quinta-feira, 17 de março de 2022

CONTRA-ATAQUE DO OCIDENTE CONTRA PUTIN

 

 BBCNEWS

Sucessivos presidentes dos Estados Unidos tentaram, com dificuldade, aprender como lidar com o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Agora, porém, quando a União Europeia e a Alemanha uniram-se a esse esforço, a realidade é outra.Putin foi cortejado por presidentes americanos, enquanto a Otan expandia para leste© Getty Images Putin foi cortejado por presidentes americanos, enquanto a Otan expandia para leste

O presidente russo chegou ao poder em 31 de dezembro de 1999. Nos 20 anos que se passaram desde então, Putin tem tentado minar a ordem liberal internacional.

O ex-espião da KGB quer reviver a grandeza russa czarista e restaurar o poderio e a ameaça da União Soviética antes de sua dissolução, em 1991.

Ele buscou – às vezes, com sucesso – redesenhar o mapa da Europa. Ele tentou – às vezes, com sucesso – imobilizar as Nações Unidas. Ele tem estado determinado – às vezes, com sucesso – a enfraquecer os EUA e promover sua divisão e seu declínio.

Fim da História?

Putin chegou ao poder numa época de arrogância ocidental. Os EUA eram a única superpotência num mundo unipolar.

A tese de intelectual americano Francis Fukuyama, falando do “fim da História” e proclamando o triunfo da democracia liberal, era amplamente aceita.

Alguns economistas até mesmo venderam a teoria de que o mundo não veria mais recessões, parcialmente graças aos ganhos de produtividade proporcionados pela nova economia digital.

Também se pensou que a globalização e a interdependência que ela criou evitariam que grandes potências econômicas travassem guerras, e a internet era amplamente vista como uma força para o bem global.

Especialmente no início, os mesmos otimismo e ilusão equivocados coloriram a forma como o Ocidente via Putin.O Air Force One, avião do presidente dos EUA, foi recebido com honras em Moscou em 2002© Getty Images O Air Force One, avião do presidente dos EUA, foi recebido com honras em Moscou em 2002

Sucessivos presidentes americanos deixaram-se levar. Bill Clinton, o ocupante da Casa Branca quando Putin ascendeu ao poder, deu de bandeja a esse ultranacionalista um popular ressentimento, ao promover a expansão da aliança militar Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) até a fronteira da Rússia.

Como George F. Kennan, o famoso arquiteto da estratégia dos EUA na Guerra Fria, alertou na época: “Expandir a Otan será o mais fatídico erro da política americana em toda a era pós-Guerra Fria”.

George W. Bush errou completamente em sua leitura do colega russo. “Eu olhei nos olhos daquele homem”, Bush disse depois de seu primeiro encontro com ele, em Eslovênia, em 2001. “Eu o achei bastante direto e confiável… Eu fui capaz de ter uma ideia sobre sua alma.”

Bush cometeu o erro de pensar que ele poderia seduzir Putin e gentilmente persuadi-lo a seguir o caminho democrático.

No entanto, embora Bush tenha visitado a Rússia mais que qualquer outro país – incluindo, como um favor pessoal, duas viagens em 2002 à cidade-natal de Putin, São Petersburgo -, o líder russo já exibia tendências perigosas.

Em 2008, ultimo ano de Bush como presidente, Putin invadiu a Geórgia – o que ele chamou de “operação para garantir o cumprimento da paz”.

O Kremlin argumentou na época – e tem argumentado desde então – que era hipocrisia de Washington reclamar dessa violação do direito internacional depois que Bush invadira o Iraque.George W. Bush recebeu Putin em seu rancho no Estado do Texas...© Getty Images George W. Bush recebeu Putin em seu rancho no Estado do Texas…...o que levou a uma certa animação da população e do comércio locais© Getty Images …o que levou a uma certa animação da população e do comércio locais

Barack Obama tentou reestruturar as relações entre EUA e Rússia. Sua primeira secretária de Estado, Hillary Clinton, até entregou a seu colega russo, Sergey Lavrov, um botão de reinício (reset) de brinquedo.

Mas Putin sabia que os EUA, após suas longas guerras no Afeganistão e no Iraque, não queriam mais policiar o mundo.

Quando Obama recusou-se, em 2013, a cumprir seu alerta anterior contra Bashar al-Assad, quando o ditador sírio usou armas químicas contra seu próprio povo, Putin viu uma oportunidade.

Ao ajudar Assad a travar sua guerra assassina, ele estendeu a esfera de influência de Moscou no Oriente Médio quando os EUA queriam sair da região.

No ano seguinte, ele anexou a Crimeia e estabeleceu uma presença no leste da Ucrânia.

Apesar de ter ouvido de Obama que deveria “parar com isso”, Putin até tentou influenciar o resultado da eleição presidencial de 2016, na esperança de que Hillary Clinton, sua inimiga de longa data, fosse derrotada, e Donald Trump, seu fã havia tempos, vencesse.Clinton promoveu a expansão da Otan, política que para muitos foi um erro© Getty Images Clinton promoveu a expansão da Otan, política que para muitos foi um erro

O magnata não escondia sua admiração por Putin, uma bajulação que parece ter encorajado o presidente russo ainda mais.

Para o deleite de Moscou, Trump criticou a Otan publicamente, enfraqueceu o sistema de alianças dos EUA do pós-guerra e tornou-se uma figura tão polarizadora que deixou os EUA mais divididos politicamente do que em qualquer momento desde a Guerra Civil (1861-1865).

É possível dizer que precisamos voltar 30 anos para encontrar um líder americano cuja postura diante do Kremlin resistiu ao tempo.

Depois da queda do Muro de Berlim, George H.W. Bush resistiu à tentação de festejar a vitória dos EUA na Guerra Fria — para o espanto dos jornalistas que cobriam a Casa Branca, ele se recusou a viajar para Berlim como forma de comemorar vitória —, sabendo que isso fortaleceria radicais no Politburo e um Exército russo que buscava a derrubada de Mikhail Gorbachev.

