sábado, 19 de março de 2022

CARACTERÍSTICAS DO VOO DAS AVES PODEM AJUDAR NA AVIAÇÃO

 

  1. Ciência 

Características físicas do voo de aves podem, no futuro, vir a ser usadas para aperfeiçoar os aviões

Fernando Reinach*, O Estado de S.Paulo

Pássaros voam de diversas maneiras. Podemos observar patos em longos voos migratórios, urubus planando em círculos sobre uma possível presa, ou gaviões e mergulhões fazendo manobras rápidas no ar para atacar uma presa. Em sua capacidade de manobrar durante o voo os pássaros são muito superiores a qualquer caça militar. O mesmo ocorre em voos de longa duração, onde facilmente competem com aviões comerciais. Essa vantagem decorre do controle que possuem sobre suas asas.

Na maioria dos aviões, a asa é basicamente fixa enquanto nas aves sua posição em relação ao corpo depende de três articulações: o ombro que liga a asa ao corpo, o cotovelo que pode dobrar a asa, e o punho que pode mudar a posição da ponta da asa. Por esse motivo é relativamente fácil construir um modelo matemático que descreve o comportamento da aeronave durante o voo, mas é muito mais complicado fazer o mesmo para um pássaro. Até hoje esses modelos não existem. Mas agora essa situação está mudando.

Voo dos pássaros
Um pelicano voa sobre o lago Dojran na Macedônia do Norte Foto: Ognen Teofilovski/Reuters

Os cientistas estudaram 22 espécies de pássaros. Para cada uma, variaram o ângulo do ombro, do cotovelo e do punho. O que eles descobriram é que essas variações de ângulo não afetavam a localização do centro de massa da ave, apesar de modificar muito as características aerodinâmicas das asas e, portanto, o comportamento da ave durante o voo. Com esses dados foi possível construir um modelo matemático, que existe para os aviões faz décadas, capaz de prever as características do voo com diferentes configurações das asas.

A descoberta mais importante é que em todas essas aves a modificação do ângulo do cotovelo e do punho permite que a ave configure suas asas para um voo estável (como aviões comerciais) ou um voo instável, onde manobras radicais ficam mais fáceis de executar (como os aviões de caça). Essa característica não era conhecida e também demonstra que as aves possuem um sistema de controle do voo que é mais complexo e mais sofisticado do que o dos aviões.

Essa investigação é fruto de uma colaboração entre engenheiros aeroespaciais, que projetam aviões, e zoólogos, que estudam o voo das aves. É possível que, no futuro, descobertas feitas estudando as características físicas do voo das aves venham a ser utilizadas para aperfeiçoar nossos aviões.

MAIS EM: BIRDS CAN TRANSITION BETWEEN STABLE AND UNSTABLE STATES VIA WING MORPHING. NATURE HTTPS://DOI.ORG/10.1038/S41586-022-04477-8 2022

* É BIÓLOGO, PHD EM BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR PELA CORNELL UNIVERSITY E AUTOR DE A CHEGADA DO NOVO CORONAVÍRUS NO BRASIL; FOLHA DE LÓTUS, ESCORREGADOR DE MOSQUITO; E A LONGA MARCHA DOS GRILOS CANIBAIS

AGU RECORRE DA DECISÃO DE ALEXANDRE DE MORAIS QUE SUSPENDEU O TELEGRAM

Advocacia-Geral da União ingressou na madrugada deste sábado, 19, no gabinete da ministra Rosa Weber, com pedido para tentar derrubar decisão de Alexandre de Moraes; governo pede que o Supremo determine que as penalidades previstas no Marco Civil da Internet não podem ser impostas por inobservância de ordem judicial

Pepita Ortega – Jornal Estadão

Alexandre de Moraes determinou a suspensão do Telegram no Brasil após a plataforma descumprir uma série de decisões judiciais, inclusive emanadas do Supremo. Foto: REUTERS/Dado Ruvic/Illustration

A Advocacia-Geral da União lançou estratégia, na madrugada deste sábado, 19, para derrubar a decisão que suspendeu o aplicativo de mensagens Telegram no País – um dos principais canais utilizados pelo presidente Jair Bolsonaro e seus aliados. O órgão pede que o Supremo Tribunal Federal determine que as penalidades previstas no Marco Civil da Internet – norma que fundamentou a decisão de suspensão – não podem ser impostas por inobservância de ordem judicial – como ocorreu no caso do aplicativo russo.

‘Suspensão do Telegram é uma decisão ruim baseada em motivos legítimos’, diz pesquisador de Oxford

O pedido de decisão cautelar, com posterior envio para referendo do Plenário da corte, foi direcionado ao gabinete da ministra Rosa Weber. Ela é relatora de uma ação em que o Partido da República questionava decisões de juízos de primeiro grau que determinaram a quebra de sigilo de mensagens de investigados no Whatsapp, e, depois da recusa do aplicativo em fornecer os conteúdos, determinaram a suspensão, por algumas horas, da plataforma em todo o território nacional.

Documento

Entre os principais argumentos da AGU está o de que as sanções previstas no Marco Civil da Internet são de natureza administrativa e não poderiam ser aplicadas em âmbito judicial. Além disso, o órgão sustentou que as penalidades de ‘suspensão temporária das atividades’ e ‘proibição de exercício das atividades’, previstas na lei, estão ligadas às infrações dos deveres de ‘garantir respeito aos direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros’.

“Daí porque sanções podem ser aplicadas a provedores de conexão ou aplicações de internet (como o Telegram e o Whatsapp) se eles não respeitarem o sigilo das comunicações, se fizerem uso indevido dos dados pessoais, mas não (pelo menos com fundamento no Marco Civil da Internet) por descumprirem uma ordem judicial”, sustenta o pedido assinado pelo chefe da pasta, Bruno Bianco.

