quarta-feira, 7 de julho de 2021

PROVÁVEL INDICAÇÃO DO GOVERNO PARA O STF

 

Sucessor de Marco Aurélio

Por
Rodolfo Costa – Gazeta do Povo
Brasília

O Advogado- Geral da Uniao (AGU), Andre Luiz de Almeida Mendonca, durante a coletiva de imprensa no Palácio do Planalto, sobre as ações de enfrentamento no combate ao coronavírus (O Advogado- Geral da União (AGU), André Luiz de Almeida Mendonça.

André Mendonça, ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), foi confirmado por Bolsonaro ao STF em reunião com ministros.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro deu início à maratona de provações que o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, vai enfrentar para garantir um assento no Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro confirmou reservadamente a ministros que indicará o ex-ministro da Justiça, mas o vazamento da informação à imprensa mais complica do que ajuda o ministro.

A Gazeta do Povo mostrou no início de junho que Mendonça havia conseguido vencer resistências e se tornar “superfavorito” para ser indicado como sucessor do ministro Marco Aurélio Mello, que se aposenta na próxima segunda-feira (12). A questão agora, segundo apurou a reportagem, é que o cenário político é menos favorável do que há um mês.

Se a indicação de Mendonça foi confirmada por Bolsonaro, a aprovação pelo Senado virou uma incógnita. Em junho, o governo contabilizava atingir até 50 votos com a indicação do chefe da AGU. Contudo, hoje, o cálculo político é outro. A CPI da Covid acuou o governo com as suspeitas sobre o contrato da vacina Covaxin e um “superpedido” de impeachment contra Bolsonaro foi apresentado. Tais fatos políticos colocam em dúvida a margem de aprovação.

O governo mantém a confiança de que Mendonça será aprovado, ainda que admita que sob uma margem inferior à projetada anteriormente. No Senado, a leitura feita é de que a votação será a mais apertada desde a redemocratização.

O que o Senado espera da sabatina de André Mendonça
A aposta no Senado — a Casa legislativa responsável por apreciar as indicações ao STF — é que o nome de André Mendonça pode até ser aprovado, mas sob um desgaste semelhante ao do ministro Edson Fachin. Em maio de 2015, o então candidato à Suprema Corte foi sabatinado por 12 horas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), na mais longa sabatina desde a redemocratização.

O colegiado aprovou a indicação de Fachin por 20 votos favoráveis e sete contrários. O plenário o aprovou por 52 a 27. O desgaste enfrentado foi superior, inclusive, ao de Alexandre de Moraes, indicado pelo impopular ex-presidente Michel Temer, aprovado na CCJ por 19 a sete na CCJ — após 11 horas de sabatina — e 55 a 13 no plenário.

A comparação feita com os dois magistrados é citada por alguns senadores como forma de explicar o quão difícil deve ser a aprovação de Mendonça. “Vai ser mais difícil que a do [ministro] Kássio [Nunes Marques], que tinha o apoio do [senador] Ciro [Nogueira, presidente do PP] e do [senador] Flávio [Bolsonaro]”, aposta um senador aliado. Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, foi aprovado 22 votos a 10 na CCJ e 57 a 10 no plenário.


Além da CPI: quais as outras resistências do Senado a Mendonça
O desgaste sofrido pelo governo na CPI da Covid é um importante elemento político para entender os motivos de resistência de alguns senadores, mas não é o único. Outro é a associação religiosa. Bolsonaro vinculou essa candidatura a uma indicação para atender o eleitorado evangélico, prometendo um ministro “terrivelmente evangélico”.

A sinalização de que Bolsonaro escolheria Mendonça atraiu o apoio do pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. O líder evangélico é desafeto de muitos senadores, e pesou ainda mais contra ele ter chamado de “arregão” o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), após ter vetada sua convocação ao colegiado.

Em junho, em solenidade no Pará para a entrega de títulos rurais, Bolsonaro foi acompanhado de Malafaia e Mendonça. O líder evangélico pediu que o presidente da República anunciasse a indicação do titular da AGU na ocasião. O apoio explícito do líder religioso tem constrangido senadores e, hoje, pesa mais contra do que a favor da indicação do ministro.

Outra resistência apontada por alguns senadores — inclusive da base governista — é que nem mesmo o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) sinaliza apoio a Mendonça. Nos bastidores, é dito que o filho de Bolsonaro não apoia o ministro da AGU. Outro na mesma situação é o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

O ex-presidente do Senado tem sido persuadido por evangélicos em sua base eleitoral, o Amapá, a apoiar Mendonça. O senador resiste à ideia e tem dito a aliados que falou diretamente a Bolsonaro que não apoiará o titular da AGU.

Por que a resistência entre aliados e o que Mendonça tem feito para contornar
Além da associação à questão religiosa, pesa contra Mendonça entre senadores a leitura de que, no STF, ele poderia ser um ministro “anti-político”. A leitura feita por alguns é que, na Suprema Corte, ele poderia ser alguém que “atacaria” a classe política.

Parte dessas suspeitas entre senadores tem sido aventada pelo passado do ministro na AGU. Mendonça foi diretor do Departamento de Patrimônio e Probidade, tendo coordenado a estrutura responsável por cuidar das ações da advocacia-geral junto à Lava Jato. A ideia de colocar uma “raposa” para cuidar do “galinheiro” não agrada alguns senadores.

Contudo, para evitar resistências entre senadores, Mendonça tem feito gestos diversos. O titular da AGU sinalizou defesa pela revisão das decisões monocráticas, uma pauta defendida no Senado. Para buscar apoio junto ao grupo dos senadores mais independentes, também acenou defesa à limitação de mandato de senadores e o apoio à prisão após condenação em segunda instância.