Aquela vitória magnânima ajudou quando veio a missão de reunificar a Alemanha, o que foi provavelmente o maior sucesso de Bush em política externa.

Putin é obviamente um adversário mais difícil, até mesmo mais duro de se lidar do que Leonid Brezhnev ou Nikita Khrushchev, o premiê soviético durante a crise dos mísseis em Cuba.

Desde a virada do século, porém, nenhum presidente americano realmente soube como lidar com Putin. Joe Biden, como George H.W. Bush, é um combatente da Guerra Fria que dedicou sua presidência à defesa da democracia, nos EUA e no exterior.

Ao buscar o restabelecimento do papel tradicional dos EUA do pós-guerra como líder do mundo livre, ele buscou mobilizar a comunidade internacional, ofereceu ajuda militar à Ucrânia e adotou o mais duro regime de sanções até hoje direcionado contra Putin.

Conforme as forças russas concentravam-se na fronteira com a Ucrânia, Biden também compartilhou informações da inteligência americana mostrando que Putin havia decidido invadir o vizinho, em maneiras que buscaram abalar as costumeiras campanhas de desinformação e operações de bandeira falsa do Kremlin.

Seu discurso sobre o Estado da União tornou-se uma convocação. “A liberdade sempre triunfará sobre a tirania”, disse. Apesar de Biden não discursar com a clareza ou força de John Kennedy (1961-63) ou Ronald Reagan (1981-89), foi entretanto um discurso significativo.

O que tem sido chocante desde o início da invasão russa, entretanto, é uma liderança presidencial contundente vinda de outro lugar.

Volodymyr Zelensky tem sido louvado e celebrado, conforme ele continua sua extraordinária jornada pessoal de comediante para colosso churchilliano.

O papel da Alemanha

Em Bruxelas, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, tem sido outra presença imponente.

Essa ex-política alemã tem sido uma força por trás da decisão, pela primeira vez na história da União Europeia, de financiar e comprar armamentos para uma nação sob ataque, um compromisso que inclui não apenas munição, mas também aviões de combate.Ursula von der Leyen, comissária europeia, tem sido uma líder de destaque© Getty Images Ursula von der Leyen, comissária europeia, tem sido uma líder de destaque

Seu compatriota, o chanceler alemão, Olaf Scholz, também demonstrou mais determinação na sua relação com Putin que sua antecessora, Angela Merkel.

Em alta velocidade, ele alterou décadas de política externa alemã pós-Guerra Fria, uma abordagem frequentemente baseada em cautela e timidez nas relações com o líder russo.

Berlim enviou sistemas antitanques e antiaéreos para a Ucrânia (encerrando a política de não enviar armamentos para zonas ativas de guerra), paralisou o projeto de gasodutos do Mar Báltico Nord Stream 2, retirou sua oposição ao bloqueio da Rússia do sistema internacional de pagamentos Swift e até mesmo comprometeu-se com um gasto de 2% do Produto Interno Bruto alemão com a área da defesa.

O maior ataque contra um Estado europeu desde a Segunda Guerra Mundial endureceu a determinação europeia. Mas também parece que a relativa fraqueza dos EUA tenha contribuído para isso.

Cientes da atabalhoada retirada dos EUA do Afeganistão e da possibilidade de uma presidência Trump 2.0, líderes europeus parecem ter percebido que não podem mais depender tanto de Washington para defender a democracia neste momento de perigo máximo.

A liderança do mundo livre tornou-se, nesta crise, um esforço comum.

Após o fim da Guerra Fria, Washington pediu às nações europeias que fizessem mais para policiar sua própria vizinhança, algo que eles não conseguiram fazer quando o desmembramento da ex-Iugoslávia levou à guerra civil na Bósnia.

Historiadores podem muito bem concluir que foi preciso uma combinação da agressividade de Putin, a fragilidade americana, a heroica determinação da Ucrânia e o medo de que a estabilidade pós-guerra da Europa esteja verdadeiramente ameaçada para que isso finalmente acontecesse.

Seria ingênuo ser levado pelo romantismo dos discursos de Zelensky ou sucumbir a uma elevação de dopamina ao vermos a tomada de um superiate de propriedade russa nas redes sociais. Putin está intensificando a guerra.

A semana passada, porém, enviou uma mensagem a Moscou – e também a Pequim – de que a ordem internacional pós-guerra continua a funcionar, apesar do emprego da máquina de guerra russa para levá-la ao colapso.

Da mesma forma que a história nunca acabou, também não acabou a democracia liberal.

Como Joe Biden disse em seu discurso sobre o Estado da União, durante uma passagem em que a retórica também serviu como uma sóbria análise: Putin “pensou que ele podia entrar, e o mundo ficaria deitado. Em vez disso, ele encontrou um muro de resistência que ele nunca havia imaginado”.

* Nick Bryant é autor do livro When America Stopped Being Great: a history of the present (Quando a América Parou de Ser Grande: uma história do presente). Ele é ex-correspondente da BBC em Nova York (EUA) e vive hoje em Sydney (Austrália).

UCRÂNIA NÃO É A FRANÇA QUE SE RENDEU EM UM MÊS PARA HITLER

 

Artigo
Por
Marcio Pitliuk

Zentralbild 153-40 II. Weltkrieg 1939-45 24.10.1940 Adolf Hitler begrüßt den französischen Staatschef Marschall Henry Philippe Petain in Montoire-sur-le-Loir. In der Mitte Chefdolmetscher Gesandter Dr. Paul Schmidt. Rechts Reichsaußenminister Joachim von Ribbentrop.

Encontro entre Adolf Hitler e o Marechal Henry Philippe Pétain.| Foto: Wikimedia Commons

A França, que em meados do Século XX, era uma das maiores potências militares e econômicas, se rendeu para a Alemanha nazista em um mês. Paris foi conquistada praticamente sem que um tiro fosse disparado. Segundo relatos dos historiadores, o governo francês não queria que os alemães destruíssem a “Cidade Luz”. Melhor se render ao inimigo. A invasão começou em 10 de maio de 1940 e a rendição oficial foi em 22 de junho. Demorou um pouco, pois Hitler fez questão de que o documento fosse assinado no mesmo vagão de trem onde a rendição alemã foi assinada ao término da I guerra. Era sua vingança.