Com relação à decisão de suspensão do Telegram, Bianco argumentou que ‘eventual conduta antijurídica’ que se imputa a investigados pela corte máxima ‘não pode reverberar automática e indistintamente em banimento de todos os demais usuários do serviço que se pretende suspender, sob pena de claros prejuízos’.

“Os consumidores/usuários de serviços de aplicativos de mensagens não podem experimentar efeitos negativos em procedimento do qual não foram partes. Pensar diferente, a um só tempo, ofenderia o devido processo legal, com antijurídica repercussão do comando judicial em face de terceiros, além de ofender, ao mesmo tempo, o princípio da individualização da pena. In casu, pois, inequívoca a desproporcionalidade da medida que, para alcançar poucos investigados, prejudica todos os milhões de usuários do serviço de mensagens”, registra trecho do pedido da AGU.

A decisão que suspensão o Telegram foi dada pelo ministro Alexandre de Moraes, a pedido da Polícia Federal, em razão do reiterado descumprimento da plataforma de decisões judiciais e dificuldade de comunicação com a empresa. No despacho de 18 páginas proferido nesta quinta-feira, 17, o ministro destaca que a empresa deixou de atender aos comandos, ‘em total desprezo à Justiça brasileira’. Alexandre argumenta que tal desrespeito ‘é circunstância completamente incompatível com a ordem constitucional vigente’ e contraria o Marco Legal da Internet.

Como mostrou o Estadãopara reverter a suspensão, o Telegram vai ter que cumprir uma série de despachos dados por Alexandre que, até o momento, foram ignorados pela plataforma. Entre as ordens descumpridas está a determinação para exclusão de uma publicação do presidente Jair Bolsonaro que ataca as urnas eletrônicas com alegações falsas e sem provas sobre supostas fraudes. Há também despachos com relação à contas do blogueiro bolsonarista foragido Allan dos Santos.

A empresa ainda precisará pagar as multas diárias fixadas em cada uma das decisões não cumpridas e indicar, em juízo, qual sua representação oficial no Brasil – um dos pontos centrais da decisão de Alexandre. O fundador do Telegram, Pavel Durov, pediu desculpas ao STF pelo que chamou de ‘negligência’ da empresa e solicitou um adiamento do bloqueio definitivo da plataforma, afirmando que vai ‘remediar a situação apontando um representante no Brasil’.

O aplicativo deixou de responder comunicações não só do Supremo, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, mas também do Tribunal Superior Eleitoral, que desenvolve uma série de estratégias para combater a desinformação nas eleições 2022Tanto a corte eleitoral quanto a Procuradoria ensaiavam medidas mais duras contra o Telegram, em razão da falta de respostas da plataforma, mas decisão de bloqueio acabou vindo de Alexandre, que vai comandar o TSE no próximo pleito.

 

IDOSOS COM COMORBIDADES EXIGEM MAIORES CUIDADOS

 

Com uma população cada vez mais longeva, aumentam também os problemas decorrentes da idade – e a necessidade de buscar cuidados específicos

Kátia Arima , Especial para o Estadão

terceira idade que viaja, pratica esportes, dança e tem uma vida social ativa é aplaudida na TV e redes sociais, mas pode ofuscar outras facetas do envelhecimento. Com a longevidade da população, vêm também as limitações físicas ou cognitivas – que não raramente aparecem juntas e ameaçam a independência e autonomia dos idosos. “É glamurosa essa velhice que tem namoro e salto de paraquedas, mas quando o idoso apresenta declínio do corpo e da mente, que é natural, as famílias ficam perdidas”, diz a psicóloga e gerontóloga Margherita Cassia Mizan.

Ela conta que quando trabalhava no Residencial Israelita Albert Einstein, onde atuou até 2013, por 14 anos, costumava receber as famílias na primeira visita, geralmente desinformadas em relação às possibilidades de cuidados com idosos dependentes. “A primeira coisa que elas faziam era procurar uma instituição de longa permanência”, diz. Termo adotado atualmente pelos especialistas, “instituição de longa permanência para idosos” (ILPI) são os “residenciais para idosos” ou “casas de repouso”, que

substitui a palavra “asilo”, com conotação negativa.

Idosos
Centros Dia, como o Geros Center, oferecem atividades para idosos semidepententes Foto: Werther Santana/Estadão

Ao perceber a dificuldade das famílias, Margherita resolveu abrir a sua própria empresa de cuidadores de idosos, a Senior Services, que atende 20 clientes em suas casas, com uma equipe de cerca de 40 cuidadores formais. “Não é que eu seja contra a ILPI, mas a melhor opção para o idoso, quando possível, é ser mantido em casa, ambiente que é o seu porto seguro”, diz a gerontóloga. “Muitas famílias tiram o idoso de casa e geram impacto nele porque mal sabem que existem outras soluções.”

O dilema entre contratar apoio de um cuidador profissional em casa, procurar uma ILPI ou assumir todas as tarefas do cuidado do idoso será cada vez mais comum nas famílias brasileiras. Na estimativa populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de idosos com 80 anos ou mais pode passar de 19 milhões em 2060, um crescimento de mais de 27 vezes em relação a 1980. Em 2016, a estimativa era de 3,5 milhões de pessoas acima dos 80 anos. Além de perda de autonomia e independência, o envelhecimento e as doenças físicas e mentais podem vir acompanhadas de comportamentos desafiadores como agressividade, alucinações e hipersexualidade. 

Proprietário do Residencial Toniolo Memory Care, uma ILPI focada em idosos com demências em São Paulo, o geriatra João Toniolo Neto notou a demanda das famílias para encontrar a instituição mais adequada para receber o idoso. Por isso, desenvolveu a ferramenta online CasasRepouso.com, que permite encontrar uma ILPI de acordo com as características indicadas. “Eu vivia fazendo indicações para outras ILPIs, já que o Residencial Toniolo não é adequado para todos os idosos. É preciso encontrar a instituição adequada para a necessidade de cada pessoa”, diz.