Para se cacifar para o STF, Mendonça continua se reunindo com senadores. Nesta terça-feira (6), almoçou com os senadores Wellington Fagundes (PL-MT), Carlos Portinho (PL-RJ), Daniella Ribeiro (PP-PB), Zequinha Marinho (PSC-PA), Plinio Valério (PSDB-AM), Jorginho Mello (PL-SC) e Maria do Carmo Alves (DEM-SE). A senadora Simone Tebet (MDB-MS) passou rapidamente pelo local, informou o jornal Valor Econômico.

O ministro de Bolsonaro procurou afastar temores de que o fato de ser evangélico norteará suas decisões no STF, caso seja aprovado. “Ele foi muito claro em dizer que a religião influencia em sua formação humana. Mas não vai tomar decisão na Corte baseado em sua fé evangélica”, afirmou Fagundes ao Valor Econômico. Mendonça também se reuniu com o senador Lasier Martins (Podemos-RS).

Aliados de Mendonça acreditam que o ministro tem tudo para vencer as resistências e sustentam que o ministro faz um bom trabalho de convencimento junto a senadores, a ponto de acreditarem em uma vitória próxima dos 50 votos no plenário. Interlocutores reconhecem que uma parte do Senado vai usar o atual momento político vivido pelo governo para fritá-lo, mas estão otimistas de que a articulação vem sendo bem conduzida.


André Mendonça terá de sobreviver à fritura dos adversários
“A partir de agora, começa a maratona para derrubar a indicação do André Mendonça”, aposta um interlocutor do STF ouvido pela Gazeta do Povo. Um indicado à Suprema Corte não se sustenta apenas com a aprovação junto a senadores. É, também, necessário sobreviver à fritura de outros postulantes à vaga no Supremo.

É comum nos bastidores que adversários tentem minar uma indicação a fim de se manter vivo politicamente. E a divulgação da escolha de Mendonça faltando uma semana para a aposentadoria do ministro Marco Aurélio não ajuda o titular da AGU.

Se Bolsonaro mantiver o compromisso feito com o presidente do STF, Luiz Fux, a indicação de Mendonça deve ser formalizada no Diário Oficial da União na próxima segunda (12) ou terça-feira (13), às vésperas do recesso parlamentar, que se inicia em 18 de julho. Sem apoio de Alcolumbre, a aposta entre senadores é que dificilmente a sabatina na CCJ ocorrerá antes de agosto.

Quanto mais dilatar o prazo para a sabatina, mais tempo Mendonça terá para se cacifar, mas, também, mais prazo terá para ser fritado. “Quanto mais demorar, mais artilharia e chances de embarreirar o André Mendonça adversários como o [Augusto] Aras [procurador-geral da República] vão ter. Quanto mais rápido for, melhor para o Mendonça”, analisa o cientista político Márcio Coimbra, coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília.

Adversários de André Mendonça tem usado suas articulações no Senado para miná-lo nos bastidores, inclusive junto a senadores menos afeitos pelo ministro. A alegação é de que, sem sua indicação ter sido oficializada no Diário Oficial da União, ele não tem a legitimidade para se posicionar como candidato efetivo. “Agora, é o momento que vão investigar a vida dele, olhar com lupa a tese de mestrado, doutorado, checar a relação com o [Dias] Toffoli [ministro do STF]”, sustenta o interlocutor da Suprema Corte.

Quem são os adversários de André Mendonça por uma vaga no STF
A escolha por Mendonça é o “plano A” de Bolsonaro. No Palácio do Planalto, interlocutores do governo afirmam que, hoje, não existe um “plano B”. Mas há outros nomes no páreo para Bolsonaro optar caso queira retirar a indicação.

Um dos mais citados nos bastidores é o ministro Humberto Martins, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ). É o nome preferido de Davi Alcolumbre; do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); e de Flávio Bolsonaro.

Outro citado é o do PGR, Augusto Aras. É um nome que conta com o apoio do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). O ministro Luís Felipe Salomão, do STJ, é apoiado por Fux, presidente do STF, mas corre por fora na disputa.

O ministro Ives Gandra Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), é outro cotado. É apoiado pelos militares, que têm grande apreço pelo pai do magistrado, o jurista Ives Gandra Martins, que foi professor de muitos dos generais na Escola Superior de Guerra.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/republica/qual-clima-no-senado-para-aprovar-andre-mendonca-no-stf/
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GOVERNO QUER VENDER 100% DOS CORREIOS

 

Editorial
Por
Gazeta do Povo

Plano do governo é vender 100% dos Correios.| Foto: Gerson Klaina/Tribuna do Paraná

A desestatização da Eletrobrás, aprovada no Congresso e à espera de sanção presidencial, não agradou completamente alguns defensores da redução do mastodonte estatal brasileiro. Não tanto por causa dos jabutis inseridos ali pelos deputados e senadores, impossíveis de remover graças a um truque mal-intencionado de redação legislativa, mas por causa do modelo de diluição da participação da União pela emissão de novas ações, mantendo ainda o governo como principal acionista, embora minoritário. Estes críticos não terão do que reclamar no caso dos Correios, se a promessa do secretário de Desestatização, Diogo MacCord, for cumprida: a venda total do capital da empresa.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quer votar o Projeto de Lei 591/21 na próxima semana, antes do recesso parlamentar. Se o Senado tiver a mesma celeridade, o governo poderia publicar o edital do leilão de privatização ainda neste ano. O projeto tem um alcance mais amplo que a mera venda da estatal, regulamentando o Sistema Nacional de Serviços Postais e estabelecendo de que maneira a União cumprirá a obrigação constitucional de “manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”, prevista no artigo 21, X da Carta Magna, sem exigir que o governo seja proprietário de uma empresa de serviços postais.