Após a derrota acachapante, Adolf Hitler incorporou a Alsácia e Lorena como territórios germânicos. O norte da França, incluindo Paris, virou Zona de Ocupação alemã. O centro-sul, chamado de França Livre, o que era mentira, foi entregue para administração do traidor Marechal Henri Philippe Benoni Omer Joseph Pétain, um belo nome para um traidor, colaboracionista dos nazistas, um pau mandado.

Vladimir Putin achou que conquistaria a Ucrânia tão fácil como Hitler conquistou a França. Mais ainda, acreditou que tomaria a Ucrânia da mesma maneira que Hitler anexou a Áustria.  Em 1938, os austríacos receberam a Wermarcht com flores e aplausos. Putin se enganou, o exército russo foi recebido a tiros por um povo que não aceita ser dominado e subjugado por uma potência estrangeira.

Putin também pensou que Volodymyr Zelensky se entregaria facilmente, como fez o Marechal Pétain, ou fugiria para os Estados Unidos, como fez De Gaulle ao ir para a Inglaterra. Zelensky uniu o povo ucraniano na defesa da pátria e, enquanto escrevo este texto, 15 dias depois da invasão, comanda de um bunker a resistência contra os invasores.

Vladimir Putin, como todos os ditadores, vive num palácio de marfim, isolado da realidade, ouve apenas quem o elogia e concorda com ele. Calou a oposição (já prendeu até agora mais de 13 mil russos que protestavam contra a guerra) e eliminou a imprensa livre. Na Rússia, até a palavra guerra está proibida.

O carniceiro de Moscou vive numa realidade paralela e por isso tomou essas decisões tão erradas. Como todos os ditadores, ele imagina que é adorado pelo povo, seus comparsas e os oligarcas repetem sempre isso, e os ucranianos se ajoelhariam para ele. Ele jamais imaginou que a Ucrânia não aceitaria ser controlada pela Rússia. Afinal de contas, quem não sonha em ser dominado por um líder que caça ursos, é faixa preta de judô e anda a cavalo sem camisa?

Putin é o perfeito ditador retratado por Woody Allen no seu filme Bananas, onde o ridículo beirava o surreal. Para Putin, Zelensky era apenas um humorista que fugiria ao primeiro tiro e os ucranianos um povo fraco a ser dominado pelo seu imenso ego.

Volodymyr Zelensky continua a pedir que a Europa e os Estados Unidos não tenham medo de enfrentar Putin, assim como os ucranianos não tiveram e mostraram que o exército russo não é tudo o que a propaganda dizia. O presidente Macron, que volta e meia liga para Putin, acha que vai convencê-lo a depor as armas na conversa, deveria lembrar o que aconteceu com a França em 1940.

O medo é o pior conselheiro numa guerra, a Rússia tem que ser parada com todas as forças.

A Ucrânia não é a França de Vichy, Zelensky não é Pétain, Putin pensa que é Hitler, mas é uma caricatura de Stalin.

Marcio Pitliuk é escritor e palestrante especialista no Holocausto, membro do Conselho Acadêmico do Stand With US e curador do Memorial do Holocausto de São Paulo.

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NÃO FAZ MAIS SENTIDO O USO DE MÁSCARAS DEPOIS DA PANDEMIA

 

Editorial
Por
Gazeta do Povo

| Foto: Bigstock

KN95 face mask. FFP2 mask as covid-19 protection. Coronavirus protection mask on black table.

Desde o início da pandemia, o uso de máscaras foi levantado como uma medida de caráter prudencial, de custo relativamente baixo para implementação, mas com resultados prováveis satisfatórios. Afinal, existe quase que um instinto no homem em proteger seu aparelho respiratório em ambientes tóxicos ou pestilentos. Como o coronavírus é um vírus transmitido pelos aerossóis e gotículas de secreções respiratórias, a ideia de proteger a boca com algum equipamento nunca pareceu má ideia. Com o tempo, a ciência tem apresentado progressos ainda inconclusivos sobre o tema, com estudos apontando para a eficácia do uso de máscaras, estudos apontando para a relevância de alguns tipos de máscaras em detrimento de outros e estudos que alegam eficácia insuficiente do objeto para prevenir a infecção por COVID-19.

Nesse ponto, a metodologia científica parece seguir seu curso normal. É possível que sejam necessários alguns anos para que os cientistas cheguem a um consenso. Mas, do ponto de vista da saúde pública, decisões precisam ser tomadas para preservar vidas e nem sempre isso é possível ser feito com 100% de acertos. Por isso, a política pública é sempre uma mistura de saber técnico e prudencial, levando em conta os custos envolvidos e os benefícios prováveis de medidas que nem sempre podem ser tomadas como indisputáveis. Usar máscaras pode prevenir a infeção? O custo para sua adoção em momento de emergência é muito alto? Essas foram as perguntas que levaram gestores públicos nas mais diversas esferas a optar por sua adoção em praticamente todo o território nacional, ainda em 2020, e durando até o presente momento em muitos lugares.

Porém, é fato que a pandemia não é mais a mesma. A variante Ômicron, apesar de seu alto índice de transmissibilidade, tem uma taxa de letalidade consideravelmente menor que a anterior. Muitos locais do mundo já começaram a flexibilizar as exigências de distanciamento social, passaporte vacinal e uso obrigatório de máscaras, sendo a pandemia já classificada como endemia em algumas nações, como Espanha, Reino Unido, entre outras. Portanto, hoje, parece haver razões suficientes, de cunho prático e científico, para sustentar a posição de que chegou a hora de discutir com mais tranquilidade, também aqui no Brasil, quando e de que forma se dará o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras, como alguns estados e municípios já começaram a fazer.


