelos mesmos princípios que regem toda nossa vida. O problema está em outro ponto que o trecho acima mostra: colocar o proprio grupo como inerentemente bom e única chance de vitória numa jihad contra um grupo necessariamente ruim, que vai destruir tudo aquilo que você tiver. Eu fiz até um artigo mostrando como essa técnica usada pelo identitarismo e é efetiva em esgarçar o tecido social.

Quando os MAVs apareceram, pela primeira vez precisei bloquear alguém na vida. Um jornalista muito amigo há anos, gente que frequentava a minha casa. Naqueles idos de 2011, havia virado moda entre parlamentares do PT mandar assessores empurrarem repórteres da TV Globo durante transmissões ao vivo em Brasília. Eu reclamei no Twitter. O outro jornalista já lançou algo como: ah, coitadinho do repórter que contribui para o fascismo que esmaga minorias, misoginia contra a Dilma…

Na época, eu assustei. Ainda não havia visto jornalistas defendendo ataque físico contra outros jornalistas em horário de trabalho. Este tipo de comportamento acaba gerando uma reação contrária na mesma intensidade, com intenção de ser mais violenta. Presenciamos essa escalada nos últimos 10 anos.

A virulência como regra, a lama moral nas ações, o esfacelamento de princípios, o crescimento de sonsos e a alta tolerância com canalhice nos trouxeram a um ambiente político onde mal se pode respirar. Adicionar 60 mil Brigadistas Digitais da CUT a esse caldeirão será um belo de um tempero.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/madeleine-lacsko/prepare-a-paciencia-cut-ressuscita-os-mavs-militancia-virtual-do-pt/
Copyright © 2022, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

  Brasil e Mundo ...