Há o risco de os parlamentares repetirem com os Correios a mesma farra dos jabutis que desfigurou o projeto de desestatização da Eletrobrás

Mesmo que ainda longe do nível de qualidade que fez dos Correios uma das instituições mais respeitadas pelos brasileiros por décadas, a empresa está se recuperando do desastre a que foi submetida durante a era petista. Os quatro anos seguidos de lucro (embora turbinado por uma isenção fiscal) ainda não compensaram os quatro anos anteriores de prejuízo, mas demonstram o potencial dos Correios – em setembro do ano passado, o ministro Fábio Faria, das Comunicações, afirmou que havia ao menos cinco interessados no leilão, incluindo gigantes estrangeiros.

O fato de a empresa ter voltado a ser lucrativa, aliás, não pode servir de argumento para que ela não seja privatizada, como afirmaram muitos parlamentares nas discussões sobre a privatização da Eletrobrás, que também fechou 2020 com lucro. O principal critério para se definir o que privatizar não pode ser o caráter lucrativo ou deficitário da estatal. A questão que precisa ser enfrentada é se a iniciativa privada é capaz de prestar o serviço postal com eficiência e qualidade. Se a resposta for afirmativa, não há razão para que o Estado atue diretamente no setor, muito menos em regime de monopólio. E, assim como no caso da Eletrobrás, não se trata apenas do respeito ao princípio da subsidiariedade, mas também de livrar empresas grandes de nefastas ingerências políticas. Nunca é demais recordar que foi uma investigação de corrupção nos Correios que levou às denúncias do mensalão, o primeiro dos grandes esquemas petistas para fraudar a democracia brasileira.


Ainda assim, há preocupações legítimas em torno da privatização, e a principal delas é a manutenção da capilaridade do serviço, já que os Correios estão hoje em 5.556 dos 5.568 municípios brasileiros, e em muitos deles a operação gera mais custos que receitas. No entanto, tanto uma lei quanto um edital bem redigidos podem garantir a continuidade do serviço postal em toda a extensão do território nacional; pode-se fazer um paralelo com as concessões de aeroportos pelo modelo de blocos, em que os consórcios vencedores arrematam terminais grandes e pequenos, com a obrigatoriedade de investimento em todos eles. A experiência internacional na privatização de serviços postais também precisa ser bem aproveitada.

Na verdade, talvez a maior ameaça esteja no Congresso Nacional – não tanto na esquerda estatizante, mas naqueles que, a exemplo do que fizeram no caso da Eletrobrás, podem alterar significativamente o projeto para garantir privilégios ou impor novos custos, reduzindo a competitividade futura dos Correios, afastando potenciais interessados e encarecendo o serviço postal. A farra dos jabutis da Eletrobrás não pode se repetir no caso dos Correios.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/editoriais/a-privatizacao-dos-correios/
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CPI NEGA DIREITO DE RESPOSTA COM DENUNCIADO

 

Acusado de malfeitos

Por
Alexandre Garcia – Gazeta do Povo

Brasília – O ministro da Saúde, Ricardo Barros, durante anúncio de novos recursos para o fortalecimento da Atenção Básica. (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, recorreu ao STF para exigir que a CPI agende o seu depoimento.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal mandou abrir a CPI da Covid, estabeleceu quem pode e quem não pode ir, definiu quem tem direito a ficar quieto na comissão e até quem pode levar advogado.

Agora, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), pediu ao STF que seja chamado para depor na CPI. Ele quer ir à comissão tentar entender por que seu nome foi envolvido nessa “conspiração” — como dizem os irmãos Miranda — sobre a vacina indiana Covaxin.

Barros diz que não tem nada a ver com isso. Tanto que a servidora do Ministério da Saúde Regina Célia, que depôs nesta terça-feira (6) na CPI, disse que nunca teve contato com o deputado, contrariando o que disseram os irmãos Miranda, e que nunca Ricardo Barros influenciou na pasta depois que deixou de ser ministro da Saúde no governo Temer.

O ministro do STF Ricardo Lewandowski deu cinco dias de prazo para a CPI explicar por que o depoimento de Ricardo Barros que estava marcado para quinta-feira (8) foi adiado e uma nova data não foi marcada. Barros está doido para falar aos senadores porque ficou no ar uma ilação, uma calúnia ou uma informação, que não tem a outra parte, não tem o outro lado. É um princípio básico da defesa o direito de resposta. Estão tirando, do deputado, o direito dele ir à CPI. Enfim, a comissão terá de se explicar com o ministro Lewandowski agora.

Miranda precisa se explicar
O senadores fizeram mil perguntas à servidora Regina Célia na CPI e ela respondeu a todas. Ela negou irregularidades na assinatura da liberação de compra da vacina Covaxin. Agora está na hora de o deputado Luís Miranda (DEM-DF) voltar à CPI para explicar aspectos do depoimento dele que estão inexplicados.

Doenças cardiovasculares matam muito
Peguei os dados de mortes da Organização Mundial de Saúde (OMS) e me surpreendi. Porque as doenças cardiovasculares, segundo a OMS, matam no mundo por ano quase 18 milhões de pessoas. E a Covid-19, nesses últimos 18 meses, matou pouco mais de 4 milhões.

Aí fico me perguntando por que os governos não fazem campanha para resolver essa matança por doenças cardiovasculares, que basicamente a gente sabe o que causa? É a má alimentação e o sedentarismo. São coisas fáceis de se corrigir a fim de reduzir esse número imenso de mortes.

As doenças cardiovasculares são a primeira causa morte do mundo e, em geral, ficam meio esquecidas na minha opinião até que a pessoa sofra um AVC ou um infarto.

André Mendonça no STF
O presidente Jair Bolsonaro anunciou que o substituto de Marco Aurélio Mello no STF será o ministro-chefe da AGU, André Mendonça — se o Senado aceitar. Os senadores irão submetê-lo a uma longa sabatina e depois acontece a votação.