Convém destacar que, se o uso da máscara podia ser considerado em face de um momento de exceção, como um razoável comportamento de natureza prudencial, sua normalização ad aeternum não deveria ser cogitada como possibilidade.  É preciso considerar que o atual índice de vacinação da população brasileira cumpre a maior parte das exigências dos especialistas em saúde pública a respeito do que seria necessário para retornarmos, gradativamente, àquilo que um dia chamamos de normalidade. O fato que isso se associa a um enfraquecimento progressivo da própria doença reforça em muito o argumento de que, em algum momento, precisamos normalizar a convivência com o vírus.

Nesse debate, há um campo que merece atenção prioritária, tendo em vista que já foi demasiadamente prejudicado com a pandemia: a educação. Nas escolas brasileiras, é sabido ser impossível garantir a correta utilização da máscara por um contingente numeroso de crianças e jovens, além disso o item também prejudica o desenvolvimento da linguagem, a socialização e o reconhecimento de emoções. Mais ainda, por ser um lugar em que professores precisam lidar cotidianamente com problemas de concentração das crianças, as máscaras se tornam um empecilho não desprezível para o bom andamento das aulas e apreensão dos conteúdos. Em outros ramos de atividade humana, como a segurança pública ou a prática de esportes, o uso de máscaras pode ser prejudicial em mais de um aspecto, envolvendo o reconhecimento de suspeitos, o desempenho de atletas e até mesmo a saúde das pessoas.

É importante ressaltar que essa decisão deveria estar ao cargo do Poder Executivo, principalmente na esfera municipal, não ao do Poder Legislativo e muito menos ao Judiciário. Isso porque o atual nível de disseminação do vírus não é uniforme para todas as unidades da federação e municípios brasileiros. Num país continental como o nosso, é natural que algumas regiões registrem uma queda mais acentuada no número de infecções do que outras. A prioridade às realidades locais para a tomada de decisões se provou um caminho mais razoável no enfrentamento da pandemia. Não deveria ser diferente no caso das máscaras. Prefeitos e governadores precisam tomar decisões nessa direção conforme o cenário for se apresentando como mais favorável. A busca da normalidade deve ser uma meta factível para todos eles.

Convém destacar que, se o uso da máscara podia ser considerado em face de um momento de exceção, como um razoável comportamento de natureza prudencial, sua normalização ad aeternum não deveria ser cogitada como possibilidade

Conviver com a doença, desde início, era previsto como etapa inevitável pelas autoridades de saúde pública. Agora, com a imunização suficientemente ampla e acessível, e a rede hospitalar com capacidade para atender casos mais graves, temos condições de dar um passo adiante rumo ao cotidiano como o conhecíamos e planejar, de modo concreto, responsavelmente, o momento em que se dará o retorno à vida sem máscaras.


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POLÍTICOS FAZEM POLÍTICA COM O DINHEIRO DO POVO E AINDA BRIGAM ENTRE SI

Campanha eleitoral

Por
Alexandre Garcia – Gazeta do Povo

Convenção nacional do PDT que confirmou pré-candidatura a presidente de Ciro Gomes: muita gente no partido acha que o dinheiro do fundo eleitoral deveria ser investido nas campanhas a deputado| Foto: Divulgação/PDT

O presidente da Petrobras, general Joaquim Silva e Luna, disse em entrevista que, se uma pessoa abastecer o carro com R$ 200 de combustível, a Petrobras só estará recebendo R$ 71. O resto fica pelo caminho. O imposto federal é pequenininho e o grosso mesmo dessa margem vai para o governo estadual. A mesma coisa com o botijão de gás. De um botijão vendido a R$ 96, a Petrobras recebe apenas R$ 38. Já o governo estadual leva R$ 43.

Aí as pessoas dizem: “poxa, mas por que a Petrobras não baixa o preço?”. É que ela não é a única produtora de combustíveis no Brasil. Existem 18 refinarias, sendo que 14 são da Petrobras. Mas se ela baixa o preço, as outras quatro vão falir, e a ideia não é essa, pelo contrário, o objetivo é estimular a iniciativa privada.

Aliás, o presidente Jair Bolsonaro disse nesta quarta-feira (16) que seria muito melhor que a Petrobras fosse privatizada, porque aí não pesava sobre o governo a alta dos combustíveis. E tinha garantia de que nunca mais partidos políticos e corruptos iriam meter a mão na empresa como fizeram no passado.

Reforma tributária
Os senadores adiaram, mais uma vez, a apreciação da proposta de reforma tributária na Comissão de Constituição e Justiça que estava prevista para esta quarta-feira (16). Passaram para a quarta-feira da semana que vem. Agora eles foram rápidos para pegar R$ 3,8 bilhões dos nossos impostos para botar na cultura na tal da Lei Paulo Gustavo.

Será que agora é tempo de se fazer isso? A cultura é importante, mas já tem a Lei Rouanet para isso e agora mais essa. Eu não consigo entender o que passa na cabeça dos senadores.

Dinheiro para campanha

O jurista Modesto Carvalhosa diz que deveria ter havido um plebiscito para perguntar ao povo brasileiro se ele quer dar dinheiro para sustentar campanha eleitoral. Por que destinaram R$ 4,9 bilhões dos nossos impostos para campanha eleitoral. E o Supremo Tribunal Federal chancelou isso que o Congresso fez.

É um dinheiro enorme, mais do que o dobro do que era antes. E tudo porque o Supremo proibiu que tenha contribuição de empresas para campanha eleitoral. Eu acho que quem deve dar dinheiro é aquele que segue o partido, o seu filiado, que gosta do partido. Mas o STF proibiu e agora todo contribuinte é obrigado a destinar parte do seu imposto para bancar campanha de partido político.

Isso ainda está causando o maior problema no pessoal da terceira via, porque tem a cláusula de barreira esse ano. Quem não eleger no mínimo 11 deputados federais em nove estados, está fora, não recebe mais um tostão de dinheiro público. Os partidos estão disputando internamente para ver quem fica com mais dinheiro.