Toniolo reconhece que a situação ideal para um idoso dependente é ser cuidado em casa, mas observa que nem sempre há condições para isso. “É preciso avaliar cada caso e entender se há riscos de manter o idoso na sua própria residência”, afirma o geriatra. Segundo ele, existe preconceito em relação às ILPIs por conta de vários problemas que existem há décadas no Brasil e que já estão sendo corrigidos em algumas instituições.Não é bom quando há idosos com diversas necessidades misturados no mesmo ambiente. Um idoso com demência pode incomodar aquele que está lúcido, mas com limitações físicasJoão Toniolo Neto, geriatra

“Não é bom quando há idosos com diversas necessidades misturados no mesmo ambiente. Um idoso com demência pode incomodar aquele que está lúcido, mas com limitações físicas. Por isso, muitas ILPIs estão se especializando”, exemplifica. “Além disso, antigamente a estrutura arquitetônica era improvisada e os profissionais não eram treinados para lidar com idosos, pois eram profissionais da saúde fazendo um bico.”

O momento da escolha

A imagem que Claudia Regis Avancine, de 61 anos, tinha das casas de repouso não era boa quando ela começou a pesquisar as opções em São Paulo, há seis anos. Depois de visitar diversas ILPIs, ela escolheu uma para sua mãe, Gilda Regis, de 94 anos, que tem Alzheimer. “Cuidar dela na minha casa estava caro demais, pois tinha gastos com cuidadores, enfermeiros. E como tenho quatro filhos, a rotina e o ambiente ficavam caóticos”, diz. 

Apesar da seleção meticulosa, Claudia se decepcionou com a primeira ILPI escolhida. Há quatro anos, Gilda foi transferida para o Residencial Santa Cruz, na zona sul de São Paulo, com o qual Claudia está muito satisfeita. “Ela é bem tratada, por profissionais capacitados. Faz várias atividades, como musicoterapia. Sinto até que rejuvenesceu”, aprova.

A adaptação da mãe à primeira ILPI foi muito dolorida para Claudia. “Eu sentia culpa, como se estivesse a abandonando. Isso me deixou emocionalmente abalada no começo, mas depois percebi que estava tudo bem e que eu estaria sempre por perto”, conta. “Para mim, ser cuidadora da minha mãe é um prazer, mas também é desgastante. Por isso, tento explicar aos amigos que não há nada de mal em contar com uma instituição, contanto que seja um lugar de confiança”, diz.

Amiga de Claudia, Regina Junko Miyake Hirama, médica veterinária, de 45 anos, optou por uma cuidadora profissional para cuidar de seu pai Tatsuo Miyake, de 89 anos, e de sua mãe Shigeko Miyake, de 88 anos. Shigeko tem Alzheimer e Tatsuo, apesar de ainda ter autonomia, está com restrição nos movimentos. Ele não aceitava a ideia de receber um cuidador, mas após duas quedas de Shigeko, resolveu ceder.

“A cuidadora ajudou a apagar os grandes incêndios, mas ainda falta tempo e energia para conseguir me dedicar melhor aos meus filhos, pois sobram afazeres como preparar as refeições, levar a consultas e providenciar medicamentos”, diz. Apesar de achar que precisa do apoio de uma cuidadora profissional diariamente, ela prefere não aumentar os gastos agora, considerando que a demanda dos cuidados – e as despesas – só irão crescer com o passar do tempo. Apesar da rotina exaustiva, Regina afirma que é gratificante cuidar dos pais. “É uma oportunidade de retribuir o que fizeram por mim.”

Cuidar de quem cuida

Atualmente, a maioria dos idosos dependentes no Brasil recebem cuidados de familiares, afirma Nereida Kilza da Costa Lima, professora da Divisão de Clínica Médica Geral e Geriatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP). Porém, ela orienta que um idoso com dependências moderadas ou avançadas seja cuidado por vários familiares e, se possível, com apoio de um cuidador profissional. “É preciso evitar o cuidador voluntário familiar exclusivo, pois qualquer pessoa precisa de um respiro, de tempo para fazer o que gosta, além de trabalhar”, diz.Cuidar de um dependente é uma tarefa árdua. Além dos cuidados médicos, há tarefas de alimentação, higiene. Tudo isso traz estafa se ficar a cargo de apenas uma pessoaNereida Kilza da Costa Lima, professora da USP

A sobrecarga – emocional e de trabalho – é o maior desafio de um cuidador informal, enfatiza Rosa Chubaci, professora coordenadora do curso de bacharelado em gerontologia da Universidade de São Paulo (USP), que forma profissionais de nível superior habilitados a fazer a gestão de atenção ao envelhecimento. “Cuidar de um dependente é uma tarefa árdua, o que não quer dizer que seja desgostoso. Além dos cuidados médicos, há tarefas de alimentação, higiene e o aumento dos gastos. Tudo isso traz estafa se ficar a cargo de apenas uma pessoa”, diz. 

Sandra Regina Simião de Souza, 51 anos, divide com o seu único irmão Florisvaldo de Souza, de 54 anos, as despesas dos cuidados com a sua mãe, Regina Simião, de 81 anos. Por mês, eles pagam R$ 2.400 a uma cuidadora profissional que os atende 44 horas por semana, além dos gastos com medicamentos, fraldas e outros itens. Regina teve um AVC há mais de 2 anos que a deixou com sequelas, o que trouxe dependência para realizar as suas necessidades básicas.

Por um ano e meio, Sandra foi responsável pelos cuidados da mãe, mas resolveu contratar uma cuidadora para apoiá-la e saiu da casa de forma que o irmão se tornasse o cuidador principal. “Ele assumiu essa responsabilidade para que eu pudesse voltar a trabalhar”, diz Sandra, que agora é recepcionista de um museu.