André Mendonça é de Santos, tem 48 anos, é pastor presbiteriano e formado em Direito com pós-graduação na Universidade de Salamanca, na Espanha. Já trabalhou na Advocacia-Geral da União sob o comando de Dias Toffoli, atual ministro do Supremo.

Começou o governo Bolsonaro como ministro da AGU, depois foi ministro da Justiça e Segurança Pública e, por fim, voltou à AGU. Mendonça se enquadra no perfil “terrivelmente evangélico” que Bolsonaro falou anteriormente, mas também tem farta cultura jurídica.


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SE VOCÊ NÃO DEIXAR DE COMER CARNE POR CONTRA PRÓPRIA ELES FARÃO UMA LEI

 

Controle total
O que realmente está em jogo. Se você não deixar de comer carne por conta própria, eles farão leis.

Por
Daniel Lopez – Gazeta do Povo

Klaus Schwab está de olho no seu bife| Foto: Agência O Globo

O título deste artigo foi inspirado num vídeo recente do investidor Mark Moss, que abriu meus olhos para um problema que poucos têm comentado. A cada dia é mais frequente nas publicações online uma célebre frase atribuída a Henry Kissinger, antigo Conselheiro Nacional de Segurança dos EUA. Ela é mais ou menos assim: “Quem controla o abastecimento de alimentos controla as pessoas; quem controla a energia pode controlar continentes inteiros; quem controla o dinheiro pode controlar o mundo”. Um dos motivos que tem feito a citação ressurgir são as propostas relacionadas ao chamado Great Reset, tema que já abordei aqui em outras oportunidades. Muitos identificam certa histeria nos comentários sobre essa ousada proposta de repaginar o mundo como o entendemos. Um antídoto para fugir aos delírios é partir de fontes primárias. Por este motivo, inicio a presente reflexão retomando um artigo publicado por Klaus Schwab no site do Fórum Econômico Mundial (FEM) no dia 03 de junho de 2020. Nele, o economista alemão defende a tese de que a pandemia representa uma “rara mas estreita janela de oportunidade para refletir, reimaginar e redefinir nosso mundo para criar um futuro mais saudável, justo e próspero”. Deus queria que seja isso mesmo. Porém, costumo pautar minhas reflexões por um importante preceito bíblico: “Examine todas as coisas; retende o que é bom”. Examinemos.

Pode ser que o Great Reset seja apenas uma maneira de “melhorar o capitalismo”. Porém, alguns o interpretam a partir da premissa de Kissinger, enxergando na proposta uma maneira de faturar bilhões e aumentar ainda mais o controle dos poderosos sobre as massas. A frase do antigo diplomata coloca três pontos de análise sobre a busca pelo poder que todos devem sempre ficar de olho: o controle dos alimentos, da energia e do dinheiro. Em geral, especialistas abordam o “Grande Reinício” como uma nova ordem financeira global. Eles o enxergam como uma espécie de reedição do Acordo de Bretton Woods, que definiu, em 1944, um novo sistema de gerenciamento econômico internacional, formalizando regras para as relações comerciais entre os países mais desenvolvidos. No entanto, um aspecto não muito frequente das análises sobre esse novo cenário proposto é seu componente alimentício.

O grande argumento para uma reforma dos hábitos alimentares é a questão da mudança climática. Especialistas têm argumentado que precisaremos, a cada 2 anos, de reduções de carbono equivalentes à que tivemos no ano de 2020, para “manter os limites seguros para o aquecimento global”. E um dos instrumentos para evitar o caos climático é, na opinião deles, controlar o consumo de carne, o novo vilão do clima global.

No dia 17 de janeiro de 2019, foi publicado um artigo no site do FEM cujo título é bem elucidativo: “Por que todos nós precisamos seguir a ‘dieta da saúde planetária’ para salvar o mundo”. Neste ano, no dia 12 de março, foi publicado outro texto no site do Fórum com o título: “Soluções baseadas na natureza podem salvar o planeta, mas somente se mudarmos nossa dieta também”. E qual seria essa dieta miraculosa? Outro estudo publicado por eles responde: “As dietas à base de plantas serão essenciais para o futuro do planeta, diz relatório”. Para eles, a humanidade somente poderá salvar o planeta se deixar de comer carne e buscar outras proteínas alternativas. Há uma campanha já antiga que tenta estabelecer a associação dos gases liberados por touros e vacas como os grandes poluidores globais.

Nesse sentido, o que eles poderiam fazer para reduzir o número de vacas no mundo? Investir numa campanha contra o consumo? Isso eles já estão fazendo há muito tempo. Outro caminho mais recente, que muitos não percebem, é um movimento que os americanos estão chamando de “farmers squeeze”, que espreme o produtor rural. Eu escrevi um artigo recente sobre esse tópico. Os fazendeiros americanos estão sendo empurrados para fora do mercado. Grandes fundos de investimento estão se dedicando fortemente à aquisição de terras agricultáveis. Comentei, por exemplo, no referido artigo, que Bill Gates já se transformou no maior dono de fazendas nos Estados Unidos. Provavelmente ele não planeja investir na pecuária.

Em 27 de fevereiro de 2019, a Reuters publicou uma matéria mostrando que a dívida dos agricultores americanos subiu para níveis somente vistos durante a crise agrícola dos anos 1980. A pressão sobre os agricultores tem sido tão grande que estudos mostram que eles estão em primeiro lugar no ranking das profissões com maiores taxas de suicídio, com 85 mortes por 100 mil pessoas.

E quem são os maiores produtores de carne no mundo? Segundo o próprio Departamento de Agricultura americano, os EUA estão em primeiro lugar, o Brasil em segundo e a União Europeia em terceiro. Mas, nos EUA, apenas 4 empresas dominam 85% do mercado de produção de carne. E duas delas estão sob o controle de brasileiros…

Eles estão determinados a convencer (ou futuramente obrigar) o mundo a deixar de comer carne. Mas não divulgam os dados mostrando que alimentar vacas com algas marinhas pode reduzir sua emissão de metano em até 82%, conforme estudo publicado no dia 18 de março no jornal inglês The Guardian.