O Podemos, por exemplo, que tem Sergio Moro como pré-candidato, já tem 11 deputados, ou seja, já está no mínimo. Se não eleger 11 na próxima eleição, não sei como vai sobreviver. O partido tem R$ 200 milhões do fundo eleitoral para gastar e pretende dar só 10% desse dinheiro para a campanha do Moro. Só que esses “só” 10% são R$ 20 milhões, quase dez vezes o dinheiro que Jair Bolsonaro usou para se eleger em 2018.

O PDT tem R$ 250 milhões. Muita gente está dizendo que Ciro Gomes não terá chance de se eleger, que tem que usar esse dinheiro para reeleger quem já está no Câmara e de quebra garantir uma bancada maior. O União Brasil, que vai receber R$ 700 milhões, já está pensando em botar esse dinheiro para eleger governador.

Resumo da ópera: é uma festa com o nosso dinheiro. Deveriam no mínimo dizer obrigado para nós, pagadores de impostos, e que ainda vamos dar mandato a eles através do voto.


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BRASIL DEVE INVESTIR PESADO EM ENERGIA NUCLEAR

 

Por
André Uliano – Gazeta do Povo

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Em 2021, a energia elétrica brasileira ficou em média quase 1/3 mais cara. Além da inflação mundial elevada em virtude dos problemas econômicos causados pelas medidas de lockdown, a energia destoou negativamente do restante dos bens por força da maior crise hídrica enfrentada pelo país em quase um século somada à alta dependência pela matriz energética nacional da energia gerada por hidroelétricas.

O tema foi objeto constante de abordagem midiática. Há, contudo, um dado muito relevante nessa equação que, a meu ver, recebe insuficiente atenção: a oferta reduzida de energia elétrica não é só um problema de custo da conta de luz ou do risco de ficar uma noite no escuro. A oferta abundante de energia barata é um fator fundamental para o crescimento econômico e para a redução da pobreza.

Com efeito, há um farto registro de dados demonstrando que existe uma correlação clara entre a disponibilidade de energia e o padrão de vida. Veja no gráfico abaixo, por exemplo, o qual coteja níveis de uso de energia por pessoa e riqueza per capita no país, com números do ano de 2019. A curva ascendente deixa patente que à medida que o consumo de energia sobe (coluna da esquerda) a renda tende a subir também (linha inferior).

O gráfico também demonstra que a população nos países de renda elevada consumiu em geral mais de 30 mil kWh. A América do Norte ficou em quase 90 mil, ao passo que a maioria das mais importantes nações europeias giravam acima dos 40 mil kWh.

Enquanto isso, países africanos famosos pela extrema pobreza tiveram consumo de menos de mil kWh, e a média mundial registrou consumo de pouco mais de 20 mil kWh. O Brasil, por sua vez, ficou na casa dos 16 mil kWh.

Logo, é evidente que para o Brasil crescer e gerar melhores padrões de vida para sua população ele precisa ampliar significativamente sua oferta de energia a preços razoáveis. Isso exige que ele aumente de modo considerável sua produção de modo acelerado e sustentável. Dentre as fontes possíveis, a energia hidrelétrica já apresenta saturação de suas fronteiras em vista da dimensão das obras, o que implica em fortes impactos ambientais, além de que crises hídricas têm fortes efeitos sobre sua capacidade produtiva. A energia eólica e a solar, cada vez mais importantes, apresentam o problema da intermitência, fator de perda de eficiência e de menor segurança de fornecimento de energia para o sistema. As termelétricas, por sua vez, como veremos em detalhe à frente, são altamente poluentes, inseguras e, no Brasil, bastante caras.

Resta, portanto, a opção da energia nuclear. Seu uso destaca-se na Europa, Estados Unidos, Canadá e Rússia. Na França, por exemplo, quase 70% da energia elétrica é produzida por fontes nucleares, enquanto na Suécia e na Finlândia, por volta de 1/3. Após forte expansão na segunda metade do século passado, os níveis mundiais de energia nuclear produzida estagnaram nos anos 2000, sendo que no Brasil menos de 2% provém dela.

Aqui apontamos 3 razões pelas quais acreditamos que o Brasil deve investir pesada e urgentemente em energia nuclear.

1) ENERGIA NUCLEAR É ALTAMENTE SEGURA
Todas as fontes energéticas possuem efeitos negativos, dentre os quais destacam-se: 1) poluição do ar; 2) acidentes ocorridos durante a construção das plantas, transporte ou manejo do processo produtivo; e, 3) emissão de gases de efeito estufa.

Examinando todas essas variáveis, a energia nuclear – assim como as demais renováveis – são muito mais seguras do que as energias geradas por combustíveis fósseis ou biomassa.

Veja os dados no seguintes gráfico:

A partir dele, podemos concluir que a energia nuclear resulta em 99,75% menos mortes do que o carvão (brown coal e coal); 99,6% menos que o petróleo (oil); e 97,5% menos que o gás.

Para tornar os números mais concretos: para cada cidade que consuma 1 terawatt-hora de energia elétrica por ano (na média, isso é consumido por uma cidade europeia de quase 200 mil habitantes), anualmente teríamos o seguinte número médio de mortes para cada tipo de energia:

i) 25 pessoas morreriam por ano a partir da produção de energia por carvão;

ii) 18 por petróleo;

iii) 3 por gás;

iv) enquanto, na média, ninguém morreria pela produção de energia nuclear. De fato, com uma taxa de mortes de 0,07 por ano, demoraria na média 14 anos para que a primeira pessoa fosse vitimada.

Ou seja, morrem mais de 350 vezes mais pessoas em decorrência da produção de energia utilizando carvão do que energia nuclear.