Idosos
É importante que o idoso faça atividades, mesmo que sob supervisão de um cuidador ou parente Foto: Werther Santana/Estadão

Há diversos fatores que limitam as famílias nos cuidados das pessoas dependentes, observa Jorge Felix, coordenador do Centro de Estudos da Economia da Longevidade e professor do curso de bacharelado em gerontologia da Universidade de São Paulo (USP): as famílias têm menos filhos, a maior participação da mulher no mercado de trabalho e a necessidade de deslocamento para outros Estados ou países.

“Há diversos fatores que acabam por romper a rede de apoio à pessoa idosa que existia nas gerações passadas. Ao mesmo tempo, o segmento etário a partir de 80 anos é o que mais cresce no País”, diz. Por isso, ele defende que é preciso desenhar uma estrutura de cuidados de longa duração de forma que o idoso envelheça preferencialmente em sua própria casa.

“No Brasil, são incipientes as políticas públicas e serviços de cuidados domiciliares a idosos”, diz. Segundo ele, é preciso que seja oferecida assistência a idosos dependentes para ajudar a fazer compras, ir ao médico ou ao cabeleireiro. “Essa necessidade já é atendida pelo serviço público em alguns países e não é discutida no Brasil. Mas a pandemia escancarou as demandas dessa velhice dependente, que deveria ser foco de políticas públicas sérias”, diz. 

Sônia Marina Barreto, de 74 anos, foi a primeira namorada de Edison Barreto, publicitário, de 74 anos. Casaram-se e tiveram quatro filhos e cinco netos. “Sônia administrava toda a família e a amo de todo o meu coração”, diz. Em 2011, porém, ela teve uma parada cardíaca e ficou em coma por 60 dias. A isquemia cerebral a deixou tetraplégica e Edison precisou se desdobrar para cuidar dela. Para amenizar a sua dor, ele conta que procurou ajuda religiosa e precisou de remédios para controlar a ansiedade.

Centros dias podem ser uma solução intermediária

Reformou e equipou a casa para mantê-la por perto, mas depois percebeu que isso não seria viável, por isso optou por uma casa de repouso, o Residencial Salute, em São Paulo, com a qual está satisfeito. “Tenho uma vida feliz, mas sofro junto com ela”, desabafa.

Uma estrutura que ajuda o idoso dependente a envelhecer em sua própria casa é o Centro Dia, espaço de convivência para idosos semidependentes, que oferece atividades e assistência de diversos profissionais, previsto no Estatuto do Idoso. Ainda há pouca oferta pública e privada e desconhecimento dos Centros Dia, mas a demanda é crescente, segundo o professor Jorge Felix. “É uma opção intermediária em relação à instituição de longa permanência, onde o idoso dependente é acolhido, mas não passa a noite”, diz.

É vasta a oferta de atividades para idosos no Geros Center, Centro Dia privado localizado na zona oeste de São Paulo, com ginástica, pilates, artesanato, pintura, rodas de conversa, clube de leitura, boliche, futebol e videogame. O espaço é adaptado para idosos com mobilidade reduzida e tem uma equipe multidisciplinar à disposição, como educador físico, psicólogo, fisioterapeutas. Auxiliares de enfermagem ajudam nos cuidados.

Idosos
Roberta Seriacopi Newmann, supervisora de Gerontologia do Geros Center: grade de atividade personalizada para cada idoso

Para participar, é preciso passar por uma avaliação para entender as necessidades do idoso e pagar por período (a partir de R$ 120 por 6 horas, com lanche incluído), por atividade ou aderir a um pacote mensal. “Analisamos o perfil cognitivo e funcional do idoso, realizamos um levantamento de interesses e montamos uma grade de atividades personalizada”, diz Roberta Seriacopi Neumann, supervisora de Gerontologia do Geros Center. Segundo ela, o público que frequenta o Centro Dia do Geros Center tem em média 85 anos e apresenta alguma limitação cognitiva ou física, mas consegue acompanhar uma atividade e socializar-se. 

Idoso não é criança

Não importa se o idoso usa fralda ou se precisa de ajuda para comer. Um idoso não deve ser comparado com uma criança, enfatiza Rosa Chubaci, coordenadora do curso de gerontologia da USP. “Muitos idosos acham desagradável essa infantilização. Afinal, eles não são crianças, eles têm uma baita experiência de vida, uma história”, diz. Portanto trate o idoso com a dignidade de um adulto experiente que precisa de ajuda – e explique a ele que não há nada de vergonhoso nisso, orienta a professora.

Um erro comum entre os cuidadores, principalmente os voluntários, é poupar os idosos de realizar ações que ainda são capazes, afirma a professora da USP. “É comum que as pessoas passem a escolher a roupa deles”, exemplifica Rosa. Outro equívoco é deixá-lo inativo. “Uma neta, por exemplo, pode passar a tarde jogando dominó com os avós. Não dá para deixar o idoso o dia todo na frente da TV”, diz.

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Idoso não deve ser tratado como criança, mesmo que necessite de cuidados Foto: Werther Santana/Estadão

“É importante que a pessoa não tenha um sentimento de inutilidade,  afirma a neuropsicóloga Gislaine Gil, fundadora da clínica Vigilantes da Memória e coordenadora do serviço de gerontologia do Hospital Sírio Libanês. “Quem está próximo do idoso na cozinha não deve desligar o fogão, mas acompanhá-lo e lembrá-lo de fazer isso”, exemplifica.

Também é preciso ter sensibilidade e delicadeza em momentos íntimos como o banho. “Se a pessoa conseguir se despir, não faça isso por ela. E vá falando o que você vai fazer, que vai passar o xampu, secar com a toalha. Pergunte o que o idoso prefere. Tente cantar ou fazer algo que deixe o momento mais tranquilo”, orienta. 