Com os Estados Unidos agora de volta ao Acordo de Paris, os signatários estão programando trilhões em investimento anual para adequar as finanças internacionais a empresas e governos que sejam partidários dessa nova moda. Aí você imagina que os grandes controladores da produção de carne mundial estariam contra esse projeto, certo? Errado. Alguns já entraram na corrida pela busca por substitutos para a carne. Eles já estão criando uma “coalizão global de proteína sustentável”.

O processo em curso é a concentração da produção de carne e a posse das terras agricultáveis cada vez nas mãos de menos pessoas. Nesse meio, surge Bill Gates argumentando que as nações ricas deveriam abandonar de vez o consumo de carne bovina e adotar completamente o bife sintético. Curiosamente, ele disse que, caso não seja possível alterar de forma espontânea os hábitos alimentícios das pessoas, poderão ser usadas regulações para mudar completamente a demanda. Talvez seja só uma coincidência o fato de ele investir em inúmeras empresas desse ramo de carne artificial. Mas fique tranquilo caso não queira comer bife sintético. Existem outras opções muito “interessantes”, conforme matéria do último dia 8 de maio, que trouxe o seguinte título: “Se queremos salvar o planeta, o futuro da alimentação são os insetos”…

Será que esse pessoal está realmente preocupado em salvar o planeta, ou em controlá-lo? Dinheiro, energia e comida. Nunca foi tão importante parar e pensar sobre isso. Depois que as leis forem aprovadas, já será tarde demais.


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CPI DA COVID ATIRA PARA TODOS OS LADOS

 

Ofensiva contra governo
Por
Olavo Soares – Gazeta do Povo
Brasília

O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni; participa de coletiva de imprensa no Palácio do Planalto

Ministro Onyx Lorenzoni pode ser convocado a dar explicações na CPI sobre anúncio de que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) será investigado pelo governo.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A CPI da Covid do Senado pode ter, nesta quarta-feira (7), um dia de notícias negativas ao governo federal. A comissão votará requerimentos que, entre outras demandas, pedem a convocação do ministro Onyx Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência, e a quebra do sigilo do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

Barros já teve sua convocação aprovada pela comissão, mas ainda não há uma data agendada para o depoimento. O parlamentar chegou a acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir para ser ouvido, medida que contrariou os senadores da CPI — segundo eles, a agenda da comissão é feita pelos integrantes do colegiado, não por agentes externos.

Outra convocação que a CPI pode decidir nesta quarta é a do diretor da Anvisa, Antonio Barra Torres. Ele já foi à comissão, em maio, e teve um novo pedido apresentado pelo vice-presidente do colegiado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). No pedido, o parlamentar alega que Barra Torres pode trazer informações sobre a compra da vacina Covaxin pelo Ministério da Saúde, negócio que entrou nas prioridades da comissão.

Os senadores governistas esperam, por sua vez, que a CPI vote a convocação de testemunhas que falariam sobre denúncias de corrupção em estados e municípios. Os parlamentares alinhados com a gestão de Jair Bolsonaro alegam que as principais falhas do Brasil no combate à pandemia de coronavírus se dão por problemas de gestão e por corrupção praticada por governadores e prefeitos.

Entre os nomes que os governistas querem ouvir e que poderão ter a convocação aprovada nesta quarta estão o de Bruno Dauster, ex-secretário da Casa Civil do governo da Bahia, e Cristiana Prestes, dona da empresa Hempcare Pharma Representações Ltda. A Hempcare comercializou respiradores com o Consórcio Nordeste, que representa os nove estados da região; os equipamentos, porém, não foram entregues. A negociação tem ainda denúncias de superfaturamento.

Testemunha-bomba fala sobre cobrança de propina
O governo também tende a ser pressionado por conta do depoimento desta quarta na CPI. A comissão receberá o ex-servidor Roberto Ferreira Dias, do Ministério da Saúde. Ele foi acusado pelo policial militar Luiz Dominguetti de pedir propina de US$ 1 dólar a cada dose da vacina AstraZeneca comercializada pela Davati, empresa para a qual Dominguetti trabalha, com o governo federal. Dias nega ter feito a cobrança, mas confirma que teve encontros com Dominguetti.

Líder do DEM no Senado e defensor do governo na CPI, Marcos Rogério (RO) disse considerar o depoimento de Dias como “oportunidade de enfrentar os questionamentos em relação a uma acusação que foi feita”. Segundo o parlamentar, a suposta transação intermediada por Dominguetti não se concretizou e não há nem sequer comprovação de que o policial militar falava em nome da AstraZeneca. A empresa negou ter intermediários para negociação com o governo brasileiro.

“Eu vejo um esforço muito grande [da oposição] de tentar acuar o governo de práticas ilegais diante do inexistente, do chamado crime impossível”, afirmou. Também apoiador do Planalto, Luís Carlos Heinze (PP-RS) disse que não tem “nenhuma objeção a que membros do governo prestem esclarecimentos”, e recordou que as vacinas Covaxin e Sputnik V ainda não tiveram sua utilização no Brasil aprovada pela Anvisa.


Recesso na CPI vira dúvida
Durante a sessão da CPI desta terça, quando o colegiado ouviu a servidora Regina Célia Silva Oliveira, o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), disse que o grupo não fará o recesso do Senado, previsto para o período entre os dias 18 e 31 de julho. “Não temos direito de tirar férias enquanto pessoas estão morrendo”, declarou.