É curioso, porque esses fatos tendem a chocar-se contra o senso comum. O que ocorre com a energia nuclear é semelhante ao que acontece com os meios de transporte. Em geral, as pessoas têm muito mais receio de viajar de avião do que de carro ou ônibus, embora a chance de morrer num acidente de carro seja muito superior. Contudo, acidentes de avião tendem a ser mais chocantes, em virtude do número de pessoas que morrem em cada um deles e da forma como são noticiados. Do mesmo modo, ao ouvir falar de energia nuclear, o público tende a pensar em Chernobyl ou Fukushima, mas eventos como aqueles são extremamente raros e acidentes com contaminação não são a única causa de morte relevante.

Vale a pena chamar a atenção para o fato de que o raciocínio que você deve fazer não é: morrem pessoas por causa da energia nuclear, logo é melhor não utilizá-la. Na verdade, a energia será produzida, por uma fonte ou outra. Então a questão é: com qual fonte pouparei mais vidas? Logo, tendo em vista que no Brasil os gargalos energéticos são cobertos com energia fóssil das termelétricas, cada usina nuclear que dispense aquelas fontes estará salvando vidas.

2) ENERGIA NUCLEAR É UMA DAS FONTES DE ENERGIA MAIS LIMPAS
Para além dos impactos de curto prazo, temos de levar também em conta os impactos de longo prazo de cada fonte de energia. Ou seja, examinar seus impactos não só para as presentes, mas também para as futuras gerações. Aqui, temos uma boa notícia: os interesses são coincidentes, visto que as energias mais seguras são também as menos poluentes.

É sabido que as energias renováveis tendem a ser mais limpas. O que é interessante perceber é que mesmo dentre as energias renováveis, a nuclear é a responsável pelas menores emissões de gases de efeito estufa.

Todos esses dados constam do seguinte gráfico, sendo que as barras da direita apontam os níveis de emissão:

Como se percebe, para cada tonelada de gases de efeito estufa emitida pela produção de energia nuclear cerca de 11 toneladas são lançadas na atmosfera pelas energias hídricas, as mais utilizadas no Brasil. Em relação aos combustíveis fósseis, a disparidade torna-se ainda maior: seguindo essa métrica, o carvão polui 273 vezes mais; o petróleo 180 vezes; enquanto o gás natural, 163 vezes.

3) ENERGIA NUCLEAR TEM CUSTO COMPETITIVO EM RELAÇÃO A OUTRAS FONTES
Embora o custo de produção de energia eólica e solar tenha despencado velozmente ao longo dos últimos anos, os custos de produção de energia nuclear são competitivos em relação a outras fontes, tendo a vantagem de ser limpa, segura e constante (não intermitente).

De fato, embora a construção de usinas nucleares apresente custo elevado, o combustível nuclear é barato e de baixo volume, implicando em reduzidos custos de operação.

Conforme matéria veiculada neste jornal,

“Depois de construídos, reatores nucleares demandam pouca manutenção e, por isso, geram eletricidade a um custo mais baixo do que usinas movidas a vento ou luz do Sol — cuja oferta, no mundo inteiro, ainda é altamente subsidiada. Elas também ocupam muito menos espaço do que, por exemplo, uma usina hidrelétrica. Como podem ser construídos em qualquer lugar, os reatores nucleares reduzem os custos com linhas e estações de transmissão e distribuição.”

No Brasil, com exceção de Angra 3 (por razões particulares e excepcionais), a energia nuclear – gerada por Angra 1 e 2 – é comparativamente barata. Segundo dados fornecidos pela Eletronuclear relativos a setembro de 2021, a energia nuclear apresentou naquele período um custo entre R$ 20,12 e R$ 31,17 por mWh, enquanto a termelétrica mais barata não ficou abaixo de R$ 80,11, com a grande maioria pairando acima de R$ 200,00 e algumas delas ultrapassando R$ 700,00 e chegando a mais de R$ 900,00.

Por conseguinte, visto que a produção abundante de energia é essencial para o aumento do padrão de vida e a redução da pobreza, e levando em conta que a energia nuclear é limpa, segura e pode ser produzida com custos competitivos, cremos que o Brasil deve investir pesado e o mais rápido possível nessa espécie de fonte energética.


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ESTRATÉGIA DA CHINA NÃO ESTÁ AJUDANDO MOSCOU NA GUERRA DA UCRÂNIA

 

Foto: Alexander ZemlianichenkoPor Christian Shepherd e Lily Kuo

Em Pequim, pressão para que o país tenha uma ação decisiva sobre a Guerra na Ucrânia começa a aumentar

THE WASHINGTON POST – Em uma conversa recente entre especialistas americanos e chineses, o lado chinês, citando pequenas mudanças na linguagem, insistiu que Pequim estava se distanciando da guerra de Vladimir Putin.

Para os participantes americanos, segundo Jude Blanchette, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, que estava lá, a resposta incrédula foi: “Ah, é mesmo?”

“O argumento deles era que a linguagem estava mudando, embora sutilmente, para mostrar descontentamento com a Rússia”, disse Blanchette sobre a discussão durante o intercâmbio entre os especialistas. “Isso nos pareceu um molho muito fraco.”

O presidente da China, Xi Jinping, durante cerimônia de encerramento das Olimpíadas de Inverno; pressão no país por posicionamento mais firme sobre a Guerra na Ucrânia aumenta.

O presidente da China, Xi Jinping, durante cerimônia de encerramento das Olimpíadas de Inverno; pressão no país por posicionamento mais firme sobre a Guerra na Ucrânia aumenta. Foto: Gabriela Bhaskar/The New York Times

Três semanas após o início do maior confronto militar na Europa desde a 2ª. Guerra, o esforço da China para não desagradar nem a Rússia nem a coalizão internacional que impõe sanções a Putin parece cada vez mais insustentável.

Está crescendo uma desconexão entre a imagem de neutralidade que Pequim quer projetar e a estratégia de longo prazo do presidente Xi Jinping de promover laços com a Rússia como parceiro prioritário no impasse com os Estados Unidos e seus aliados.