Embora seja difícil, é preciso evitar ao máximo o confronto com o idoso. “Tente oferecer uma atividade, alternativas que possam interessar para permitir que ele receba os cuidados”, diz a neuropsicóloga. O cuidador, seja voluntário ou profissional, é capaz de minimizar o desconforto dos idosos dependentes. “Quando o idoso é tratado com afeto, consegue passar melhor por momentos desafiadores.”

Cuidador de idosos não é profissão regulamentada, mas ter uma formação de qualidade faz diferença

No Brasil, o cuidador de idosos é uma profissão não regulamentada e a maioria das pessoas que atua profissionalmente é autodidata, afirma Wilson Jacob Filho, professor de geriatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Ele afirma que uma minoria desses profissionais tem um preparo adequado para exercer bem o cuidado dos idosos. “Um bom cuidador profissional tem competência técnica, obtida por cursos atualizados e de qualidade e experiência prática, além de valores humanitários. É importante que ele tenha vocação”, diz.

O professor explica que esse profissional deve conhecer as nuances do cuidado, a linha fina entre ajudar o idoso e ao mesmo tempo permitir que ele continue a realizar tarefas que o mantém ativo. E apresenta uma dica de ouro para selecionar um cuidador de idosos: “Veja como ele aborda o idoso: perceba se ele busca se conectar com o idoso e entender a necessidade dele.”

Empatia, humanidade e respeito são as habilidades mais importantes de um cuidador, na visão de Isabela Kanupp Silva, de 31 anos, que se dedica a esse trabalho desde 2014. “A pessoa idosa deve ser respeitada em suas vontades e desejos”, diz. A experiência de Isabela como cuidadora começou dentro de casa. Dos 13 aos 23 anos, ela cuidou sozinha do pai, que sofria de Parkinson.

Idosos
Cláudia Avancine com a mãe, Gilda, que sofre de Alzheimer: ‘Sei que ela é bem tratada’ Foto: Felipe Rau/Estadão

Quando o estado dele se agravou, ela fez um curso de cuidador de idosos no Senac, de 160 horas, para aprender a cuidar melhor dele. Depois da morte do pai, em 2013, Isabela usou o conhecimento e experiência para prestar serviços para empresas de home-care. Continuou a investir na sua formação: fez seis cursos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e agora estuda para ser tecnóloga em gerontologia, na Faculdade Anhanguera.

Autônoma desde 2021, ela cuida de uma idosa que mora sozinha, sendo responsável por sua higiene, alimentação, oferta de medicação, atividades de estimulação, entre outras tarefas. Também dá consultoria de cuidados e atende pontualmente outras famílias. “O que mais gosto na minha profissão é o aprendizado constante e de ver um idoso ter uma melhora na qualidade de vida através do cuidado”, diz.

Quem precisa de cuidadores de idosos para atendimento na residência também pode optar por empresas que fazem a gestão desses profissionais. É o caso de Luiz Cláudio Carrara, 62 anos, engenheiro, que contratou a empresa Onix para os cuidados de sua mãe, Dalva Bertoloni, 89 anos, que tem Alzheimer. “Ela precisa de assistência 24 horas e a empresa garante que sempre haverá um plantonista para atendê-la. Além disso, fornecem um relatório de acompanhamento, que ajuda a tomar atitudes quando necessário”, diz. 

Uma das profissionais responsáveis por Dalva é Maria Pâmela Conceição Martins, de 34 anos, que trabalha para a Onix. Além de se dedicar à higiene e à alimentação de Dalva, Maria Pâmela conta que costuma levá-la para caminhar, para tomar sol, além de estimulá-la por meio de atividades recreativas, como pintura e jogos interativos.

“Não quero ser uma funcionária chata que chega para fazer os cuidados, mas alguém que passe tranquilidade e confiança. Quero que eles esperem a minha chegada ansiosamente.”, diz Pâmela, que se dedica à profissão desde 2013. “Eu sei que posso fazer diferença na vida deles. E quando você faz um bom trabalho, recebe gratidão e carinho do idoso, apesar de todas as dificuldades que eles enfrentam”, diz.

A gerontóloga Jullyanne Marques Souza Teixeira, proprietária da Onix, considera essencial que o cuidador de idosos goste de sua profissão, que é desafiadora e exige muita paciência. “Muitas vezes, quando o idoso está doente, a família fica mal. O cuidador tem que entender que muitas situações desagradáveis não devem ser levadas para o lado pessoal. Ele tem o papel de deixar esse ambiente mais leve, para que o idoso consiga ter mais conforto”, diz.

Jullyane alerta que há muitos cuidadores que atuam no mercado com uma formação precária. “Para não cair numa cilada, é preciso checar a experiência e os cursos realizados pelo candidato a cuidador de um idoso”, alerta. Para a sua empresa, que tem 55 clientes ativos, a gerontóloga busca cuidadores formados em cursos de instituições de renome, como a Cruz Vermelha ou Senac, com carga horária de 160 horas.

Muitos cuidadores de idosos são técnicos de enfermagem, o que por um lado é bom, já que têm habilidades relacionadas aos cuidados de saúde, mas é importante que esses profissionais busquem se aprimorar com habilidades e conhecimentos específicos da gerontologia, afirma a professora Nereida Kilza da Costa Lima, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. “É preciso dar atenção completa ao idoso, não só à sua saúde, o que inclui conversar, estimular. Para isso, é preciso estar capacitado”, diz.