A quebra do recesso para a CPI tem sido demandada há dias por Aziz e pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL). O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ainda não se manifestou sobre o assunto. A Gazeta do Povo consultou a assessoria do Senado para saber sobre a possibilidade de a CPI manter as atividades mesmo com o restante da Casa em recesso, mas ainda não obteve retorno.

Adversário da gestão Bolsonaro, o senador Otto Alencar (PSD-BA) disse ser favorável ao cancelamento do recesso. “Uma interrupção de 15 dias é tudo que o governo precisa e quer para atrapalhar as investigações.  Mas não vamos recuar em nada”, afirmou.


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segunda-feira, 5 de julho de 2021

PRECISAMOS ACREDITAR EM ALGO

 

Paulo Silvestre – Jornal Estadão

A vida tem um jeito especial de eventualmente nos jogar em um turbilhão de fatos e tarefas que nos tiram a perspectiva de qual é nosso lugar no mundo. Passamos a viver um dia após o outro sem refletir sobre o que poderíamos fazer para melhorar. Quando isso acontece, para reconstruirmos nosso caminho, às vezes temos que primeiramente chegar ao fundo do poço.

É o caso da falta de confiança generalizada em nossa sociedade. Ela deriva de uma crise política e econômica que já dura sete anos, e que só vem piorando. A pandemia, que nos apresentou desafios nunca antes enfrentados, nos tirou ainda mais do nosso eixo. É o que demonstram os recentes estudos globais Digital News Report, do Instituto Reuters e da Universidade de Oxford, e o Trust Barometer, da consultoria Edelman.

O fato é que, se não confiamos em mais nada, ou quando apenas as nossas convicções pessoais guiam nossos atos, a sociedade se dissolve. Passamos a viver dentro de um eterno “diálogo de surdos”, em que ninguém mais constrói nada com o outro, indo cada vez mais para o fundo.

Temos que romper esse círculo vicioso!



A desconfiança é um sentimento natural diante do desconhecido ou de alguém que dá mostras de praticar atos questionáveis. É um sentimento de autopreservação legítimo contra quem potencialmente pode nos fazer algum mal. Mas ela não pode crescer sem limites. Caso contrário, chegamos no ponto em que estamos, com uma polarização irracional, o que afeta nosso próprio desenvolvimento ao excluirmos possibilidades sociais.

Por exemplo, será que só podemos comprar de quem pensa igual a nós? Se a pessoa tiver outras ideias, será que tudo que ela faz é necessariamente ruim? Por outro lado, será que tudo feito por quem pensa como nós é bom? Contratar pessoas que são diferentes de nós seria uma ameaça ao nosso estilo de vida?

Claro que nenhuma dessas ideias extremistas é verdadeira! Mas pensamentos como esses estão guiando a nossa vida.

As pessoas acreditam no que elas quiserem, no que lhes for mais conveniente. Sempre foi assim! Mas algo mudou em nossos cérebros há alguns anos, com o apoio das redes sociais.

Para nos vender todo tipo de coisa, seus algoritmos nos mantêm enjaulados em uma zona de conforto de pensamento único. Qualquer ideia que tivermos parece ser corroborada pelo mundo, quando, na verdade, é apenas um recorte da sociedade filtrado pelo sistema, escondendo de nós pensamentos divergentes. Trata-se do que o ativista digital americano Eli Pariser chamou, há uma década, de “filtro bolha”.

Tanto é assim que, em 2016, o renomado Dicionário Oxford elegeu “pós-verdade” como a “palavra do ano”. Na sua definição, ela é “relativa ou referente a circunstâncias nas quais os fatos objetivos são menos influentes na opinião pública do que as emoções e as crenças pessoais.”

Eu me pergunto se os organizadores da obra imaginavam quão proféticos estavam sendo ao escolher essa palavra.

O papel do jornalismo

Os veículos de informação têm um papel decisivo nesse resgate da verdade e da confiança. E, se alguém tinha alguma dúvida, isso ficou claro durante a pandemia: quando a situação ficou realmente crítica, a população correu para eles em busca de notícias confiáveis. Ou seja, apesar de toda a campanha de difamação que sofrem, eles conseguem manter uma boa reputação, especialmente quando as fontes “alternativas” de conteúdo carregam demais na pós-verdade.

O Digital News Report demostrou que a confiança aumentou em plena pandemia. Com informações de 46 países, que representam metade da população global, o relatório indica que a confiança no jornalismo cresceu seis pontos percentuais em 2021, chegando a 44%, mesmo índice de 2018. Além disso, aumenta a distância entre a confiança em veículos jornalísticos e em conteúdos nas redes sociais, que estacionaram em 24%.

O Brasil ficou em sétimo lugar entre esses países na confiança da população na imprensa, com 54%, empatado com Bélgica e Nigéria. O país em que a população mais acredita no jornalismo é a Finlândia, com 65%. Já nos Estados Unidos, que têm uma das melhores imprensas do mundo, apenas 29% da população acredita nos veículos de comunicação.

Isso é explicado pelos dados do Trust Barometer, que indica que eleitores de políticos conservadores e que abusam da pós-verdade confiam pouco na imprensa. A péssima colocação dos EUA deriva, portanto, da cruzada do ex-presidente Donald Trump contra o jornalismo.

Pela metodologia desse relatório, a confiança global na imprensa chegou a 51%, 2% a mais que em 2020. No Brasil, a confiança é de 48%, 4% a mais que no ano anterior.

Linguagem e formato

O levantamento do Instituto Reuters e da Universidade de Oxford traz duas coisas importantes. A primeira é que alguns grupos sociais não se sentem bem representados pelos veículos jornalísticos, como negros, mulheres e eleitores conservadores. A outra é que apenas 18% dos jovens se informam assim, enquanto 60% fazem isso nas redes sociais, sendo cada vez mais atraídos por redes visuais, como Instagram e TikTok.