Um risco geopolítico

A pressão dos governos ocidentais – e de acadêmicos e da opinião pública chinesas – está aumentando sobre a liderança chinesa para usar seus laços econômicos com a Rússia para forçar um cessar-fogo. Mas fazer isso é um risco para os líderes chineses, que têm pouca experiência em lidar com crises geopolíticas longe de seu território.

“A maioria da comunidade internacional está muito descontente com a posição da China, e a imagem internacional da China pode não melhorar como resultado”, disse Tong Zhao, membro do Carnegie Endowment for International Peace, com sede em Pequim. “Parece que a China não é muito habilidosa em jogar jogos geopolíticos internacionais.”

Apesar de algumas tentativas de se distanciar da Rússia, disse ele, a abordagem de Pequim permanece fundamentalmente a mesma e “muito genérica, porque não acho que a China saiba neste momento quais principais mudanças políticas deve adotar”.

Russian President Vladimir Putin attends a meeting with Chinese President Xi Jinping in Beijing, China February 4, 2022. Sputnik/Aleksey Druzhinin/Kremlin via REUTERS ATTENTION EDITORS - THIS IMAGE WAS PROVIDED BY A THIRD PARTY.

Russian President Vladimir Putin attends a meeting with Chinese President Xi Jinping in Beijing, China February 4, 2022. Sputnik/Aleksey Druzhinin/Kremlin via REUTERS ATTENTION EDITORS – THIS IMAGE WAS PROVIDED BY A THIRD PARTY. Foto: SPUTNIK

Entre as mudanças de linguagem estava a decisão de Xi de chamar a invasão de “guerra” pela primeira vez ao falar com seus colegas alemães e franceses na semana passada – um afastamento de semanas de descrição oficial da guerra como uma “operação militar especial” ou uma “situação”.

O embaixador da China na Ucrânia, Fan Xianrong, reuniu-se na segunda-feira, 14, com o chefe da administração regional de Lviv e prometeu que a China seria “uma boa força para a Ucrânia, tanto econômica quanto politicamente”.

Sinais positivos de Pequim?

Esses ajustes nas mensagens diplomáticas e aberturas para a Ucrânia foram considerados sinais positivos por aqueles na Europa que estão ansiosos para que a China use sua influência sobre a Rússia para pressionar por um acordo negociado.

Mas suas esperanças provavelmente são infundadas, de acordo com Andrew Small, membro sênior do German Marshall Fund. “Existem pequenos pedaços de posicionamento tático para lidar com as consequências do apoio que eles estenderam à Rússia, mas nada se desvia dos fundamentos de apoio [a Putin]”, disse ele.

O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, sugeriu que seu país está disposto a ser um mediador, mas a China tem pouca experiência em atuar como pacificadora em disputas internacionais. Durante anos, a política externa chinesa tem sido uma extensão das prioridades políticas domésticas, onde a principal prioridade é preservar a segurança do regime. As poucas vezes em que a China esteve diretamente envolvida em negociações envolveu assuntos em sua esfera imediata de influência, como sediar diálogos de seis partes para retardar os programas de desenvolvimento nuclear e de mísseis da Coreia do Norte, ou organizar conversas entre grupos rebeldes e a junta em Mianmar para evitar uma crise de refugiados em sua fronteira.

O melhor que a China poderia fazer, disse Small, seria sediar reuniões ou enviar mensagens entre as partes, mas as autoridades carecem de compreensão ou incentivo para pressionar as partes em direção a um acordo duradouro. “Eles não vão correr atrás de novas propostas para arranjos de segurança na Europa, porque isso pode explodir em seus rostos”, disse ele.

Teorias da conspiração e propaganda

Os esforços da China para se apresentar como uma parte neutra foram ainda mais prejudicados quando seu Ministério das Relações Exteriores apoiou teorias da conspiração russa sobre supostos programas de armas biológicas apoiados pelos EUA na Ucrânia, na semana passada.

“Isso é um mau presságio não apenas para o relacionamento da China com os Estados Unidos, mas também para seus laços com a Europa”, escreveram analistas da Alliance for Securing Democracy em um estudo recente sobre desinformação coordenada entre China e Rússia. “A resposta da China à invasão da Rússia é vista como um teste decisivo – e Pequim está falhando”.

Yang Jiechi, principal diplomata da China, encontra-se com o conselheiro de segurança nacional dos EUA Jake Sullivan em Roma em 14 de março de 2022.

Yang Jiechi, principal diplomata da China, encontra-se com o conselheiro de segurança nacional dos EUA Jake Sullivan em Roma em 14 de março de 2022. Foto: Jin Mamengni/Xinhua via AP

Há argumentos dentro da China de que Pequim está cometendo um erro tático ao ficar com Moscou e atacar o Ocidente. Um ensaio incomumente franco de um estudioso chinês sênior publicado no fim de semana argumentou que a tentativa de dividir a diferença entre a Rússia e o Ocidente poderia alienar grande parte do mundo e deixar a China em uma situação pior.

Para salvaguardar os interesses da China, Pequim deve escolher “o menor dos dois males e descarregar o fardo da Rússia o mais rápido possível”, escreveu Hu Wei, vice-presidente do Centro de Pesquisa de Políticas Públicas do Gabinete do Conselheiro do Conselho de Estado da China. “Atualmente, estima-se que ainda haja um período de janela de uma ou duas semanas antes que a China perca seu espaço de manobra. A China deve agir de forma decisiva”.

A liderança da China parece indiferente a tais apelos. O artigo de Hu foi censurado logo após ser publicado.

As autoridades chinesas, em vez disso, promovem o “princípio de segurança indivisível” da Rússia e argumentam que as preocupações de segurança de Putin são legítimas e causadas pela expansão da Otan e do apoio ocidental a “revoluções coloridas” e reformas democráticas. Embora as autoridades chinesas afirmem que a China apoia a paz e o fim da guerra o mais rápido possível, a mídia estatal é predominantemente pró-russa em suas reportagens, e as vozes e comentários antiguerra foram silenciados.