COMO ESCOLHER UMA CASA DE REPOUSO

Manter o idoso em casa é a recomendação dos especialistas, mas a Instituição de Longa Permanência (ILPI) é uma opção quando o manejo se torna muito complexo. Veja dicas para uma boa escolha:

  • Perfil: Leve em conta necessidades e preferências do idoso. É possível encontrar ILPIs focadas em perfis específicos, como de pessoas em quadro demencial. 
  • Licenças: Confira se a ILPI tem todas as licenças necessárias para o funcionamento. Por meio do CNPJ da instituição, faça uma consulta junto à Covisa (Coordenação de Vigilância em Saúde).
  • Limpeza: Verifique se o local é limpo, iluminado e bem ventilado e se não tem mau cheiro. 
  • Segurança e mobilidade: Observe se há piso antiderrapante, sinalização de degraus, barras de apoio, grades e rede de segurança nas janelas altas.
  • Equipe: Pesquise sobre a formação do responsável técnico, que deve ter nível superior. Verifique se o número de funcionários atende às demandas de todos os idosos, se a equipe é multidisciplinar. 
  • Alimentação: Deve ser variada, nutritiva e suficiente.
  • Atividades: Veja quais são as opções de lazer e recreação para movimentar o corpo e trazer bem-estar mental.

MATURIDADE EMOCIONAL É NECESSÁRIA NA VIDA

 

Por Monica Machado, psicóloga pela USP, fundadora da Clínica Ame.C, pós-graduada em Psicanálise e Saúde Mental pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein

Uma crítica consiste em um julgamento, uma análise ou avaliação de algo ou alguém. Embora na filosofia o termo “crítica” não tivesse na sua origem a ideia de algo necessariamente negativo, a palavra adquiriu esta conotação, e quando falamos de crítica, sempre se considera algo desaprovado.

As críticas podem ser eficientes ferramentas de crescimento e aprendizagem, uma vez que geralmente apontam comportamentos, atitudes e pensamentos que precisam ser mudados. Além disso, transformam a maneira de lidar com problemas e situações de dificuldade, gerando melhores resultados no âmbito pessoal ou profissional.

Mas, e quando a crítica é destrutiva?

As críticas destrutivas costumam ter afirmações negativas, com o intuito de julgar, ressaltar defeitos ou até diminuir uma pessoa. Mas há como ouvir algo desagradável sem que você se desestabilize emocionalmente (e perca a pose)!

Reflita antes de responder

Ninguém gosta de ser julgado, muito menos negativamente, mas saiba que é possível responder a uma crítica destrutiva de forma inteligente e madura. Se a pessoa, ainda que tenha tido más intenções, estiver correta, concorde com ela. Diga que ela tem razão, mas que poderia ter sido mais sutil.

Caso o comentário seja totalmente infundado, feito somente para te depreciar na frente dos outros, rebata com uma bobagem qualquer, deixando claro que a crítica foi infantil e não te atingiu. Em ambos os casos, a pessoa será pega de surpresa e a vergonha será dela. Posteriormente, aproveite o que foi dito para repensar em suas qualidades, seus comportamentos e identificar o que pode ser melhorado. Por mais destrutiva que seja, uma crítica é sempre uma oportunidade de auto avaliação.

Maturidade emocional

A forma como a crítica é recebida também depende da maturidade emocional da pessoa, de sua capacidade de filtrar os elementos do comentário, analisa-los friamente e saber separar para si aquilo que considera útil ou produtivo para modificar sua forma de ser.

Uma pessoa com baixa tolerância à frustração, terá uma tendência maior a tomar a observação do outro como negativa ou destrutiva, e simplesmente rechaçá-la integralmente, sequer chegando a considerar que possa ter elementos positivos. O sentimento predominante nestas situações é o de rejeição, como se a crítica do outro abrangesse sua pessoa como um todo, e não um aspecto específico de sua pessoa.

Nestes casos, é bem provável que haja necessidade de buscar ajuda psicoterápica, pois o autoconhecimento nos leva a lidar melhor com as opiniões ou com os argumentos de outras pessoas. Quando nos conhecemos e passamos a enxergar tanto nossos potenciais como nossas dificuldades, conseguimos separar o que é nosso e o que é do outro. Afinal, todos teremos que lidar com críticas a vida toda.

A Startup Valeon reinventa o seu negócio

Enquanto a luta por preservar vidas continua à toda, empreendedores e gestores de diferentes áreas buscam formas de reinventar seus negócios para mitigar o impacto econômico da pandemia.

São momentos como este, que nos forçam a parar e repensar os negócios, são oportunidades para revermos o foco das nossas atividades.

Os negócios certamente devem estar atentos ao comportamento das pessoas. São esses comportamentos que ditam novas tendências de consumo e, por consequência, apontam caminhos para que as empresas possam se adaptar. Algumas tendências que já vinham impactando os negócios foram aceleradas, como a presença da tecnologia como forma de vender e se relacionar com clientes, a busca do cliente por comodidade, personalização e canais diferenciados para acessar os produtos e serviços.

Com a queda na movimentação de consumidores e a ascensão do comércio pela internet, a solução para retomar as vendas nos comércios passa pelo digital.

Para ajudar as vendas nos comércios a migrar a operação mais rapidamente para o digital, lançamos a Plataforma Comercial Valeon. Ela é uma plataforma de vendas para centros comerciais que permite conectar diretamente lojistas a consumidores por meio de um marketplace exclusivo para o seu comércio.

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sexta-feira, 18 de março de 2022

PUTIN PRECISA DE UM MOTIVO PARA ACABAR COM A GUERRA NA UCRÂNIA

 

 John Simpson – BBCNEWS

Até a pior guerra chega ao fim. Às vezes, como em 1945, o único desfecho é lutar até a morte. Na maioria das vezes, porém, as guerras terminam com um acordo que não satisfaz a ninguém inteiramente, mas pelo menos põe um fim ao derramamento de sangue.Tanque russo destruído pelas forças ucranianas em Luhansk© Fornecido por BBC News Tanque russo destruído pelas forças ucranianas em Luhansk

E geralmente, mesmo após os piores e mais amargos conflitos, os dois lados retomam gradualmente seu relacionamento antigo, menos hostil.