Muitos veículos tradicionais ensaiam distribuir seus conteúdos nessas plataformas, até mesmo no TikTok. Mas como passar a informação necessária e não perder sua credibilidade nesses formatos? O tradicional Washington Post, com 143 anos, contratou Dave Jorgenson como editor dedicado ao TikTok. Ele consegue um bom engajamento, mas não dá notícias na plataforma.

Os veículos precisam encontrar o caminho para se reconectar com o público. Eles não podem esquecer seus valores, que os tornaram respeitados, mas talvez tenham que abandonar boa parte do seu formato e da sua linguagem.

O jornalismo só é viável se estiver representando o público! Caso contrário, a pós-verdade de políticos mequetrefes manipulará ainda mais as massas, destruindo a confiança das pessoas em todas as instituições, o que, a médio prazo, colocará em risco a própria existência da democracia.

O historiador israelense Yuval Noah Harari afirma que o ser humano só alcançou a dominância do planeta por ser o único ser vivo com a capacidade de acreditar em desconhecidos para construir algo com eles. A isso, damos o nome de “sociedade”. Não podemos perder esse recurso essencial de construir algo em grupo.

Será que chegamos ao fundo do poço da confiança para começar a reconstruí-la? Eu espero que sim, ou o que será do Brasil e do mundo daqui a 20 anos? Os que hoje são jovens precisam aprender o valor do bom jornalismo, tornando-se melhores cidadãos. Já os veículos de informação precisam reassumir seu protagonismo. Para isso, devem lembrar para quem trabalham, que é o público, e não seus acionistas, nem os anunciantes e muito menos os grupos de poder.

Como disse certa vez o jornalista e artista Millôr Fernandes, “jornalismo é oposição; o resto é armazém de secos e molhados.”

Quanto a nós, todos nós, temos que reaprender a confiar no outro, mesmo em quem pensa diferentemente de nós. Só assim tiraremos nossa sociedade desse atoleiro em que está metida.

A ESCOLA BRAILEIRA PRECISA SOFRER UMA TRANFORMAÇÃO RADICAL

 

Diz Daniel Castanho, do grupo Ânima Educação

Sonia Racy – Jornal Estadão

Daniel Castanho. Foto: Claudio Belli

A educação brasileira “tem de passar por uma transformação enorme”. Quem o diz, e que se dedica a essa causa há muito tempo, é o empresário Daniel Castanho – que faz de seu grupo, a Anima Educação, o laboratório de uma “comunidade de aprendizagem” de 350 mil alunos e 18 mil educadores.

A transformação a que ele se refere, pressupõe uma condição: “Você tem de pensar o futuro vindo do futuro”. O que, segundo ele, significa “quebrar toda a estrutura dogmática que existe dentro da escola atual”. Pois “essa escola da forma como está estruturada, morreu. Professor que quer controlar o aluno, acabou”.

Castanho quer tirar da frente dos alunos, por exemplo, disciplinas como Matemática, Física, Português… Na verdade, já está tirando, pois o modelo de ensino que se pratica em suas escolas é integrado e holístico. “No Anima não temos mais a área de tecnologia, pois ela está presente na empresa como um todo”. E a pandemia do coronavírus, nisso tudo? “O que ela está fazendo é antecipar o que já precisaria estar mudado”.

Nesta entrevista, o educador deixa claro o que pretende atingir: “No final, a gente não é o que a gente junta, mas o que a gente espalha. A vida tem que ser pautada pela capacidade de sonhar. Quem não sonha já morreu”. A seguir, os melhores trechos da conversa.

Como a pandemia está mudando a educação?
A educação tinha, e tem, que passar por uma transformação enorme. A pandemia não transformou nada, o que ela está fazendo é antecipar o que já precisaria ser mudado. Quem sabe essa mudança será estrutural. Por exemplo, o ensino a distância vai deixar de existir, vai ser o ensino permeável, fluido, integrado, indissociável. Sem esse negócio de ensino a distância e/ou presencial.

E o que é exatamente essa mudança estrutural?
Veja, a escola atual foi desenhada na época da revolução industrial, cujo propósito era tirar a pessoa do campo e levá-la pra indústria. Ou seja, ela oferece a mesma coisa pra todo mundo, ensino formalizado, disciplinas. Aí tem algo grave, aprende-se alguma coisa e não se vê nenhum sentido. A escola está estruturada para que o aluno faça uma prova que não tem significado.

Eu aprendi um montão de coisas que não usei.
Não é que não sirva, hoje a gente sabe que precisa aprender, o cérebro desenvolve um conjunto heterogêneo de saberes. Quem vai fazer medicina tem de aprender Física por quê? Por causa da lógica. Se você faz Medicina, não importa se é questão de Matemática ou Física. O que conta é que você fica mais inteligente de uma maneira holística. Mas o fato é que você não aprende, você decora. Pra quê? Decora para a prova. E depois estuda na universidade pra quê? Para tirar o diploma. Aí vai trabalhar pra quê? Para ganhar dinheiro. E nunca para o seu propósito, pra ser um empreendedor, pra fazer uma coisa de que goste. Ser empreendedor não é ter uma empresa, é ser um resolvedor de problemas. Enfim, voltando à questão central, o aluno tem de entender por que está aprendendo aquilo.

O método, no sentido da maneira de ensinar, tem sido o mesmo há quanto tempo?
É o mesmo desde sempre. Mas além do significado, você tem de aumentar a qualidade da presença. Porque você tem de estar onde está. Tem um ditado indiano que diz que o segredo da felicidade é você estar onde está. Muita gente está no trabalho pensando no fim de semana, e no fim de semana pensa na reunião… A qualidade da presença é o quê? É estar na aula com desejo de aprender. Você só aprende por curiosidade ou necessidade.