Em um ano em que Xi deve romper com a tradição e assumir um controverso terceiro mandato e estender seu governo sobre o país indefinidamente, uma reviravolta na crise da Ucrânia é impensável.

“Uma mudança dramática na Rússia vai levantar questões sobre sua liderança”, disse Yun Sun, diretor do programa da China no Stimson Center.

Muitas das preocupações da Rússia sobre a hegemonia ideológica dos EUA e os blocos de segurança ocidentais são compartilhadas pela China. Observar como os países ocidentais pressionam a Rússia pode ter consolidado uma visão de que reparar as relações com o Ocidente é uma causa perdida.

Os ministros da Defesa da Rússia, Serguei Shoigi, e da China, Wei Fenghe, assistem a exercício militar conjunto em 13 de agosto de 2021.

Os ministros da Defesa da Rússia, Serguei Shoigi, e da China, Wei Fenghe, assistem a exercício militar conjunto em 13 de agosto de 2021. Foto: Savitskiy Vadim/Russian Defense Ministry Press Service via AP

“Isso só contribui para a visão chinesa de que o próximo alvo estratégico do Ocidente é a China, e haverá um confronto entre a China e o Ocidente mais cedo ou mais tarde”, disse Zhao.

A mudança fundamental na posição da China em relação à Rússia pode ser vista comparando sua resposta à Ucrânia com a forma como ela lidou com a anexação da Crimeia por Putin em 2014. Naquela época, Pequim adotou uma posição mais cautelosa, nunca reconheceu a demanda russa e evitou apoiar as exigências de Moscou para que a Otan voltasse ao seu status anterior a 1997.

Desta vez, embora a China tenha expressado consternação com o conflito, seu apoio à posição anti-Otan da Rússia não vacilou.

“Esta é uma aposta de longo prazo que Xi Jinping fez”, disse Small. “Existem muitos relacionamentos que a China está disposta a descartar, mas também há uma visão de que você se apega a certos países e a Rússia é um pelo qual você se inclinará para trás”.

PREÇOS DOS COMBUSTÍVEIS UM PROBLEMA A SER RESOLVIDO

 

  1. Opinião 

A título de baratear o diesel, congressistas interferem na autonomia dos Estados e, de quebra, podem ter contribuído para aumentar o preço do combustível

Notas & Informações, O Estado de S.Paulo

Nove Estados e o Distrito Federal (DF) poderão ser forçados a aumentar a carga tributária para se ajustar à nova lei, já sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro. O governo de São Paulo, um dos Estados com alíquota mais baixa, deve estar entre aqueles obrigados a aumentar a cobrança para se ajustar à nova regra. A decisão dos congressistas, alinhada aos interesses pessoais do presidente da República, indica despreparo, improvisação e disposição para intervir de forma autoritária na ordem federativa.

Os governos estaduais tributam o diesel, pelo velho sistema, cobrando um porcentual sobre o preço da bomba de combustíveis. A alíquota do tributo, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), pode ser diferente em cada Estado. Pela nova lei, será cobrado, em todo o País, um valor fixo, em reais, por litro do combustível.

Na média do preço atual do diesel, a alíquota média do ICMS, convertida em valor, corresponderia a R$ 0,81 por litro, levando-se em conta a média do preço de referência. A alíquota de São Paulo equivaleria a R$ 0,74. Outros oito Estados, além do DF, também teriam espaço para aumentar a cobrança e se ajustar à nova regra. Os dados são de uma simulação produzida por secretários de Fazenda e publicada pelo Estadão.

Ao aprovar essa lei, congressistas embarcaram no populismo tosco do presidente da República, sem examinar as condições atuais da tributação e os problemas de adaptação ao novo sistema. Mostraram desinformação, despreparo e desconhecimento de um padrão tributário implantado há mais de meio século.

Quando o Brasil importou o modelo do tributo sobre o valor agregado, os governos estaduais abandonaram o Imposto sobre Vendas e Consignações e adotaram, em 1967, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias (a palavra Serviços e a letra S apareceriam depois da reforma ocasionada pela Constituição de 1988).

Desde a implantação do ICM, há 55 anos, a diversidade federalista produziu efeitos positivos e negativos. Os Estados puderam ajustar o novo tributo às suas prioridades. Houve alíquotas menores para alguns produtos, como alimentos básicos, e maior tributação de itens selecionados, como viria a ser o caso da energia elétrica. Mas a diversidade levaria também à concessão de facilidades para atração de investimentos. Isso facilitou a modernização de áreas menos desenvolvidas, mas criou condições para a guerra fiscal.

Governos estaduais tentaram coordenar seus interesses por meio de um conselho de secretários de Fazenda. Nem sempre conseguiram. Por isso, alguns problemas foram levados, nem sempre com solução rápida e eficiente, ao Supremo Tribunal Federal. Houve, também, tentativas de eliminar a guerra fiscal por meio de reformas legais, às vezes muito tímidas. Mas, de modo geral, evitou-se o risco de soluções contrárias aos padrões federativos, mantidos desde a reforma de 1967.

O ICM, baseado num modelo em vigor na Europa e discutido no Brasil por vários anos, foi implantado, no período militar, como parte de um grande conjunto de reformas. A subordinação do tributo ao poder estadual foi uma diferença importante, e às vezes muito criticada, em relação ao modelo original. Mas a adoção do sistema foi um avanço, apesar de seus muitos problemas, quando comparado com o padrão anterior.

Hoje, é um tanto estranho, e com certeza assustador, ver os valores do federalismo atropelados no Congresso – e especialmente no Senado, a casa da Federação – mais de quatro décadas depois de extinta a ditadura. Mais que a improvisação e os erros técnicos, inquieta ver um Legislativo alinhado aos arroubos autoritários de um presidente da República tão distante dos valores democráticos quanto dedicado a seus interesses pessoais. O debate sobre combustíveis e ICMS envolve instituições, muito mais que problemas de mercado e de finanças públicas.

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

  Brasil e Mundo ...