Se tivermos sorte, estamos começando a ver o início deste processo acontecendo agora entre a Rússia e a Ucrânia.

O ressentimento, sobretudo do lado ucraniano, vai durar décadas. Mas ambos os lados querem e precisam de paz: a Ucrânia, porque suas vilas e cidades sofreram um terrível golpe, e a Rússia, porque, segundo o presidente ucraniano, já sacrificou mais homens e aparato do que perdeu em suas duas guerras incrivelmente violentas na Chechênia — embora isso seja impossível de verificar.

Mas ninguém assina voluntariamente um acordo de paz que provavelmente levará à sua própria derrocada.

Para o presidente russo, Vladimir Putin, continua a busca por maneiras de livrar a cara. O presidente da Ucrânia, Zelensky, já demonstrou notável habilidade como diplomata, e está claramente disposto a dizer e fazer o que for aceitável para ele e seu povo para tirar os russos de seu país.

Para ele, há um objetivo primordial — garantir que a Ucrânia saia desta experiência terrível como um país unido e independente, e não com uma província da Rússia, que é no que o presidente Putin inicialmente parecia pensar que poderia transformá-la.

Para Putin, tudo o que importa agora é que ele seja capaz de declarar vitória. Não importa que todos em seu governo entendam que a Rússia saiu arranhada desta invasão desnecessária. Não importa que os cerca de 20% de russos que entendem o que realmente está acontecendo no mundo saibam que Putin apostou tudo em uma fantasia criada por ele mesmo e perdeu.

A batalha vai ser pelo apoio da maioria da população restante, que tende a acreditar tacitamente no que é dito na televisão estatal — mesmo quando há momentos como o súbito aparecimento na tela da extraordinariamente corajosa editora de TV Marina Ovsyannikova com um cartaz para dizer que tudo o que está sendo dito é propaganda.Marina Ovsyannikova segurando um cartaz que diz "Não à Guerra" ao vivo na TV russa, em 15 de março© Fornecido por BBC News Marina Ovsyannikova segurando um cartaz que diz “Não à Guerra” ao vivo na TV russa, em 15 de março

Então, o que Putin vai fazer para sair desta guerra desastrosa bem na fita aos olhos da maioria na Rússia?

Em primeiro lugar, uma garantia, talvez até mesmo a ser escrita na Constituição da Ucrânia, de que o país não tem intenção de aderir à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) num futuro próximo. Zelensky já preparou o terreno para isso, pedindo à Otan algo com o qual a aliança não poderia concordar (estabelecer uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia), criticando depois a organização por desapontá-lo e, finalmente, refletindo em voz alta que não tinha certeza de que, se a Otan se comportasse assim, valeria a pena se juntar à mesma.

Nesse cenário, a Otan leva a culpa, com a qual pode lidar facilmente, e a Ucrânia obtém a liberdade de agir como quiser.

Mas esta é a parte fácil. Será mais difícil lidar com a ambição urgente que Zelensky e a Ucrânia têm de aderir à União Europeia, à qual a Rússia é quase igualmente hostil, embora também haja maneiras de contornar isso. O mais difícil de tudo para a Ucrânia engolir será o roubo descarado do território ucraniano pela Rússia, no mais completo desrespeito ao solene tratado internacional que ela havia assinado para proteger as fronteiras da Ucrânia.

A perda da Crimeia em 2014 é algo que a Ucrânia pode ser forçada a aceitar formalmente. E a Rússia pretende claramente manter as áreas no leste da Ucrânia que já estão efetivamente sob controle russo — e talvez mais.

Em 1939, Joseph Stalin invadiu a Finlândia, que já havia sido parte do império russo. Ele tinha certeza de que suas tropas abririam caminho rapidamente — assim como Putin pensou em relação à Ucrânia em 2022. Os generais de Stalin, que compreensivelmente temiam por suas vidas, disseram que ele estava certo. E, é claro, não estava.

A Guerra de Inverno se arrastou até 1940, o exército soviético foi humilhado, e a Finlândia sentiu um orgulho nacional justificável por resistir a uma superpotência. Perdeu território, porque autocratas como Stalin e Putin precisam sair dessas coisas parecendo que conquistaram uma vitória. Mas a Finlândia manteve a coisa mais importante e imperecível: sua total independência como nação livre e autodeterminada.

Do jeito que as coisas estão hoje, a Ucrânia — tendo repelido tantos ataques russos e feito as forças de Putin parecerem fracas e ineficazes — deve ser capaz de fazer isso. A menos que os exércitos de Putin consigam capturar Kiev e muitas outras partes, a Ucrânia sobreviverá como entidade nacional, assim como a Finlândia em 1940.

Perder a Crimeia e partes do leste da Ucrânia seria uma perda amarga, ilegal e totalmente injusta. Mas Putin teria que começar a usar armas muito mais pesadas do que já usa, se quiser sair por cima. Do jeito que as coisas estão, na terceira semana de combate, ninguém pode duvidar seriamente quem será o verdadeiro vencedor desta guerra.

FUTURO DOS BRICS COM O ISOLAMENTO DA RÚSSIA

Relações internacionais

Por
Fábio Galão – Gazeta do Povo

Videoconferência dos Brics, em novembro de 2020: outros países da aliança têm evitado uma condenação enfática da invasão russa à Ucrânia| Foto: EFE/EPA/ALEXEI NIKOLSKY/SPUTNIK/KREMLIN

Com as sanções do Ocidente devido à invasão da Ucrânia estrangulando a economia da Rússia, o futuro dos Brics, a aliança de países que inclui também Brasil, Índia, China e África do Sul, está em xeque.

A condenação da comunidade internacional ao governo de Vladimir Putin pode levar ao estreitamento dos laços entre os componentes do grupo ou levar a aliança, que não esteve muito ativa recentemente, ao esfacelamento?