No fundo, é a diferença entre decorar e aprender, não?
Isso. Mas aí, a escola está estruturada com sistemas de ensino e as duas coisas têm que mudar. Sistema é um negócio fechado, o mesmo para todo mundo, nada personalizado. E aí tem o ensino. O foco é o que eu ensinei, não o que você aprendeu. A gente tem de migrar o sistema de ensino para ecossistemas de aprendizagem, onde o foco não é o que se ensinou, mas o que o aluno aprendeu. E a metodologia envolve muita coisa. A começar pela transmissão do conteúdo: todos aprendendo a mesma coisa. Você aprende algo para uma prova que tem um gabarito. Se tem gabarito, cabe num algoritmo. Se cabe no algoritmo, pode ser substituída por um robô. E daí o que vemos? Que estamos preparando nossas crianças, nossos jovens, para fazer algo que pode ser substituído. Ou seja, os robôs vão roubar esse emprego deles.

O que se pode fazer a respeito?
O que eu lhe digo é que a tecnologia vai devolver a humanidade ao ser humano. De que forma? Tirando esses empregos que podem ser substituídos por algoritmo e gerando outros que tenham a ver com criatividade, com olhar o outro, com solidariedade, curiosidade. São os elementos que têm de estar presentes dentro da escola. Então, a escola vai passar por uma disrupção muito grande. Vai se aprender Matemática, Física, Português, mas também aulas de teatro e educação física, que vão te ensinar garra, determinação, o modo como você vai lidar com o erro. Na educação física, se você não acertou a cesta, pega a bola, tenta de novo, de novo… Exercita a resiliência. Na aula de artes, você enxerga o que não é explícito, ouve o que não foi falado. Coding e decoding serão a base dessa educação futura.

De que se trata?
Codificar e decodificar, ou programar e desconectar. Coding é programar – daí a enorme demanda por cursos de programação para aplicativos. Decoding é desconectar, entrar no flow, contato com a natureza, meditação, detox da tecnologia. Acredito que o futuro será o equilíbrio entre esses dois momentos.

Há uma ideia hoje, nas empresas, de que na hora de contratar alguém, o domínio técnico ficou menos importante do que competência comportamental.

Esse é um assunto incrível. Muitas vezes você tem na escola gente de um nível parecido, um pouco mais homogêneo. E depois vêm as redes sociais, cujos algoritmos foram desenhados pra te mostrar exatamente o que você já pensa. E aí você começa a achar que todo mundo pensa igual… Todo mundo quem? Todo mundo a quem você deu like, que você curtiu… Resultado: as pessoas se tornam xenofóbicas, com dificuldade de escutar. Tá cada vez mais polarizado.

O que uma escola pode fazer a respeito?
O papel da escola é ampliar a diversidade. E não é porque está todo mundo falando, é porque as empresas estão exigindo. A empresa precisa conviver com as diferenças, a escola precisa promover diferenças e diversidades para que as pessoas possam refletir melhor. E por quê? Porque a gente está entrando num mundo do pós-emprego. Não se vai mais trabalhar com um time de marketing, outro de finanças, RH… Na Anima, por exemplo, não temos mais área de tecnologia, ela está na empresa como um todo. A empresa não tem um time de 20 mil pessoas, tem 2 mil grupos de 10 pessoas. E quem são esses? São os squads, os times. É a menina do RH com o rapaz das finanças, mais o de tecnologia atuando em um só projeto. Todos vão trabalhar por projeto, você não vai mais parar de estudar.

E como as escolas vão organizar essa aula?
Hoje você tem o professor que dá uma aula que poderia ser gravada e passada a diferentes classes e que o aluno pode ver e rever na hora em que quiser. O aluno apreende a mensagem e tem perguntas que depois, aí sim, vem o especialista para a aula síncrona. Não será uma aula, ele vai interagir, passar sua experiência. E digo mais: uma grande revolução vai ser quando metade da sala for de alunos da escola privada e metade da escola pública. Aí sim vamos ter uma revolução no País. A tecnologia criando uma comunidade de aprendizado.

Mas para isso cada um terá de assumir sua responsabilidade desde cedo. Como é que se consegue isso?
Hoje, ou você trabalha com confiança, autonomia e accountability ou você morreu. Não cabe mais no mundo uma estrutura comando-controle. A escola do modo como está estruturada morreu, professor que quer controlar o aluno, acabou. As empresas que atuam assim serão extintas, assim como os dinossauros.

Como você está fazendo suas mudanças na Anima?
Lá a gente não tem mais as disciplinas – Matemática I, Contabilidade I… Você tem o Business Plan. Parte dos professores está na Anima, parte está em empresas, porque é algo indissociável. A gente não desenvolve conteúdo, desenvolve competência. Primeiro você recebe conteúdo, amplia seu repertório, para depois ter a interação. É mão na massa, laboratório, trabalhando com os outros. O aluno não entra em Engenharia ou Medicina, ele entra na universidade, vê todas aquelas competências e vai estudando, não existe ex-aluno.

Ensinando dessa forma, o MEC reconhece depois?
Claro. Ele exige, para que o aluno seja um administrador, que tenha estes requisitos. Todos são cumpridos. Você pode fazer tudo na universidade seguindo o conteúdo da Base Nacional Comum Curricular, a BNCC.

Como realizar tudo isso sem que haja antes uma evolução do ser humano?
Como eu lhe disse, o futuro da escola, da universidade, está baseado no coding. É o uso da tecnologia. Mas não é melhorando um processo obsoleto. Você tem de pensar o futuro vindo do futuro. Repensar a escola quebrando toda essa estrutura dogmática que existe hoje. Por isso tem também o decoding, essa relação com a natureza, com outros seres humanos. E no final a gente não é o que a gente junta, é o que a gente espalha. A vida tem de ser pautada pela curiosidade, pela capacidade de sonhar. Quem não sonha já morreu.

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

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