Ricardo Bruno Boff, professor do curso de Relações Internacionais da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), citou que antes da invasão da Rússia à Ucrânia, os Brics, criados com o objetivo de construir alternativas de cooperação ao sistema ocidental de regras e instituições estabelecido depois da Segunda Guerra Mundial, já vinham perdendo fôlego, devido ao alinhamento do Brasil ao governo Trump nos dois primeiros anos da gestão de Jair Bolsonaro e a problemas econômicos da África do Sul.

“Agora, nesse momento, do jeito que as coisas estão, é claro que os Brics deixam de ser prioridade, inclusive para a Rússia. A instituição em si fica adiada, até mesmo encontros, certamente o Putin tem outras coisas na cabeça no momento”, explicou Boff, em entrevista à Gazeta do Povo.

Os companheiros da Rússia nos Brics têm evitado uma condenação enfática da invasão da Ucrânia. No dia seguinte ao início da guerra, Índia e China se abstiveram numa votação no Conselho de Segurança das Nações Unidas que condenou a operação (a resolução foi derrubada com o veto russo) – a África do Sul não faz parte do conselho, e o Brasil votou contra os russos.

Posição que manteve dias depois numa votação na Assembleia-Geral da ONU, quando sul-africanos, indianos e chineses se abstiveram.

Entretanto, apesar dessas condenações, Bolsonaro não impôs sanções à Rússia e tem defendido uma posição pragmática, devido aos interesses do Brasil no comércio exterior com Moscou, como a importação de fertilizantes.

A China, considerada a grande parceira geopolítica de Putin, criticou as sanções impostas pelo Ocidente e tem se oferecido para mediar uma solução para o conflito, mas nesta semana a imprensa americana noticiou que o país planeja ajudar financeiramente e com armas a ação russa na Ucrânia – o que o Kremlin e Pequim negaram.

Relações desde a União Soviética
O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, disse que foi convidado a intermediar negociações. Seu partido, o Congresso Nacional Africano, é simpático a Moscou, pelo apoio da União Soviética à legenda durante o apartheid.

“A Rússia é nossa amiga por completo”, declarou recentemente Lindiwe Zulu, ministra do Desenvolvimento Social da África do Sul, que, segundo o New York Times, estudou em Moscou na época do apartheid. “Não vamos criticar essa relação que sempre tivemos.”

Sem dar maiores detalhes, a Embaixada da Rússia na África do Sul agradeceu recentemente no Twitter pela solidariedade da população do país africano.

“Caros seguidores, recebemos um grande número de cartas de solidariedade de sul-africanos, tanto de indivíduos quanto de organizações. Agradecemos seu apoio e estamos felizes por vocês terem decidido ficar conosco neste momento, quando a Rússia, como há 80 anos, está lutando contra o nazismo na Ucrânia!”, publicou.

No caso da Índia, o histórico de relações com a União Soviética também pesa, segundo Somdeep Sem, professor associado de estudos de desenvolvimento internacional na Universidade de Roskilde (Dinamarca).

Os comunistas assinaram um acordo de cooperação com os indianos em 1971 e ficaram ao seu lado nas disputas com o Paquistão sobre a Caxemira, posição que foi mantida pela Rússia.

“Em 1955, declarando apoio à soberania indiana sobre a Caxemira, o líder soviético Nikita Khrushchov disse: ‘Estamos tão perto que, se vocês nos chamarem do topo das montanhas, apareceremos ao seu lado’”, lembrou Sem, em artigo publicado no site da Al Jazeera.

Questões militares e comerciais também contribuem para essa parceria: de acordo com Sem, armas russas corresponderiam a de 60 a 85% do armamento das forças indianas hoje, e a Índia informou nesta semana que está conversando com Moscou para importar mais petróleo da Rússia – num momento em que Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia anunciam que vão deixar de comprar o produto russo.

Dependência da China pode desequilibrar aliança
Ricardo Bruno Boff destacou que, por questões militares e territoriais, a Rússia talvez seja o segundo membro mais poderoso dos Brics, e consequentemente seu isolamento pode fazer o grupo perder força. Entretanto, mesmo com as parcerias com a Rússia, individualmente os outros países não devem ser penalizados, acredita o professor – isso, é claro, se não colaborarem na guerra.

“Eu acredito que não devem ocorrer represálias abertas, como embargos econômicos, sanções, até porque não teria justificativa. O que os outros países podem sofrer é algum tipo de isolamento diplomático, de afastamento, por exemplo, deixar de receber visitas, críticas abertas, na imprensa, mas não acredito que devam temer alguma coisa mais concreta”, justificou Boff.

Internamente, porém, a correlação de forças dos Brics pode mudar, já que a Rússia aposta principalmente nas relações comerciais com a China para amenizar as perdas que vem sofrendo com as sanções ocidentais.

“Com uma China mais poderosa, acaba ficando um Brics em que o ‘c’ adquire um tamanho maior que as outras letras”, afirmou Boff. “A China já é o país mais poderoso dentro dos Brics, o mais significativo, eu diria que sem a China os Brics não andam, e acredito que o desequilíbrio [dentro da aliança] aumenta, sim, com o enfraquecimento da Rússia.”

A respeito do Brasil, o professor não acredita que o país sofrerá grandes consequências dentro dos Brics, por ter sido o único país do grupo a ter votado contra os russos na ONU.

“Acho que tem que ser por aí: condena em termos humanitários, de direito internacional, mas olhando para seus interesses comerciais. Eu acredito que essa posição brasileira, se bem explicada, bem trabalhada pelo Itamaraty, se o Brasil não aderir a sanções e a questões mais concretas contra a Rússia, dá para manejar no meio termo”, projetou o professor.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/mundo/com-o-isolamento-da-russia-como-sera-o-futuro-dos-brics/
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